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domingo, 22 de fevereiro de 2009

Especialistas indicam os rumos que a EAD pode tomar a partir do modelo de regulamentação adotado para o setor


Futuro incerto

Especialistas indicam os rumos que a EAD pode tomar a partir do modelo de regulamentação adotado para o setor. Conheça as tecnologias que determinarão os próximos passos da modalidade no país

Juliana Holanda

Há mais de três séculos, a Gazeta de Boston publicava em suas páginas um anúncio que vendia "material para ensino e tutoria por correspondência". Era o começo da educação a distância. No Brasil, o começo do ensino não presencial remonta à década de 30, quando o Ministério da Educação criou o Serviço de Radiodifusão Educativa. Passadas sete décadas, com um crescimento médio de 20% ao ano e a necessidade de incluir mais brasileiros na graduação, a modalidade vive um momento de questionamentos que podem definir o seu futuro: qual o nível de intervenção necessário para garantir sua qualidade? Que autonomia as instituições devem ter para criar novos métodos pedagógicos? É possível adotar um modelo unificado num país das dimensões do Brasil?

Essas perguntas começaram a ganhar relevância entre educadores e envolvidos com a educação a distância a partir do final de 2007, quando o Ministério da Educação definiu os instrumentos para credenciamento institucional, de polos e autorização de cursos na modalidade. Era o início da regulação do setor que, até então, não tinha instrumentos específicos. Passou-se a exigir uma infra-estrutura para cada polo presencial que inclui, entre outros itens, auditório, biblioteca e laboratórios especializados. No final do ano passado, o órgão anunciou o resultado do processo de supervisão iniciado no começo de 2008: mais de mil polos desativados. Agora, o MEC estuda novos critérios para a autorização de cursos.

O setor começa a se adaptar às regras, mas as consequências já são visíveis. As instituições que adotaram o modelo de ensino online foram as mais afetadas. A maioria refreou planos de expansão e concentra esforços em altos investimentos para agregar infra-estrutura aos polos presenciais, que antes eram usados prioritariamente para as avaliações dos alunos. É o momento de adequação ao modelo de educação a distância que está sendo desenhado no país.

A necessidade de avaliar o sistema é corroborada pelo setor. A Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed) se pronunciou a favor da necessidade de se estabalecer critérios para a garantia da qualidade. Mas a Associação é contra a adoção de um modelo pedagógico único para todo o Brasil e a diferenciação de regras. "Outros países não têm leis específicas para a EAD. A modalidade deveria ser incluída dentro do processo de educação da universidade", defende Frederic Litto, presidente da Abed.

As instituições que passaram pelo primeiro processo de supervisão do Ministério também apoiam a regulação. "Concordamos com a necessidade da avaliação não só no ensino a distância, mas na educação como um todo", diz Julian Rizo, diretor executivo da Eadcon. "A regulamentação é positiva porque não existia uma norma que definisse critérios claros", completa Elisabeth Bueno Lassranchi, reitora da Unopar, outra instituição supervisionada.

O temor, alegam os envolvidos, é que esse ajuste desconsidere diversidades. "O modelo brasileiro tem de ser plural, o das federais não serve para as demais, é oneroso. O aluno que paga mensalidade não quer, nem pode pagar mais", diz Beatriz Ribeiro, diretora da PUC Minas Virtual. Ela faz uma conta rápida: com a exigência de um tutor presencial por disciplina, no caso do curso de ciências contábeis da PUC, por exemplo, seria necessário contratar 48 tutores. A ida frequente dos alunos aos polos presenciais também é inviável para quem vive no interior, principal público da instituição, segundo Beatriz. "Há uma tensão entre a necessidade da comunidade que não tem acesso ao ensino e as exigências do MEC. Não é assim que se assegura qualidade", reflete.

Julian Rizo revela que a tendência do sistema Eadcon é encerrar a oferta de ensino em cidades com menos de mil habitantes, onde vivem cerca de 50% de seus alunos. O motivo é a dificuldade em se cumprir com todas as exigências para os polos presenciais em cidades pequenas. Segundo seus cálculos, o investimento em cada polo deve ser de R$ 350 mil, em média. Rizo prevê que o sistema Eadcon, que opera pela Faculdade Educacional da Lapa (Fael) e pela Fundação Universidade do Tocantins (Unitins), deve fechar de 500 a 600 centros de apoio. "Essa legislação vai provocar efeitos positivos e outros não tão positivos assim. Os investimentos em qualidade são benéficos. Mas a preocupação é com a queda na cobertura da educação a distância, se o modelo definido não conseguir chegar a cidades menores", diz.

Para Frederic Litto, essa pode ser a maior conseqüência para o país. "A educação a distância é a única forma de atingir a meta de incluir 30% dos jovens de 18 a 24 anos no ensino superior. Toda essa regulamentação vai diminuir as chances de alcançar o índice", prevê.

Por outro lado, o Ministério da Educação investe na Universidade Aberta do Brasil (UAB) como frente de batalha para a formação de professores e expansão do número de alunos. "Somos 100% a favor da UAB, mas uma universidade aberta significa não exigir vestibular para entrar, como é feito na Inglaterra", diz Litto.

O professor de economia da UnB e vice-presidente da Abed, Marcos Formiga, exemplifica: "As boas universidades abertas do mundo têm funil ao contrário. O acesso é livre, o difícil é sair porque ao longo do curso só fica quem se dedica".

