terça-feira, 29 de julho de 2008

NEM TUDO O QUE CONTA PODE SER CONTADO. Educação.



Por Jan Hunt, Psicóloga Diretora do "The Natural Child Project"
Recentemente eu recebi uma carta em resposta a meu artigo "Notas escolares: úteis ou nocivas?", dizendo, entre outras coisas:
"Seu artigo sobre notas escolares tende a ser um instrumento para se inventar desculpas. Não só para as crianças mas também para os pais. Seja em sala de aula, seja no serviço ou em um 'site' da internet (as premiações assinaladas na página principal de seu 'site' [The Natural Child Project] representam sua aprovação) - somos avaliados. Não foi nesse sistema de avaliação "imperfeito, enganoso e perigoso" que você recebeu um título de Mestrado? As notas são um meio que permite aos pais e aos alunos medir seu desempenho. A simplificação das notas a 'Satisfatório' e 'Insatisfatório' provocou fortes reações entre os pais. Um 'S' ou um 'I' não especificam um nível de desempenho. Enfim, eu concordo e apóio de todo o coração a idéia de que as crianças devem ser respeitadas de todos os modos possíveis. Também imploro aos pais que não ensinem e protejam somente os direitos de seus filhos, mas igualmente as responsabilidades que lhes correspondem".
Aqui vai a minha resposta:
Sua carta é bem-vinda, pois me dá a oportunidade de explicar uma aparente contradição entre minhas convicções declaradas e meus próprios atos.
Você tem razão, é claro, em que existe uma contradição entre minhas declarações sobre o perigo das avaliações e a apresentação em meu 'site' na internet de títulos acadêmicos e premiações. Mas a contradição não está em meu modo de pensar e sim nas falsas convicções de nossa sociedade. Eu me defronto com o dilema inevitável de que para ser vista e aceita como uma pessoa com idéias que vale a pena ler, devo me apresentar com as "qualificações" que nossa sociedade espera e exige. É triste mas é verdadeiro que as pessoas que não têm graduação acadêmica simplesmente não são levadas tão a sério quanto aquelas que têm essa qualificação, independentemente de seu conhecimento e capacidade. Eu mesma aprendi quase tudo o que sei sobre criação de filhos a partir de minha própria experiência como mãe, interagindo de coração com meu filho, e não de meus anos de estudante em um programa universitário.
É uma grande ironia que justamente nós que nos declaramos contra o sistema de avaliação e qualificação artificial precisemos apresentar nós mesmos essas qualificações, para nos fazermos ouvir. Acho essa situação frustrante e particularmente odiosa, mas não vejo como escapar dela.
Tenho esperança de que se a natureza nociva do sistema de avaliação escolar pudesse ser compreendida e abolida, a sociedade começaria a avaliar tudo de um modo mais realista e o trabalho de uma pessoa poderia ser apreciado e avaliado simplesmente por seus próprios méritos. Até chegar a esse ponto eu vou continuar a apontar as deficiências dos sistemas que pretendem "medir desempenho" mas que na verdade não o fazem, nem são capazes.
Quero acrescentar aqui uma observação: eu vejo certa diferença entre os prêmios conferidos a um 'site' na internet com a finalidade principal de ajudar as pessoas a escolherem entre milhares de 'sites', e sistemas de avaliação que intimidam e afetam a preciosa auto-estima de nossos filhos. Como escreveu John Holt, "quando amedrontamos as crianças, bloqueamos totalmente seu aprendizado... o único meio das crianças obterem um senso de dignidade, competência, valor próprio e auto-estima é serem bem-sucedidas em tarefas de sua própria escolha, por seus próprios padrões e para sua própria satisfação, e não à dos outros".
Quanto a preparação das crianças para terem boas notas "no serviço", o que acontece é exatamente o contrário. O consultor de empresas Peter Drucker, em uma reportagem na revista 'Careers Today' ('Carreiras Hoje'), citou vários empresários de destaque lastimando o fato de que novos funcionários admitidos diretamente a partir da faculdade, "estão acostumados a, todas as vezes que fazem alguma coisa, alguém lhes dar um A, B ou C e dizer 'isto está muito bom' ou 'não está muito bom'. Eles não sabem como avaliar seu próprio trabalho. Eles não conseguem se libertar do apoio da autoridade". Nesse sentido, as escolas estão julgando muito mal o que as crianças realmente necessitam para estar bem preparadas para o "mundo real". Parece que o hábito da avaliação e do direcionamento externo é prejudicial não só enquanto as crianças ainda estão na escola mas também quando elas passam para o mundo real do trabalho.
O fato dos pais insistirem em avaliações específicas só demonstra que eles também freqüentaram a escola e que aprenderam a acreditar na utilidade das notas. Seja o sistema "A, B, C" ou "S, I", não há saída para o grande erro de todos os sistemas de avaliação: qualquer nota inferior à máxima é uma ofensa e um castigo, e todas as ofensas e castigos são ineficientes e nocivos. Um professor de pedagogia da Universidade de Victoria (Colúmbia Britânica, Canadá) durante anos ofereceu uma recompensa em dinheiro a quem fosse capaz de provar o benefício das notas baixas. Ele tem o dinheiro até hoje.
Albert Einstein tinha um aviso na parede de seu escritório: "Nem tudo o que conta pode ser contado e nem tudo o que pode ser contado, conta". Vamos dar uma olhada em cada uma dessas frases:
"Nem tudo o que conta pode ser contado". Tenho uma amiga que tem mais sabedoria, compaixão, compreensão e criatividade do que qualquer outra pessoa que eu conheço. Ela encontra soluções para problemas que ninguém mais consegue resolver e apresenta essas soluções com delicadeza e tato. Seu exemplo de vida feliz inspira muita gente. Embora ela seja a melhor conselheira que eu conheço, ela não tem nenhum título. Se ela quisesse trabalhar como psicoterapeuta, ela teria que embarcar em um longo curso universitário.
"Nem tudo o que pode ser contado, conta". Eu também conheci um número deprimente de psicólogos incompetentes e negligentes que não chegam aos pés da minha amiga mas cujos títulos profissionais instilam uma falsa confiança em seus clientes. Eles podem pendurar um diploma na parede mas não são capazes de agir a partir de seu coração. A sabedoria verdadeira não vem dos livros e não pode ser medida por provas, notas e títulos. Ela vem sempre do amor que uma pessoa recebe quando criança e da abertura às lições que a vida lhe proporciona.
Como é possível respeitar as crianças "de todos os modos possíveis" ameaçando-as com provas e notas, ignorando seu modo singular de aprender, desprezando seu ritmo próprio de desenvolvimento e classificando-as como "bem-sucedidas" ou "mal-sucedidas" com base em provas que não conseguem avaliar muito mais do que a memória de curto prazo e desprezam aquilo que essas crianças têm de realmente valioso e precioso? Essa sim é uma contradição que precisa receber a atenção de professores, administradores escolares e de todos aqueles que estejam preocupados com o bem estar das crianças em nosso mundo.

Fonte: http://members.tripod.com/~Helenab/jan_hunt/tudoque.htm

Este artigo é para uma reflexão profunda.
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domingo, 27 de julho de 2008

Psicopedagogia 3.


APOSTILA DE INTRODUÇÁO A PSICOPEDAGOGIA




EMENTA: o estudo da história da Psicopedagogia com vistas a uma formação reflexiva e crítica, sobre a atuação do psicopedagogo em sua ação preventiva ou remediativa, fazem parte do processo de conhecimento do especialista assim como situa-o em seu contexto de atuação e sua ética profissional. A Psicopedagogia se ocupa da aprendizagem humana, e surgiu de uma demanda: o problema de aprendizagem. O trabalho psicopedagógico pode estar relacionado com equipes ligadas ao campo da Educação e Saúde. Formas de atuação do Psicopedagogo. As diferenças e as relações entre psicopedagogia terapêutica e a preventiva.

OBJETIVO:

* Especializar profissionais para atuar de forma preventiva nos distúrbios de aprendizagem, através do estudo do fenômeno educativo e nas diferentes formas de aquisição do conhecimento;

* Desenvolver e possibilitar ao psicopedagogo oportunidade de reflexão, sobre sua atuação, através de aprofundamento teórico, ética e delimitação do campo profissional;

* Propiciar conhecimento sobre o desenvolvimento histórico do psicopedagogia e da prática do psicopedagogo, tanto clínico quanto institucional;

* Propiciar um primeiro contato com os pressupostos teóricos que apóiam e dão consistência à prática psicopedagógica clínica e institucional através de muita leitura e discussão.

CONTEÚDO:

ü Conceituar Psicopedagogia;

ü Objeto de Estudo da Psicopedagogia;

ü Teorias que embasam o trabalho psicopedagógico

ü Campo de atuação do psicopedagogo;

ü Traços históricos da Psicopedagogia na Argentina;

ü Percursos da Psicopedagogia no Brasil;

ü Atuação da psicopedagogia clínica;

ü Atuação psicopedagógica institucional;

ü Atuação psicopedagógica na pesquisa científica;

ü Atuação psicopedagógica no assessoramento.

ü Código de Ética da ABPp;

BIBLIOGRAFIA:

BOSSA, Nádia Aparecida. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre: Ed. Artes Médicas, 2ª. Ed. 2000.

GASPARIAN, Maria Cecília Castro. Contribuições do modelo relacional sistêmico para a psicopedagogia institucional, -São Paulo: Lemos Editorial, 1997.

MONEREO, Carles. O assessoramento psicopedagógico: uma perpectiva profissional e construtivista./ Carles Monereo e Isabel Sole; trad. Beatriz Affonso Neves – Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

SCOZ, Beatriz J. Lima et alli. Psicopedagogia – o caráter interior na formação e atuação profissional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.

PAIM. Sara. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

VISCA, Joege. Clínica Psicopedagogia – epistemologia convergente. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987.

1. INTRODUÇÃO

A Psicopedagogia nasceu da necessidade de uma melhor compreensão do processo de aprendizagem, ou seja, contribuir na busca de soluções para a difícil questão do problema de aprendizagem.

A aprendizagem deve ser olhada como a atividade de indivíduos ou grupos humanos, que mediante a incorporação de informações e o desenvolvimento de experiências, promovem modificações estáveis na personalidade e na dinâmica grupal as quais revertem no manejo instrumental da realidade.

O objeto central de estudo da psicopedagogia está se estruturando em torno do processo de aprendizagem humana: seus padrões evolutivos normais e patológicos e a influência do meio (família, escola, sociedade) em seu desenvolvimento.

A Psicopedagogia é um campo de conhecimento e atuação em Saúde e Educação, enquanto prática clínica, tem-se transformado em campo de estudos para investigadores interessados no processo de construção do conhecimento e nas dificuldades que se apresentam nessa construção. Como prática preventiva, busca construir uma relação saudável com o conhecimento, de modo a facilitar a sua construção.

KIGUEL (1983) ressalta que a Psicopedagogia encontra-se em fase de organização de um corpo teórico específico, visando à integração das ciências pedagógicas, psicológica, fonoaudiológica, neuropsicológica e psicolingüística para uma compreensão mais integradora do fenômeno da aprendizagem humana.

O psicopedagogo deve desenvolver sua ação, mas sempre se retratando as teorias, englobando vários campos de conhecimentos.

Diversos autores que tratam da Psicopedagogia enfatizam o seu caráter interdisciplinar.

O foco de atenção do psicopedagogo, é a reação da criança diante das tarefas, considerando resistências, bloqueios, lapsos, hesitações, repetição, sentimentos de angustias.

O psicopedagogo ensina como aprender e para isso necessita aprender o aprender e a aprendizagem.

Para os profissionais brasileiros (Maria M. Neves; Kiguel; Scoz; Golbert; Weiss; Rubinstein, pode-se verificar que o tema da aprendizagem ocupa-os e preocupa-os, sendo os problemas desse processo (de aprendizagem) a causa e a razão da psicopedagogia.

Para os Argentinos também a aprendizagem preocupa, ou seja, “ a aprendizagem com seus problemas” constitui-se no pilar-base da psicopedagogia. São eles: Alícia Fernandez, Sara Pain, Jorge Visca, Mariana Muller.

Então, o que é a Psicopedagogia?

Para SISTO (1996) é uma área de estudos que trata da aprendizagem escolar, quer seja no curso normal ou nas dificuldades.

CAMPOS (1996), considera que os problemas de aprendizagem constituem-se no campo da Psicopedagogia.

Por SOUSA (1996), a Psicopedagogia é vista como área que investiga a relação da criança com o conhecimento.

O Código de Ética da Psicopedagogia, no Capítulo I, Artigo 1º, afirma que “A Psicopedagogia é campo de atuação em saúde e educação o qual lida com o conhecimento, sua ampliação, sua aquisição, distorções, diferenças e desenvolvimento por meio de múltiplos processos”

A Psicopedagogia é uma área de estudos nova que pode e está atendendo os sujeitos que apresentam problemas de aprendizagem.

BOSSA (1994), a Psicopedagogia nasce com o objetivo de atender a demanda – dificuldades de aprendizagem.

FERREIRA (1982, P.1412) Psicopedagogia “é o estudo da atividade psíquica da criança e dos princípios que daí decorrem, para regular a ação educativa do indivíduo”.

Segundo MULLER, a Psicopedagogia liga-se as características da aprendizagem humana, como se aprende, como essa aprendizagem varia evolutivamente e está condicionada por outros fatores; como e porque se produzem as alterações da aprendizagem, como reconhecê-las e tratá-las, que fazer para prevení-las, e para promover processos de aprendizagem que tenham sentido para os participantes.

Esse objeto de estudo, que é um sujeito a ser estudado por outro sujeito, adquire características específicas e depende tanto do trabalho clínico ou preventivo.

O trabalho clínico não deixa de ser preventivo, pois trata alguns transtornos de aprendizagem, podendo evitar o aparecimento de outros.

Nessa modalidade de trabalho, deve o profissional compreender o que o sujeito aprende, como aprende e porque além de perceber a dimensão da relação entre psicopedagogo e sujeito de forma a favorecer a aprendizagem.

No trabalho preventivo, a instituição, enquanto espaço físico e psíquico da aprendizagem, é objeto de estudo da psicopedagogia, uma vez que são avaliados os processos didático metodológicos e a dinâmica institucional que interferem no processo de aprendizagem.

Ao psicopedagogo cabe saber como se constitui o sujeito, como este se transforma em suas diversas etapas de vida, quais os recursos de conhecimento de que ele dispõe e a forma pela qual produz conhecimento e aprende.

Esse saber exige que o psicopedagogo recorra a teorias que lhe permitam aprender, bem como às leis que regem esse processo: as influências afetivas e as representações inconscientes que o acompanham, o que pode comprometê-lo e o que pode favorecê-lo.

O psicopedagogo precisa saber o que é ensinar e o que é aprender; como interferem os sistemas e métodos educativos; os problemas estruturais que intervêm no surgimento dos transtornos de aprendizagem e no processo escolar.

Enfim, a psicopedagogia se ocupa da aprendizagem humana, que adveio de uma demanda – o problema de aprendizagem. – Como se preocupa com o problema de aprendizagem, deve ocupar-se inicialmente do processo de aprendizagem, estudando assim as características da aprendizagem humana.

É necessário comentar que a Psicopedagogia é comumente conhecida como aquela que atende crianças com dificuldades de aprendizagem. É notório o fato de que as dificuldades, distúrbios ou patologias podem aparecer em qualquer momento da vida e, portanto, a Psicopedagogia não faz distinção de idade ou sexo para o atendimento.

Atualmente, a Psicopedagogia vem se firmando no mundo do trabalho e se estabelecendo como profissão.

2. OBJETO DE ESTUDO DA PSICOPEDAGOGIA

No livro da Nádia Bossa, a Psicopedagogia no Brasil, a autora cita vários autores no que se refere ao objeto de estudo da psicopedagogia, vejam a seguir:

Para Kiguel, "o objeto central de estudo da Psicopedagogia está se estruturando em torno do processo de aprendizagem humana: seus padrões evolutivos normais e patológicos – bem como a influência de meio (família, escola, sociedade) no seu desenvolvimento" (1991, p. 24).

De acordo com Neves, "a psicopedagogia estuda o ato de aprender e ensinar, levando sempre em conta as realidades interna e externa da aprendizagem, tomadas em conjunto. E, mais, procurando estudar a construção do conhecimento em toda a sua complexidade, procurando colocar em pé de igualdade os aspectos cognitivos, afetivos e sociais que lhe estão implícitos" (1991, p. 12).

Segundo Scoz, "a psicopedagogia estuda o processo de aprendizagem e suas dificuldades, e numa ação profissional deve englobar vários campos do conhecimento, integrando-os e sintetizando-os"(1992,p.2).

