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domingo, 25 de maio de 2008

O JOGO E O DESENVOLVIMENTO INFANTIL NA TEORIA DA ATIVIDADE E NO PENSAMENTO EDUCACIONAL DE FRIEDRICH FROEBEL



O JOGO E O DESENVOLVIMENTO INFANTIL NA TEORIA
DA ATIVIDADE E NO PENSAMENTO EDUCACIONAL DE
FRIEDRICH FROEBEL
ALESSANDRA ARCE*
RESUMO: Este artigo apresenta um estudo teórico comparativo da
pedagogia desenvolvida por Friedrich Froebel e da teoria da atividade
(Leontiev, Elkonin e Vigotski) no que diz respeito ao jogo e ao desenvolvimento
infantil. Ainda que essas duas abordagens considerem
o jogo uma atividade muito importante no desenvolvimento da criança,
elas diferem em sua visão do que seja o significado do jogo no
contexto do processo de formação do indivíduo. Essa divergência é
uma conseqüência de suas opostas concepções acerca da relação entre
a natureza humana e a história.
Palavras-chave: Jogo. Froebel. Elkonin. Leontiev. Teoria da atividade.
PLAY AND CHILD DEVELOPMENT IN
ACTIVITY THEORY AND FRIEDRICH FROEBEL’S EDUCATIONAL THOUGHT
ABSTRACT: This article presents a theoretical comparative study of
the pedagogy developed by Friedrich Froebel versus activity theory
(Leontyev, Elkonin and Vygotsky) concerning play and child development.
While both approaches consider play as a very important
activity in a child’s development, they differ in their view of the
meaning of play within the context of the individual formation process.
This divergence is a consequence of opposing conceptions of
the relationship between human nature and history.
Key words: Play. Froebel. Elkonin. Leontyev. Activity theory.
* Professora do Departamento de Psicologia e Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras da USP, campus de Ribeirão Preto, e membro dos Grupos de Pesquisa “História,
Sociedade e Educação no Brasil” e “Estudos Marxistas em Educação”. E-mail:
alessandraa@ffclrp.usp.br e learce@uol.com.br
10 Cad. Cedes, Campinas, vol. 24, n. 62, p. 9-25, abril 2004
Disponível em
O jogo e o desenvolvimento infantil na teoria da atividade e no pensamento...
objetivo deste artigo é analisar as semelhanças e diferenças entre,
por um lado, Froebel e, por outro, Elkonin e Leontiev, no
que diz respeito às contribuições que esses autores deram à psicologia
do desenvolvimento infantil e à educação pré-escolar. Para isso
faremos uma comparação entre as idéias de Froebel e as da teoria da
atividade acerca do papel do jogo no desenvolvimento da criança em
idade pré-escolar. Dividimos este texto em três partes. A primeira destina-
se a apresentar de forma breve a concepção de Froebel de desenvolvimento
infantil e do papel do jogo. A segunda apresenta as concepções
de Elkonin e Leontiev também sobre o desenvolvimento
infantil e o jogo. Na terceira parte apresentamos as conclusões a que
chegamos com essa análise comparativa.
O jogo em Froebel – a auto-atividade e a unidade vital respeitando
o desenvolvimento infantil
Para apresentarmos os princípios norteadores do desenvolvimento
infantil que alicerçam a concepção de jogo de Froebel,1 utilizaremos
duas obras deste autor: A educação do homem (The education
of man) e a Pedagogia dos jardins-de-infância (Pedagogics of the
Kindergarten).
Froebel em seu livro A educação do homem inicia sua explicação
de como se dá o desenvolvimento humano, em especial o infantil,
afirmando que Deus é o princípio de tudo e que a vida do homem
deve buscar harmonizar-se com sua divindade e com todas as outras
criações divinas. O divino presente em cada coisa que existe sobre a
terra revela sua essência. O homem deve procurar esta essência divina
no interior de si mesmo para então cultivá-la e exteriorizá-la em suas
criações. Jesus é para Froebel um exemplo da luta espiritual que devemos
travar em busca de nossa perfeição e da nossa união com Deus
e a Natureza. Esta lei eterna e divina, à qual Froebel se refere, guia o
desenvolvimento de todos os seres na Terra. Apesar das particularidades
que envolvem o desenvolvimento dos seres e os fenômenos da Natureza,
nós podemos, por meio do acompanhamento desse processo,
compreender como se dá o desenvolvimento humano.
Por isso encontraremos em toda a obra de Froebel a constante
comparação do desenvolvimento da criança com o das sementes; a criCad.
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Disponível em
Alessandra Arce
ança para Froebel é como uma semente a ser cultivada e, conseqüentemente,
o educador alemão procurará a harmonização do homem
com a Natureza desde a mais tenra idade. Para Froebel o princípio a
partir do qual todos os homens seriam iguais se encontrava na relação
entre infância e Natureza. Somente conhecendo as relações entre infância,
Natureza e Deus é que poderíamos presentear cada indivíduo
com o autoconhecimento e a aceitação de seu lugar em nossa sociedade.
