Não há como negar a
importância de saber quem manda na educação. De fato, tal conhecimento permite
direcionar os esforços das políticas públicas para os atores mais relevantes no
processo.
Mas de saída, temos de ser
modestos em nossas pretensões de chegar a conclusões firmes e claras. O
problema é conceitualmente resvaladiço e a evidência empírica bem magra. No
fundo, navegamos com base em uma experiência própria acumulada – e que às vezes
pode pregar peças.
Seja como for, achamos que
vale o esforço de ver até onde conseguimos avançar com os poucos dados
existentes e com uma inevitável dificuldade de definir até mesmo o que é
“mandar”.
Para os nossos propósitos,
diante de um conceito muito fluido do que seja “mandar”, fixamos algumas
definições úteis para a análise:
1. Mandar pode significar o
poder de fazer as coisas acontecerem, tomando um rumo diferente daquele que
ocorreria na ausência de tal ação. É o conceito mais óbvio e intuitivo do
termo.
2. Mandar pode também ser
entendido como o poder de impedir que algumas coisas aconteçam. É o poder de
veto ou de censura. Sem essa ação passiva, as coisas seriam diferentes. Por
exemplo, os sindicatos “mandam” na educação, no sentido de que impedem a
modernização da carreira e das regras de remuneração. Outro exemplo, o
Ministério Público embargou obras de construção de escolas de ensino
fundamental em municípios paulistas alegando que as prefeituras só poderão
investir em educação depois de “zerar” a demanda por creches.
3. Alargando um pouco o
conceito, mandar é também definir e redefinir o clima de opinião vigente. Com
as ideias, percepções e atitudes da sociedade se alterando, tornam-se mais
fáceis alguns cursos de ação, enquanto outros ficam mais problemáticos. Por
exemplo, quando a grande imprensa e a opinião pública educada passam a
valorizar a avaliação, isso permite mudanças mais arrojadas nas suas políticas.
Sem o apoio da opinião pública dos leitores da Folha de S. Paulo, Paulo Renato
Souza não teria ousado lançar o Provão, objeto de forte rejeição nos meios
universitários. Nesse sentido restrito, a imprensa e o público educado “mandam”
na educação, pois viabilizam politicamente algumas mudanças e tornam outras
menos palatáveis. Outro exemplo: progressivamente vai se reduzindo o número de
municípios em que os diretores de escolas são indicações políticas dos
prefeitos ou de outros atores políticos. Tal prática se torna progressivamente
mais desconfortável.
Diante dessas três
interpretações de “mandar”, saímos em busca das múltiplas combinações das ações
e inações dos atores correspondentes. Quem faz acontecer? Quem trava? Quem
pauta o certo e o errado, o aceitável e o inaceitável naquele momento? Mas,
sobretudo, estamos buscando aqueles atores que são capazes de introduzir
mudanças, boas ou ruins. Quem serão? O ministro, os secretários estaduais, os
prefeitos ou seus secretários? Os bons diretores de escolas que funcionam bem,
independentemente das decisões superiores?
ANTES de prosseguir, vale
definir uma outra dimensão do “mandar”, necessária para entender o poder
público. Suspeitamos sempre do poder que reside nos incumbentes, por exemplo,
na alocação de recursos. Eles teriam poder para decidir se dão para o estado X
ou para o município Y?
Mas há também um poder do
Estado que se manifesta na criação de programas com regras objetivas e que são
aplicadas mecanicamente, ou quase. Ou seja, são implementadas sem a
interveniência de decisões discricionárias dos dirigentes. Por exemplo, notas
abaixo de tantos pontos no Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes)
podem levar à suspensão dos vestibulares. Ou, no caso da pós-graduação, acima
de tanto, significam mais bolsas da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior). Tais regras tornam o Estado poderoso, mas não
conferem tanto espaço de manobra aos incumbentes, já que as regras são
mecanicamente aplicadas.
Tendemos a condenar um
governo central que toma decisões discricionárias, aplicadas nos níveis mais
baixo. No entanto, o julgamento pode ser bem mais matizado, se os avanços se
operacionalizam por via de regras universalistas, aplicadas sem favoritismos.
