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sexta-feira, 12 de setembro de 2014

O professor universitário precisa de pós-graduação? por Otavio Lino e Nicolas Gunkel



O professor universitário precisa de pós-graduação? por Otavio Lino e Nicolas Gunkel

Nova lei que entrou em vigor em março impede que universidades federais exijam titulações de mestrado e doutorado em concursos para docentes. A medida, que deve ser revista pelo governo, reascende o debate sobre o perfil ideal do professor no ensino superior

Uma lei de iniciativa do Governo Federal, que entrou em vigor em março deste ano, reascendeu a discussão sobre a importância da pós-graduação para que um docente lecione no ensino superior. O texto do Ministério da Educação proíbe que as universidades federais exijam como requisito para a inscrição em seus concursos as titulações de mestrado e doutorado. Na prática, quem tiver apenas o diploma de graduação pode disputar agora todas as novas vagas para professores. Questionado por dirigentes de universidades sobre a nova regra, o governo afirmou que deve voltar atrás, permitindo que as universidades exijam as titulações.

Apesar do impasse jurídico, a medida trouxe rápidos resultados práticos pelo país – de aceitação e de protesto. Aderindo à nova legislação, a Federal de Santa Catarina abriu no fim de março 200 vagas para candidatos que tivessem, no mínimo, diploma de graduação. Já a Federal de Pernambuco suspendeu todos seus processos de contratação e emitiu uma nota de repúdio à nova regra. Se, para alguns, a lei serviu para abrir portas a profissionais qualificados, para outros, ela ameaça a qualidade do ensino universitário.
Por ser estadual, a USP não se enquadra no novo regulamento. Mesmo assim, sua aprovação voltou a alimentar o debate sobre o perfil ideal de um professor de universidade pública. O profissional sem pós-graduação tem formação e conhecimento teórico suficientes para lecionar no ensino superior? Ele tem algo para oferecer ao estudante universitário que mestres e doutores não possam oferecer com mais qualidade?

Aperfeiçoamento Com a implantação da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), no começo da década de 1950, foram concedidas as primeiras 79 bolsas de estudo de pós-graduação no país. Para a médica, pesquisadora e pró-reitora de Graduação Telma Maria Zorn, “a criação da pós-graduação deu um impulso extraordinário e foi o que fez o Brasil crescer tanto quanto cresceu”. Atualmente, segundo dados da GeoCapes, o número de estudantes de pós-graduação no Brasil chega perto dos 200 mil, entre alunos de mestrado e doutorado.

Mas a formação de pesquisadores qualificados não representa necessariamente a formação de docentes aptos à prática pedagógica. Segundo Telma, tanto a Capes quanto a USP têm trabalhado de forma a reconhecer a importância na formação do docente universitário, como é o caso do PAE (Programa de Aperfeiçoamento de Ensino), que dá aos pós-graduandos uma aproximação com a função. Mas na prática não é bem assim. A pesquisa científica na pós-graduação, cada vez mais verticalizada e fragmentada, acaba por afastar os pós-graduandos das salas de aula, além de restringirem muitas vezes o ensino às linhas de pesquisa nas quais tornaram-se especialistas.
Para contornar a relação entre ensino e pesquisa, a USP tem discutido a criação de um programa de recepção dos jovens docentes ingressantes na carreira. Segundo Telma, este programa estimularia os departamentos a darem suporte não só na questão de adaptá-los à graduação, começando com uma carga horária menor para o ensino, mas também para orientá-los sobre o funcionamento da universidade. “Teoricamente, esse doutor jovem deveria estar pronto para tudo, mas, na pós-graduação, ele não tem essa oportunidade”, afirma. “Isso é extremamente importante, principalmente nas áreas em que a interdisciplinaridade é mais valiosa para a pesquisa.”
Carreira científica Dados publicados pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), organização ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, mostram que do total de mestres formados entre 1996 e 2009, cerca de 40% estão empregados no setor de educação. Dos doutores, 80% estão no ramo.
Esta busca pela carreira de professor pelos pós-graduandos recém formados, no entanto, é alvo de críticas por parte da pró-reitora de graduação da USP. Segundo ela, “professores contratados que acabaram de concluir a pós-graduação saem, muitas vezes, com pouca experiência para dar aulas”.