Como conseqüência desse processo teríamos uma sociedade melhor.
Esta relação entre Deus, Natureza e Humanidade era representada
por Froebel (1887) por meio de um triângulo. Os três elementos
dessa tríade seriam inseparáveis uns dos outros. Essa tríade formaria
o que Froebel denominava “unidade vital”, na qual a educação deveria
estar alicerçada para poder conduzir o indivíduo ao desenvolvimento
pleno. Dentro do princípio da “unidade vital” os processos de
interiorização e exteriorização seriam fundamentais, pois levariam à
clarificação da consciência ao autoconhecimento, ou seja, à educação.
A formação e o desenvolvimento ocorrem graças ao que o homem recebe
do mundo exterior, mas só se efetivam de modo eficaz quando
se sabe, por assim dizer, tocar no seu mundo interior. Este processo
chamado de interiorização consiste no recebimento de conhecimentos
do mundo exterior, que passam para o interior, seguindo sempre
uma seqüência que deve caminhar do mais simples ao composto, do
concreto para o abstrato, do conhecido para o desconhecido. A atividade
e a reflexão são os instrumentos de mediação desse processo nãodiretivo,
o que garante que os conhecimentos brotem, sejam descobertos
pela criança da forma mais natural possível. O processo
contrário a este é chamado de exteriorização, no qual a criança
exterioriza o seu interior. Para que isso ocorra, a criança necessita trabalhar
em coisas concretas como a arte e o jogo, excelentes fontes de
exteriorização. Uma vez exteriorizado seu interior, a criança passa a ter
autoconsciência do seu ser, passa a conhecer-se melhor: é assim que a
educação acontece. Para Froebel a educação deveria estar alicerçada na
“unidade vital” (Homem, Deus e Natureza) e os processos de
exteriorização e interiorização deveriam nortear qualquer metodologia
que viesse a ser utilizada com as crianças. Estes processos de
exteriorização e interiorização precisam da ação para mediá-los, necessitam
de vida e atividade, não de palavras e conceitos. Froebel via
na exteriorização e na interiorização a concretização de algo natural
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O jogo e o desenvolvimento infantil na teoria da atividade e no pensamento...
na criança, devendo o educador estar sempre atento a esses dois processos,
pois toda a atividade externa da criança é fruto de sua atividade
interna.
Agir pensando e pensar agindo era, para Froebel, o melhor método
para evitar que o ensino por demais abstrato prejudicasse o desenvolvimento
dos talentos dos alunos. Esse método preconizado por
Froebel levaria os alunos à compreensão da tríade que guia todas as
suas vidas abrindo, portanto, as portas para se atingir a perfeição como
ser humano. O aprender fazendo, proposto por Froebel, respeita, antes
de tudo, a metodologia natural das crianças. Segundo Froebel, a
máxima que deve reger toda a educação é “(...) observar, apenas observar,
pois a criança mesma te ensinará” (apud Cole, 1907, p. 26).
Somente assim o professor será capaz de conhecer realmente seu aluno,
entendendo sua dinâmica interna e descobrindo sua essência humana,
seu potencial, seu talento. Em seu livro Pedagogia dos jardinsde-
infância, Froebel reforça este princípio afirmando que todo o
esforço da educação e dos educadores deve estar voltado para o
favorecimento do desenvolvimento livre e espontâneo do indivíduo.
Todo ser humano, tendo sido criado por Deus, também possui imensa
criatividade.
A educação, trabalhando com o princípio da “unidade vital”, a
partir da ação que favorece a exteriorização e a interiorização, leva a
criança, segundo Froebel, a conhecer e reconhecer Deus em todas as
suas obras, especialmente na Natureza. Essa forma de educação também
levaria a criança a se reconhecer dentro dessa “unidade vital”,
harmonizando-se com ela. Por trabalhar de forma fragmentada, a escola
não consegue perceber essa unidade, seu trabalho é morto, o exterior
e o interior são justapostos, tornando-se impossível uma aprendizagem
viva. O educador deveria respeitar a Natureza, a ação de
Deus e a manifestação espontânea do educando. A educação deve seguir
o livre desenvolvimento, não podendo ser prescritiva, determinista
e interventora, pois assim destrói a origem pura da Natureza
do educando. Por isso, Froebel utiliza o termo “educação sequitória”,
ou seja, aquela que vigia e protege as energias naturais da vida.
Alicerçada na experiência, essa pedagogia se centra na orientação e no
despertar da atividade espontânea da criança, disseminando qualidades
e aniquilando defeitos, por meio do desenvolvimento pleno da
harmonia entre Homem, Deus e Natureza.