Para Golbert: (...) o objeto de estudo da Psicopedagogia deve ser entendido a partir de dois enfoques: preventivo e terapêutico. O enfoque preventivo considera o objeto de estudo da Psicopedagogia o ser humano em desenvolvimento enquanto educável. O enfoque terapêutico considera o objeto de estudo da psicopedagogia a identificação, análise, elaboração de uma metodologia de diagnóstico e tratamento das dificuldades de aprendizagem (1985, p. 13).

Para Rubinstein, "num primeiro momento a psicopedagogia esteve voltada para a busca e o desenvolvimento de metodologias que melhor atendessem aos portadores de dificuldades, tendo como objetivo fazer a reeducação ou a remediação e desta forma promover o desaparecimento do sintoma". E ainda, "a partir do momento em que o foco de atenção passa a ser a compreensão do processo de aprendizagem e a relação que o aprendiz estabelece com a mesma, o objeto da psicopedagogia passa a ser mais abrangente: a metodologia é apenas um aspecto no processo terapêutico, e o principal objetivo é a investigação de etiologia da dificuldade de aprendizagem, bem como a compreensão do processamento da aprendizagem considerando todas as variáveis que intervêm nesse processo" (1992, P. 103).

Do ponto de vista de Weiss, "a psicopedagogia busca a melhoria das relações com a aprendizagem, assim como a melhor qualidade na construção da própria aprendizagem de alunos e educadores" (1991, P. 6).

Com referência aos profissionais brasileiros supracitados, pude-se verificar que o tema aprendizagem ocupa-os e preocupa-os, sendo os problemas desse processo ( de aprendizagem) a causa e a razão da Psicopedagogia. Pode-se observar esse pensamento traduzido nas palavras de profissionais argentinos como Alicia Fernandez, Sara Paín, Jorge Visca, Marina Müller, etc., que atuam na área e estão envolvidos no trabalho teórico. Para eles, "a aprendizagem com seus problemas" constitui-se no pilar-base da Psicopedagogia.

Segundo Jorge Visca, a Psicopedagogia, que inicialmente foi uma ação subsidiária da Medicina e da Psicologia, perfilou-se como um conhecimento independente e complementar, possuída de um objeto de estudo – o processo de aprendizagem – e de recursos diagnósticos, corretores e preventivos próprios.

Atualmente, a Psicopedagogia trabalha com uma concepção de aprendizagem segundo a qual participa desse processo um equipamento biológico com disposições afetivas e intelectuais que interferem na forma de relação do sujeito com o meio, sendo que essas disposições influenciam e são influenciadas pelas condições socioculturais do sujeito e do seu meio.

Ao psicopedagogo cabe saber como se constitui o sujeito, como este se transforma em suas diversas etapas de vida, quais os recursos de conhecimento de que ele dispõe e a forma pela qual produz conhecimento e aprende. É preciso, também, que o psicopedagogo saiba o que é ensinar e o que é aprender; como interferem os sistemas e métodos educativos; os problemas estruturais que intervêm no surgimento dos transtornos de aprendizagem e no processo escolar.

Segundo Bossa, faz-se, desta maneira, imperioso que, enquanto psicopedagogos, aprendemos sobre como os outros sujeitos aprendem e também sobre como nós aprendemos. Para Alicia Fernández, esse saber só é possível com uma formação que os oriente sobre três pilares:

-prática clínica, construção teórica, tratamento psicopedagógico-didático.

De acordo com Alicia Fernández (1991), todo sujeito tem a sua modalidade de aprendizagem,ou seja, meios, condições e limites para conhecer.

No trabalho clínico, conceber o sujeito que aprende como um sujeito epistêmico-epistemofílico implica procedimentos diagnósticos e terapêuticos que considerem tal concepção. Para isso, é necessária uma leitura clínica na qual, através da escuta psicopedagógica, se possa decifrar os processos que dão sentido ao observado e norteiam a intervenção.

Ainda de acordo com Alicia Fernández, necessitamos incorporar conhecimentos sobre o organismo, o corpo, a inteligência e o desejo, estando estes quatro níveis basicamente implicados no aprender. Considerando-se o problema de aprendizagem na interseção desses níveis, as teorias que ocupam da inteligência, do inconsciente, do organismo e do corpo, separadamente, não conseguem resolvê-lo.

Faz-se necessário construir, pois, uma teoria psicopedagógica fundamentada em conhecimentos de outros corpos teóricos, que, ressignificados, embasem essa prática.

3. EMBASAMENTOS TEÓRICOS

Fundamentos da psicopedagogia implica refletir sobre as suas origens teóricas; desde o seu parentesco com a Pedagogia, que traz as indefinições e contradições, de uma ciência cujos limites são os da própria vida humana.

Como já mencionamos a psicopedagogia necessita de várias áreas para compor o seu objeto de estudo: Psicologia, Filosofia, Neurologia, Sociologia, Línguistica e a Psicanálise, etc...

O conhecimento de diversas áreas segundo os autores Argentinos e Brasileiros servem para fundamentar a constituição de uma teoria psicopedagógica.

Devido a complexidade do seu objeto de estudo, são importantes à psicopedagogia, conhecimentos específicos de diversas outras teorias, como:

- Psicanálise, que encarrega-se do inconsciente;

- Psicologia Social, que visa a constituição do sujeito e suas relações familiares grupais e institucionais, em condição socio-culturais e econômicas;

- Epistemologia / Psicologia genética, que analisa e descreve o processo de como se constrói o conhecimento em interação com outros e com os objetos.

- Lingüística, encarrega-se da compreensão da linguagem.

- Pedagogia, contribui com as diversas abordagens do processo ensino-aprendizagem;

- Neuropscologia, possibilita a compreensão dos mecanismos cerebrais que subjazem ao aprimoramento das atividades mentais. Etc...

Dessa forma todas essas teorias (áreas) fornecem meios para refletir e operar no campo psicopedagógico.

Os profissionais da psicopedagogia, sustentam a sua prática em pressupostos teóricos.

O foco de atenção do psicopedagogo, é a reação do sujeito diante das tarefas, considerando resistências, bloqueios, lapsos, hesitações, repetição, sentimentos de angustias.

Atualmente, a Psicopedagogia refere-se a um saber e a um saber-fazer, às condições subjetivas e relacionais – em especial familiares e escolares – às inibições, atrasos e desvios do sujeito ou grupo a ser diagnosticado.

O conhecimento psicopedagogico não se cristaliza numa delimitação fixa, nem nos déficits e alterações subjetivas do aprender, mas avalia a possibilidade do sujeito, a disponibilidade afetiva de saber e de fazer, reconhecendo que o saber é próprio do sujeito.

4. UM POUCO DE HISTÓRIA

Historicamente, segundo BOSSA (2000) os primórdios da Psicopedagogia ocorreram na Europa, ainda no século XIX, evidenciada pela preocupação com os problemas de aprendizagem na área médica.

Acreditava-se na época que os comprometimentos na área escolar eram provenientes de causas orgânicas, pois procurava-se identificar no físico as determinantes das dificuldades do aprendente. Com isto, constituiu-se um caráter orgânico da Psicopedagogia.

De acordo com BOSSA (2000), a crença de que os problemas de aprendizagem eram causados por fatores orgânicos perdurou por muitos anos e determinou a forma do tratamento dada à questão do fracasso escolar até bem recentemente.

Nas décadas de 40 a 60, na França, a ação do pedagogo era vinculada à do médico. No ano de 1946, em Paris foi criado o primeiro centro psicopedagógico. O trabalho cooperativo entre médico e pedagogo era destinado a crianças com problemas escolares, ou de comportamento e eram definidas como aquelas que apresentavam doenças crônicas como diabetes, tuberculose, cegueira, surdez ou problemas motores. A denominação “Psicopedagógico” foi escolhida, em detrimento de “Médico Pedagógico”, porque acreditava-se que os pais enviariam seus filhos com menor resistência.

Em decorrência de novas descobertas científicas e movimentos sociais, a Psicopedagogia sofreu muitas influências.

Em 1958, no Brasil surge o Serviço de Orientação Psicopedagógica da Escola Guatemala, na Guanabara (Escola Experimental do INEP - Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais do MEC). O objetivo era melhorar a relação professor-aluno.

Nas décadas de 50 e 60 a categoria profissional dos psicopedagogos organizou-se no país, com a divulgação da abordagem psico-neurológica do desenvolvimento humano.

Atualmente novas abordagens teóricas sobre o desenvolvimento e a aprendizagem, bem como inúmeras pesquisas sobre os fatores intra e extra- escolares na determinação do fracasso escolar, contribuíram para uma nova visão mais crítica e abrangente.

5. CAMPO DE ATUAÇÃO

O campo de atuação está se ampliando, pois o que inicialmente caracterizava-se somente no aspecto clínico (Psicopedagogia Clínica), hoje pode ser aplicado no segmento escolar (Psicopedagogia Institucional) e ainda em segmentos hospitalares, empresariais e em organizações que aconteçam a gestão de pessoas.

O aspecto clínico é realizado em Centros de Atendimento ou Clínicas Psicopedagógicas e as atividades ocorrem geralmente de forma individual.

O aspecto institucional, como já mencionado, acontecerá em escolas e organizações educacionais e está mais voltada para a prevenção dos insucessos relacionais e de aprendizagem, se bem que muitas vezes, deve-se considerar a prática terapêutica nas organizações como necessária.

De acordo com Júlia Eugênia Gonçalves, Mestra em Educação e Psicopedagoga, “é preciso que seja feita uma ressalva quanto á maneira como a Psicopedagogia encara a aprendizagem humana, vista sempre como uma feição própria do indivíduo se relacionar com o Conhecimento gerado e armazenado pela Cultura e os problemas de aprendizagem como oriundos de fraturas ocorridas nessa relação, vínculos mal estabelecidos entre aprendentes e ensinantes, seja por fatores de natureza orgânica, cognitiva ou emocional.

O trabalho psicopedagógico, portanto, não se apresenta como reeducativo, mas, sim , como terapêutico (uma terapia centrada na aprendizagem) ; não se dirige para um público específico, porque aprendentes somos todos nós, humanos : crianças, jovens, ou velhos que nos mantemos vivos e atuantes, enquanto aprendemos e ensinamos e podemos contribuir com a nossa marca para a evolução da humanidade.

Ainda segundo Julia, “a atuação do psicopedagogo difere daquela do psicólogo, pois este não está preocupado especificamente com a aprendizagem , como aquele. Costumo dizer que o ser humano, em sua complexidade, sempre articula uma maneira de pedir ajuda, quando está em dificuldades de qualquer natureza. Seja a criança, apresentando uma dificuldade específica na Escola ; seja o jovem , fazendo muitas vezes uma verdadeira negação da escolaridade e enveredando pela marginalidade; seja o idoso, entrando em depressão por se julgar incapaz de aprender e continuar contribuindo para sua comunidade . Quando esse pedido de ajuda se dá via aprendizagem, aí deve atuar o psicopedagogo, por ser o profissional cuja formação o habilita para compreender e atender tais solicitações.

A Psicopedagogia aplicada a segmentos hospitalares e empresariais está voltada para a manutenção de um ambiente harmônico e à identificação e prevenção dos insucessos interpessoais e de aprendizagem. Pode ser realizada de forma individual ou em grupo.

É possível perceber que a Psicopedagogia também tem papel importante em um novo momento educacional que é a inserção e manutenção dos alunos com necessidades educativas especiais (NEE) no ensino regular, comumente chamada inclusão.

Entende-se que colocar o aluno com NEE em sala de aula e não criar estratégias para a sua permanência e sucesso escolar inviabiliza todo o movimento nas escolas. Faz-se premente a necessidade de um acompanhamento e estimulação dos alunos com NEE para que as suas aprendizagens sejam efetivas.

6. COMPETÊNCIA DO PSICOPEDAGOGO

Competência é qualidade de quem é capaz de resolver certo assunto, fazer determinada coisa. Implica em capacidade, habilidade para o exercício de uma função.

Competente não é só quem possui uma aptidão, mas quem tem suficiência, propriedade e adequação na tarefa que executa.

cumpre-nos analisar o que faz o psicopedagogo, qual é sua tarefa, a fim de que possamos avaliar as competências que dela derivam.

O prefixo “ psi “ não é moderno. Deriva de “physis “, utilizado pelos pré-socráticos para definir a totalidade de tudo que é .

Para Ser, necessário se faz possuir as características da espécie humana.

Fílon, de Alexandria, desvelava a condição humana dentro de um quatérnio:

basar, soma - dimensão corporal;

nephesh - dimensão psíquica;

nous - dimensão consciente, cognitiva;

pneuma- o sopro - dimensão espiritual .

Sara Paín , utiliza também um quatérnio para explicar as vias pelas quais os seres humanos acedem ao “ Conhecimento “. . Estas quatro estruturas permitirão ao bebê captar o conhecimento, para reproduzir-se como humano, para ser. São elas:

O organismo - substrato biológico;

O corpo - lugar da identidade;

estruturas cognitivas- inteligência

estrutura simbólica - função semiótica ( sinais, signos e símbolos )

Podemos ,então, concluir que psi- é um prefixo aplicável a seres humanos e que psicopedagogos trabalham com esta categoria.

Ser humano é então, desde a antigüidade, ser diferente.

Ser humano é ser aprendendente , recriando e criando conhecimentos. Ser humano é buscar a liberdade na obrigação da interpretação. Esta é sua dialética.

Para realizar um trabalho “ psi “, necessário se faz, portanto, interpretar.

O homem é o único animal hermenêutico. Ele é dotado de um pensamento reflexivo, que o capacita a fazer um juízo de valor sobre si mesmo, sobre os outros e sobre a realidade que o cerca.

Desde o início da História da humanidade, temos testemunhos do trabalho de alguns” psis

Quem nos apresenta a eles é Fílon, que assim denomina um grupo de homens de cultura helenística.

Os terapeutas eram hermeneutas habilitados na arte da interpretação dos textos sagrados, dos sonhos e dos eventos da existência.

Aqueles que Fílon de Alexandria chamava de terapeutas tinham uma maneira de viver bem diferente daquela que vivenciam os que hoje levam esse nome.

O psicopedagogo será um terapeuta ? esta pergunta tanto atrai como amedronta. É a dialética de uma atividade ainda não totalmente especificada e regulamentada.

Terapia é, sem dúvida nenhuma, “ arte da interpretação “.

Efeitos e afetos modificam-se em direção a um melhor ou a um pior, de acordo com o sentido que se dá a um sofrimento, um evento, um sonho ou um texto . Os acontecimentos são o que são, o que se faz deles depende do sentido que se lhes dá.

A palavra therapeutes precisa ser melhor especificada.Ela pode apresentar dois sentidos principais a partir do verbo de que provém:

1-servir, cuidar, honrar

2 -tratar, sarar

Terapeuta é aquele que cuida, que se desvela em direção ao outro procurando aliviar-lhe os sofrimentos. É aquele que cuida, não o que cura. Ele está lá apenas para por o sujeito nas melhores condições possíveis, a fim de que este atue e venha a se curar.

Terapeuta é também aquele que honra, e que, portanto, é responsável por uma ética subjacente à sua atividade. Neste sentido, os terapeutas saõ também filósofos, porque estão sempre em busca da verdade que se encontra por detrás das aparências. O homem é seu livro de estudos e ele ama o Homem e a sabedoria que dele se origina. Isso pode parecer uma utopia, para muitos, mas, utopia não é o irrealizável, mas o irrealizado ! Deste modo, podemos fazer uma leitura da descrição dos terapeutas, como algo semelhante ao mito fundador, original, de todas as terapêuticas.

A psicopedagogia é uma forma de terapia. Daí não haver a distinção, como lembra Alícia, entre psicopedagogia institucional e clínica. Todo trabalho psi é clínico seja realizado numa instituição ou entre as quatro paredes de um consultório. Clínica é a nossa atitude de respeito pelas vivências do outro, de disponibilidade perante seus sofrimentos, de olhar e de escuta além das aparências que nos são expostas.

O psicopedagogo é um terapeuta que trabalha com esta característica básica do ser humano que é a aprendizagem

Fílon define os terapeutas como aqueles que cuidavam do corpo, das imagens e dos arquétipos que o animam, do desejo e do Outro.

Vejamos o que eu penso que ele queria dizer com isto e como podemos estabelecer uma relação deste quatérnio, com a competência do psicopedagogo:

1- Cuidar do corpo : não o corpo compreendido como organismo. Lembremo-nos de Sara Pain e da distinção que ela traça entre estas duas estruturas. O corpo de que cuidamos é aquele transversalizado pelo desejo, um corpo animado ( ânima - aquilo que anima, que dá o movimento ). Não um corpo objeto, mas um corpo sujeito, que “ fala “. Cuidar do corpo é prestar atenção ao sopro que o anima e que possibilita a aprendizagem. É preciso um movimento para que ocorra aprendizagem. Caberá ao terapeuta a função de dialogar com este corpo, desatando os nós que se colocam como impelidos á vida e à inteligência criativa.

