O que é Etnocentrismo (Antropologia)
Resenha por Iatala Mané (Guiné-Bissau) e Marcondes Lucena (Brasil)
Bibliografia: ROCHA, Everardo P. Guimarães. O que é etnocentrismo. 3ª ed. São Paulo, Brasiliense, 1986.
O Que é Etnocentrismo
“Etnocentrismo é uma visão de mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência” — assim define-se o etnocentrismo nas primeiras palavras do livro em questão (p. 5). Mas o que isso significa, na realidade?
Bem, como sabemos, os seres humanos possuem um instinto nato que os habilita a identificar tudo quanto seja a eles estranho, ou diferente. Nós costumamos separar as coisas quase que geralmente em dois grupos distintos e bem contornados: o grupo do “eu” ou do “nós” e o grupo do “outro”. Essa separação ocorre, de acordo com o livro, devido a um “fenômeno onde se misturam tanto elementos intelectuais e racionais quanto elementos emocionais e afetivos”. (p. 5). E ainda afirma que os elementos intelectuais incluem uma dificuldade de se pensar a diferença, já os elementos emocionais se tratam de sentimentos como estranheza, medo, hostilidade etc.
No plano histórico, o livro aborda o surgimento da visão antropológica do relativismo ou da relativização. Traça-se uma linha contextual, narrando os limiares das visões antropológicas que antecederam a visão de relativização. (pp. 26, 27) Inicia-se com o surgimento das teorias evolucionistas tal como uma tentativa de explicação racional para as diferenças entre as culturas. O evolucionismo é uma visão de mundo etnocêntrica por visualizar as demais culturas meramente como estágios de evolução correspondentes a estágios anteriores ao nosso. No entanto, as teorias evolucionistas são mais avançadas do que as visões etnocêntricas anteriores, segundo o livro, por tratar as demais culturas como “humanas”, embora “atrasadas” ou “menos evoluídas”. (p. 37) Os principais contribuintes dessa corrente foram James Frazer, Edward Tylor e Lewis Morgan.
O evolucionismo acabou por contribuir para a relativização futura por tratar o diferente como humano, o que se trata de um paradoxo. E isso se deu, na realidade, pela dificuldade teórica dos evolucionistas em determinar um referencial seguro para se medir a “evolução” cultural. Além disso, o trabalho de campo ou pesquisa de campo deu ímpeto a novas análises antropológicas, visto que os cientistas que empregavam tal método podiam agora conviver diretamente com as culturas estudadas em questão. O antropólogo Bronislaw Malinowski foi um dos principais fundadores dessa forma de análise. Mas, antes dele, surgiram algumas escolas ou “doutrinas” antropológicas “intermediárias”, entre elas: os estudos realizados por Franz Boas (pp. 40-45), a escola personalidade e cultura (p. 55), o reducionismo (p. 56), os estudos de Julien Steward (p. 59), entre outros.
O livro apresenta os estudos de Durkheim, Malinowski e Radcliff-Brown como importantes para o entendimento aprofundado da Antropologia, principalmente de sua linha relativista. (p. 63) Após abordar algumas partes importantes dos estudos acerca de tais pensadores, a obra finaliza abordando estudos sobre Claude Lévi-Strauss, fundador da teoria estruturalista. E afirma-se que o “etnocentrismo é exorcizado” quando “a ida ao ‘outro’ se faz alternativa para o ‘eu’” (p. 109).
A obra O Que é Etnocentrismo é muito importante para a nossa realidade mundial. Não somente como ferramenta teórica, mas também como útil para a realização de práticas políticas, reais. O conceito de superioridade ou inferioridade entre culturas deve ficar obsoleto ao se verificar todas as culturas numa perspectiva horizontal ao invés de uma esquematização vertical, onde o fator tempo e história são descontextualizados. Isso é muito importante visto que nem todas as culturas possuem uma concepção de tempo e história homogênea, se é que possuem tal concepção. Embora todos os povos ou etnias estejam sempre na mesma linha do tempo, elas não se inter-relacionam numa perspectiva de progressão onde um estágio é correspondente a outro estágio de outra cultura num fator tempo diferenciado. O processo de complexização das culturas é único entre elas mesmas, por isso deve ser relativizado.
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