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Alessandra Arce
Em A educação do homem o educador alemão dá os primeiros
passos rumo à utilização de uma psicologia do desenvolvimento como
fundamento da educação, por intermédio da divisão do desenvolvimento
humano em estágios: a primeira infância, a infância e a idade
escolar. Esses estágios são apresentados por Froebel de forma muito
mais detalhada do que o fizera Pestalozzi. Froebel atrela a cada fase
um tipo de educação que deve respeitar as características próprias da
fase. Isso fica muito claro num dos textos dessa obra, intitulado “O
homem no primeiro período da infância”. Em certo momento desse
texto Froebel explica que, se o adulto observar, por exemplo, o jogo e
a fala de uma criança, poderá compreender o nível de desenvolvimento
no qual ela se encontra. Isso significa que a observação das atividades
espontâneas da criança, como a brincadeira e a fala, é de grande
importância para o êxito da atividade educativa.
Para a realização do autoconhecimento com liberdade, Froebel
elege o jogo como seu grande instrumento, juntamente com os brinquedos.
O jogo seria um mediador nesse processo de autoconhecimento,
por meio do exercício de exteriorização e interiorização da
essência divina presente em cada criança, levando-a assim a reconhecer
e aceitar a “unidade vital”. Froebel foi pioneiro ao reconhecer no
jogo a atividade pela qual a criança expressa sua visão do mundo. Segundo
Froebel o jogo seria também a principal fonte do desenvolvimento
na primeira infância, que para ele é o período mais importante
da vida humana, um período que constitui a fonte de tudo o que
caracteriza o indivíduo, toda a sua personalidade. Por isso Froebel
considera a brincadeira uma atividade séria e importante para quem
deseja realmente conhecer a criança.
Brincadeira. – A brincadeira é a fase mais alta do desenvolvimento da criança
– do desenvolvimento humano neste período; pois ela é a representação
auto-ativa do interno – representação do interno, da necessidade e do impulso
internos. A brincadeira é a mais pura, a mais espiritual atividade do
homem neste estágio e, ao mesmo tempo, típica da vida humana como um
todo – da vida natural interna escondida no homem e em todas as coisas. Por
isso ela dá alegria, liberdade, contentamento, descanso interno e externo, paz
com o mundo. Ela tem a fonte de tudo o que é bom. A criança que brinca
muito com determinação auto-ativa, perseverantemente até que a fadiga física
proíba, certamente será um homem determinado, capaz do auto-sacrifício
para a promoção do bem-estar próprio e dos outros. Não é a expressão
mais bela da vida neste momento, uma criança brincando? – uma criança to14
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O jogo e o desenvolvimento infantil na teoria da atividade e no pensamento...
talmente absorvida em sua brincadeira? – uma criança que caiu no sono tão
exausta pela brincadeira? Como já indicado, a brincadeira neste período não
é trivial, ela é altamente séria e de profunda significância. Cultive-a e crie-a,
oh, mãe; proteja-a e guarde-a, oh, pai! Para a visão calma e agradável daquele
que realmente conhece a Natureza Humana, a brincadeira espontânea da
criança revela o futuro da vida interna do homem. As brincadeiras da criança
são as folhas germinais de toda a vida futura; pois o homem todo é desenvolvido
e mostrado nela, em suas disposições mais carinhosas, em suas
tendências mais interiores. (Froebel, 1887, p. 55-56)
Em seu livro Pedagogia dos jardins-de-infância (1917, p. 93),
Froebel reforça a idéia acima exposta ressaltando que a brincadeira é a
chave para nos comunicarmos e conhecermos a criança pequena. O
autor ainda destaca que a brincadeira desenvolve as características humanas
das crianças, auxiliando meninos e meninas a encontrarem e
exercerem desde cedo o papel que lhes cabe na sociedade.
Muitas características humanas desenvolvem-se na criança pela sua brincadeira
com a boneca, porque em razão disso sua própria Natureza se tornará,
em um certo tempo, objetiva e daí reconhecível para a criança e para os pensativos
e observadores pais e babás. Daí se tornar visível mais tarde, através
da e pela diferença espiritual, a diferença de vocação e vida entre o menino
e a menina. O menino deslumbra-se com o brincar com a esfera e o cubo
como coisas separadas e opostas, enquanto a menina ao contrário desde cedo
se deslumbra com a boneca, o que intimamente une em si os opostos da esfera
e do cubo. O significado interno deste fato é que o menino pressente
cedo e sente seu destino – comandar a e penetrar na Natureza externa – e a
menina antecipa e sente seu destino – cuidar da Natureza e da vida. Isso
aparece um pouco mais tarde. Assim como a união do esférico e do angular
é, especialmente para a garota, uma boneca, uma criança de brincadeira, da
mesma forma a régua da mãe, ou a bengala do pai são, para o garoto, um cavalo,
um cavalinho de pau. O último expressa o destino masculino do garoto,
aquele de dominar a vida; o primeiro expressa o destino feminino da menina,
de cuidar da vida. (Froebel, 1917, p. 93)
Froebel reconhecia que o jogo varia conforme a idade da criança.