Contudo, o problema vale na
outra direção, ou seja, pode impedir uma ação benéfica do executivo. Por
exemplo, as regras de carreira do magistério, muitas vezes, impedem a
implantação de mudanças necessárias para a melhoria da qualidade do ensino. No
caso, houve a anulação de provas de seleção de professores temporários pela
Justiça de São Paulo, com base na legislação em vigor. Ou seja, o poder
discricionário não pode ser usado de maneira criativa ou benéfica.
Um mapa do poder
No Gráfico 1, mapeamos quem
poderia mandar na educação, em qualquer das conotações definidas acima.
Obviamente, o que está apresentado não passa de uma lista sem qualquer censura
ou filtro de plausibilidade. É o que poderia influir, pela sua existência e posição
no espaço social, político e administrativo em que opera a educação. Na
discussão que segue, exploramos cada uma destas hipóteses.
Nesse mapa mental, incluímos
o MEC (Ministério da Educação), os estados, os municípios e os diretores de
escolas. A pergunta óbvia é quem manda em quem? Do ponto de vista
político-institucional e de acordo com a Constituição de 1988, nenhum nível
manda no outro. Não obstante, a lei prescreve a colaboração entre os níveis. A
experiência e as regras sociológicas da burocracia sugerem que tal cooperação é
difícil fazer funcionar na prática.
Nem os estados estão
subordinados ao governo federal e nem os municípios aos estados. Nesse primeiro
cenário, perguntaríamos se o MEC manda nos estados ou nos municípios. Na
prática, ninguém manda em outro nível. Diretamente, não mandam, mas a
dependência financeira de vários estados e municípios em relação ao governo
federal pesa.
Por outro lado, não parece
que os estados mandam nos seus municípios. Na maioria dos casos, há um forte
distanciamento entre secretarias estaduais e os municípios. Sabe-se que muitos
municípios organizaram seus sistemas de ensino autonomamente, ignorando as
políticas educacionais do estado ao qual se vinculam. Não há culpados nessa
história. Essa situação reflete as características do federalismo brasileiro e,
de certa forma, a ausência de mecanismos que viabilizem um regime de
colaboração efetivo entre os níveis de governo.
Ao fim e ao cabo, alguém
manda mesmo? Manda em quem? Isso porque a negativa não é apenas ser mandado e
ter de obedecer. Pelo contrário, pode significar também uma crônica situação de
impasse ou inércia, em que nada de muito substancial acontece, pela falta de
poder de alguma autoridade para se sobrepor aos demais atores com força
política. Como tentaremos demonstrar, esses impasses tendem a caracterizar a
situação de estados e das grandes cidades. Em contraste, a observação casual
sugere que nos municípios pequenos as autoridades têm mais poder decisório,
pela ausência de oposição organizada. Voltaremos ao tema, mais adiante.
Mais distantes do processo
decisório, mas não menos importantes, temos a multiplicidade de atores da
sociedade civil. Há os sindicatos de professores e patronais. Há os movimentos
empresariais e a grande imprensa. E, finalmente, há os pais e suas eventuais
associações. Como sugeriremos, quase sempre, de pouca expressão e poder.
No que segue, examinaremos
cada um desses atores, perguntando quanto poder têm, seja para mudar, bloquear
mudanças ou transformar o clima de opinião sobre os temas educativos.
MEC
O MEC não manda diretamente
na educação, pois não tem escolas básicas. Além disso, não tem poder de
determinar políticas educativas estaduais ou municipais. Essa é uma
característica muito decisiva no sistema federativo brasileiro. Se é para o bem
ou para o mal, não está claro.
Diante de estados e
municípios de desempenho catastrófico, seria até bom que mandasse, para
consertar os desastres. Mas o reverso da medalha são a inércia e as regras
burras que travam os sistemas mais progressivos e dinâmicos. Se o MEC mandasse
mais, seria ainda pior.
As universidades federais
são autônomas. Na teoria, são completamente autônomas. Na prática, estão atadas
a um cordão umbilical financeiro e administrativo, tendo pouca liberdade de
ação sobre o seu orçamento e suas contratações. Na verdade, nem o MEC tem
grande poder discricionário sobre muitos desses gastos. Boa parte da
implementação orçamentária reside na área financeira do governo federal. Em
contraste, as universidades decidem seus rumos acadêmicos, mesmo que estejam
distantes das prioridades do MEC e do que poderíamos chamar de “interesse
nacional”. De certa maneira, é o pior dos mundos.