2- Cuidar do Ser : uma escuta e um olhar dirigida para aquele que É, ou seja, para aquilo que não se apresenta como doentio e mortal. Cuidar do ser é não estar voltado primeiramente para a doença ou para o doente,, mas para aquilo que se acha fora do alcance da doença e que mantém o sujeito vivo. É olhar em primeiro lugar para aquilo que vai bem, para o ponto de luz que pode dissipar as trevas. É cuidar no homem aquilo que escapa ao homem, abrindo espaços para modificações, para mudanças, um espaço onde o homem possa se recolher e descansar, encontrando seus próprios caminhos para aprender. Não é ensinar, é possibilitar aprendizagens.

3- Cuidar do desejo:uma palavra que ocorre muitas vezes na obra de Fílon é “Equilíbrio” . Cuidar do desejo é não percorrer um caminho de excessos, mas um caminho do meio. O desejo é o do Outro e o meu. No trabalho psicopedagógico não existe professor e aluno, mas ensinante e aprendente que interagem sem possuírem papéis fixos ou predeterminados. Não se trata de querer a todo custo fazer compreender, querer que o outro compartilhe as nossas mais íntimas convicções. Isso de nada serve e denota uma vontade de poder. Melhor é respeitar o do outro como se respeita o seu próprio rítmo. Cuidar do desejo é atentar para as próprias necessidades, é procurar supervisão e terapia para a melhoria de nossa escuta e de nosso olhar, que se direciona tanto para o outro como para nós mesmos.

4- Cuidar do outro : A verdade é a condição da alegria, e, por isso, é necessário, ver com clareza. Isso supões sair das projeções, que não nos deixam ver o que é. É preciso” por entre parêntesis”. Isso significa olhar para uma pessoa, um acontecimento e não projetar sobre isto nossos temores e desejos, todas as nossas lembranças. É deixar de lado o próprio ponto de vista e os seus condicionamentos, ver as coisas a partir delas mesmas, em sua “ outridade. O olhar do terapeuta não deve ser claro apenas no sentido de lúcido, mas também no sentido de esclarecedor. Diante de um olhar assim, a pessoa não se sente julgada, nem menosprezada, mas aceita, e esta aceitação é a condição necessária para que se inicie o caminho de cura. Adquirir um olhar esclarecedor, para o terapeuta, é adquirir a humildade é relativisar o “ eu “.

A competência do psicopedagogo está, portanto, na difícil tarefa de por em articulação teoria e prática. Não existe psicopedagogo enquanto o “ fazer “ não se inicia. Não existe Psicopedagogia sem a busca da verdade que esta inscrita no conhecimento de si e do outro e na criação de novos conhecimentos.

É necessária uma integração também entre os saberes científicos, a fim de que a competência do psicopedagogo seja sentida:

epistemológico - especificidades dos conhecimentos

saberes científicos: metodológico -encontrar respostas pessoais aos

conhecimentos em questão

pedagógico - transmissão dos conhecimentos

Escolher a psicopedagogia como terapia, fazer-se terapeuta é uma assumir a responsabilidade por uma formação contínua e cada vez mais aprofundada nas questões humanas, é assumir a responsabilidade por uma atividade que implica um saber interdisciplinar e eclético, sem sectarismos de qualquer espécie, é estar aberto para as mudanças.

7. PROJETO LEI

Projeto Lei n. 3124/97 do Deputado Barbosa Neto que regulamenta a profissão do Psicopedagogo e cria o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Psicopedagogia.

- O psicopedagogo é o profissional que auxilia na identificação e resolução dos problemas no processo de aprender. O Psicopedagogo está capacitado a lidar com as dificuldades de aprendizagem, um dos fatores que leva a multirepetência e à evasão escolar, conduzindo a marginalização social.

O Psicopedagogo:

1. Possibilita intervenção visando à solução dos problemas de aprendizagem tendo como enfoque o aprendiz ou a instituição no ensino público ou privadoç

2. Realiza o diagnóstico e intervenção psicopedagógica, utilizando métodos, instrumentos e técnicas próprias da Psicopedagogia;

3. Atua na prevenção dos problemas de aprendizagem

4. Desenvolve pesquisas e estudos científicos relacionados ao processo de aprendizagem e seus problemas;

5. Oferece assessoria psicopedagógica aos trabalhos realizados em espaços institucionais, inclusive no ensino superior;

6. Orienta, coordena e supervisiona cursos de especialização de psicopedagogia, em nível de pós-graduação, expedidos por instituições ou escolas devidamente autorizadas ou credenciadas nos termos da legislação vigente.

O QUE O PSICOPEDAGOGO OBSERVA NO INDIVÍDUO

q Coordenação motora ampla;

q Aspecto sensório motor;

q Dominância lateral;

q Desenvolvimento rítmico;

q Desenvolvimento motor fino;

q Criatividade;

q Evolução do traçado e do desenho;

q Percepção e discriminação visual e auditiva;

q Percepção espacial;

q Percepção Viso-motora;

q Orientação e relação espaço-temporal;

q Aquisição e articulação de sons;

q Aquisição de palavras novas;

q Elaboração e organização mental;

q Atenção e concentração;

q Expressão plástica;

q Aquisição de conceitos;

q Discriminação e correspondência de símbolos;

q Raciocínio lógico matemático.

A Psicopedagogia há muito tempo é reconhecida, respeitada e regulamentada em países culturalmente desenvolvidos como: Argentina, Estados Unidos, França (onde surgiu em meados do sec. XIX) . Neuropediatras, Psiquiatras e Educadores, começaram a estudar e trabalhar temas pertinentes a problemas relacionados com a conduta e o comportamento do indivíduo, principalmente com relação ao seu desenvolvimento cognitivo, afetivo, emocional, orgânico e motor.

8. A PRÁXIS PSICOPEDAGOGICA

A práxis psicopedagógica é entendida como o conhecimento dos processos de aprendizagem nos seus aspectos cognitivos, emocionais e corporais.

8.1 – Psicopedagogia Clínica

Diagnostica, orienta, atende em tratamento e investiga os problemas emergentes nos processos de aprendizagem. Esclarece os obstáculos que interferem para haver uma boa aprendizagem. Favorece o desenvolvimento de atitudes e processos de aprendizagem adequados. Realiza o diagnóstico-psicopedagógico, com especial ênfase nas possibilidades e pertubações da aprendizagem; esclarecimento e orientação ocacional operativa em todos os níveis educativos.

A psicopedagogia no campo clínico emprega como recurso principal a realização de entrevistas operativas delicadas e a progressiva resolução da problemática individual e/ou grupal daqueles que a consultam.

8.2 – Psicopedagogia Institucional

A psicopedagogia vem atuando com muito sucesso nas diversas Instituições, sejam escolas, hospitais e empresas. Seu papel é analisar os fatores que favorecem, intervem ou prejudicam uma boa aprendizagem em uma instituição. Propõe e ajuda o desenvolvimento dos projetos favoráveis a mudanças.

Portanto o objetivo do psicopedagogo é o de:

- Conduzir a criança ou adolescente, o adulto ou a Instituição a reinserir-se, reciclar-se numa escolaridade normal e saudável, de acordo com as possibilidades e interesses dela.

- Promover a aprendizagem, garantindo o bem estar das pessoas em atendimento profissional, valendo-se dos recursos disponíveis, incluindo a relação interprofissional.

- Atender indivíduos que apresentem dificuldades para aprender por diferentes causas, estando assim, inadaptados social ou pedagogicamente.

- Encorajar aquele que aprende à tornar-se cada vez mais autônomo em relação ao meio, em interagir com os colegas e resolver os conflitos entre eles mesmos; a ser independente e curioso; a usar iniciativa própria; Ter confiança na habilidade de formar idéias próprias das coisas; a exprimir suas idéias com convicção e conviver construtivamente com medos e angústias.

A Psicopedagogia tem muito a ensinar sobre o vínculo professor/aluno, professor/escola e sua incidência na construção do conhecimento e na constituição subjetiva de alunos e educadores.

A Psicopedagogia tem trabalhado com as relações entre as modalidade de ensino da escola e dos professores e as modalidades de aprendizagem de alunos e educadores.

A Psicopedagogia oferece inúmeros conhecimentos e formas de atuação para a abertura de espaços objetivos/subjetivos onde a autoria do pensamento de alunos e professores seja possível e, consequentemente, a aprendizagem ocorra.

O Psicopedagogo têm realizado trabalhos com grupos de educadores resgatando suas histórias de aprendizagem, ressignificando seus modelos de aprendentes/ensinantes; têm proporcionado a abertura de espaços vivencias para que os educadores reconheçam a própria autoria de pensamento, permitindo assim que seus alunos também sejam sujeitos pensantes. Espaços onde os educadores se conectam com a angústia de conhecer e de desconhecer redimensionando seus vínculos com os alunos.

O trabalho psicopedagógico tem como base às teorias de Jean Piaget, Vygostky. Howard Gardner. Henry Wallon, Freud, Perrenoud, David Ausebel, Pichon, etc..

9. ÉTICA PROFISSIONAL

Os psicopedagogos devem seguir certos princípios éticos que estão condensados no Código de Ética, devidamente aprovado pela Associação Brasileira de Psicopedagogia, no ano de 1996.

O Código de Ética regulamenta as seguintes situações:

· os princípios da Psicopedagogia;

· as responsabilidades dos psicopedagogogos;

· as relações com outras profissões;

· o sigilo;

· as publicações científicas;

· a publicidade profissional;

· os honorários;

· as relações com a educação e saúde;

· a observância e cumprimento do código de ética; e

as disposições gerais.

Capítulo I - Dos Princípios

Artigo 1º

A Psicopedagogia é um campo de atuação em educação e saúde que lida com o processo de aprendizagem humana; seus padrões normais e patológicos, con­siderando a influência do meio - família, escola e sociedade - no seu desenvol­vimento, utilizando procedimentos próprios da Psicopedagogia.

Parágrafo Único

A intervenção psicopedagógica é sempre da ordem do conhecimento relaciona do com o processo de aprendizagem.

Artigo 2º

A Psicopedagogia é de natureza interdisciplinar. Utiliza recursos das várias áreas, do conhecimento humano para a compreensão do ato de aprender no sentido, ontogenético e filogenético, valendo-se de métodos e técnicas próprias.

Artigo 3º

O trabalho psicopedagógico é de natureza clínica e institucional, de caráter; preventivo e/ou remediativo.

Artigo 4º

Estarão em condições de exercício da Psicopedagogia os profissionais graduados em 3º grau, portadores de certificados de curso de Pós-Graduação de Psicopedagogia, ministrado em estabelecimento de ensino oficial e/ou reco­nhecido, ou mediante direitos adquiridos, sendo indispensável submeter-se à supervisão e aconselhável trabalho de formação pessoal.

Artigo 5º

O trabalho psicopedagógico tem como objetivo: (i) promover a aprendizagem; garantindo o bem-estar das pessoas em atendimento profissional, devendo valer-se dos recursos disponíveis, incluindo a relação interprofissional; (ii) realizar pesquisas científicas no campo da Psicopedagogia

Capitulo II - Das responsabilidades dos psicopedagogos

Artigo 6º

São deveres fundamentais dos psicopedagogos:

a) Manter-se atualizado quanto aos conhecimentos científicos e técnicos que tratem do fenômeno da aprendizagem humana.

b) Zelar pelo bom relacionamento com especialistas de outras áreas, mantendo uma atitude crítica, de abertura e respeito em relação às diferentes visões de mundo.

c) Assumir somente as responsabilidades para as quais esteja preparado den­tro dos limites da competência psicopedagógica.

d) Colaborar com o progresso da Psicopedagogia. e) Difundir seus conhecimentos e prestar serviços nas agremiações de classe sempre que possível.

f) Responsabilizar-se pelas avaliações feitas, fornecendo ao cliente uma defi­nição clara do seu diagnóstico.

g) Preservar a identidade, parecer e/ou diagnóstico do cliente nos relatos e . discussões feitos a título de exemplos e estudos de casos.

h) Responsabilizar-se por crítica feita a colegas na ausência destes

i) Manter atitude de colaboração e solidariedade com colegas sem ser conivente ou acumpliciar-se, de qualquer forma, com o ato ilícito ou calúnia. O respeito e a dignidade na relação profissional são deveres fundamentais do psicopeda­gogo para a harmonia da classe e a manutenção do conceito público.

Capítulo III - Das relações com outras profissões

Artigo 7º

O psicopedagogo procurará manter e desenvolver boas relações com os compo­nentes das diferentes categorias profissionais, observando, para este fim, o seguinte:

a) Trabalhar nos estritos limites das atividades que lhe são reservadas.

b) Reconhecer os casos pertencentes aos demais campos de especialização, encaminhando-os a profissionais habilitados e qualificados para o atendimento.

Capítulo IV-Do sigilo

Artigo 8º

O Psicopedagogo está obrigado a guardar sigilo sobre fatos de que tenha co­nhecimento em decorrência do exercício de sua atividade.

Parágrafo Único

Não se entende como quebra de sigilo informar sobre o cliente a especialistas comprometidos com o atendimento.

Artigo 9º

O Psicopedagogo não revelará, como testemunha, fatos de que tenha conhecimento no exercício de seu trabalho, a menos que seja intimado a depor perante autoridade competente.

Artigo 10º

Os resultados de avaliações só serão fornecidos a terceiros interessados mediante concordância do próprio avaliado ou do seu representante legal.

Artigo 11º

Os prontuários psicopedagógicos são documentos sigilosos e não será franquiado o acesso a pessoas estranhas ao caso.

Capítulo V - Das publicações científicas

Na publicação de trabalhos científicos deverão ser observadas as seguintes normas:

a) As discordâncias ou críticas deverão ser dirigidas à matéria em discussão e não ao autor.

b) Em pesquisa ou trabalho em colaboração, deverá ser dada igual ênfase aos autores, sendo de boa norma dar prioridade na enumeração dos colaboradores àquele que mais contribuiu para a realização do trabalho. ­

c) Em nenhum caso o Psicopedagogo se prevalecerá da posição hierárquica para fazer publicar; em seu nome exclusivo, trabalhos executados sob sua orientação.

d) Em todo trabalho científico deve ser indicada a fonte bibliográfica utilizada, bem como esclarecidas as idéias descobertas e as ilustrações extraídas de cada autor.

Capítulo VI - Da publicidade profissional

Artigo 13º

O Psicopedagogo ao promover publicamente a divulgação de seus serviços, deverá faze-lo com exatidão e honestidade.

Artigo 14º

O Psicopedagogo poderá atuar como consultor científico em organizações que visem o lucro com venda de produtos, desde que busque sempre a qualidade dos mesmos.

Capítulo VII - Dos honorários

Artigo 15º

Os honorários deverão ser fixados com cuidado a fim de que representem justa retribuição aos serviços prestados e devem ser contratados previamente.

Capítulo VIII - Das relações com educação e saúde

Artigo 16º

O Psicopedagogo deve participar e refletir com as autoridade competentes so­bre a organização, a implantação e a execução de projetos de Educação e Saú­de Pública relativas a questões psicopedagógicas.

Capitulo IX - Da observância e cumprimento do código de ética

Artigo 17º

Cabe ao Psicopedagogo, por direito, e não por obrigação, seguir este código.

Artigo 18º

Cabe ao Conselho Nacional da ABPp orientar e zelar pela fiel observância dos princípios éticos da classe.

Artigo 19º

O presente código poderá ser alterado por proposta do Conselho da ABPp e aprovado em Assembléia Geral;

Capitulo X - Das Disposições Gerais

Artigo 20º

O presente código de ética entrou em vigor após sua aprovação em Assembléia Geral, realizada no V Encontro e II Congresso de Psicopedagogia da ABPp em 12/07/1992, e sofreu a 1ª alteração proposta pelo Congresso Nacional e Nato no biênio 95/96 sendo aprovado em 19/07/1996, na Assembléia Geral do III Congresso Brasileiro de Psicopedagogia, da ABPp, da qual resultou a presente redação.

Assim sendo, o psicopedagogo deve ser um profissional que tem conhecimentos multidisciplinares, pois em um processo de avaliação diagnóstica, é necessário estabelecer e interpretar dados em várias áreas. O conhecimento dessas áreas fará com que o profissional compreenda o quadro diagnóstico do aprendente e favorecerá a escolha da metodologia mais adequada, ou seja, o processo corretor, com vista a superação das inadequações do aprendente.

É necessário ressaltar também que a atualização profissional é imperiosa, uma vez que trabalhando com tantas áreas, a descoberta e a produção do conhecimento é bastante acelerada.

No que diz respeito à Pedagogia, a relação que se pode estabelecer com a Psicopedagogia, é que ela representa uma das colunas de sustentação do emergente campo de conhecimento, assim como igual importância, tem a Psicologia e outras áreas de conhecimento que o permeiam.