O professor não deve menosprezar esse aspecto, mas sim, ao contrário,
observá-lo com atenção e trabalhá-lo adequadamente, auxiliando
assim o desenvolvimento infantil. No capítulo em que Froebel
descreve a infância, em A educação do homem (1887, p. 112-113), ele
chama a atenção para as diferenças existentes entre as brincadeiras na
primeira infância e na infância. Na primeira infância as brincadeiras
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seriam mais centradas na atividade, no movimento, no início do processo
de exteriorização da criança. No período chamado por Froebel
de infância, a brincadeira seria mais grupal que no período da primeira
infância. Esse caráter grupal da brincadeira na infância produziria
o desenvolvimento moral das crianças e as prepararia para a convivência
em harmonia.
Na obra Pedagogia dos jardins-de-infância (1917), Froebel apresenta-
nos os seus brinquedos criados para auxiliar a brincadeira infantil
sem ferir seu desenvolvimento natural. Os brinquedos criados
para este fim foram chamados de “dons”. Froebel assim chamou esses
brinquedos, ou materiais educativos, porque eles seriam uma espécie
de “presentes” dados às crianças, ferramentas para ajudá-las a descobrir
os seus próprios dons, isto é, descobrir os presentes que Deus
teria dado a cada uma delas. Com esses brinquedos Froebel cristalizou
importantes concepções a respeito do jogo, como por exemplo:
ele observou que o jogo só funciona se as regras são bem entendidas;
a continuação do jogo requer sempre a introdução de novos materiais
e idéias; por essa razão existem muitas ocasiões nas quais o adulto
deve brincar junto com a criança para auxiliá-la e manter vivo seu interesse.
Todos os jogos de Froebel que envolvem os “dons” sempre começavam
com as pessoas formando círculos, dançando, movendo-se e
cantando. Dessa forma elas atingiriam a perfeita unidade. Froebel percebeu
também, por meio desses jogos e brincadeiras, a grande força
que os símbolos possuem para a criança. Assim Froebel elegia a brincadeira
e os brinquedos como mediadores tanto no processo de apreensão
do mundo pela criança, por meio da interiorização, como também
no processo de conhecimento de si mesma pela criança (autoconhecimento),
por meio da exteriorização. Por essa razão o criador
dos Kindergarten entendia que os brinquedos e as brincadeiras não poderiam
mais ser escolhidos ao acaso. Eles deveriam ser estudados para
que se pudesse oferecer às crianças as atividades mais adequadas ao
seu nível de desenvolvimento.
Foi em seus jardins-de-infância que o autor procurou desenvolver
plenamente o trabalho com os dons. Nessas instituições ele conseguiu
reunir todos os seus princípios educacionais. Por isso, segundo
Liebschner (1992), não teria sido fácil para Froebel achar um
nome adequado para essa instituição, procurando durante vários meses
um nome que melhor se adequasse a esse novo estabelecimento.
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O jogo e o desenvolvimento infantil na teoria da atividade e no pensamento...
Ele não queria empregar a palavra “escola” por considerar que ela traria
o sentido de se estar colocando coisas na cabeça da criança, ensinando
algo, e não era esse o propósito dessa instituição. Seu propósito
residia em guiar, orientar e cultivar nas crianças suas tendências
divinas, sua essência humana por meio do jogo, das ocupações e das
atividades livres, tal como Deus faz com as plantas da Natureza. A
palavra alemã Kindergarten (jardim de crianças) conseguiu unir todas
estas idéias e princípios. Assim, estava criada a instituição na qual todos
os preceitos até aqui expostos iriam ser aplicados em toda a sua
plenitude, principalmente o que se refere ao respeito ao desenvolvimento
da criança e à subordinação da educação ao estágio no qual se
encontrasse tal desenvolvimento.
A teoria da atividade e o jogo – Elkonin e Leontiev e a psicologia
histórico-cultural
Ao fazermos a comparação entre Froebel e a psicologia sóciohistórica
não podemos deixar de ressaltar que não nos esquecemos do
fato de que Froebel viveu num contexto social e cultural totalmente
distinto e também não deixamos de reconhecer seu pioneirismo, especialmente
considerando que ele formulou suas concepções numa
época na qual a psicologia ainda não surgira como um campo da ciência.
Ao fazermos essa comparação entre Froebel de um lado e, de
outro, Elkonin, Leontiev e Vigotski, nosso foco se concentra principalmente
nas distintas concepções de ser humano e de sociedade e,
conseqüentemente, nas distintas concepções a respeito do jogo e do
desenvolvimento infantil.



Como vimos acima, Froebel realizou importantes descobertas a
respeito do jogo e do desenvolvimento infantil em seus estudos. Entretanto,
a base de suas discussões residia em uma infância naturalizada,
divina e universal. Fruto do divino, a infância era vista por
Froebel como o que de mais puro e bom existe no ser humano. Conseqüentemente,
este período da vida humana necessitaria de tempo,
tal qual uma flor. Essa fase do desenvolvimento humano deveria ser
preservada, resguardada de qualquer coisa que pudesse vir a perturbála.