O valor da prática Para o ex-professor de Jornalismo da ECA (Escola de Comunicações e Artes) e diretor da Oboré, Sérgio Gomes, a restrição do ensino a professores com titulações acadêmicas acaba impedindo que grandes profisionais dêem aula. “Se traçarmos um ranking dos cem jornalistas mais premiados do país, garanto que mais de 80% não dão ou nunca deram aula. Em parte, porque eles não puderam fazer carreira acadêmica”, afirma. Segundo Gomes, há aí uma grande contradição. “A universidade exige títulos de natureza acadêmica para um tipo de professor que, para ser um grande professor, não poderia ter gastado tanto tempo com carreira acadêmica”.
A ausência de profissionais mais práticos nas salas de aula cria, segundo o jornalista, uma lacuna entre o estudante que se forma e seus concorrentes no mercado. “Quantos professores hoje têm experiência de redação? Quantos não trabalham contra o relógio há mais de cinco anos?”, questiona.
Apesar de ser contra a exigência de pós, Gomes não descarta a importância da formação teórica dos professores. “Não faço defesa do anti-intelectualismo. Muito pelo contrário. Acho extremamente importante ser reflexivo. Mas há grandes profissionais que produzem conhecimento também fora das universidades.”
Telma Maria Zorn concorda que a universidade precisa valorizar mais a prática. Como exemplo, ela cita a Faculdade de Medicina, que tem poucos professores em regime de dedicação integral em pesquisa e docência (RDIPD) em seu quadro. “Os docentes precisam atender pacientes para saber ensinar seus alunos. O profissional que fica só dentro da universidade não tem essa prática”, afirma.
Pesquisa acadêmica Para o ex-professor da Faculdade de Educação, Antônio Joaquim Severino, é na pós-graduação que o docente universitário tem seu mais importante contato com a pesquisa teórica e prática. “Quando se exige a titulação, não se está cobrando uma posição acadêmica, um status, mas uma experiência de construção de conhecimento”, explica. Em seu artigo “Ensino e pesquisa na docência universitária: caminhos para a integração”, Severino considera que a docência universitária não deve ser praticada como uma mera extensão da pesquisa, e sim como um processo contínuo de desenvolvimento do saber. “O mínimo que se exige de um professor é que ele acompanhe o desenvolvimento do saber de sua área, mas, além disso, impõe-se a postura investigativa porque o conhecimento é um processo de construção”.



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A nova lei desestimula a pós-graduação, as pesquisas universitárias e o interesse de grandes talentos pela profissão
O novo Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal - aprovado pela presidente Dilma Rousseff "no apagar das luzes" de 2012, em 31 de dezembro - representa um retrocesso para o país. A avaliação é de especialistas e acadêmicos que se mostram surpresos com a velocidade "meteórica" com que a matéria tramitou no Congresso Nacional.
Na prática, o Palácio do Planalto sancionou o Projeto de Lei 4368/12, encaminhado pelo Executivo,  dando origem à Lei nº 12772/12 que alterou dispositivos da Lei nº 7.596, de 10 de abril de 1987. Tradicionalmente, os projetos de interesse político, como esse, não enfrentam resistência em sua tramitação.  O PL foi apresentado em agosto, aprovado pelos deputados em 05 de dezembro e em 21 do mesmo mês pelos senadores.
No entender do cientista Walter Colli, professor titular da Universidade de São Paulo (USP) e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), a nova lei desestimula a pós-graduação, as pesquisas universitárias e o interesse de grandes talentos pela profissão. Isso porque a promoção para a categoria de professor titular "valoriza em demasia a progressão temporal" em detrimento do mérito acadêmico e científico.
Em meio à tramitação do projeto na Câmara e no Senado Federal,  a SBPC e ABC encaminharam, no fim de 2012, um manifesto aos parlamentares alertando sobre os riscos que o PL acarretaria à carreira dos professores de universidades públicas federais. Mesmo assim, a tramitação da matéria surpreendeu cientistas que depositavam na presidente Dilma a expectativa de vetá-lo.
"Foram detectados aspectos que poderão trazer graves dificuldades, problemas e, por que não dizer, retrocesso, para as Universidades Federais Brasileiras, principalmente no que tange a qualidade da Pesquisa e do Ensino de Graduação e Pós-Graduação", destaca a nota (disponível em http://www.sbpcnet.org.br/site/busca/mostra.php?id=1800) assinada pela presidente da SBPC, Helena Nader, e pelo presidente da ABC, Jacob Palis.
O Ministério da Educação, por intermédio da assessoria de comunicação, informa que o novo Plano tem por objetivo "buscar a valorização da dedicação exclusiva", igualmente a titulação dos docentes, embora acadêmicos e cientistas afirmem o contrário.  
Sem querer entrar nos detalhes da nova lei, a nota do MEC destaca os reajustes salariais assegurados na nova legislação. Nesse caso, cita que o plano prevê aumento mínimo de 25% e máximo de 40%, a ser aplicado em março deste ano 2013. O reajuste será gradual. Isto é, neste ano será concedida metade (50%) do aumento total previsto para 2013. Assim, a média do reajuste salarial previsto para este ano será de 16%.