Como regra, o MEC ditaria as
agendas da educação. Mas o seu poder está muito balcanizado, dentro de suas
inúmera instâncias. O ministro tem pouco controle sobre o CNE (Conselho
Nacional de Educação), embora tenha grande poder de escolha de seus membros e
tenha sido o autor das regras de indicação deles. De fato, o poder do MEC na
escolha dos membros do CNE agora é fortíssimo, basta ver a atual composição. O
mesmo com a Conaes (Comissão Nacional de Avaliação do Ensino Superior) e outros
órgãos colegiados. Certo ou errado, esses órgãos acabam sendo fatores
inerciais.
No mundo real, convivendo com
tantas forças inerciais, o MEC não é capaz de políticas ousadas. E nem mesmo de
evitar impasses que resultam em políticas mornas, ou de evitar a permanência de
um status quo indesejável.
Dentre seus próprios
funcionários, há pouca congruência nas posições tomadas, inclusive contradições
entre o que desejaria o ministro e o que consegue fazer ou aprovar. Por
exemplo, aí está a reforma do Ensino Médio que patina sem rumo e sem uma
orientação que revele uma visão moderna do que deveria ser esse ensino. Ademais,
há hoje um considerável aparelhamento das equipes intermediárias, trazendo
inércia, conflitos e defesa de interesses corporativos, partidários ou
pessoais.
No todo, as equipes do MEC
tendem a ser tecnicamente superiores às de quase todos os estados e municípios.
Mas nem por isso poderíamos afirmar que estão à altura do desafio de tirar a
educação do país da mediocridade em que sempre esteve.
Ainda assim, o MEC tem um
bom número de ferramentas que lhe dão poder, quando sabe usá-las.
PNE
Na teoria, o PNE (Plano
Nacional de Educação) estabelece o marco normativo da educação brasileira.
Cumpre ao MEC a sua preparação. Uma vez formulado, vai para o Congresso para
aprovação, muitas vezes, com alterações que tornam irreconhecíveis os projetos
originais.
Na prática, tal como em
outros assuntos, os planos não possuem os instrumentos legais para sua
implementação. Se no presente o PNE será diferente, ainda está por se ver. O
PNE prescreve um gasto de 7% do PIB em educação. Mas quem obriga os estados ou
municípios a gastarem mais? E quanto deverão gastar? Na prática, o PNE é uma
das peças mais fracas no arsenal do MEC.
Avaliação Uma ferramenta
recente na história do ensino brasileiro é a avaliação. Começando com a
avaliação da pós-graduação, foi rapidamente ganhando abrangência, com o Saeb
(Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), o Provão que virou Enade,
Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), Prova Brasil e Ideb (Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica). Em contraste com o PNE, é uma arma
poderosa, quase sempre para o bem. Também é um instrumento que, uma vez
definido, não admite mais o arbítrio de ninguém. Se o curso X perdeu bolsas
porque caiu a nota da Capes, essa não é uma decisão discricionária da sua
diretoria. Se o curso Y teve seu vestibular suspenso porque sua nota no Enade
está abaixo de tantos pontos, trata-se de uma decisão tomada por algoritmos de
análise da avaliação.
Por tudo o que se sabe, a
avaliação da Capes tem um impacto positivo e poderoso na qualidade da
pós-graduação. O mesmo impacto benéfico se imputa ao Provão/Enade. Em ambos os
casos, podemos discordar com detalhes dos testes e das medidas atreladas a
eles. Mas no todo, tais limitações não chegam a comprometer seu papel saneador.
Tudo indica que as melhorias do Ideb são, em boa medida, o resultado da
existência do próprio Ideb que cria constrangimentos para escolas e municípios
mal avaliados. No entanto, ainda não sabemos se a recente melhoria do Ideb está
ou não relacionada com o elevado absenteísmo de alunos no dia da prova, o que
poderia mascarar algum tipo de seleção dos melhores.
