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segunda-feira, 3 de março de 2014

Yoga na visão da Filosofia Sankhya

 Filosofia Sankhya do Yoga
Filosofia Sankhya do Yoga

Filosofia Sankhya do Yoga

Yoga na visão da Filosofia Sankhya
Jayadvaita Das
Existem duas energias principais criadas pelo Ser Supremo (ishvara): param-sakti (energia espiritual), e prakrti-sakti (energia material). Por trás de toda a criação material existe a substância primordial espiritual. Sem o princípio espiritual nada, nem mesmo dentro do campo material, pode existir. Isto leva a concluir que a causa da criação material é espiritual; que existe um princípio qualitativamente igual por toda parte; que o princípio material é uma transformação remota do princípio espiritual; ou que o espiritual gera a matéria, mas a matéria não tem potência para gerar o espiritual.
Além destas duas energias existe uma terceira energia importante: tathasta-sakti (entidade vida), que está envolvida pela energia material inferior embora em sua essência ela, tathasta-sakti, seja espiritual. Desse modo, a entidade viva também é considerada energia marginal, pois, por ser constituída de potência espiritual – mas estar presa no condicionamento material – ela fica atraída pela matéria e pela transcendência ao mesmo tempo. Numa visão mais ampla podemos ver que este mundo material atua como um cativeiro da alma espiritual. Mesmo sendo espiritual, a alma, por estar influenciada pela natureza material, permanece presa em diferentes corpos materiais. O que motiva este aprisionamento é a identificação com o corpo e seus subprodutos materiais. Além desta identificação ilusória há também a constante busca por prazer, felicidade e satisfação. Isto é natural da alma. Todos querem isto. Mas, a busca destes elementos na plataforma material é inútil e infrutífera. A solução é restabelecer sua ligação com a fonte última de toda criação, a fonte de todo prazer, felicidade e satisfação. Anandamayo, cuja fonte é a Pessoa Suprema.
O processo para se restabelecer esta ligação com o Ser Supremo original é o processo de yoga. Porém, é necessário se compreender as complexidades da existência material que atam a alma espiritual ao mundo dos fenômenos materiais. Para isto, a filosofia Sankhya apresenta em detalhes a constituição deste mundo material – o que evidencia que este não é o habitat natural da alma espiritual. Portanto, Sankhya é a filosofia do yoga. Inclusive, podemos ver claramente os ensinamentos de Sankhya no Yoga-sutra. Patañjali se baseou na filosofia de Kapiladeva para definir os parâmetros do yoga em sua obra. Em geral, o processo autêntico de yoga aceita a filosofia Sankhya como base para a compreensão dos elementos materiais e da alma espiritual. Não há como apresentar uma filosofia do yoga que não considere o que está embasado nos conceitos de Sankhya. O yoga não ensina uma filosofia separada da autorrealização espiritual. Yoga significa autorealização, reintegração. Yoga é a prática do conhecimento e Sankhya é o conhecimento que deve ser aplicado à prática. Yoga é sinônimo de espiritualidade. Por isso, Sankhya e yoga caminham juntos. Nos capítulos 3 e 5 do Bhagavad-gita, é explicado o sistema de Sankhya-yoga. Pode-se notar, numa análise mais profunda, que Patañjali apresenta o Astanga-yoga em sintonia com o Bhagavad-gita e Kapiladeva.
O Bhagavad-gita (15.3-4) expõe uma analogia do mundo material e como sair dele.
na rupam asyeha tathopalabhyate
nanto na cadir na ca sampratistha
asvattham enam su-virudha-mulam
asanga-sastrena drdhena chittva
tatah padam tat parimargitavyam
yasmin gata na nivartanti bhuyah
tam eva cadyam purusam prapadye
yatah pravrttih prasrta purani