A Psicopedagogia nasceu, especialmente, da necessidade de compreensão e atendimento às pessoas com dificuldades e distúrbios de aprendizagem e ao longo de sua estruturação, veio e vem adquirindo novas perspectivas.

10 – A HISTORIA DA PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL E NA ARGENTINA

Bossa, em sua obra Psicopedagogia no Brasil faz um resumo referente a trajetória da Psicopedagogia, ressalta que o movimento da Psicopedagogia no Brasil deu-se devido ao seu histórico na Argentina.

A autora articula que encontra-se trabalhos de autores argentinos na literatura brasileira, os quais constituem os primeiros esforços no sentido de sistematizar um corpo teórico da Psicopedagogia. A origem do pensamento argentino acerca da Psicopedagogia, está fortemente marcada pela literatura francesa. Autores como Jacques Lacan, Maud Mannoni, Françoise Dolto, Julián de Ajuriaguerra, Janine Mery, Michel Lobrot, Pierre Vayer, Maurice Debesse, René Diatkine, George Mauco, Pichón-Rivière e outros, são freqüentemente citados nos trabalhos argentinos.

Relata a autora que, a Psicopedagogia nasceu na Europa, ainda no século XIX. Inicialmente, pensaram sobre o problema de aprendizagem: os filósofos, os médicos e os educadores.

De acordo com Bossa, na literatura francesa – encontra-se, entre outros, os trabalhos de Janine Mery, psicopedagoga francesa, que apresenta algumas considerações sobre o termo psicopedagogia e sobre a origem dessas idéias na Europa, e os trabalhos de George Mauco, fundador do primeiro centro médico-psicopedagógico na França onde se percebe as primeiras tentativas de articulação entre Medicina, Psicologia, Psicanálise e Pedagogia, na solução dos problemas de comportamento e de aprendizagem.

O termo psicopedagogia curativa, foi adotado por Janine Mery, usado para caracterizar uma ação terapêutica que considera aspectos pedagógicos e psicológicos no tratamento de crianças que apresentam fracasso escolar. Tais crianças " experimentam dificuldades ou demonstram lentidão em relação aos seus colegas no qual diz respeito às aquisições escolares" (Janine Mery, 1985, p. 16).

Segundo essa autora, no final do século XIX, educadores como Itard, Pereire, Pestalozzi, e Seguin começaram a se dedicar às crianças que apresentavam problemas de aprendizagem em razão de vários tipos de distúrbios. Pestalozzi, inspirando nas idéias de Rousseau , fundou na Suíça um centro de educação através do trabalho, onde usou o método intuitivo e natural, estimulando em especial a percepção. Educadores como Pereire, Itard e Seguin também se preocuparam principalmente com a percepção. Mery aponta esses educadores como pioneiros no tratamento dos problemas de aprendizagem, observando, porém, que eles se preocupavam mais pelas deficiências sensoriais e pela debilidade mental do que propriamente pela desadaptação infantil.

Em 1898, Edouard Claparède, famoso professor de Psicologia, juntamente com o neurologista François Neville, introduziu na escola pública as "classes especiais", destinadas à educação de crianças com retardo mental. Esta foi a primeira iniciativa registrada de médicos e educadores no campo da reeducação (cf. Claparède, 1959). Em 1904 e 1908 iniciam-se as primeiras consultas médico-pedagógicas, as quais tinham o objetivo de encaminhar as crianças para as classes especiais.

Ainda em fins do século XIX foi formada uma equipe médico- pedagógica pelo educador Seguin e pelo médico psiquiatra Esquirol. A partir daí a neuropsiquiatria infantil passou a se ocupar dos problemas neurológicos que afetam a aprendizagem (cf. Mery, 1985, p. 11). Nessa mesma época Maria Montessori, psiquiatra italiana, criou um método de aprendizagem destinado inicialmente às crianças retardadas.

Posteriormente, o método Montessori foi estendido a todas as crianças, sendo hoje utilizado em muitas Escolas. Sua principal preocupação está na educação da vontade e na alfabetização, via estimulação dos órgãos dos sentidos – sendo por isso classificado como sensorial (cf. Montessori, 1954).

O psiquiatra Ovidir Decroly também se preocupou com a ed. infantil, utilizando técnicas de observação e filmagem para estudar as situações de aprendizagem. Criou os famosos Centros de Interesse, que perduram até os nossos dias (cf. Decroly, 1929).

Conforme Mery (1985), em 1946 foram fundados os primeiros Centro Psicopedagógicos, onde se buscava unir conhecimentos da Psicologia, da Psicanálise e da Pedagogia para tratar comportamentos socialmente inadequados de crianças, tanto na escola como no lar, objetivando a sua adaptação.

De acordo com o professor Lino de Macedo, "a Psicopedagogia é uma (nova) área de atuação profissional que tem, ou melhor, busca uma identidade e que requer uma formação de nível interdisciplinar (o que já é sugerido no próprio termo psicopedagogia)" (1992, p. VIII).

10.1 - A Psicopedagogia na Argentina

De acordo com Alicia Fernández, a graduação em Psicopedagogia surgiu há mais de trinta anos na Argentina. Na prática, a atividade psicopedagógica iniciou-se antes da criação do próprio curso. Profissionais que possuíam outra formação viram a necessidade de ocupar um espaço que não podia ser preenchido pelo psicólogo nem pelo pedagogo. Desta maneira, começaram fazendo reeducação, com o objetivo de resolver fracassos escolares. Trabalhava-se as funções egóicas, tais como memória, percepção, atenção, motricidade e pensamento, medindo-se os déficits e elaborando planos de tratamento que objetivavam vencer essas faltas. De acordo com Bossa, Alicia afirma que o curso de Psicopedagogia passou por três momentos distintos devido a alterações nos seus planos de estudo. (Bossa e Montti, 1991, p.22).

Para Fernández e Montti, o segundo momento da Psicopedagogia na Argentina é constituído pelos planos de 1963, 1964 e 1969, nos quais se evidencia a influência da Psicologia Experimental na formação do psicopedagogo. Neste momento, busca-se a formação instrumental do profissional, ou seja, procura-se capacitá-lo na medição das funções cognitivas e afetivas.

Durante os trinta anos que se passaram desde o seu estabelecimento na Argentina, a Psicopedagogia tem ocupado um significado espaço no âmbito da educação e da saúde. Nesse processo evolutivo, é importante destacar um fato relevante que permitiu mudanças na abordagem da Psicopedagogia: da reeducação à clínica. Na década de 1970 criou-se em Buenos Aires os Centros de Saúde Mental, onde atuavam equipes de psicopedagogos que faziam diagnóstico e tratamento. Esses profissionais observavam que, depois de um ano de tratamento, quando os pacientes retornavam para controle, haviam "resolvido" os seus problemas de aprendizagem. Entretanto, em lugar desses problemas surgiam graves distúrbios de personalidade: fobias, traços psicóticos, etc. Os reeducadores tomaram, então, consciência de que haviam afogado o único grito que esses sujeitos tinham para se expressar, produzindo-se, pois, um deslocamento de sintoma. A partir daí ocorre uma grande mudança na abordagem psicopedagógica. Os psicopedagogos começam a incluir no seu trabalho o olhar e a escuta clínica da Psicanálise, resultando no atual perfil do psicopedagogo argentino.

Observam Fernández e Montti que, na Argentina, a atuação psicopedagógica está ligada, fundamentalmente, a duas áreas: a educação e a saúde. A função do psicopedagogo na área educativa é cooperar para diminuir o fracasso escolar, seja este da instituição, seja do sujeito ou, o que é mais freqüente, de ambos. Esse objetivo é perseguido através de assessoramento aos pais, professores e diretores, para que possam decidir e opinar na elaboração de planos de recreação, cujo objetivo é o desenvolvimento da criatividade, do juízo crítico e da cooperação entre os alunos. Ainda na área educativa, psicopedagogo argentino atua no serviço de orientação vocacional, na passagem do 1º para o 2º e deste par o 3º grau, bem como em outras atividades que surgem em função de necessidades concretas da instituição.

Quanto a área de saúde, o psicopedagogo, na Argentina, trabalha em consultórios particulares e/ou em instituições de saúde, hospitais públicos e particulares. Sua função é reconhecer e atuar sobre as alterações da aprendizagem sistemática e/ou assistemática. Procura-se reconhecer as alterações da aprendizagem sistemática, utiliza-se diagnóstico na identificação dos múltiplos geradores desse problema e, fundamentalmente, busca-se descobrir como o sujeito aprende. Utilizam-se, no diagnóstico, testes para melhor conhecer o paciente e a sua problemática, os quais são selecionados em função de cada sujeito. Participam do processo diagnóstico tanto o sujeito quanto os pais.

10.2 – Psicopedagogia no Brasil

De acordo com Bossa, no Brasil, se explicou o problema de aprendizagem como produto de fatores orgânicos (Lefèvre, 1968, 1975, 1981; e Grünspun, 1990). Nesse caminhar, na década de 70 foi difundida que a causa de uma disfunção neurológica não-detectável em exame clínico, chamada disfunção cerebral mínima (DCM), fosse o problema.

No final da década de 70, surgiram os primeiros cursos de especialização em Psicopedagogia no Brasil, idealizados para complementar a formação dos psicólogos e de educadores que buscavam soluções para esses problemas. Esses cursos foram estruturados e, dentro desse contexto histórico, amparados num conhecimento científico, fruto de uma dinâmica sociocultural que não a nossa.

Os profissionais de Porto Alegre organizaram centros de estudos destinados à formação e atualização em Psicopedagogia – nos moldes dos cursos do Centro Médico de Pesquisas de Buenos Aires -, como o professor Nilo Fichtner, que fundou o Centro de Estudos Médicos e Psicopedagógicos na capital gaúcha. Essa formação em Psicopedagogia dá-se num quadro de referências baseado num modelo médico de atuação. Segundo Golbert (1985), "a Clínica Médica Pedagógica de Porto Alegre, dirigida pelo Dr. Nilo Fchtner desde 1970, prepara profissionais em Psicopedagogia Terapêutica".

Neste breve histórico da Psicopedagogia no Brasil, não se pode deixar de mencionar o trabalho da professora Genny Golubi de Moraes, por sua contribuição na compreensão e tratamento dos problemas de aprendizagem. Coordenadora de cursos na PUC-SP, foi responsável pela formação de um grande número de profissionais da Psicopedagogia que hoje desenvolvem importantes trabalhos na área. Priorizou sempre o trabalho preventivo, deixando clara a sua preocupação no sentido de fazer com que cada vez menos crianças cheguem à clínica por problemas escolares.

A nova abordagem desse curso pioneiro reflete a mudança na forma de conceber a problemática do fracasso escolar e a busca pela identidade desse profissional brasileiro, que nasce como reeducador e que, ao longo do tempo, amplia o seu compromisso assumindo a responsabilidade com a diminuição dos problemas de aprendizagem nas escolas e, consequentemente, com a redução dos altos índices de fracasso escolar.

A Associação Brasileira de Psicopedagogia não deixa de dar contornos à prática psicopedagógica em nosso País. Tem sido responsável pela organização de eventos de dimensão nacional, bem como por publicações cujos temas retratam as preocupações e tendências na área.

Segundo Bossa, o trabalho psicopedagógico não pode confundir-se com a prática psicanalítica e nem tampouco com qualquer prática que conceba uma única face do sujeito. Um psicopedagogo, cujo objeto de estudo é a problemática da aprendizagem, não pode deixar de observar o que sucede entre a inteligência e os desejos inconscientes. Diz Piaget que "o estudo do sujeito ‘epistêmico’ se refere à coordenação geral das ações (reunir, ordenar ,etc.) constitutivas da lógica, e não ao sujeito ‘individual’, que se refere às ações próprias e diferenciadas de cada indivíduo considerado à parte" (1970, p. 20). Desse sujeito individual ocupa-se a psicopedagogia.

O conceito de aprendizagem com o qual trabalha a Psicopedagogia remete a uma visão de homem como sujeito ativo num processo de interação com o meio físico e social. Nesse processo interferem o seu equipamento biológico, as suas condições afetivo-emocionais e as suas condições intelectuais que são geradas no meio familiar e sociocultural no qual nasce e vive o sujeito. O produto de tal interação é a aprendizagem.

Conhecer a Psicopedagogia implica um maior conhecimento de várias outras áreas, de forma a construir novos conhecimentos a partir delas. Ao concluir o curso de especialização em Psicopedagogia, o aluno está iniciando a sua formação, o que deve ser um ponto de partida para uma eterna busca do melhor conhecimento.

Referências

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ARTIGOS:

Artigo de Júlia Eugênia Gonçalves, “APRESENTANDO A PSICOPEDAGOGIA” www.aprender-ai.com.

Texto apresentado por ocasião do II ENCONTRO MINEIRO DE PSICOPEDAGOGIA – Belo Horizonte, MG, 1997

Sites importantes para pesquisas:

http://www.psicopedagogia.com.br

http://www.abpp.com.br

http://www.aprender-ai.com.Br

SEGUE ABAIXO ARTIGOS PARA LEITURAS COMPLEMENTARES:

1 - A Psicopedagogia no Brasil: uma possível leitura

Edith Rubinstein

O artigo trata do percurso da Psicopedagogia no Brasil, as diferentes concepções ao longo do tempo e a contribuição do órgão de classe na difusão e no desenvolvimento da Psicopedagogia em nosso meio.

Para esta reflexão sobre o percurso da Psicopedagogia no Brasil estarei considerando três experiências de caráter pessoal, as quais julgo importantes para se pensar nos rumos da psicopedagogia brasileira. Quero frisar que esta leitura, deve ser compreendida como uma das possíveis leituras sobre os rumos da Psicopedagogia e da profissionalização daqueles que se dedicam a área. Esta reflexão está baseada na vivência profissional como psicopedagoga clínica; no convívio com os colegas da ABPp e como supervisora nas áreas clínica e institucional. Estas experiências me permitem acompanhar as diferentes visões que se têm sobre a Psicopedagogia e sobretudo das diferentes formas de compreender o fracasso escolar.

Em nosso país, (e acredito que em outros também ), surgiram primeiramente profissionais que se dedicavam a atender crianças que por diferentes razões não conseguiam se adaptar à escola. Essas crianças ficavam à margem, eram discriminadas, sofriam. Não somente elas sofriam, mas também seus professores; alguns ficavam imobilizados, outros frustrados. Pais ficam aflitos quando seus filhos não correspondem ao que deles se espera. Todos os envolvidos: a criança, o mestre, os pais, esperam que o ato de ir à escola seja acompanhado do ato de aprender. Porém nem sempre está presente, na mente das pessoas, a concepção de que aprender é um processo complexo e que envolve múltiplas variáveis.

Os primeiros psicopedagogos eram profissionais da educação, sensíveis, idealistas, que queriam ajudar na reintegração daqueles que estavam à margem. As dificuldades para aprender eram atribuídas a uma inaptidão. O aprendiz, possivelmente, deveria ser portador de algum distúrbio que o impedia de aprender como seus demais pares, as causas estavam depositadas principalmente nele.

Os profissionais buscavam compreender as razões do não aprender a partir de explicações sobre a natureza do desenvolvimento orgânico, sendo que, em muitos casos as dificuldades em alguns casos eram associadas à questão da maturidade psico-neurológica.

Para compreender melhor as questões das dificuldades de aprendizagem, buscavam-se respostas através dos estudos de psicologia, neurologia, psicomotricidade, porém, a ênfase estava numa prática, nas técnicas que melhor atendessem às necessidades que tinham por objetivo reeducar, isto é educar novamente através de um método mais eficaz, específico para o aprendiz que apresentasse lentidão, ou alguma inaptidão.

Para formar profissionais que atendessem as crianças com fracasso escolar, surgiram primeiramente no Brasil cursos de curta duração os quais ofereciam subsídios para entender aspectos específicos como aqueles relacionados com a psicomotricidade; linguagem e raciocínio. Esses cursos eram ministrados por profissionais brasileiros com experiência no atendimento de crianças com dificuldades escolares ou por profissionais estrangeiros especialmente convidados, freqüentemente do cone sul. Os profissionais iam construindo um currículo acadêmico a partir das oportunidades que surgiam em suas cidades e baseados também em sua formação acadêmica e em seus interesses específicos.

Os livreiros especializados que visitavam os consultórios e as instituições também contribuíram para a formação dos profissionais. Eles ofereciam materiais especializados em reeducação: livros, jogos e material pedagógico, especialmente da Argentina e da Espanha. Nessa época os profissionais buscavam as melhores técnicas para o seu trabalho. Pessoalmente tive oportunidade de conhecer a linha de trabalho do Dr. Bernardo Quirós da Argentina, primeiramente através de seus livros e posteriormente em cursos breves oferecido pela ABRAFA (Associação Brasileira de Fonoaudiologia) em 1977. Nessa ocasião esteve presente em nosso meio professor Jacobo Feldman, membro do Centro Médico dirigido pelo Dr. Quirós, para ministrar o curso "Distúrbios da Aprendizagem Escolar".