Podemos dizer que as
avaliações tornam o MEC mais poderoso. Contudo, não criam espaços discricionários
para seu ministro ou secretários. Essas figuras tornam-se zeladoras de um
processo que anda mais ou menos sozinho (em que pesem arranhões no processo
aqui ou acolá). De outro lado, as avaliações nacionais estimularam o surgimento
de contrapartidas estaduais e municipais, que ajudam a definir programas locais
com base em evidências e fortalecem o uso de indicadores no acompanhamento do
que acontece na escola.
Fundef/Fundeb
Dentre todas, a arma mais
importante no arsenal do MEC é o sistema de financiamento Fundef/Fundeb (Fundo
de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental/ Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
Educação), que tem papel determinante na educação básica. O MEC é hoje o ator principal
na definição dos critérios e per capita/aluno/ano; piso salarial nacional dos
professores; complementação da União para atingir o valor mínimo. Com o Fundef,
o MEC passou a ter papel central e articula seu poder político para votar o que
quer seja nessa área do financiamento. A imensa maioria dos estados e
municípios depende financeiramente das decisões e alocações do MEC via FNDE
(Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) para transporte escolar,
merenda e EJA (Educação de Jovens e Adultos).
Aqui é preciso esclarecer. O
Fundeb representa mais de 90% do gasto em educação e 80% desses recursos
referem-se a gasto com folha de pagamento. Atualmente, o financiamento da
educação via Fundef tem a seguinte composição: municípios (42%), estados (38%),
União (20%).
Nos estados, os recursos de
educação são basicamente do Fundeb devido à composição da cesta de impostos.
Nos municípios, há maior variação, pois, além do per capita definido em cada UF
(que é o mesmo para a rede estadual e as municipais), os recursos vinculados à
educação podem ser acrescidos, dependendo da arrecadação de impostos locais que
não entram na cesta de impostos do Fundeb. É o caso de municípios muito ricos
que não conseguem gastar os 25% constitucionais. Por exemplo, a prefeitura de
Paulínia oferece BOLSAS DE ESTUDOpara todos os jovens que concluírem o ensino
médio e ingressarem em faculdades públicas ou privadas, mas sobram bolsas e
faltam alunos. O salário inicial de professor 40 horas é R$ 4 600 e do diretor
de escola, R$ 6 500, muito acima da média nacional. Mas, mesmo assim, acabam de
encerrar uma greve de 62 dias, mostrando que greves e magnitude dos salários
não se associam muito – assunto retomado mais adiante.
Já nos municípios e estados
mais pobres, a dependência financeira do MEC é grande, tanto na complementação
dos recursos do Fundeb quanto em relação a alocações negociadas via FNDE. As
alocações do FNDE para merenda, transporte e livro didático são universalistas.
As alocações para EJA, capacitação, pós-escola, saúde do escolar dependem de
negociação por projeto. Não sabemos se tal negociação exorbita o que seria
razoável em tais casos.
O Fundef/Fundeb limitou a
autonomia do gasto em educação, definiu regras, como o mínimo de 60% dos
recursos vinculados para o pagamento dos professores e estabeleceu controles
que funcionam. Em que pese a perda de autonomia dos entes locais, nesse caso,
não parece que seja algo a lamentar. Ao contrário, sabe-se que muitos prefeitos
perderam seus mandatos por não cumprirem a lei.
De fato, uma vez criadas as
regras, a sua execução é algorítmica. Aplica-se a fórmula e implementa-se o que
sair dela. Se há exceções, não chamam a atenção.
Financiamentos sem
condicionalidades
Os funcionários do MEC
gostam das CARTEIRAS de projetos. No pior dos cenários, dão pequenos poderes de
premiar amigos e aliados. Nos melhores cenários, financiam atividades
interessantes, criativas e bem-vindas. Na prática, há de tudo, embora a
magnitude dos cenários negativos flutue com as gestões de plantão no MEC.
Flutua também a magnitude dos recursos nessas rubricas. No todo, não parecem se
revelar como importantes para atrapalhar ou ajudar a causa da educação. Mas
podem ser relevantes nos inúmeros mecanismos de uso político da máquina da
educação. Exemplos de transferências voluntárias relevantes: recursos para
construção de creches (o que mais dá voto nos municípios); recursos para o
Brasil Profissionalizado (escolas técnicas e cursos profissionalizantes crescem
mais no Norte e no Nordeste).