Já em 2014 o acréscimo será de 30% do total estabelecido, ao passo que em 2015 o reajuste atingirá 20% do total, segundo o ministério. A principal crítica dos cientistas recai, porém, sobre o fato de a carreira de magistério, em qualquer universidade federal, iniciar sempre (sic, Art. 8º, caput) pelo piso da categoria. Ou seja, pela categoria de professor auxiliar, independentemente da titulação.
A lei estabelece cinco etapas na carreira do magistério federal - professor auxiliar, assistente, adjunto, associado e titular - que devem ser conquistadas por concurso público exigindo apenas o diploma de graduação. Hoje para ingressar no magistério da USP (estadual), por exemplo, o professor tem de ser portador do título de doutor. Assim também era para as universidades federais, até a promulgação dessa nova Lei.
"Para exemplificar, no meu caso, cheguei ao cargo de professor titular na USP, mas se quisesse fazer parte do corpo docente regular de uma universidade federal teria de prestar concurso para professor auxiliar, na base do novo sistema e lá ficar por três anos, pelo menos. No entanto, como obtive o título de doutor há mais de 20 anos posso entrar para uma nova categoria denominada com o estranho nome de Cargo Isolado de Professor Titular-Livre do Magistério Superior", analisa o cientista.
Diante do novo modelo, o mesmo resultado não será obtido por um grande cientista que tenha o título de doutor há menos de 20 anos, já que ele terá de recomeçar sua carreira da base.
"Para aspirar subir um pouco mais, ser um professor assistente, ele teria de esperar um intervalo de dois anos", exemplifica Colli, ex-presidente da CTNBio , também atual Segundo Tesoureiro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Esse tipo de escalonamento, segundo Colli, afasta os melhores talentos das universidades públicas federais.
Com a mesma opinião, a professora associada do Instituto de Bioquímica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Debora Foguel, destaca que, no modelo anterior, a posição de professor titular na universidade pública federal era alcançada por um novo concurso, avaliado por uma banca altamente qualificada.
"Somente os professores com grande mérito acadêmico com destacada contribuição na pesquisa alcançavam tal nível diferenciado", lamenta Debora, pro-reitora de Pós-Graduação e Pesquisa da mesma universidade e membro titular da ABC.
"Certamente quem o redigiu parece desconhecer o ambiente universitário, a pesquisa e a inovação que temos procurado trazer para dentro de nossas universidades", salienta a pesquisadora.
Histórico - O PL havia sido costurado com entidades sindicais em meados do ano passado  em troca  do fim greve dos professores federais. Aparentemente, lutava-se por um aumento salarial que passará a valer a partir de março, inicio do ano letivo. A nova Lei mostra, porém, que um dos motivos da greve era o de mitigar o rigor na admissão e promoção de professores pela análise do mérito na avaliação da qualidade, analisa Colli.
Impacto nas pesquisas - Para Colli, exigir apenas o título de graduação no inicio da carreira de magistério reduz a importância da pós-graduação no Brasil e, por tabela, as pesquisas universitárias que hoje respondem pela maioria das pesquisas científicas nacionais.
Dessa forma, ele vê necessidade de mudanças na Lei, sobretudo no artigo 8º  propondo que o ingresso na carreira do magistério superior seja realizado por concurso público de vários níveis. Isto é, para a categoria de professor auxiliar exigindo diploma de graduação; para a de professor assistente com a exigência de títulos de mestre; e a professores adjunto e associado para pessoas com nível de doutor.
"Assim, seria possível atrair pessoas melhores para os concursos, valorizando a nossa pós-graduação", disse.
Com a nova Lei, Colli acredita que a universidade pública se aproxima das universidades privadas que não exigem, pelo menos a maioria delas, o título de mestre ou de doutor para lecionar, pagando, assim, salários relativamente menores.
Retrocesso no número de doutores -  Na avaliação de Débora, o novo plano de carreira do magistério federal tende a retardar a chegada do Brasil no time dos países que apresentam relação de doutores por número de habitantes mais justa.
No Brasil, o número de portadores de títulos de doutorado proporcionalmente ao número de habitantes é um dos mais baixos do mundo. Conforme consta do Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) de 2011 a 2020, existem no país 1,4 doutores titulados por cada mil habitantes na faixa etária entre 25 e 64 anos, na frente apenas da Argentina, com 0,2 doutores, na mesma comparação. O número brasileiro fica aquém do observado em países desenvolvidos como Suíça, no topo do ranking, com 23 doutores em um universo de mil habitantes; Alemanha, com 15,4; e Estados Unidos, com 8,4.
Evitando entrar no mérito do novo plano de carreira do magistério, o assessor da Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura (Unesco ) no Brasil, o professor Célio da Cunha, considera  baixo o número de doutores no Brasil em relação ao de habitantes. O ideal, analisa, seria o Brasil se aproximar dos Estados Unidos, titulando cinco a seis doutores por mil habitantes.
Inconstitucionalidade  - Colli define o novo Plano como "concentrador e paternalista" por atribuir ao Ministério da Educação (MEC) a prerrogativa de avaliar os cursos e os critérios de promoção dos docentes, contrariando o artigo 207 da Constituição Federal que concede autonomia às  universidades do ponto de vista didático e administrativo.
"Se diluem todos os ganhos que tivemos até agora com a pós-graduação e com a experiência das universidades no aperfeiçoamento das avaliações de mérito", lamenta Colli.
(Viviane Monteiro, Jornal da Ciência)

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