Para Froebel existiria uma lei divina e eterna capaz de regular o
desenvolvimento infantil, tal como ocorreria com o desenvolvimento
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Alessandra Arce
de tudo o que existe na natureza. Perturbar impedindo que essa lei se
cumpra seria o mesmo que destruir a semente mais perfeita criada por
Deus: a criança e sua infância.
No século XX surgiu na União Soviética uma escola de psicólogos
estudando o desenvolvimento infantil e o papel da educação de maneira
oposta à do citado pedagogo alemão. Entre estes estudiosos encontramos
Vigotski, Leontiev e Elkonin. Mas por que seria a abordagem
dessa escola soviética oposta à de Froebel sobre o desenvolvimento infantil
e o papel do jogo na educação de crianças menores de seis anos?
Elkonin, em seu texto Toward the problem of stages in the mental
development of children (2000), discute a complexa questão da divisão
do desenvolvimento infantil em estágios de acordo com a faixa
etária ou com a aquisição de determinados patamares de desenvolvimento
cognitivo, os quais deveriam ser frutos da universalização do
acesso à educação escolar, o que levaria cada indivíduo a desenvolver
ao máximo as suas potencialidades, como ser pertencente ao gênero
humano. Sendo um psicólogo compromissado com a construção de
uma sociedade socialista, Elkonin entendia que a escola deveria também
estar compromissada com a construção dessa sociedade. Somente
dessa forma a escola contribuiria para o pleno desenvolvimento do
ser humano. Apoiados na concepção materialista-dialética de homem
e sociedade, Elkonin, Leontiev e Vigotski desenvolveram uma corrente
da psicologia que estudou o desenvolvimento humano e, como parte
desse estudo, analisou o papel do jogo na educação e no desenvolvimento
de crianças menores de seis anos.
Conseqüentemente, ao contrário de Froebel, estes autores viam
a infância e seu desenvolvimento fortemente conectados com a educação
e com a sociedade na qual a criança está inserida. Elkonin
(2000), apoiado também nos estudos de outro soviético, Blonski,
afirma que não existe um desenvolvimento da infância universal, único
e natural. O desenvolvimento infantil é passível de mudanças históricas.
As crianças de hoje não se desenvolvem da mesma forma que
as crianças do século XVIII se desenvolveram. A infância não é eterna
e imutável, nem dependente majoritariamente do subjetivo que existe
em cada indivíduo, em seu interior. As condições culturais, econômicas,
sociais, históricas são fatores decisivos neste desenvolvimento.
Crianças vivendo numa mesma época histórica podem apresentar dife18
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rentes processos de desenvolvimento em conseqüência das diferenças
existentes em suas atividades. Essas atividades são sempre situadas num
determinado contexto social e cultural. Elkonin, Leontiev e Vigotski
não acreditavam em uma essência humana de origem do homem divina
e espiritual. Fundamentar os estudos sobre o desenvolvimento humana
nesse tipo de crença seria colocar-se longe da ciência e do pressuposto
marxista de que o ser humano constrói a sua própria história
assim como é por ela construído. Por essa razão, Leontiev em seu livro
O desenvolvimento do psiquismo (1978) faz a seguinte afirmação:
Se um ser inteligente vindo de outro planeta visitasse a Terra e descrevesse as
aptidões físicas, mentais e estéticas, as qualidades morais e os traços do comportamento
de homens pertencentes às classes e camadas sociais diferentes
ou habitando regiões e países diferentes, dificilmente se admitiria tratar-se de
representantes de uma mesma espécie. Mas esta desigualdade entre os homens
não provém das suas diferenças biológicas naturais. Ela é o produto da
desigualdade econômica, da desigualdade de classes e da diversidade consecutiva
das suas relações com as aquisições que encarnam todas as aptidões e
faculdades da natureza humana, formadas no decurso de um processo sóciohistórico.
(Leontiev, 1978, p. 274)
Essa teoria sócio-histórica da formação dos seres humanos é
oposta à concepção de Froebel já apresentada aqui. Este, como vimos,
não concebia a infância como sendo influenciada e produzida pelo
processo histórico da humanidade como um todo. A visão romântica
e idílica que Froebel tinha da infância humana lhe possibilitava pensar
em um desenvolvimento eterno, divino, natural e universal.
Vigotski afirmava que o desenvolvimento infantil é um processo
dialético, a passagem de uma fase a outra é marcada não pela simples
evolução (como afirmava Froebel), mas por uma revolução que
implicaria mudanças qualitativas na vida da criança. Esse processo não
pode ser separado assepticamente da inserção da criança na sociedade
e do reflexo desta nas necessidades da criança, em seus motivos e em
seu desenvolvimento intelectual. Elkonin afirma que a tentativa de separação
do desenvolvimento infantil em diferentes âmbitos é uma característica
da busca de naturalização desse desenvolvimento, separação
essa que produz muitos dos dualismos tão presentes nas várias
abordagens existentes na psicologia do desenvolvimento. Somente
com a superação dessa forma de se estudar o desenvolvimento é que
seremos capazes de entendê-lo verdadeiramente.