Financiamentos com
condicionalidades
Estes são projetos com
regras claras e mecanismos que, em princípio, são automáticos ou governados por
conselhos de pares ou de eminências. Ou seja, se o candidato à ajuda faz isso
ou aquilo certo, ganha o recurso. É o caso do livro didático, das bolsas, do
FIES (Programa de Financiamento Estudantil) e de vários outros projetos desse
tipo. E também do Fundeb, já mencionado.
Como na avaliação, se os
mecanismos de alocação foram bem pensados, funcionam a contento, estimulando
comportamentos benéficos. São programas de fomento bem-vindos e que criam
sinalizações importantes para o sistema. Como dito, se as mecânicas de alocação
são sadias, funcionam mais ou menos autonomamente. Dão poder ao MEC, mas não
aos seus incumbentes.
Embora o MEC não determine
políticas estaduais ou municipais, distribui recursos orçamentários, alguns com
normas bem definidas e que são disputados por estados e municípios. Por
exemplo, o Plano de Ações Articuladas/PAR iniciado em 2007, pelo qual só ganham
DINHEIRO os que seguem as orientações federais. Nele há recursos para creches;
transporte escolar; capacitação de professores (agora comandado pela Capes e
pelas instituições de educação superior – IES federais). Não há pesquisa sobre
o assunto, mas tudo indica que houve forte centralização desses recursos nos
últimos anos.
Nas reuniões do Consed
(Conselho Nacional de Secretários de Educação), os principais assuntos têm sido
piso salarial, financiamento, aumento dos recursos do Fundeb, mais recursos
para transporte escolar da FNDE e do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao
Ensino Técnico e Emprego). Por conta desses recursos, os estados estão cada vez
mais presos à agenda do MEC.
O lado ruim dessa
dependência é uma recentralização do ensino. Em um país do tamanho do Brasil,
não está nada claro que centralizar é uma resposta inteligente aos problemas
encontrados. O lado bom é que, em boa medida, a maioria dos programas têm
regras claras e objetivas de repartição de fundos. Não menos importante, são
regras que tendem a premiar o que é bom para a educação. Ademais, os fundos não
podem ser usados como moeda de troca na politicagem tradicional.
Poder de pautar a mídia
Pesquisas bem conduzidas
mostraram que boa parte da imprensa, seja a grande seja a local, publica notícias
cuja maioria esmagadora vem do MEC. Em particular, originam-se dos diversos
sistemas de avaliação. Por razões diferentes, estados e municípios produzem
pouca notícia para a mídia, exceto quando há denúncias ou escândalos.
O MEC ganha grande visibilidade
por via da imprensa. Mas nem sempre tem muito controle sobre o que sai. Esse é
o caso dos escândalos e denúncias, reais ou imaginários que podem erodir a sua
reputação, bem como a dos ministros do momento.
Estados
O poder no nível dos estados
depende enormemente dos incumbentes, ou seja, governador e secretário de
Educação. Se levam educação a sério, as coisas podem acontecer. Se não, ficam
atolados na mediocridade de sempre.
Classicamente, estados mais
maduros e mais ricos levam educação mais a sério. De fato, os estados do
Centro-Sul estão no topo da distribuição de qualidade. Mas há exceções, em
ambas as direções.
Há o caso de alguns estados
novos que estão dando grandes saltos, como o Tocantins. E também, alguns
tradicionais que estão regredindo, como o Rio de Janeiro.
Pelo que sugere a observação
das estatísticas temporais de educação, a continuidade das políticas é
essencial. Nesse sentido, estados com vida política conturbada tendem a ficar
para trás. Estados em que uma mesma equipe se mantém no poder durante mais de
uma gestão e dá prioridade ao ensino, há boas chances de avanços.
São Paulo teve
descontinuidades e maus governos no passado. Isso se refletiu em uma estagnação
do seu ensino, diante de estados como Minas Gerais, que deram um salto. Mas,
com a volta a uma situação mais normal e a continuidade dos últimos anos, São
Paulo voltou ao topo da distribuição de qualidade. Atualmente, é um dos
melhores, desde o primeiro Saeb. Avançou mais do que a maioria, melhorou no
Ideb (1º e 2º lugares em 2009), avançou mais no desempenho da Prova Brasil do
que no fluxo (que é bom, mas estagnado). Além disso, foi o primeiro estado a
adotar a base curricular unificada com apostilas bimensais, hoje adotadas por
vários estados e municípios (RJ, ES, PE, CE).