Posteriormente, foram sendo formados cursos de longa duração, de especialização, que objetivavam, além de oferecer recursos para o trabalho, buscar uma compreensão mais global do fenômeno da aprendizagem e das suas dificuldades. Em geral o público que freqüentava estes cursos já vinha com alguma experiência profissional, alguns eram pedagogos, outros psicólogos e outros fonoaudiólogos.

Na década de 1970 já havia movimento científico/acadêmico em Porto Alegre, preocupado com a formação e capacitação de profissionais que atendessem a pessoas com os chamados "distúrbios de aprendizagem" ou "inaptidão para aprender". Tratava-se do curso dirigido pelo Dr. Nilo Fichtner, médico psiquiatra, e chamava-se Psicopedagogia Terapêutica.

Os primeiros cursos formais de Psicopedagogia eram denominados de Reeducação Psicopedagógica, Psicopedagogia Terapêutica, Dificuldades Escolares, A criança-problema numa classe comum, entre outros. Esses cursos ocorreram, primeiramente, nas cidades de Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo.

Um fato histórico influiu fundamentalmente no percurso da psicopedagogia brasileira - a fundação da Associação de Psicopedagogos, que surgiu primeiramente como Associação Estadual de Psicopedagogos de São Paulo, em 1980, para posteriormente tornar-se Associação Brasileira de Psicopedagogia em 1985. Este foi sem dúvida um fato marcante, pois uma associação de Psicopedagogos, tornou-se uma associação de Psicopedagogia. Há nesta passagem uma diferença fundamental, pois se assume a área de conhecimento Psicopedagogia, a partir de um órgão de classe.

Em 1985 o tema do encontro de psicopedagogos foi: "O caráter interdisciplinar na formação e atuação do profissional". A escolha do tema sintetizava uma preocupação com a articulação entre o saber teórico e o saber prático mediado pela formação pessoal. Fazendo um olhar a posteriori percebe-se neste evento o início da construção do tripé indivisível e fundante da Psicopedagogia: conhecimento/atuação/formação. O conhecimento psicopedagógico não se sustenta sem a prática, e esta demanda uma formação pessoal específica. Esta articulação já vinha sendo gestada, mas foi na passagem de uma associação estadual de psicopedagogos para uma associação de caráter nacional de psicopedagogia, que se alastrou pelo Brasil afora um enfoque mais abrangente na formação profissional.

Não há como negar o fato de que, a partir da criação do órgão de classe, a Psicopedagogia ganhou força, corpo e penetração nos meios acadêmicos e reconhecimento público e oficial. Hoje existem várias prefeituras contratando profissionais que tenham especialização em Psicopedagogia.

Se no início do percurso profissional a ênfase estava nas técnicas, havia também preocupação com as teorias que melhor pudessem esclarecer o fenômeno das dificuldades de aprendizagem. A Psicopedagogia nasceu de uma falta; fez-se necessário oferecer melhores recursos teóricos e técnicos para capacitar profissionais que já atendiam a criança com inadaptação escolar. Se no início a capacitação ocorria fora do marco acadêmico, aos poucos foram sendo criados cursos mais densos, alguns por iniciativa particular. Aos poucos a formação começou a ser efetuada dentro dos cursos de especialização após a graduação e de mestrado dentro das universidades.

A concepção de Psicopedagogia ainda não é uniforme. Poder-se-ia dizer que ao longo da construção da disciplina é possível distinguir três orientações diferentes, as quais denotam diferentes concepções desta área de conhecimento:

1ª - Reeducação: a preocupação maior esta com as técnicas que melhor contribuem para promover a recuperação. As dificuldades são entendidas como distúrbios, inaptidão. O atendimento das dificuldades de aprendizagem, no seu inicio, estava mais vinculado a uma visão organicista. Os educadores buscam explicações preferencialmente na neurologia. Aspectos orgânicos são motivo de preocupação dos educadores e psicólogos, testes padronizados e a normatização são super valorizados.

2a - Psicopedagogia Dinâmica : Começava a haver uma interlocução com várias áreas do conhecimento e um distanciamento da reeducação, cresce a preocupação com aspectos da subjetividade. A aprendizagem do sujeito cognoscente, enquanto processo, é o tema central da preocupação nesta orientação de Psicopedagogia. Apesar desta tendência dinâmica, construída a partir das articulações com diferentes áreas do conhecimento, a questão não se resolveu totalmente. Não foi suficiente adquirir o conhecimento de outras disciplinas, é necessária uma construção específica, ou seja, uma tradução psicopedagógica. Não basta introduzir a Psicanálise, a Linguística, etc como disciplinas, para sair do enfoque tecnicista ou organicista; é preciso construir uma Psicopedagogia que não se confunda nem com a Psicanálise, nem com a Linguística ou demais áreas.

3a - Psicopedagogia Transdisciplinar: A Psicopedagogia está ao mesmo tempo entre as disciplinas e além das disciplinas. Esta orientação surge a partir do momento em que os profissionais constroem instrumentos próprios, teorias e estratégias próprias. Ela vem com a maturidade sendo fruto da experiência acumulada. Dentro desta concepção busca-se avaliar o potencial de aprendizagem e o processo em si. Existe maior equilíbrio na compreensão dos aspectos da objetividade e da subjetividade. Valoriza-se a técnica do profissional, o seu estilo próprio de trabalho e não as técnicas em si.

Apesar de podermos distinguir essas três diferentes orientações/concepções dentro de uma perspectiva histórica do desenvolvimento da Psicopedagogia, elas coexistem, pois a questão da formação profissional é complexa. Nem todos os cursos oferecidos estão preparados para atender às necessidades dos profissionais em formação. Várias são as causas determinantes, algumas delas burocráticas, como, por exemplo, a exigência nos cursos de especialização latu sensu, de docentes com formação teórica e titulação, mesmo que sem experiência clínica ou institucional para dar conteúdos psicopedsgógicos. Nem sempre está presente, nas instituições que formam psicopedagogos, a preocupação com a plena capacitação profissional, pois o estágio supervisionado nem sempre é oferecido. Felizmente, estes problemas estão sendo enfrentados, pois são os próprios alunos que buscam e pedem a qualidade dos cursos.

A preocupação com a qualidade dos cursos é muito salutar, mas não conseguirá resolver toda a questão da formação profissional. É evidente que, dentro desta área que lida especificamente com aprendizagem, não se conseguirá jamais construir um curso que corresponda plenamente a todas as necessidades. A formação continuada é uma condição sine qua non para todos aqueles que queiram exercer a função de psicopedagogos, seja na área clínica ou institucional.

Paradoxalmente pode-se dizer que a Psicopedagogia surge de uma falta, mas para garantir sua existência a falta deve continuar presente. Não há como se pensar em compreender a aprendizagem, complexa como é, através de postulados prontos. Entendo que a Psicopedagogia é a disciplina da indisciplina, da discussão, dos contrapontos, do questionamento, da incerteza.

A contribuição da Psicopedagogia, hoje, ultrapassa os limites da clínica dos problemas de aprendizagem. Ela foi criada primeiramente para dar conta das dificuldades que a escola não conseguia resolver de forma adequada. A partir do trabalho clínico, foi se construindo uma interlocução entre os terapeutas psicopedagogos e os profissionais da escola. Se no início apenas era escutado o pedido da escola em recuperar o aluno, hoje existe um movimento na direção contrária: os psicopedagogos mostram para os profissionais da escola um novo discurso, que sintetiza três postulados:

1) Dificuldades não necessariamente, são sinônimo de patologia

2) Para compreender e avaliar dificuldades, os testes padronizados não são determinantes. Através da observação criteriosa da criança em ação, de seu estilo próprio de lidar com o conhecimento e com o saber, da compreensão do contexto onde ela se insere, contexto cabe aos profissionais levantarem as possíveis hipóteses, sobre as dificuldades que se apresentam.

3) Considerar a singularidade do sujeito e a relação vincular professor/aluno; pais/filhos podem contribuir para minimizar os efeitos da inadaptação escolar.

Presenciamos atualmente uma tendência interessante na Psicopedagogia: profissionais da Escola buscando recursos na Psicopedagogia, para melhor compreender a criança com dificuldades, há neste movimento uma preocupação salutar com a prevenção. O olhar clínico no sentido de considerar aspectos da singularidade do aprendiz e ao mesmo tempo uma atitude questionadora, torna possível uma intervenção psicopedagógica institucional. Esta nova posição dos profissionais da instituição, torna a Escola um local onde se vive a experiência do acolhimento, da tolerância, do respeito pelas diferenças. Sabemos hoje, que a integridade, autonomia e criatividade de uma nação dependem, em grande parte, da educação oferecida pelos educadores às novas gerações. É o professor dentro de sala, nessa intimidade, quem "toma as rédeas", quem assume esta função. É preciso tomar consciência dessa responsabilidade e se preparar continuamente para responder a essa função desafiadora, conflituosa e quem sabe até da ordem do impossível.

Hoje, os psicopedagogos estão ampliando seu olhar e seu campo de ação. Eles estão presentes onde se faz necessário aprender a aprender, nas mais diferentes instituições seja em empresas ou hospitais. O reconhecimento tem ocorrido pela contribuição e pelos efeitos da intervenção psicopedagógica.

Embora o fato da formação psicopedagógica se encaminhar rumo a uma visão transdisciplinar, devemos valorizar, sobretudo, a sua primeira condição que é a de educador. Os postulados do Relatório para a UNESCO, concretizam aquilo que para a psicopedagogia é a questão central: a aprendizagem. Potencialmente, podemos todos aprender pois é nossa condição de humanos e, ao aprender nos humanizamos. A questão central é : o educador é um possível agente de mudanças.

No Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI, sob o título: Educação- um tesouro a descobrir, coordenado e organizado por Jacques Delors, o professor é visto como agente de mudanças e formador de caráter e do espírito das novas gerações.

Neste documento, a Educação é vista sob quatro pilares. Para que a educação cumpra seus alvos é necessário que se organize em torno de quatro aprendizagens: aprender a conhecer, isto é adquirir ferramentas básicas para aprender; aprender a fazer, isto é adquirir uma profissão, aprender a viver juntos, a participar e cooperar com os outros e finalmente aprender a ser, pela qual se desenvolve a personalidade e identidade.

Para finalizar quero novamente ressaltar o papel fundante e fundamental d ABPp neste percurso da Psicopedagogia brasileira. A idéia de criar um órgão de classe surgiu dentro de uma instituição que forma psicopedagogos: Instituto Sedes Sapientiae. Um pequeno e idealista grupo de alunos, que estava terminando sua formação, não queria interromper os estudos e resolveu criar a associação com fins científicos culturais. Estava presente também na sua fundação o desejo de ver reconhecida e regulamentada a profissão. Isto ocorreu há mais de 20 anos. A Associação não somente nasceu para congregar e criar consciência profissional, mas também para dar continuidade à formação. A Associação nasceu e continua dentro de uma perspectiva científico cultural. É difícil imaginar a Psicopedagogia brasileira hoje sem a Associação.

Quero também lembrar o apoio recebido pelos professores do Instituto Sedes Sapientie que alimentaram o entusiasmo e acolheram os alunos no seu propósito de criar a entidade. O apoio era ideológico, mas também concreto e material, pois alguns professores ofereceram seus locais de trabalho para a primeira sede da Associação. Provavelmente, na fundação da Associação, nem o pequeno grupo de alunos e nem os mestres poderiam pensar que hoje esta Associação organizaria tantos congressos e encontros e que a Associação pudesse contribuir para que outros profissionais dos diferentes estados da União se organizassem em sessões e núcleos.

A Associação vem organizando cursos, seminários, encontros, congressos, correspondendo à sua proposta inicial: dar continuidade à formação dos profissionais da área. Sua revista é reconhecida pela qualidade da sua produção científica. Pode-se dizer que a ABPp e a construção da identidade da Psicopedagogia caminham juntas. Nos nossos encontros, seja em pequena quanto em grande escala, são discutidas as questões de natureza teórica, de natureza prática e ética da Psicopedagogia.

Tenho a convicção de que o clima de tolerância, acolhimento e convivência com as diferenças, que marcou o nascimento da Associação continua presente como marca desta agremiação. A Psicopedagogia é sem dúvida uma prática que se manifesta através de diferentes estilos. A Psicopedagogia brasileira vem construindo seu próprio caminho, ele se faz presente nas teses e monografias produzida nas Universidades e nos instrumentos de trabalho concebidos por psicopedagogos. É possível hoje olhar para a Psicopedagogia no Brasil, na sua "maioridade", construída dentro e fora dos marcos acadêmicos.

Não há como negar em nossa formação, contribuição dos nossos primeiros mestres brasileiros, sensíveis ao sofrimento da criança com dificuldades em sala de aula, Geny Golubi de Morais, em São Paulo, Nilo Fichtner em Porto Alegre, que entre outros, buscavam respostas para reintegrar a criança. Vieram posteriormente os mestres latino americanos: Sara Paín, Mabel Condemarin, Ana Maria Rodrigues Muniz, Jorge Visca, Alicia Fernandez. Suas contribuições foram fundamentais e determinantes. Foi com o impulso deles que pudemos sair da abordagem reeducativa e penetrar numa abordagem relacional, dinâmica. Na concepção atual de Psicopedagogia, estão incorporadas as modalidades de aprendizagem, isto é, leva-se em consideração a relação que o sujeito da aprendizagem estabelece com a construção maior do ser humano que é poder aprender, poder transformar. Pessoalmente estou convencida de que mais do que olhar para as dificuldades de aprendizagem, é necessário considerarmos o sujeito da aprendizagem em seu estilo próprio de se relacionar com o conhecimento e com o saber, inserido num contexto cultural onde está presente a sua singularidade.

A construção da identidade da Psicopedagogia vem com o tempo, com a maturidade, com a experiência dos profissionais, com a produção acadêmica, com a discussão, com a polêmica sadia, e, principalmente, com a consciência profissional advinda de uma agremiação forte e unida.

Bibliografia

Delors, Jacques - Educação, um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, Editora Cortez, São Paulo, 1999.

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Edith Rubinstein

2 - A psicopedagogia: muito mais que uma ciência, um caminho

Daniela Mazurek Perfeito

Psicóloga, mestre em psicopedagogia.

e-mail: daniperfeito@terra.com.br

Este artigo visa levantar alguns aspectos relevantes no que tange a algumas maneiras de conceituar a psicopedagogia e seu objeto de estudo do ponto de vista de alguns autores e da minha prática profissional e acadêmica, bem como de ressaltar o foco de estudo da psicopedagogia que é a aprendizagem e a forma como é vista, conceituada e como pode ser entendida. São muitas as dúvidas que ainda aquecem e atormentam as inquietantes mentes dos pesquisadores e estudantes no que tange ao que se reporta a psicopedagogia.Da mesma forma que existem abordagens distintas na Psicologia, na Educação, na Biologia, o mesmo ocorre na psicopedagogia. Estamos nos referindo a seres humanos, com sua individualidade e suas características próprias, ou seja a sujeitos que estão inseridos em um contexto amplo, complexo e embora comum, muito peculiar. Todos somos dotados de um organismo, de cognição, de afetividade e partilhamos da esfera familiar, social e cultural, portanto, cada um traz consigo suas marcas, valores, crenças e atitudes que foram passados de geração para geração, que foram introjetados, que foram e são reproduzidos e também criados, de acordo com a capacidade de autoria de cada um, de acordo com a forma com a qual cada sujeito representa simbolicamente aquilo que abstrai do mundo externo e elabora ou não em seu mundo interno.

Talvez seja incorreto pensar em uma explicação, uma definição única para a psicopedagogia, um único olhar, uma vez que todos somos autores e reprodutores de pensamento, mas de uma coisa, estamos todos falando – da aprendizagem, que é o objeto de estudo da psicopedagogia. E embora existam várias definições, algumas são passíveis de um “cruzamento” e podem delimitar a psicopedagogia como uma ciência “humana”, mas humana em sua expressão e prática, afinal ela retrata o sujeito como um ser que interage consigo mesmo e com o meio e que está em constante aprendizagem.

São muitos os olhares voltados para a psicopedagogia, no entanto alguns autores embora definam algumas características distintas, depositam um olhar semelhante, onde o que parece ser mais evidente é entender e “olhar” o sujeito em sua totalidade, mas como um sujeito que é peculiar e singular e que portanto necessita do contato com o diferente para poder socializar-se e aprender.

Para Visca (1987) a psicopedagogia possui como objeto de estudo o processo de aprendizagem com seus recursos diagnósticos, corretores e preventivos próprios, no qual as disposições afetivas e intelectuais que interferem na forma de relação do sujeito com o meio influenciam e são influenciadas pelas condições sócio-culturais do sujeito e do seu meio.