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Tal perspectiva naturalizante do desenvolvimento infantil, primeiramente,
vê a criança como um indivíduo isolado, para o qual a sociedade não passa
de um “mero hábitat” sui generis. Em segundo lugar, o desenvolvimento
mental é visto como um simples processo de adaptação às condições de vida
existentes na sociedade. Em terceiro lugar, a sociedade é vista como a união
de dois elementos distintos: “o mundo dos objetos” e o “mundo das pessoas”,
ambos dados pelo ambiente no qual a criança se encontra. Como conseqüência,
em quarto lugar aparece o desenvolvimento de dois mecanismos
diferentes de adaptação: um para o “mundo dos objetos” e outro para o
“mundo das pessoas”; a isso se reduziria o desenvolvimento mental. Sendo
assim, o desenvolvimento mental seria, nessa concepção, o desenvolvimento
desses mecanismos de adaptação a esses diferentes mundos traduzidos na
vida infantil como: o “mundo da criança e os objetos” e o “mundo da criança
e os outros”. (Elkonin, 2000, p. 4)
Dentro deste quadro teórico, rapidamente esboçado, é que aparece
a brincadeira e o jogo na educação pré-escolar para estes autores.
Leontiev, Elkonin e Vigotski concordam que o jogo é a atividade principal3
nesse período da infância. Como esses autores partem de uma
visão oposta à de Froebel do desenvolvimento infantil, encontramos
no estudo por eles realizado do jogo princípios também opostos aos
princípios froebelianos.
Para Leontiev e Elkonin (ambos apoiados nos estudos realizados
também por Vigotski) a brincadeira não é uma atividade instintiva
na criança. Para esses autores a brincadeira é objetiva pois ela é
uma atividade na qual a criança se apropria do mundo real dos seres
humanos da maneira que lhe é possível nesse estágio de desenvolvimento.
Esses autores afirmam que a fantasia, a imaginação que é um
componente indispensável à brincadeira infantil, não tem a função de
criar para a criança um mundo diferente do mundo dos adultos, mas
sim de possibilitar à criança se apropriar do mundo dos adultos a despeito
da impossibilidade de a criança desempenhar as mesmas tarefas
que são desempenhadas pelo adulto. Por exemplo, ao brincar de motorista
de ônibus ela precisa usar da fantasia para substituir as operações
reais realizadas por um motorista de ônibus pelas operações que
estejam ao seu alcance. Mas isso não é uma forma de se afastar do
mundo real no qual existem motoristas de ônibus e sim, ao contrário,
de se aproximar cada vez mais desse mundo.
Para Froebel o brinquedo é um ato que faz parte da natureza
infantil, sendo assim a atividade principal desta faixa etária a única
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O jogo e o desenvolvimento infantil na teoria da atividade e no pensamento...
forma que a criança tem de expressar seu mundo interior, de conhecer-
se e de harmonizar-se com a tríade da Unidade Vital. A criança
necessita simbolizar seu interior em objetos. A brincadeira proporciona
essa simbolização. Assim a brincadeira leva a criança a descobrir
sua essência divina e também leva o adulto, que observa a criança
brincando, a descobrir como essa criança está inserida nos planos do
Criador para os seres humanos.
Para Leontiev e Elkonin, a brincadeira é a atividade principal2
do período pré-escolar, mas as razões para esta afirmação são distintas
das de Froebel. A começar por como Leontiev descreve o status de atividade
principal no desenvolvimento infantil de uma atividade:
O que é, em geral, a atividade principal? Designamos por esta expressão não
apenas a atividade freqüentemente encontrada em dado nível do desenvolvimento
da criança. O brinquedo, por exemplo, não ocupa, de modo algum,
a maior parte do tempo de uma criança. A criança pré-escolar não brinca
mais do que três ou quatro horas por dia. Assim, a questão não é a quantidade
de tempo que o processo ocupa. Chamamos de atividade principal aquela
em conexão com a qual ocorrem as mais importantes mudanças no desenvolvimento
psíquico da criança e dentro da qual se desenvolvem processos
psíquicos que preparam o caminho da transição da criança para um novo e
mais elevado nível de desenvolvimento. (Leontiev, 1988, p. 122)
Vemos, então, que a brincadeira se constitui em atividade principal
porque na idade pré-escolar ela provoca estas “revoluções” no desenvolvimento
infantil. Vigotski (1984) expõe ser incorreto afirmar
que a brincadeira seria um protótipo da atividade cotidiana da criança.
Essa afirmação não está em conflito com a teoria da atividade
principal desenvolvida por Leontiev e Elkonin, pois eles não afirmam
que a brincadeira, como atividade principal da idade pré-escolar, levaria
a criança, em seu cotidiano, a agir de maneira fantasiosa, a agir
movida pela imaginação e não pela realidade objetiva. Leontiev afirma
claramente que a ruptura entre significado e sentido estabelecida
durante a brincadeira é abandonada imediatamente assim que a criança
deixa de brincar. Isso quer dizer que a criança em seu cotidiano
age movida pela realidade objetiva e não se deixa dominar pela fantasia
existente no momento da brincadeira.