“Não se pode perceber a verdadeira forma desta árvore neste mundo. Ninguém pode compreender onde começa ou onde ela se alicerça. Mas com determinação, deve-se derrubar com a arma do desapego esta árvore fortemente arraigada. Em seguida, deve-se procurar aquele lugar do qual ninguém volta após ter chegado, e lá render-se a esta Suprema Personalidade de Deus de quem tudo começou e de quem tudo emana desde tempos imemoriais.”
Isto quer dizer que temos uma relação temporária com este mundo material. Podemos aceitar que estamos aqui há milhares de vidas, mas em uma única vida podemos mudar completamente este conceito. O ponto é render-se ao Supremo. Adyam purusam prapadye. Adyam purusam, ou a original Personalidade de Deus (ishvara) é a quem a entidade viva deve se render. Não há ninguém mais além dEle. É uma grande ilusão procurar algum refúgio dentro da natureza material. Somente a Superalma é que pode dar o verdadeiro refúgio. Por isto ele é adyam purusam. Este purusam é o mesmo isvara que Patañjali indica como a pessoa a quem a alma espiritual deve se render, prapadye. Ele diz isvara pranidhana va. Renda-se ao Ser Supremo. Mas, para se alcançar esta convicção o yogi deve desenvolver o desapego (asanga-sastrena) pelo mundo material. E este desapego só pode resultar de um profundo conhecimento autorizado.
Sankhya de Maharshi Kapila
Sankhya significa profundo estudo analítico da natureza material em seus variados elementos e, em última análise, a compreensão do que existe por trás da matéria. Situando a filosofia Sankhya no contexto filosófico ocidental, ela estaria entre as mais completas elaborações metafísicas. Porém, a grande diferença desta metafísica de Sankhya para outras escolas é que ela se destina especialmente a dar condições de liberação às entidades vivas. Em outras palavras, Sankhya é o conhecimento verdadeiro através do qual se pode escapar do enredamento material.
Kapiladeva é filho do mítico bhakti-yogi Kardama Muni, filho de Brahma. Assim, a filosofia Sankhya de Kapiladeva é considerada a mais elevada de todas as tradicionais escolas de filosofia. Nela podemos encontrar claramente exposto todos os conceitos metafísicos da natureza. A principal diferença existente entre Kapiladeva e o falso Kapila (que viveu num período próximo de Patañjali) é que aquele expõe a filosofia de Sankhya sem excluir a presença de Deus. O falso Kapila até mesmo escreveu uma obra ateísta conhecida como Sankhya-sutra que não é aceita como uma obra autorizada. Ele se baseou na Sankhya de Kapiladeva e excluiu qualquer alusão sobre a Verdade Absoluta, a Suprema Personalidade de Deus.
A filosofia ateísta não tem nenhuma compatibilidade com o processo de yoga. Logo, o Sankhya de Kapiladeva, é a filosofia do yoga, pois como já foi mencionado, ela está em concordância com a filosofia Vedanta que conclui: krsnas tu bhagavam svayam. Krishna é a Suprema Personalidade de Deus, o único refúgio para todas as entidades vivas.
O próprio Srimad-Bhagavatam (3.25.1), o summum bonum de toda a literatura Védica, esclarece a respeito da grande personalidade de Kapiladeva.
kapilas tattva-sankhyata
bhagavam atma-mayaya
jatah svayam ajah saksad
atma-prajnaptaye nrnam
“Embora seja não-nascido, a Suprema Personalidade de Deus nasceu como Kapila Muni através de Sua potência interna. Ele desceu para disseminar o conhecimento transcendental para o benefício de toda a raça humana.”
O Ser Supremo é considerado não-nascido porque Ele não tem uma origem. E ainda assim Ele é a origem última de tudo. Sarva karana karanam. Mesmo sendo não-nascido e livre da influência da natureza material Ele desce à plataforma material para realizar Suas atividades transcendentais e deixar Sua mensagem para o benefício de todos. Isto aconteceu em Sua vinda há cinco mil anos quando deixou o Bhagavad-gita com todas as instruções necessárias para se alcançar a autorrealização. Também há mais de quinhentos anos novamente Ele veio para propagar a prática do conhecimento contido no Bhagavad-gita. Do mesmo modo, Ele veio há milhões de anos para deixar o conhecimento sobre a filosofia Sankhya do Astanga-yoga. Kapilas tattva-sankhyata bhagavam. Entende-se nisto que Kapiladeva é a própria Suprema Personalidade de Deus. Como no Bhagavad-gita (4.7):