Para Kiguel (1991, p.24) o objeto central de estudo da psicopedagogia está se estruturando em torno do processo de aprendizagem humana, seus padrões evolutivos normais e patológicos, bem como a influência do meio como a família, a escola e a sociedade no seu desenvolvimento. Para Neves (1991, p.12) a psicopedagogia estuda o ato de aprender e ensinar, levando em conta as realidade interna e externa da aprendizagem, tomados em conjunto, procurando estudar a constituição do conhecimento em toda a sua complexidade, procurando equivaler os aspectos cognitivos, afetivos e sociais.

Do ponto de vista de Weiss (1991, p.6) a psicopedagogia busca a melhoria das relações com a aprendizagem, assim como a melhor qualidade na construção da própria aprendizagem.

O ser humano, segundo Pain, tem uma tendência natural para aprender e se não aprende é porque há algo errado, embora o ser humano seja capaz de superar-se nas próprias dificuldades. Não podemos deixar de considerar que às vezes o não aprender é que vai fazer com que o sujeito receba aquilo que necessita, inconscientemente, por ação dos mecanismos de defesa (Freud).

De acordo com Fernandez (1991) todo sujeito tem a sua modalidade de aprendizagem, ou seja, meios, condições e limites para conhecer, necessitando incorporar conhecimentos sobre o organismo, o corpo, a inteligência e o desejo, estando esses quatro níveis basicamente implicados no aprender.

Segundo Fernandez (2001) é preciso ver o sujeito inserido em um espaço objetivo e subjetivo de construção de autorias de pensamento e olhar ensinantes e aprendentes com suas capacidades conscientes, sua afetividade, seu imaginário e sua sexualidade.

De acordo com Pain (1987, p.15) “nesse lugar do processo de aprendizagem coincidem um momento histórico, um organismo, uma etapa genética da inteligência e um sujeito associado a tantas outras estruturas teóricas, de cuja engrenagem se ocupa e se preocupa a epistemologia, nos referimos principalmente ao material histórico, à teoria piagetiana da inteligência e à teoria psicanalítica de Freud, enquanto instauram a ideologia, a operatividade e o inconsciente.”

Assim como elucida Bossa (1987), os autores brasileiros Neves, Kiguel, Scoz, Golbert, Barone, Weiss, Rubstein e outros, assim como os argentinos Fernandez, Pain, Visca, Muller, são unânimes quanto à necessidade de conhecimentos de diversas áreas que, articulados, fundamentam a constituição de uma teoria psicopedagógica capaz de fornecer meios para refletir cientificamente e atuar no campo da psicopedagogia.

No que tange a refletir cientificamente, há a possibilidade dessa reflexão se transformar em aprendizagem, assim como frisa Fernandez (1998, p.15)

“A única forma para que o estudo da psicopedagogia possa transformar em aprendizagem é abrindo espaços de autoria do pensamento para nós mesmos, enquanto tentamos abri-lo para os outros”

A mesma autora (1998, p.15) coloca que:

“Nossa disciplina é indisciplinada, como o são o desejo e o saber. Indisciplinada porque conhece a falta, os limites. No reconhecimento da carência está a potencia...

A psicopedagogia vai constantemente discutir seus fundamentos e construir suas ferramentas.”

Dessa forma, a psicopedagogia abre espaço para novas buscas do conhecimento no processo da aprendizagem.

Andrade (2003, p.89) quando escreve sobre psicopedagogia, diz “Ela vai tratar exatamente da possibilidade do sujeito aprender que ele é incompleto. O sujeito aprendente vai aprender do ensinante a lidar com suas próprias castrações, com a sua incompletude.”

Para Fernandez, todo ato de inteligência por mais sutil e rudimentar que seja, também é uma interpretação da realidade externa.

Ao falar em interpretação, fala-se em recursos que o ser humano provém intelectual e subjetivamente, e em realidade externa, em aspectos culturais e sociais. Novamente reporta-se ao ser humano, ao sujeito em sua totalidade, na condição de aprendente como define a psicopedagogia.

Da mesma forma, segundo Pain, a realidade é percebida pelo aprendente como uma projeção do seu mundo interior que por sua vez, se constitui à partir da introjeção do mundo exterior significado pelo outro.

Fernandez afirma que a aprendizagem é uma construção individual interna, produto da própria natureza, da herança genética e biológica mais o conhecimento do meio ambiente que o rodeia. Entretanto, por ser específica de cada um, realiza-se através do corpo num processo histórico, pessoal e social. O desenvolvimento cognitivo e afetivo são as duas faces do desenvolvimento intelectual. Toda conduta será implicada por esses dois aspectos sobre uma base de motivações inconscientes.

Partindo dessas definições, entre tantas outras que se configuram na prática psicopedagógica, ao psicopedagogo cabe saber e investigar como se constitui o sujeito, como esse sujeito se relaciona como o meio, como se transforma em suas diversas etapas da vida, quais os recursos de conhecimento de que ele dispõe e a forma pela qual produz conhecimento e aprende.

A psicopedagogia então, parece caber “olhar” o sujeito em sua totalidade, alguém dotado de uma dimensão orgânica, afetiva, cognitiva e cultural e que atuam concomitantemente e em equilíbrio, possibilitam a construção de conhecimento. Para que haja equilíbrio, não é necessariamente preciso que todas essas funções encontrem-se totalmente preservadas, mas que no caso disso não ocorrer, haja a compensação através de uma “negociação” entre elas.

A psicopedagogia é uma ciência que abre espaço para descobertas, investigações, que cria condições e viabiliza espaços para a troca e conseqüente expansão do conhecimento, que permite o intercambio cultural das ciências que se reportam ao entendimento do sujeito, que permite ao ser humano ser autor de seu pensamento, e que permite, portanto, a viagem e a interação entre o velho e o novo, entre o tradicional e o moderno, entre o ideal e o real, entre o masculino e o feminino, entre o subjetivo e o objetivo. É portanto uma ciência capaz de unir, integrar, viabilizar, promover, pois é a ciência que se reporta ao ser aprendente, ao que dá ao ser humano a condição de constituir-se na aprendizagem e esse processo se dá desde o seu nascimento e perpetua até sua morte.

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_________ A educação para o 3o. milênio. Psicopedagogia on-line. Edição Eletronica, 2000

Publicado em 17/01/2005

3 - APRENDIZAGEM E PSICOPEDAGOGIA – UM ENCONTRO LÚDICO

Daniela Mendes Piloni - Psicóloga e Psicopedagoga.

Tendo como princípio a atuação ímpar do professor na formação do cidadão freqüentador de uma unidade de aprendizagem: a escola, a questão da aprendizagem pode passar pela questão de entender a relação professor-aluno e a representação que o primeiro tem em relação ao segundo.

Este estudo procura contribuir com reflexões para que seja possível uma revisão e reciclagem de práticas e metodologias que indique um caminho inverso ao universo da mídia: a afetividade e a atuação de um jovem criativo, executor de obras sociais. O intuito principal é auxiliar este jovem a canalizar energias para sua autonomia e construção de uma identidade cidadã saudável.

Tomando como base que a Psicopedagogia tem como objeto de estudo o APRENDER, preocupando-se no seu surgimento com as questões relacionadas aos déficits de aprendizagem, torna-se um suporte rico de contribuição neste trabalho. A preocupação principal da Psicopedagogia é o aprendizado do ser humano, integrando o cognitivo e o afetivo para realizar o processo como um todo.

Para fazermos uma junção do nome propriamente dito, teremos: “Pedagogia” que se preocupa mais com o conhecimento cognitivo e intelectual; e a “Psicologia” que está voltada para a busca do bem estar do indivíduo. Então temos a PSICODEDAGOGIA que relaciona a capacidade do aluno de se sentir competente no seu aprendizado, relacionando-o com prazer.

A Psicopedagogia dos conteúdos na sala de aula revoluciona a inter-relação professor-aluno. Se de um lado o aluno é visto de um modo integrativo e participa da construção do conhecimento, de outro é indispensável uma transformação na postura do professor. É importante que o educador tenha os cuidados necessários para permitir que a autonomia do educando avance sem que ele, educador, se sinta ameaçado e não exija mais que o aluno pode dar. Ao facilitar e organizar o processo produtivo de aprendizagem o educador deve assegurar a todos a prática e vivência, a possibilidade de observar e construir o conhecimento.

O trabalho psicopedagógico atua não só no interior do aluno ao sensibilizar para construção do conhecimento, levando em consideração os desejos do aluno, mas requer também uma transformação interna do professor. Para que o professor se torne um elemento facilitador que leve o educando ao desenvolvimento da autopercepção, percepção do mundo e do outro, integrando as três dimensões, deve estar aberto e atento para lidar com questões referentes ao respeito mútuo, relações de poder, limites e autoridade. Quando se fala da profissão professor, não se pode deixar de enfatizar a “Influência do Professor e do ambiente escolar” na vivência dos alunos.

A seriedade profissional do professor se manifesta quando compreende o seu papel de instrumentalizar dos alunos para a conquista dos conhecimentos e sua aplicação na vida prática; incute-lhes a importância do estudo na superação das suas condições de vida; mostra-lhes a importância do conhecimento das lutas dos trabalhadores, orienta-os positivamente para as tarefas da vida adulta. Tais propósitos devem ser concretizados na prática, através de aulas planejadas nas quais se evidenciem a segurança nos conteúdos e nos métodos de ensino; a constância e firmeza no cumprimento das exigências escolares pelos alunos; o respeito no relacionamento com os alunos.

Temos o paradigma de que o professor ao mesmo tempo em que não deve contemporizar com a negligência e com o descumprimento dos deveres, deve estar atento para o bem relacionamento humano com os alunos. O respeito se manifesta, pois, no senso de justiça, no verdadeiro interesse pelo crescimento do aluno, no uso de uma linguagem compreensível, no apoio às suas dificuldades, nas atitudes firmes e serenas.

O ambiente escolar pode exercer, também um efeito estimulador para o estudo ativo dos alunos. Os professores precisam procurar unir-se a direção da escola e aos pais para tornar a escola um lugar agradável e acolhedor.

Uma das poucas alegrias da vida numa época de ansiedade é o fato de sermos forçados a tomar consciência de nós mesmos. Quando a sociedade contemporânea, nesta fase de reversão de padrões e valores, não consegue dar-nos uma nítida visão “do que somos e do que devemos ser”, vemo-nos lançados à busca de nós mesmos. A dolorosa insegurança que nos rodeia torna-se um incentivo a indagar: será que nos passou despercebido algum manancial de força e orientação?

De modo geral prefere-se indagar: como é possível alcançar a integração interior numa sociedade tão desintegrada? Ou então: como empreender a longa evolução para a auto-realização numa época em que quase nada é certo, nem no presente, nem no futuro?

Gente muito preocupada tem ponderado tais questões. O psicoterapeuta não possui respostas mágicas. A nova luz que a psicologia profunda lança sobre os motivos ocultos dos nossos pensamentos, sentimentos e ações será de grande ajuda, sem dúvida alguma, na busca do próprio eu. Mas existe algo além dos conhecimentos técnicos e compreensão pessoal que anima o sujeito a aventurar-se até onde os anjos temem pisar e apresentar suas idéias e experiências sobre as difíceis questões da vida.

Observando a história da humanidade, podemos perceber que hoje, mais do que nunca, o processo de desenvolvimento está centrado na aquisição do conhecimento e marcado por grandes transformações. Atualmente a humanidade vivencia grandes avanços tecnológicos que possibilitam a ocorrência acelerada de novas pesquisas e descobertas. Para acompanhar esse processo de mudanças a aquisição do conhecimento torna-se imprescindível.

Além disso, vivemos a era da integração em todos os setores do planeta, que se expressa de maneira mais ampla, pelo fenômeno da globalização. Percebemos que em todos os níveis e nas diferentes áreas de atuação existe um grande anseio, uma busca constante pela integração. Esse movimento é pouco explicitado, mas percebe-se que está presente em estado latente na maioria de nós.

A descoberta de nosso potencial permite não só o reconhecimento de nossa capacidade de autoria, mas também cria condições para a abertura de espaços onde outros se reconheçam autores.

Para isso não há mágica. Com certeza a origem dessas mudanças passa pela educação. Recentemente, várias mudanças curriculares têm sido realizadas propondo educar o indivíduo para torná-lo cidadão. Tais medidas significam um avanço. Entretanto, essas medidas só serão bem sucedidas se forem acompanhadas de um trabalho com os indivíduos aprendentes que habitam em cada ensinante. Ou seja, com os educadores responsáveis pelas linhas de frente da educação.

Neste sentido a escola deve ser um espaço de promoção da articulação da realidade interna e externa do aprendiz, tornando a educação e a formação como um trabalho de duas questões indissociáveis. Uma das tarefas da escola é desenvolver a habilidade de negociação e a convivência pacífica, como algo imprescindível em um mundo globalizado. A escola deve trabalhar o autoconhecimento como possibilidade de abertura para o desenvolvimento da autonomia e da capacidade de julgamento.

A tônica desses princípios é o compromisso com a cidadania exigindo, para isso, educadores críticos da realidade e uma escola que não seja apenas reprodutora das relações de trabalho, mas que possibilite o desenvolvimento do autoconhecimento dos educadores, a fim de que construam relações de autonomia. Esses princípios enfatizam em igual medida as áreas convencionais no que se refere ao domínio das disciplinas; a dimensão social, no que se refere aos valores e atitudes; a dimensão pessoal, no que se refere aos afetos, sentimentos e preferências dos indivíduos.

A concretização desses princípios exige um investimento de possibilidades de aprender a aprender de alunos e educadores. Para isso, a escola necessita de um espaço onde os educadores possam recriar a si mesmos como aprendentes, sentindo-se autores de seus próprios pensamentos e, conseqüentemente, capazes de ensinar e aprender.

Esses fatos, aliados ao contexto global explicam a importância crescente da psicopedagogia, que na sua concepção atual, já nasce com uma perspectiva globalizadora condizente com os rumos da aprendizagem na atualidade. Ela ocupa um lugar privilegiado porque justamente não está em um único lugar, sua força está justamente localizada no poder transitar pelas fendas, pelos espaços entre objetividade/subjetividade – ensinante/aprendente.

De acordo com CIAMPA (1998), num primeiro momento somos levados a ver a identidade como um traço estatístico que define o ser. Como algo que aparece isoladamente, imutável, estático.

A partir dessas considerações, penso que a Construção da Identidade é uma Questão de Aprendizagem. Precisamos sempre nos perguntar quem queremos ser a partir da possibilidade de aprender. Quando perguntamos quem queremos ser, essa pergunta sem uma resposta prévia, pode nos assustar. Entretanto, como futuros profissionais psicopedagogos, não podemos nos esquecer que a força da Psicopedagogia é justamente poder perguntar sobre seu próprio objeto, porque a Psicopedagogia trata do aprender e aprender implica perguntar e perguntar-se.

Parece então necessário e saudável que a Psicopedagogia como outra área de conhecimento ligada com a subjetividade do “Ser – Humano” esteja sempre aberta para perguntar sobre sua identidade, considerando os conhecimentos adquiridos, o presente e o futuro, enfim, o desejo de se transformar, de continuar crescendo.

BIBLIOGRAFIA:

CIAMPA, Antônio da Costa. A estória do Severino e a história da Severina- um ensaio de psicologia social. São Paulo. Brasiliense.1996.

CODO, Wanderley. LANE, Silvia T. M. Psicologia Social- O homem em Movimento. São Paulo. Brasiliense. 1a ed. 1984.

COSTA, Wilse Arena da. A construção social do Conceito do Bom Professor. Cuiabá: UFMT, 1998. (Tese de Mestrado)

FAGALI, Eloísa Quadros. VALE, Zélia Del Rio do. Psicopedagogia Institucional Aplicada: a aprendizagem escolar dinâmica e construção na sala de aula. Petrópolis – RJ. Editora Vozes, 1998.

FERNÁNDEZ, Alicia. A mulher escondida na professora: Uma leitura psicopedagógica do ser mulher, da corporalidade e da aprendizagem. Porto Alegre, Artes Médicas,1994.

FERREIRA, Weil Berta. O cotidiano do Adolescente. Petrópolis: Vozes, 1995.

LANE. Silvia T. Maurer. O que é Psicologia Social. Coleção primeiros passos. São Paulo. Nova Cultural - Brasiliense. 1985.

LODI, João Bosco. A Entrevista Teoria e Pratica. 7a ed. São Paulo. Pioneira. 1991.

RAPPAPORT, Clara Regina, FIORI, Wagner Rocha, DAVIS, Cláudia. Psicologia do Desenvolvimento: A idade escolar e a adolenscência. Vol. 4. São Paulo: E.P.U.,1981-1982.

SÁ, C. P. A construção do objeto de pesquisa. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1998.

SPINK, M. J. (Org.) O conhecimento no cotidiano: as representações sociais na perspectiva da Psicologia Social. São Paulo, Brasiliense, 1995.