A brincadeira, segundo Vigotski (1984, p. 117), é a atividade
principal porque “cria uma zona de desenvolvimento proximal da criCad.
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ança”, ou seja, no brinquedo a criança realiza ações que estão além do
que sua idade lhe permite realizar, agindo no mundo que a rodeia tentando
apreendê-lo. Neste ponto o papel da imaginação aparece como
emancipatório: a criança utiliza-se da imaginação na brincadeira como
uma forma de realizar operações que lhe são impossíveis em razão de
sua idade. A criança reproduz ao brincar uma situação real do mundo
em que vive, extrapolando suas condições materiais reais com a ajuda
do aspecto imaginativo. Para que a criança possa tornar real uma operação
impossível de ser realizada na sua idade, ela utiliza-se de ações
que possuem um caráter imaginário, o faz-de-conta entra em cena, gerando
uma discrepância, segundo Leontiev (1988), entre a operação
que deve ser realizada (por exemplo andar a cavalo) e as ações que formam
essa operação (por exemplo selar o cavalo, montar no cavalo etc.).
Como a criança não pode usar um cavalo real, ela utiliza-se de um cabo
de vassoura, por exemplo, como se este fosse seu cavalo. Isso ocorre porque
a criança tem como alvo o processo e não a ação. Outro exemplo é
a brincadeira com uma boneca. A criança ao brincar com a boneca repete
situações ou acontecimentos presentes na vida adulta, como por
exemplo cuidar de um bebê. Ao fazê-lo ela imita a forma como a mãe
cuida do irmão mais novo. Por isso Vigotski (1984, p. 117) afirma que
o brinquedo “é muito mais a lembrança de alguma coisa que realmente
ocorreu do que imaginação”. Leontiev (1988, p. 126) afirma que na
brincadeira todas as operações e ações que a criança realiza são reais e
sociais; por meio delas a criança busca apreender a realidade. Leontiev
apresenta um exemplo de crianças brincando de vacinação contra a varíola.
Nessa brincadeira as crianças imitavam a seqüência real da ação
realizada para a vacinação. Primeiro passava-se álcool na pele e depois
era aplicada a vacina. O adulto pesquisador que observava essa brincadeira
propôs às crianças a utilização de álcool de verdade, o que foi recebido
com entusiasmo pelas crianças. Mas então ele disse que precisaria
pegar o álcool em outra sala e sugeriu que elas fossem aplicando a
vacina enquanto ele iria buscar o álcool e deixassem para passar o álcool
ao final do processo. As crianças não aceitaram a sugestão e preferiram
não usar álcool de verdade, mas manter a seqüência real da ação.
Desse exemplo Leontiev extrai a seguinte conclusão:
Em um jogo, as condições da ação podem ser modificadas: pode-se usar papel,
em vez de algodão; um pedacinho de madeira ou um simples pauzinho,
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O jogo e o desenvolvimento infantil na teoria da atividade e no pensamento...
em vez de agulhas; um líquido imaginário em vez de álcool, mas o conteúdo
e a seqüência da ação devem, obrigatoriamente, corresponder à situação real.
(...) É preciso acentuar que a ação, no brinquedo, não provém da situação
imaginária mas, pelo contrário, é essa que nasce da discrepância entre a operação
e a ação; assim, não é a imaginação que determina a ação, mas são as
condições da ação que tornam necessária a imaginação e dão origem a ela.
(Leontiev, 1988, p. 126-127)
Na brincadeira a criança cria uma ruptura entre sentido e significado
de um objeto, isto é, um pequeno pedaço cilíndrico de madeira
não perde seu significado para a criança mas durante a brincadeira
esse objeto pode assumir para a criança o sentido de uma seringa
de aplicação de vacina. Importante destacar que a criança não realiza
essa ruptura antes de iniciar a brincadeira nem mesmo depois de encerrada
a brincadeira. Somente durante a atividade é que se faz necessária
a imaginação.
Mas qual seria o tipo de brincadeira mais marcante para as crianças
em idade pré-escolar, isto é, na faixa dos três aos seis anos de
idade? O jogo protagonizado ou jogo de papéis. Segundo Elkonin
(1998, p. 31), nesse tipo de brincadeira “influi, sobretudo, a esfera
da atividade humana, do trabalho e das relações entre as pessoas e,
por conseguinte, o conteúdo fundamental do papel assumido pela
criança é precisamente a reconstituição desse aspecto da realidade”.