De qualquer forma, educadores são otimistas com relação ao futuro do ensino a distância no Brasil. A expectativa é que a modalidade, que cresceu 54,8% de 2004 a 2007, passe por um período de adequação, mas continue a se expandir. "A educação a distância não é uma opção, é o futuro. Quem estiver fora da EAD nos próximos anos está fora da educação", analisa o pró-reitor de EAD da Metodista, Luciano Sathler. "Há uma mudança no perfil do aluno, no mercado e na maneira como a sociedade enxerga de que forma o conhecimento é disseminado. A EAD é a resposta para esses três níveis de mudança de paradigma", justifica.

Marcos Formiga acredita que a regulação do Ministério, inclusive, não deve afetar a modalidade, cuja inclinação é se disseminar fora da graduação. "A tendência mundial é ter o acréscimo do conhecimento e não a valorização do diploma por si. No mundo inteiro as profissões regulamentadas estão acabando, hoje a certificação é muito maior do que o diploma. É uma tendência que está chegando aqui."

Segundo dados do Anuário Abed de 2007, 972 mil alunos estão matriculados em instituições credenciadas, enquanto 582 mil frequentam um curso de educação corporativa. "A educação a distância nas empresas vai explodir", prevê Formiga.
Na análise de Litto, a educação a distância no Brasil continuará a ser dividida sob três tipos de economia. "Na agrícola continuarão a ser oferecidos os cursos por correspondência e por rádio. Na industrial, os telecursos e na informática, as aulas por internet", prevê.

Segundo os últimos dados disponíveis no Anuário Abed, 77% dos cursos a distância são realizados via material impresso, 62,9% por e-learning (internet), 45% por vídeo, 23,6% por televisão e 11,4% via satélite. A tecnologia que prevalecerá num futuro próximo ainda é uma aposta incerta. "Ninguém sabe como a internet e a telefonia móvel vão se integrar, mas sabemos que a conexão será toda via IP (Internet Protocol)", avalia Beatriz, da PUC Minas.

Aproximações com novas tecnologias começam a aparecer nesse cenário. A Universidade Metodista de São Paulo ensaia investimentos no mobile learning, que usa aparelhos móveis, como celulares, para fins educacionais, tendência na área de educação já percebida nos Estados Unidos. A instituição promoverá um encontro sobre o tema em março, com especialistas nacionais e internacionais sobre o tema.

Rizo diz que a Eadcon planeja para 2010 mudar a plataforma de projeção das aulas para o sistema digital signed, que divide o conteúdo em blocos e permite o envio de informações durante todo o dia. "Por essa tecnologia poderíamos oferecer internet via aérea para um aluno em qualquer lugar do Brasil", diz.

Seja qual for a tecnologia, os educadores são otimistas quanto à adequação das atuais medidas para as necessidades do país. Por ser o começo do processo é natural que ainda venham ajustes, defendem. "Indiscutivelmente vamos partir para a flexibilização, seja nesse ou no próximo governo", aposta Marcos Formiga.

Rizo, que diz estar em processo de entendimentos com o MEC, também aposta no tempo como melhor resposta para as questões atuais. "O processo de conversa do setor com o regulador no Brasil é devagar, mas todos os casos têm sido muito bem resolvidos. Acredito que a EAD é uma quebra de paradigma num setor muito conservador como o da educação. No final, vamos chegar a um consenso para o crescimento controlado com qualidade. Quem faz EAD tem de pensar o setor para os próximos dez anos", defende.

MEC estuda novos critérios para abertura de cursos

Marta Avancini

O Ministério da Educação está revendo os critérios para autorização dos cursos de graduação a distância. Ainda em estudo no órgão, as novas exigências, explica o secretário de Educação a Distância do MEC, Carlos Eduardo Bielschowsky, seguirão os parâmetros estabelecidos no processo de supervisão, realizado no final de 2008, e que resultou na assinatura de termos de saneamento com quatro instituições de ensino. "Estamos fazendo um ajuste no sistema, que cresceu rápido demais, dando origem a algumas distorções", afirma Bielschowsky.

Os termos foram assinados pela Universidade Estadual de Tocantins (Unitins), Faculdade Educacional da Lapa (Fael), no Paraná, ambas operadas pelo sistema Eadcon, Universidade do Norte do Paraná (Unopar), e Centro Universitário Leonardo da Vinci (Uniasselvi), de Santa Catarina.

As quatro instituições respondem por cerca de 257 mil alunos em um sistema que atende a 760,5 mil matriculados. Ao todo, existem no Brasil 109 instituições de ensino superior - entre particulares, comunitárias e públicas - que oferecem cursos de graduação a distância, segundo os dados do MEC.

Os problemas foram constatados nos chamados "centros de apoio" das instituições. De acordo com Bielschowsky, as instituições abriram centros de maneira indiscriminada e sem a autorização do MEC. "Elas tinham autorização para abrir polos, mas foram além e criaram os centros de apoio, que não são reconhecidos." O diretor executivo da Eadcon, Julian Rizo, que opera com cerca de mil centros de apoio, diz que antes não havia referencial de modelo a seguir, mas agora há um esforço para se adequar à nova regulamentação. "O MEC nos esclareceu que podemos continuar com essas operações até o final dos cursos. Os alunos atuais não serão afetados", diz Rizo.

A Unopar terá de reduzir o número de alunos: em 2009, somente poderá atender 35 mil estudantes, uma redução significativa, considerando que no ano passado a Unopar recebeu 50 mil novos alunos. Segundo a reitora da Unopar, Elisabeth Lassranchi, até outubro a instituição estará completamente adaptada. "Fizemos uma proposta para coordenação pedagógica em cada polo. Estamos comprando cinco mil computadores para cada polo e contratando e capacitando 357 tutores."


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Fonte: http://revistaensinosuperior.uol.com.br/textos.asp?codigo=12332

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