TAILLE, Yves de La. OLIVEIRA, Marta Kohl de. DANTAS, Heloysa. Piaget, Vygotsky, Wallon: Teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo. Summus. 1992.

WILSE, Arena da Costa. A construção social do conceito do Bom Professor. Cuiabá: UFMT, 1998. (Tese de Mestrado)

Publicado em 11/12/2003 12:14:00

www.psicopedagogia.com.br ou Psicopedagogia On line.

3 - A REG4 - REGULAMENTAÇÃO DO PSICOPEDAGOGO

Nívea Maria C. de Fabrício

Presidente da ABPp fala sobre a regulamentação da profissão

Como está a regulamentação da profissão de psicopedagogo?

Está em Brasília obedecendo aos trâmites legais, sob o comando do Deputado Barbosa neto e, está na comicidade em fóruns, encontros, simpósios, ou seja, em todas as situações e momentos em que possamos refletir e trocar, sobre o papel e campo de atuação do Psicopedagogo; da Psicopedagogia. Nosso processo de regulamentação passa pela legalização e legitimação. A sociedade legitima e a lei legaliza. Na minha concepção , a Psicopedagogia é a profissão do terceiro milênio, pelo menos no próximo século, portanto, sua legitimação é mais decorrente. Já, a legalização, pelo aspecto burocrático, e pela dinâmica democrática que deve incorporar, o ritmo é diferenciado, talvez mais lento, principalmente porque estamos reivindicando alto novo no Brasil. Nosso projeto de regulamentação será de especialidade e não de graduação. Isso é inédito! O Conselho Nacional vem discutindo o assunto desde 92. O projeto já foi aprovado na comissão do trabalho. Já houve audiência pública da comissão de educação; estamos aguardando o julgamento. A seguir vem a comissão de justiça. O que eu estou sentindo de importante, é que temos o Brasil inteiro se mobilizando e, nossa função, é mostrar à comissão da Educação nossa importância e a necessidade da regulamentação.

Por que vem crescendo a necessidade do psicopedagogo nas instituições e na clínica?

Porque o Psicopedagogo trabalha essencialmente com o fenômeno aprendizagem. Aprendizagem em seu processo maior, num processo educativo na vida, na sociedade, nas relações.

A educação está fragmentada, mas exigindo capacidades integradoras. Aprender a aprender está muito difícil. A aprendizagem está muito difícil. Em uma palestra, em Goiás, Marina Colassante, disse: "O jovem, a criança, precisam desenvolver algumas imagens, fantasias que a vida de hoje não está permitindo". Temos uma realidade no Brasil que vai do menino da "idade da pedra" (o índio e as crianças sem acesso à tecnologia), ou você tem aquele menino que está na Internet 24 h ao dia. Tanto um quanto outro, tomando os dois extremos, precisam da construção de um EU e de uma aprendizagem saudável. Penso que o espaço do psicopedagogo é muito grande, e quando analisamos a possibilidade da regulamentação, é muito em função dessa necessidade de se colocar na melhoria da qualidade de vida do ser humano e do planeta. Um outro fator é o preconceito que existe contra a psicologia ( sou psicóloga e sei disso), o psicopedagogo é mais fácil de ser aceito em alguns lugares, em algumas famílias.

Daí a importância do reconhecimento do psicopedagogo?

Acho que mais importante que a regulamentação, é o psicopedagogo se movimentar para ser reconhecido pela competência. Como acontece com a psicanálise que não é uma profissão legalizada mas é "reconhecida" socialmente. Eu vejo a psicopedagogia necessitando disso, só assim irá se manter num patamar, num status especial. Veja bem, anos atrás houve a profissão de Orientador Educacional, que não existe mais e por quê? Talvez por dificuldades em se apropriar do lugar. O psicopedagogo precisa se apropriar do seu lugar. Esse para mim é o verdadeiro reconhecimento. O reconhecimento oficial é importante mas mais importante que tudo é provarmos a competência do psicopedagogo, sua relevância social, especialmente neste momento histórico que vivemos: mudanças de valores, de paradigmas numa velocidade rápida.

Se o importante é a competência, qual a diferença na questão da regulamentação como especialização e não como graduação?

Porque é necessário que o profissional possua uma formação acadêmica mais sólida e aprofundada para formar-se psicopedagogo assim ele enriquece sua graduação anterior, em qualquer curso de áreas afins por exemplo fonoaudiologia, pedagogia, psicologia. O curso precisa ter um estágio supervisionado, deve ter algumas garantias de qualidade. O reconhecimento garantiria, abrir o espaço de uma forma mais concreta na Rede Pública, em todas as Instituições Públicas do país, garantindo uma ação mais social e democrática.

Qual a diferença da psicopedagogia no Brasil e na Argentina, onde é regulamentada e se estende às áreas hospitalar, empresarial, etc ?

A cultura da psicopedagogia no Brasil está engatinhando quando comparada à Argentina. Acho que as diferenças passam fundamentalmente pela realidade cultural de cada país. A Argentina tem uma história cultural diferente do Brasil. Fiquei uma semana em Los Ninõs, com Ana Maria Muñiz que desenvolve um trabalho comprometido com a seriedade. No Brasil nosso processo histórico foi e é outro, seguimos outro caminho. Os profissionais argentinos, por sua própria história na psicopedagogia, são mais amadurecidos, nós temos profissionais pensando o novo, voltados para as peculiaridades da nossa realidade.

Em que setores estará o psicopedagogo?

Em primeira instância no setor da Educação, em seguida nos hospitais, estatais e empresas. Ele está onde há relações sociais e, portanto, aprendizagem. Está nas instituições , está no aprender humano. Aliás, o psicopedagogo está chegando nas empresas de uma forma muito linda. Se você parar para pensar o movimento que acontece hoje, e está voltado à relação empresa-empregado que vai deixando de ser matriarca protetora. Por tudo que se lê, há a possibilidade a médio prazo da CLT ser modificada no Brasil nessa questão de ser a lei tão paternalista. Nesse momento sobreviverá o profissional mais formado, o mais estruturado, mais competente. Aí, o espaço do psicopedagogo vai se abrir como um botão em rosa. Há algumas experiências, poucas é verdade, mas é um espaço que o psicopedagogo vai saber ocupar nas empresas, sejam estatais ou privadas, atuando nesse novo momento de se aprender a ser empresa e empregado.

E nas escolas, como está o trabalho do psicopedagogo institucional?

Nas escolas particulares o psicopedagogo é uma realidade. Boa parte das boas escolas têm esse profissional nos seus quadros. Se não existe como uma vaga estabelecida em organograma o Orientador ou Coordenador são psicopedagogos e atuam como tal, com olhar e postura de escuta, mediando as aprendizagens em todos os níveis.

E na saúde?

Na saúde também já existem boas experiências. O Hospital das Clínicas está com um setor de psicopedagogia muito bom. Está fazendo um trabalho ligado ao Francisco Assunção, da Psiquiatria Infantil. A Escola Paulista de Medicina também tem gente trabalhando na Santa Casa e em outros Hospitais do Brasil com equipes multidisciplinares.

Você já sabe da existência de psicopedagogos empresariais?

Sim. Sei de colegas que atuam com procedimentos e postura psicopedagógicos junto à área de Recursos Humanos para melhorar a qualidade do aprendizado das pessoas, dos funcionários. Nesse trabalho a atuação está direcionada para o desenvolvimento individual e coletivo do corpo de funcionários. Um funcionário, com suas potencialidades reconhecidas e promovidas, se situa melhor como cidadão de direitos e deveres, portanto mais produtivo para si, para a empresa, para a sociedade e para o planeta. O psicopedagogo, a partir de sua experiência na escola, quer privada ou estatal, observou a necessidade da valorização e desenvolvimento do ser humano, da consideração do custo-benefício como possibilidade e garantia da continuidade de um trabalho. Essa visão era o que as empresas – não escolas, necessitavam. Dá para entender como foi a solicitação de Psicopedagogos nas empresas, não dá?

Em sua opinião, a família e a escola estão confundindo seus papéis? Assistimos a um empurra-empurra de responsabilidades e a criança muitas vezes acaba em um psicólogo ou psicopedagogo sem a efetiva necessidade?

Isso é muito delicado. Na realidade é a família que está perdida, não sabendo lidar com situações novas. Acho que a escola passa a ter uma função mais abrangente, por isso defendo o psicopedagogo institucional. Se você cuidar da psicopedagogia institucional, provavelmente vai ocupar um vazio importante na vida das crianças. Recortemos um exemplo, como o caso de uma criança, que vai a um neuropsiquiatra e vende uma imagem absolutamente oposta à realidade. O neuropsiquiatra pode comprar essa imagem. Isto é um recorte! Já o psicopedagogo que está na clínica, tem que atuar integrando-se com a família e escola, sem competição, mas em parceria para poder trabalhar. Não estamos, aqui, generalizando a atuação de todos profissionas, mas destacando que, pela sua peculiaridade, o trabalho de especialistas pode ser recortado. Já o de Psicopedagogo não o pode, sob pena de não atuar como Psicopedagogo também, é bom afirmar que não estou dizendo que o Psicopedagogo substitui o possível "vazio" que pode haver na relação família-filhos, mas que ele tem a obrigação de atuar nesse espaço, favorecendo a ambos o entendimento do processo que vivem e que, naquele momento, estão podendo desenvolver.

A interface entre a psicopedagogia e a orientação educacional é muito grande, no projeto de regulamentação está previsto algum tipo de aproveitamento, ou integração de atividades?

Sim, porque nosso objeto de trabalho é a aprendizagem e o aprender a aprender eterno, independentemente do contexto histórico e, portanto, metodológico determinante na época.

O que a ABPp está fazendo efetivamente para a regulamentação acontecer?

Há uma comissão organizada com membros da associação, da nacional e das sessões trabalhando nisso. Efetivamente há mais membros de Goiânia e Brasília, pela própria proximidade com Brasília. Todo Projeto de Lei precisa de um deputado. No nosso caso é o deputado Barbosa Neto quem está guiando o projeto. Já houve audiência pública e a síntese do projeto já consta neste site, o Psicopedagogia On Line ( http://www.psicopedagogia.com.br ) e no site da ABPp ( http://www.abpp.com.br ).

Como está a fiscalização de cursos de psicopedagogia, de profissionais?

Como a profissão não é regulamentada a Associação não pode fiscalizar, o que fazemos é organizar os cursos e profissionais através do cadastramento. Um dos objetivos no Congresso de 2000 é um pré-Congresso para os organizadores dos cursos, com a intenção de garantir a boa qualidade de um estágio supervisionado.A ABPp é uma instância catalisadora dos anseios nacionais e, como tal, estará ao lado da categoria, zelando e defendendo a qualidade do seu trabalho.

Uma vez que o curso não está regulamentado, como ficam os profissionais que se intitulam psicopedagogos?

Na verdade a questão é outra. A questão é onde este profissional fez a sua formação? Pois é isso que vai pesar, na minha opinião, sem dúvida sobreviverá no mercado, como em qualquer outra profissão, o profissional mais competente, isso é inegável. A psicopedagogia é uma profissão onde o indivíduo precisa estar muito bem estruturado enquanto EU, caso contrário não terá condições de Ter o necessário olhar abrangente. Então ele tem de cuidar de sua formação, tem de fazer supervisão, não adianta escapar da supervisão,.Assim, a formação de base é que deve ser perguntada detalhadamente, o psicopedagogo tem de cuidar da sua formação. Ele deve cuidar de sua formação completa enquanto profissional ou pessoa, independentemente desta ou daquela linha de atuação.

De uma forma geral, como está o sistema escolar?

Muito aquém do necessário. Neste final da década de 90 ainda encontramos formatos semelhantes aos de algumas décadas atrás. Não está formatado para a criança atual. Se tivéssemos nas escolas psicopedagogos trabalhando essas estruturas, talvez não tivéssemos o número imenso de crianças chegando aos consultórios com problemas de aprendizagem. À medida que as escolas não estão sendo estruturadas para corresponder às necessidades das crianças mais sensíveis, é mais fácil encaminhar. Não é um simples delegar. Na realidade essas escolas não têm condição de atendê-las não estão estruturadas para esse lugar. Permanecem com um formato e o modelo escolar no mundo, obviamente, tem diferenças de lugar para lugar, de década para década. A grande maioria das escolas renovadas na década de 70, não conseguiu sustentar as mudanças. De uma certa maneira tentaram renovar o modelo, mas não modificaram o estrutural. Houve escolas que se perderam na orientação porque esqueceram que a criança precisa ser organizada, precisa ser cuidada dentro daquilo que tem. Vieram com idéias muito boas, com conceitos acadêmicos de primeira grandeza, mas deixaram de adequar a instituição. Podemos dizer que deixaram de se fundamentar , de se atualizar, de viver constextualizandas com o momento histórico que vivemos. Se o olhar psicopedagógico existisse nas escolas, a clínica seria reduzida. A falta de uma estrutura psicopedagógica gera muito problema escolar. Uma escola bem estruturada pode resolver muitos problemas. Ao analisarmos dois níveis de psicopedagogos, o clínico e escolar, deveria ir para o clínico aquela criança que efetivamente apresenta um problema clínico. Mas, as escolas confundem muito, mandando para os clínicos crianças que uma boa estrutura escolar resolveria. A atuação do psicopedagogo amenizaria.

Quais seriam os problemas clínicos, ou indicação para uma escola especial?

Essa é uma pergunta muito ampla. Um caso clínico seria daquela criança que tem alguma etiologia neurológica, alguma questão fisiológica, ou que, ao longo de sua história, adquiriu algum problema que dificulta sua relação dela com a aprendizagem, machucada pelo sistema. Um caso de cuidado especial seria o daquela criança mais desatenciosa. A criança mais inteligente que é tachada como problema.

Os psicopedagogos estão também nas escolas especiais?

Uma escola especial, tem de estar na mão de um psicopedagogo.

Presidente, para finalizar, como será o Congresso de Psicopedagogia de 2000?

Estamos preparando um Congresso comprometido com as demandas e anseios da contemporaneidade, que possa fortalecer a psicopedagogia no Brasil como um todo, que seja multiplicador, fortalecedor. O psicopedagogo também precisa saber o seu lugar. A escola não é lugar para se fazer clínica, na escola se faz Psicopedagogia Institucional. Infelizmente, vemos alguns profissionais fazendo clínica dentro da escola, isso não dá certo porque não é ali esse espaço.

5 - ALGUMAS PERGUNTAS SOBRE PSICOPEDAGOGIA

Gostaria que fosse explicitada a diferença entre a psicologia escolar e a psicopedagogia

Podemos diferenciar a Psicopedagogia da Psicologia Escolar de três formas:

1. diferença quanto à origem histórica:

A Psicologia Escolar surgiu para explicar o fracasso escolar, enquanto a

Psicopedagogia surgiu como um trabalho clínico dedicado ao trabalho com aqueles que apresentavam dificuldades na aprendizagem por problemas específicos.

2. diferença quanto à formação:

A Psicologia Escolar é uma especialização do curso de graduação em Psicologia, enquanto o curso de Psicopedagogia é um curso de especialização, que recebe graduados em diversos cursos.

3. diferença em relação ao campo de atuação:

Talvez esta seja a diferença mais significativa. O trabalho da Psicologia Escolar se realiza nos limites da Psicologia, enquanto o trabalho Psicopedagógico se realiza na interface da Psicologia e da Pedagogia ou, mais recentemente, na interface da Psicanálise e da Pedagogia. Neste último caso, busca entender e intervir no processo de ensino e aprendizagem, levando em conta o inconsciente e a relação transferencial.

Qual o trabalho que a psicopedagogia poderia oferecer no trabalho de coordenação da Educação Infantil - creches e escolas?

A contribuição da Psicopedagogia na Educação Infantil

Embora a Psicopedagogia esteja voltada para o processo de aprendizagem formal e seus problemas, pode contribuir com o trabalho realizado na Educação Infantil,

sobretudo na prevenção de futuros problemas de aprendizagem.

Nesse sentido, pode oferecer parâmetros do desenvolvimento infantil e do processo de organização psíquica. Estes parâmetros podem apontar direções para o planejamento de atividades a serem realizadas com as crianças, assim como sinalizar eventuais dificuldades que as crianças dessa faixa etária podem apresentar.

Adiantando alguma coisa sobre isso pode-se dizer que a brincadeira é a atividade privilegiada da infância. Isso lhe ajuda tanto na sua constituição psíquica como no seu processo de desenvolvimento, de aprendizagem e de sociabilização. Os educadores que se dedicam aos pré-escolares devem ter isso em mente e privilegiar também essa atividade na proposta de tarefas.

Se houver interesse de sua parte no curso de Psicopedagogia, acho que é importante buscar um que contenha uma disciplina dedicada aos jogos e brincadeiras.