yada yada hi dharmasya
glanir bhavati bharata
abhyuttanam adharmasya
tadatmanam srjamy aham
“Sempre e onde quer que haja um declínio na prática religiosa e um aumento predominante de irreligião, aí Eu próprio descendo.”
É por este motivo que encontramos na citação anterior a expressão atma-prajnaptaye. O Ser Supremo desce para transmitir o conhecimento transcendental, beneficiando a raça humana. Este conhecimento eleva a consciência à plataforma espiritual, pois ele enfatiza a prática do transcendental serviço devocional amoroso ao Supremo. Mam ca yo ‘vyabhicarena bhakti-yogena sevate. Aqueles que se ocupam sem interrupção em bhakti-yoga, serviço devocional amoroso ao Supremo (sa gunan samatityaitan), transcende os modos da natureza material e situam-se no nível de Brahman (brahma-bhuyaya kalpate).
Portanto, o conhecimento de Sankhya resulta na liberação de todas as condições aflitivas que o mundo material impõe. Ela leva ao amor incondicional pelo Ser Supremo. Amar a Deus sobre todas as coisas e serví-Lo em pura devoção amorosa. E este é o objetivo mais elevado da vida humana. No Srimad-Bhagavatam (3.24.36), o próprio Kapiladeva esclarece a causa de Seu aparecimento:
etan me janma loke ‘smin
mumuksunam durasayat
prasankhyanaya tattvanam
sammatayatma-darsane
“Meu aparecimento neste mundo destina-se especialmente a explicar a filosofia Sankhya, que é tida em alta estima por aqueles que , buscando a autorrealização, desejam libertar-se do enredamento de desnecessários desejos materiais.”
Ele diz que seu principal propósito nesta Sua vinda é para dar o verdadeiro refúgio. Durasayat é a ilusória tentativa de satisfazer os desejos materiais. Querendo escapar dos problemas e sofrimentos, a entidade viva condicionada procura se refugiar na natureza material. Asayat se refere a refúgio, porém, durasayat se refere a um refúgio muito difícil de ser alcançado, pois a qualquer momento ele pode ser perdido. Pode-se buscar refúgio até mesmo no corpo material que é pleno de desconforto e misérias. Por este motivo, Kapiladeva diz que a filosofia Sankhya é tattvanam. Ela é para proporcionar a compreensão verdadeira sobre a realidade. Ilusoriamente pode-se aceitar esta realidade aparente captada pelos sentidos materiais como sendo a realidade última. Mas, pela filosofia Sankhya concluímos que existe uma outra realidade muito mais ampla e profunda. Ela é a realidade transcendental que permeia esta fugaz e frágil realidade imanente. Além disso, Kapiladeva mostra que a realidade da alma presa num corpo material é como uma doença que só pode ser sanada através do conhecimento prático de Sankhya (bhakti-yoga).
No Bhagavad-gita encontramos que os corpos materiais destinam-se a destruição (antavanta ime dehah). Mas, a alma eterna que habita o corpo temporário deseja atividades também eternas e que realmente lhe dêem satisfação (nityasyoktah saririnah). Geralmente as pessoas menos informadas questionam sobre o corpo material sem saber da existência de um corpo espiritual eterno e ansioso por realizar atividades espirituais. Assim, a filosofia Sankhya leva o yogi a compreender sua natureza original e compreendendo este fato o yogi se ocupa em atividades transcendentais livres de resultados condicionantes.
 http://www.yogaculture.com.br/?p=1547

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