O estado do Rio de Janeiro
está regredindo, há tempos. A sequência de gestões ineficazes parece explicar
boa parte do retrocesso.
Minas Gerais fez uma grande
e modelar reforma nos anos 1990. Após uma pequena queda na gestão Itamar
Franco, voltou a se consolidar no topo da distribuição. Talvez seja um dos
estados que mais inovaram na gestão. Os governos mineiros vêm sendo mais
arrojados nesta área.
O Rio Grande do Sul foi um
dos primeiros estados a consolidar uma rede pública de educação com uma certa
qualidade. Mas, de tempos para cá, perdeu velocidade, embora seu desempenho se
mantenha no grupo dos melhores, com ligeira queda no médio.
As grandes estrelas são os
estados do Centro-Oeste que vêm ganhando posição rapidamente. O que foi
considerado por Peter Fleming como a maior região desconhecida do mundo (em
1932), hoje virou um conjunto de estados que já ultrapassaram amplamente o
Norte e o Nordeste.
De fato, a maioria dos
estados do Norte e do Nordeste está praticamente paralisada. Não há forças
capazes ou dispostas a tirá-los do atraso educativo. Alguns poucos avançam,
como o Ceará, além de ser um dos estados que mais progrediram na articulação
estado-município. No caso de Pernambuco, os progressos nos anos iniciais foram
notáveis. Sergipe também avançou. Os outros permanecem em níveis lastimáveis,
aparentemente no mesmo pântano político de sempre. Até os novos estados, os
ex-territórios, estão passando na frente do Norte e do Nordeste.
Talvez uma análise mais
detalhada mostre outras conclusões. Mas tudo indica que a capacidade dos
estados de alterar a sua educação parece depender de dois fatores:
Em primeiro lugar, de seu
tamanho e consolidação. Estados maiores e mais velhos tendem a ter fatores
inerciais mais robustos. Ou seja, são mais difíceis de mudar. Nem dão saltos
para cima e nem afundam, de repente. Em contraste, nos novíssimos estados do
Centro-Oeste e nos ex-territórios há mais espaço de manobra. Há ascensões
espetaculares, como o caso do Tocantins, já mencionado.
Em segundo lugar, há um
outro fator relevante que é a “qualidade do sistema político”. Como outros
termos usados aqui, trata-se de um termo vago, mas que, ainda assim, transmite
alguma ideia. Ficaram para trás estados com governos travados, como foi o caso
de Pernambuco. Entretanto, esse estado está melhorando e o projeto das
parcerias do sistema privado com escolas de ensino médio (criado por Marcos Magalhães)
parece se consolidar e já abrange 80% da rede. Alagoas, Paraíba, Maranhão e Rio
Grande do Norte ainda operam sob um sistema político que não parece permitir
avanços no ensino. Piauí talvez esteja dando sinais de que vai mudar.
Dado o seu grande porte, os
estados tendem a andar devagar, seja para frente, seja para trás. Mas para o
ensino médio, é lá que reside a autoridade, pois afora o sistema privado, esse
ensino é operado pelas secretarias estaduais de educação.
Cumpre registrar que o poder
efetivo dos estados para lidar com o seu ensino municipal tende a ser muito
débil. Há tentativas aqui e acolá – como o caso do Ceará, já mencionado. Mas no
todo, talvez seja ainda mais impotente do que o governo federal, pois este
último financia várias carteiras de fundos para escolas municipais e tem outras
armas mais poderosas.
Municípios
Os municípios são as
unidades em que se encontra maior variabilidade, seja para avançar, seja para
regredir. Observamos forte protagonismo ou descaso completo.
A praga mais recorrente são
as descontinuidades, advindas das mudanças de governo. Diante da falta de
equipes estáveis e profissionais, fica tudo ao sabor dos humores e persuasões
do prefeito.