Essa realidade que circunda a criança, segundo o autor, pode ser dividida
em duas esferas: a dos objetos e a das atividades humanas. Em
um primeiro momento de sua vida, a criança concentra sua atividade
nos objetos e nas ações que os adultos realizam com esses objetos. Entretanto,
à medida que o jogo protagonizado vai evoluindo, o foco
desloca-se destes para as relações que as pessoas estabelecem entre si,
mediante suas ações com os objetos, ou seja, a criança passa a interessar-
se pelas relações travadas entre os seres humanos e passa a reproduzi-
las em suas brincadeiras.
Elkonin (idem, p. 35) afirma que a atividade e as relações humanas
possuem um impacto tão grande no jogo protagonizado que seu
tema pode variar, contudo o conteúdo sempre permanece o mesmo,
qual seja, “a atividade do homem e as relações sociais entre as pessoas”.
É na pré-escola que o jogo protagonizado se desenvolve intensamente
e alcança o nível máximo quando a criança deixa a fase da
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Alessandra Arce
atividade de manipulação dos objetos. Importante ressaltar, segundo
Elkonin, a necessidade de se expor essa criança às mais ricas situações
e produções humanas, pois, quanto maior e mais rica for sua inserção
no mundo que a circunda, mais a criança desenvolverá suas capacidades.
Elkonin afirma que:
(...) A base do jogo é social devido precisamente a que também o são sua natureza
e sua origem, ou seja, a que o jogo nasce das condições de vida da criança
em sociedade. As teorias do jogo que o deduzem dos instintos e dos impulsos
internos marginalizam, de fato, a questão de sua origem histórica. Ao
mesmo tempo, a história do surgimento do jogo protagonizado é justamente
aquela que pode nos revelar a sua natureza. (Elkonin, 1998, p. 36)
Assim, o jogo protagonizado, para Elkonin, constitui-se em uma
fonte preciosa para o desenvolvimento infantil durante a idade pré-escolar.
O jogo é um dos mecanismos dentro e fora da escola capazes de
auxiliar a criança a apreender o conjunto das riquezas produzidas pela
humanidade, gerando revoluções no desenvolvimento infantil.
Considerações finais
Este estudo aqui apresentado possuiu um caráter preliminar,
entretanto a exposição realizada de forma sucinta de ambas as teorias
possibilita-nos visualizar grandes distinções. Se por um lado temos
Froebel atrelando a infância e seu desenvolvimento à Natureza e ao
Divino, por outro encontramos Leontiev, Elkonin e Vigotski procurando
apreender a infância dentro de todo o conjunto de aspectos que
compõem nossa organização social como fruto da história que foi escrita
pela humanidade. Portanto, Froebel aponta para uma visão romântica
e naturalizante tanto do desenvolvimento infantil quanto do
jogo, ao passo que a escola soviética da psicologia se calca no materialismo
histórico-dialético para estudá-los. Dois períodos distintos da
história da humanidade cruzaram-se neste texto com o intuito de
mostrarmos quão radicais são as diferenças com relação ao jogo quando
tomamos como ponto de partida uma visão de homem e sociedade
centrada em uma concepção mística, subjetivista, naturalizante e
alienada; e outra que busca compreender o homem como protagonista
e fruto da história visando a propiciar a esse homem a apreensão
deste movimento e das riquezas produzidas. Não podemos deixar de
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O jogo e o desenvolvimento infantil na teoria da atividade e no pensamento...
destacar que a concepção de Froebel influenciou muitos educadores e
principalmente aparece como pioneira dentro do movimento que mais
tarde se constituiria sob a nomenclatura de Movimento Escolanovista.
Assim, ao criticarmos os fundamentos de sua teoria esta se estende a
todos os educadores que procuram pensar o desenvolvimento infantil a
partir de princípios similares. Esta também é a crítica que está
subjacente às exposições da escola soviética, tornando-as incompatíveis
com as mesmas. Impossibilitando a prática de ecletismos, ou seja, a
utilização conjunta de elementos considerados válidos em ambas as teorias
sem o respeito aos diferentes alicerces teóricos, esperamos com este
artigo contribuir para o debate a respeito do papel que o jogo e a concepção
de desenvolvimento infantil desempenham na constituição de
uma concepção de educação e de infância.
Recebido em novembro de 2003 e aprovado em março de 2004.
Notas
1. Para um estudo mais detalhado da vida e obra de Friedrich Froebel, ver Arce (2002), A
pedagogia na ‘Era das Revoluções’ – uma análise do pensamento de Pestalozzi e Froebel
(Campinas: Autores Associados). Friedrich August Froebel nasceu em 21 de abril de
1782, na região sudeste da Alemanha, falecendo em 1852. Froebel pode ser considerado
o pedagogo dos Jardins de Infância, instituição destinada a educar crianças menores de 06
anos fundada em 1840 na cidade de Blankenburg.
2. A expressão original em russo é “veduschaya deyatelnost”. As edições em português de textos
de Leontiev têm adotado ora a expressão “atividade principal”, ora a expressão “atividade
dominante”.
Referências bibliográficas
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de Pestalozzi e Froebel. Campinas: Autores Associados, 2002.
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