Gostaria de informações sobre a parceria da psicopedagogia com a filosofia como possibilidade de prevenção as questões de aprendizagem.

Quando trabalhamos na área de humanas, temos que reconhecer que esta área é de extrema amplidão e complexidade. A Filosofia está e sempre esteve por trás do trabalho psicopedagógico, pois não há como trabalhar o sujeito sem refletirmos sobre a condição humana, seja em seu âmbito particular, seja em seu âmbito genérico.

Assim, ao trabalharmos na área clínica, sempre teremos que pensar sobre quem é aquele sujeito que atendemos, quais são seus valores, quais são suas regras morais e éticas, quais são suas aspirações, para que assim possamos tentar compreendê-lo e, com isto, compreender seu modo de funcionamento e de absorção da realidade, da vida à sua volta.

De certo modo, a resposta à sua pergunta é, por um lado, absolutamente subjetiva, uma vez que remeterá às suas condições pessoais de reflexão filosófica. Por outro lado, a filosofia é um campo de conhecimento que pode ser aplicado à psicopedagogia, desde que se trabalhe especificamente com ele. A associação da psicopedagogia com a filosofia enquanto forma de lidar com aspectos preventivos das dificuldades de aprendizagem é muito relativa; como já disse acima, estão absolutamente entrelaçadas por princípio. O seu uso irá depender do Psicopedagogo que manusear este tipo de relação, dando maior ou menor ênfase aos conceitos que deseje anunciar, analisar, usar como estímulo à reflexão.

Nada impede que você, dentro de seu campo de trabalho, pesquise um determinado autor/filósofo ou uma determinada linha de pensamento e associe tais pensamentos, conceitos e reflexões à sua prática psicopedagógica.

Dentro de um espectro mais amplo, sabemos que a filosofia permaneceu, durante muito tempo, como parte do curriculum escolar nacional e depois foi extinta. Dentro de minha visão, creio que a ausência da filosofia dentro dos currículos nacionais causou grandes danos, pois extinguiu-se uma referência de conduta e de estímulo à reflexão.

Qual a distinção entre Psicopedagogia, Psicologia Educacional e Orientação Educacional

Esta distinção poderá ser feita a partir das informações contidas nos códigos de ética dessas ocupações. As funções de Psicólogo Escolar e Orientador Educacional já possuem uma tradição na estrutura institucional. A função do Psicopedagogo Institucional é mais recente em nosso meio e sua importância tem sido reconhecida a ponto de que, hoje há concursos públicos para esta função em Escolas Públicas.

A Psicopedagogia na sua origem no Brasil, esteve voltada para atender crianças com dificuldades de aprendizagem dentro de um contexto clínico. Atualmente a Psicopedagogia também vem contribuindo na área da prevenção das dificuldades de aprendizagem, bem como desenvolvendo programas que visam promover a integração dos alunos com dificuldades de aprendizagem. O Psicopedagogo institucional atende professores e os alunos dentro da instituição, orientando professores para enfrentar o desafio de atender a diversidade dos alunos e intervindo institucionalmente junto aos alunos em programas de avaliação e intervenção.

6 - O QUE É PSICOPEDAGOGIA?

João Beauclair

Vivenciar Psicopedagogia é um estado de ser e estar sempre em formação, projetação e em processo de criação.

O que é psicopedagogia? De leigos a estudantes de psicopedagogia, muitos ainda questionam sobre a função do psicopedagogo nos diversos âmbitos: educação, saúde, ação social, clínica e institucional.

Para entender o que é Psicopedagogia, acredito ser importante ir além da simples junção dos conhecimentos oriundos da Psicologia e da Pedagogia, que ocorre com bastante freqüência no senso comum, isto porque, em sua própria denominação Psicopedagogia aparece “suas partes constitutivas – psicologia + pedagogia – e que oferece uma definição reducionista a seu respeito”, como nos ensina Julia Eugenia Gonçalves .

Na realidade, a Psicopedagogia é um campo do conhecimento que se propõe a integrar, de modo coerente, conhecimentos e princípios de diferentes Ciências Humanas com a meta de adquirir uma ampla compreensão sobre os variados processos inerentes ao aprender humano. Enquanto área de conhecimento multidisciplinar, interessa a Psicopedagogia compreender como ocorre os processos de aprendizagem e entender as possíveis dificuldades situadas neste movimento. Para tal, faz uso da integração e síntese de vários campos do conhecimento, tais com a Psicologia, a Psicanálise, a Filosofia, a Psicologia Transpessoal, a Pedagogia, a Neurologia, entre outros.

Por que a Psicopedagogia não tem seu papel claro na formação do/a Psicopedagogo/a?

Vivenciar Psicopedagogia é um estado de ser e estar sempre em formação, projetação e em processo de criação. Criação de sentidos para nossa própria trajetória enquanto aprendentes e ensinantes, enquanto seres viventes na complexa gama de relações que estabelecemos com o nosso tempo e espaço humano. Todas as nossas ações e produções, por serem humanas, estão sempre em processo de permanente abertura, colocadas num prisma próprio para novas interpretações e busca de significados e sentidos, situadas num movimento incessante de desconstrução e de re-construção. Dizendo isso de uma outra forma, posso afirmar que, no nosso tempo de reconfiguração de paradigmas, os conceitos estão constantemente sendo revistos e ganhando novos significados; com a Psicopedagogia não podia ser diferente, visto que o pensar reflexivo sobre esta área do conhecimento se constitui uma das importantes tarefas a ser desempenhada por quem lhe tem como campo de ação, profissionalidade, dedicação e estudo. Mas será que realmente a Psicopedagogia não tem seu papel claro na formação do/a Psicopedagogo/a? Ou isto é um mito que precisa ser reconsiderado?

Qual o papel do psicopedagogo nas áreas possíveis de atuação?

Sabendo que, na verdade, a Psicopedagogia é um campo de atuação que, ao atuar de forma preventiva e terapêutica, posiciona-se para o compreender os processos do desenvolvimento e das aprendizagens humanas, recorrendo a várias áreas e estratégias pedagógicas objetivando se ocupar dos problemas que podem surgir nos processos de transmissão e apropriação dos conhecimentos (possíveis dificuldades e transtornos) , o papel essencial do psicopedagogo é o de ser mediador em todo esse movimento. Se for além da simples junção dos conhecimentos da Psicologia e da Pedagogia, o psicopedagogo pode atuar em diferentes campos de ação, situando-se tanto na Saúde como na Educação, já que seu fazer visa compreender as variadas dimensões da aprendizagem humana, que, afinal, ocorrem em todos os espaços e tempos sociais.

O modelo argentino da psicopedagogia no trabalho multidisciplinar em hospitais e escolas é institucionalizado. No Brasil apesar de se falar muito no trabalho multidisciplinar, pouco se vê desta atuação. Você acredita que somente com a regulamentação da profissão isto se tornará uma realidade?

Talvez o trabalho multidisciplinar institucionalizado ainda não seja prática comum nem mesmo em outros países, com raras exceções, evidentemente. O paradigma cartesiano-positivista ainda é o grande entrave a ser superado para que se possa pensar em um outro modo de fazer ciência e cuidar das pessoas. É necessário um processo longo, a ser vivenciado ainda por um bom tempo como desafio a ser superado. O modelo argentino de Psicopedagogia, com o trabalho multidisciplinar em hospitais e escolas também teve sua trajetória de luta, como em muitos momentos nos apontaram Jorge Visca e Alícia Fernandéz. Realmente em nosso país, esta atuação ainda é restrita de fato. E um ponto essencial para tal é a regulamentação da profissão: esta questão é primordial para o avançar da profissionalidade do psicopedagogo. A meu ver, é um processo muito rico a ser vivido por todos nós psicopedagogos.

Ao falarmos de transdisciplinaridade na Psicopedagogia, pressupomos que a prática e o olhar psicopedagógico objetivem: aceitar um novo paradigma; ter preparação teórica adequada; possuir conhecimento prático suficiente; estar capacitado pedagogicamente e psicopedagogicamente; ser aberto e criativo; conhecer as novas tecnologias; atualizar-se permanentemente; entender e aceitar a diversidade discente. Em sua experiência acadêmica, isto é ensinado nos cursos de psicopedagogia?

Se não é ensinado, pelo menos vivenciado enquanto perspectiva, caminho a ser trilhado não resta a menor dúvida. Compreendo que o psicopedagogo é um pesquisador permanente, um sujeito que, a cada movimento, ação e conduta enquanto profissional, busca alternativas para os dilemas, tensões, limites que lhe surgem, vislumbrando sempre novas possibilidades. E tudo é processo, movimento. Precisamos acreditar, cada vez mais, no ensinamento de nossa mestra Ivani Fazenda, que nos diz da importância da espera, da humildade, do conduzir-se com harmonia e perseverança em tudo o que se refere a mudanças de paradigmas. O cuidado maior, a meu ver, deve ser efetivamente, com a proliferação dos cursos de Psicopedagogia pelo Brasil sem as devidas orientações. A ABPp esforça-se, de modo contundente, em mostrar o quanto é necessário ter preparação teórica adequada e possuir conhecimento prático suficiente, além de sugerir caminhos para a organização curricular de cursos de especialização em Psicopedagogia. Na minha vivência, enquanto docente da área em diferentes cursos de formação em Psicopedagogia no país, observo o esforço imenso em fazer o melhor, pois afinal estar capacitado pedagogicamente e psicopedagogicamente, ser aberto e criativo, conhecer as novas tecnologias, atualizar-se permanentemente; entender e aceitar a diversidade discente são desafios imensos, para uma vida inteira. O essencial, acredito, é o desejar fazer o melhor possível e neste desejar, realizar.

Em julho próximo, no Fórum da ABPp – Associação Brasileira de Psicopedagogia, você estará lançando o primeiro livro da Coleção “Olhar Psicopedagógico”, da Editora WAK, do Rio de Janeiro, com o tema “Psicopedagogia: trabalhando competências, criando Habilidades”. Por quê a escolha deste tema?

A Coleção Olhar Psicopedagógico é uma aposta na continuidade da produção acadêmica e no surgimento e divulgação de novos autores em Psicopedagogia no Brasil. Em São Paulo, no ano passado, ao participar como conferencista convidado e docente de um curso sobre a construção do olhar do Psicopedagogo no II Congresso Latino Americano de Psicopedagogia promovido pela ABPP, numa conversa informal, Alícia Fernandez me falou sobre como o Brasil, por sua diversidade e criatividade, pode e tem contribuído para a avançar do campo psicopedagógico. A escolha do tema talvez esteja vinculada a isso: nos meus processos de autoria de pensamento, também posso contribuir para o debate, posso elaborar outras possibilidades, evidenciar outros aspectos à reflexão. Ter competências e habilidades em nossos fazeres cotidianos, tanto nos espaços clínicos e/ou institucionais é questão primordial para nossa própria vivência e sobrevivência enquanto formadores e profissionais em Psicopedagogia.

Qual a importância em se debater este tema e quais são as competências e habilidades do psicopedagogo?

A importância em se debater este tema reside, a meu ver, na busca mesma do reconhecimento e da importância da atuação do psicopedagogo em nosso tempo presente. O que está construído neste meu livro é um referencial, uma matriz de competências, vinculadas a habilidades básicas para o seu desenvolvimento. Aqui não me cabe, por questões de espaço e lugar, ampliar e desenvolver todas elas, mas a primeira destas competências está voltada para a necessidade do psicopedagogo estabelecer elos de conexão com as principais articulações e correntes teóricas contemporâneas, propondo-se a busca permanente da teoria na construção de suas práticas profissionais, principalmente no que concerne aos pressupostos da transdisciplinaridade e da complexidade. E a última está vinculada ao vivenciar, efetivamente, em sua vida pessoal cotidiana a máxima de ser um eterno aprendiz, exercendo nesta vivência senso crítico, humildade, serenidade, escuta, espera, olhar atento, intuição e novas formas de compreensão da complexidade inerente aos diferentes aspectos da realidade. Para cada competência – elas são sete, há uma proposta de três habilidades básicas, ou seja, no livro há uma matriz de competências com as habilidades básicas para cada uma delas. O continuar deste meu trabalho agora está na elaboração de estratégias facilitadoras deste movimento. Meu desejo é contribuir para o debate e abrir outras possibilidades de interlocução.

Estamos sabendo que outros livros virão, poderia nos adiantar quais serão os temas?

Como coordenador da coleção, discuto com o Pedro, nosso editor da WAK, sobre os temas que acreditamos ser de fundamental importância atualmente no campo da Psicopedagogia no Brasil. O próximo volume, que dependendo de todo um processo que estamos vivendo agora, poderá também ser lançado no Fórum da ABPp em julho e contém artigos de diferentes autores que atuam em distintos estados brasileiros. É um volume intitulado Psicopedagogia: espaço de ação, construção de saberes, onde teremos artigos de Ieda Boechat, José Artur Bastos, Julia Eugenia Gonçalves, Dulce Consuelo, Elizabeth Borges, Adriana Schimidt e um texto de minha autoria com temas vinculados ao aprofundamento psicopedagógico. O terceiro volume, sobre Psicopedagogia Institucional e ainda sem título definido também já está sendo organizado, com artigos de Maria Irene Maluf, Simaia Sampaio, Geni Lima, Maria Taís de Melo, Márcia Siqueira de Andrade, Julia Eugenia Gonçalves e um outro artigo meu onde relato sobre uma experiência de formação em Psicopedagogia Institucional vivenciada recentemente. O quarto volume, ainda sem autores efetivamente confirmados, ainda está em elaboração e em processo de seleção de artigos e tratará sobre o tema “dificuldades” em aprendizagem e as possibilidades de intervenção do psicopedagogo. É um trabalho muito gratificante e nossa contribuição pretende ser a melhor possível, afinal, é uma maneira de estarmos auxiliando no reconhecimento de nossa própria área de formação e atuação, que tanto nos estimula a irmos adiante em nossa trajetória enquanto aprendente e ensinantes.

Você participa de grupos de discussão através da Internet? Como tem sido sua experiência?

Este pergunta é muito interessante. Sempre brinco em minhas palestras, cursos, conferências e oficinas que eu divido a minha trajetória enquanto aprendenteensinante em dois momentos distintos: em a.C. e d.C. , ou seja, antes e depois do computador em minha vida, pois tal tecnologia me permitiu e ainda me permite ampliar perspectivas de aprendizagem e o que considero fascinante: as possibilidades de aproximação que temos com os que atuam e se interessam pelos temas que estudamos e dedicamos nossas pesquisas e leituras. Meu encontro com a Psicopedagogia se deu desta forma, através de um desses encontros: Julia Eugenia Gonçalves, atualmente presidente da Fundação Aprender, em Varginha, Minas Gerais, é moderadora de um grupo de discussão que eu participo faz anos e nossos intercâmbios sempre foram excelentes. Recentemente fui convidado pela Dr. Márcia Siqueira de Andrade, do Instituto de Psicopedagogia da UNISA, a participar de um outro grupo, o ILAPp, e novos intercâmbios estão sendo feitos, novas aproximações e contatos estão surgindo, inclusive com a possibilidade de termos, desta forma, novas idéias para outros volumes da Coleção Olhar Psicopedagógico e outros projetos em comum: é o que eu chamo sempre de aprendizagem colaborativa. Também modero duas listas de discussão no yahoogrupos, onde troco e-mails com alunos, colegas de trabalho, divulgo eventos em educação, temas interessantes em Psicopedagogia, bibliografias, lançamentos de livros, indicação de sites, fóruns, congressos, enfim, estimulo outras pessoas a participarem desta rede fundamental ao nosso ser e estar no mundo, ampliando sempre nossos movimentos e exercendo nossas competências e sensibilidades solidárias, como nos ensina Hugo Assmann e Jung Mo Sung. Isto sem falar no meu próprio site, www.profjoaoabeauclair.kit.net , onde divulgo minhas ações de consultoria e oficinas de formação em educação e psicopedagogia.

Faz-se Psicopedagogia nesta mídia interativa?

A Internet é efetivamente uma mídia interativa fabulosa e essencial ao nosso tempo presente. Talvez não possa afirmar definitivamente que se faz Psicopedagogia com esta mídia interativa de forma direta, mas que com certeza é ferramenta de importância ímpar para o seu desenvolvimento, isso é inegável. Mas, infelizmente, ainda há, por incrível que pareça resistência em relação ao seu uso com este objetivo. Mas, não tenhamos pressa, afinal, como nos ensina o poeta espanhol Antonio Machado, “caminhante, não há caminho, o caminho se faz ao caminhar.” Adelante!

Leia sinopse do livro "PSICOPEDAGOGIA - TRABALHANDO COMPETÊNCIAS, CRIANDO HABILIDADES" Autor:JOÃO BEAUCLAIR; Editora: WAK EDITORA entrando no endereço:

http://www.psicopedagogia.com.br/lancamento/lancamento.shtml

Publicado em 29/06/2004 16:57:00

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