O Sistema de Gestão
Integrada (SGI) da Fundação Pitágoras foi plenamente implementado no município
de Vespasiano (MG). Os resultados foram expressivos e os visitantes de outros
municípios, como São José dos Campos (SP), decidiram adotar o modelo. Não
obstante, mudou o prefeito. O novo, simplesmente, mandou desmontar o sistema.
Alguns municípios padecem da
imaturidade política do clientelismo. Ao contrário dos governos estaduais ou do
MEC, as forças políticas locais estão próximas do poder decisório. Para
influenciar a Secretaria Estadual de Educação, é preciso viajar para a capital
e conseguir audiência com o secretário, feito que pode não ser trivial. Mas no
município, o prefeito e o secretário estão no meio da rua, vulneráveis aos
pedidos e pressões.
Outro fator a considerar é o
amadorismo da maioria das prefeituras. Cidades como Rio de Janeiro ou São Paulo
têm ótimas equipes. De fato, melhores do que muitos estados. Contudo, nas
pequenas são todas improvisadas, se é que existem.
Observa-se que os municípios
podem dar grandes saltos, dependendo da personalidade e persuasão dos
prefeitos. De fato, se comparamos os avanços dos municípios com as capitais,
veremos que estas últimas andam mais lentamente. Sua inércia política é maior,
pois são burocracias mais frondosas, com mais gente, mais competência para
proteger feudos de poder, sindicatos mais fortes e mais vícios acumulados. Há
também o problema de escala nos municípios maiores. As cidades do Rio de
Janeiro e de São Paulo possuem redes de ensino maiores do que muitos estados,
fazendo com que se pareçam mais com estados, do ponto de vista da inércia.
Vereadores
Está para ser melhor
conhecido o impacto dos vereadores sobre os sistemas de educação. Sabemos que
ali residem os focos mais óbvios do pequeno clientelismo. Por exemplo, a
nomeação de professores ou merendeiras. Mas não sabemos as influências
positivas que podem ter. Vimos um exemplo curioso da cidade de Itabirito (MG)
em que a Câmara de Vereadores encomendou um estudo detalhado sobre o sistema de
educação e saúde do município e que foi apresentado pelo autor e discutido
publicamente.
Prefeitos
Em grande medida, o poder de
alterar a educação tende a estar com os prefeitos. Na verdade, parece ser uma
constante que secretários de educação quase sempre sejam figuras inexpressivas
e dóceis, diante do prefeito. Em geral, são fracos e as secretarias, quase
inexistentes. Não obstante, há casos em que prefeitos escolhem secretários
fortes, para que tenham liderança e autonomia para implementar mudanças. Vimos
isso em Ouro Branco, com uma secretária que revolucionou a educação, mais até
do que o próprio prefeito esperava. Mais adiante, acabou entrando em rota de
colisão e pediu demissão.
Talvez, por todas essas
razões, o cenário mais favorável para a inovação é a sorte de ter um prefeito
bom. E se tiver mais sorte ainda, continuidade nas gestões. Os municípios
menores não precisam administrar conflitos internos com a burocracia – que é
mais forte nas cidades grandes, nos estados e capitais.
Em suma, na ordem geral das
coisas, há mais de cinco mil prefeitos que podem mandar na educação, para o bem
ou para o mal. Ao que parece, quanto mais velho o sistema e quanto maior o
município, menos mandam, por conta dos fatores políticos inerciais.
De fato, observamos em
municípios pequenos resultados na Prova Brasil que se igualam às médias dos
países da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico).
Ao contrário, os grandes dificilmente conseguem mostrar números que sejam
respeitáveis, pelas métricas de país avançado. Veja-se que o melhor desempenho
educativo em capitais cabe a Curitiba. No entanto, há quase meio milhar de
municípios com resultados melhores do que esta capital.
Mas as suas fraquezas podem
ser mais dramáticas. Veja-se que as redes estaduais mais fracas (Alagoas,
Maranhão, Amapá, Pará e Bahia) têm desempenho bem superior ao dos piores
municípios. Ou seja, em contraste com os municípios, estados e cidades grandes
convergem para a mediocridade. Nem muito bons e nem muito ruins. Não há forças
para vencer a inércia política.
Sejam estados, sejam municípios,
idade e tamanho parecem ter um forte impacto. Os menores e mais jovens têm mais
variabilidade, para cima e para baixo. Os melhores e piores municípios são
pequenos ou muito pequenos.
A maior inércia reside nos
sistemas maiores, independentemente de serem estados ou municípios. Também
problemáticos são os municípios das áreas metropolitanas que representam mais
de 65% da matrícula do ensino fundamental. Têm as mazelas das cidades grandes,
concentram populações muito vulneráveis com baixa escolaridade e não têm a
centralidade e os recursos das capitais.
Diretores de Escolas
As 90 escolas públicas onde
os Parceiros da Educação atuam são um grande laboratório para entender a
micropolítica da educação. Fica claro que os bons diretores conseguem fazer
acontecer mudanças, apesar da burocracia infernal, do absenteísmo dos
professores e dos equívocos das diretorias regionais.
Há escolas com diretores
eficazes, no comando, há muito tempo. Eles, simplesmente, ignoram as políticas
governamentais que podem atrapalhar. Aproveitam apenas aquilo que pode ajudar a
melhorar o dia a dia da sua escola.
Se pensamos em políticas
para dar mais protagonismo aos diretores, o ideal seria contratar head hunters
para caçar os melhores diretores. Esses deveriam ser TUTORES das escolas piores
de seu distrito ou bairro. Seria uma revolução especialmente nas periferias
urbanas das grandes cidades onde tudo é mais complexo e difícil.
A sociedade civil
Cada vez mais atores da
sociedade civil entram no cenário político ou técnico da educação brasileira.
Alguns sempre estiveram, como os sindicatos. Outros são mais recentes, mas
adquiriram uma presença forte e que não pode ser desconsiderada.
Sindicatos
Os sindicatos de professores
são uma força inercial, militando contra a modernização do ensino. Além de
bloquear as mudanças, apenas reivindicam mais gastos e menos accountability.
Seu desempenho é perfeitamente previsível. Os autores não conseguiram
identificar casos em que os sindicatos foram agentes de mudança.
Nossos sindicatos parecem
ser menos poderosos do que em outros países mais centralizados do continente.
De fato, em alguns países, são os próprios sindicatos que nomeiam os
professores! Ou até nomeiam ministros!
Seja como for o seu poder,
vis-à-vis outros países, os professores pertencem à categoria que mais fez
greve nos últimos vinte anos. Segundo as pesquisas, ganham de longe dos médicos
e dos policiais. De um lado, as greves mostram a fraqueza dos sindicatos dos
professores que não conseguem ter sucesso nas negociações. Por outro lado,
mostram também sua força de mobilização e a adesão dos pais dos alunos, sempre
favoráveis aos professores. Em meados de 2011, sete estados estavam em greve,
bem como vários municípios. E note-se que as greves eclodem tanto em locais de
baixos como de altos salários.
Os sindicatos patronais
tentam conter a fúria legislativa do MEC, sobretudo no ensino superior. Mas não
conseguem uma voz uníssona e nem disciplinar os descalabros de alguns de seus
próprios membros. Suas relações com o MEC oscilam entre pacíficas e
turbulentas. Mas seus sucessos são bastante modestos.
Imprensa
A imprensa, grande e
pequena, sempre pendeu para noticiar piolhos e desfalques. Mas isso mudou.
Recentemente, a grande imprensa se torna um agente de mobilização social
ponderável e com uma linha editorial mais premeditada. Nos melhores grupos, as
equipes de jornalistas especializados em educação se tornaram mais competentes
tecnicamente. Não obstante, tropeçam frequentemente na interpretação das
estatísticas educativas.
É preciso considerar que o
espaço da mídia devotado para a educação vem crescendo bastante. Esse se tornou
um elemento de grande peso na mudança na opinião pública. Observam-se também
ações incisivas em certos temas.
Opinião pública educada
Esse é um fator de grande
importância. Era quase ausente no passado, mas tem um papel crescente. Para
ilustrar casos extremos, hoje é politicamente inaceitável a falta de vagas no
ensino fundamental.
Houve claras tentativas de
desfigurar o Provão, por parte da presidência do Inep (Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais) na gestão do ministro Cristovam Buarque. É
plausível a hipótese de que essa erosão tenha sido neutralizada pela forte reação
da grande mídia, especialmente a revista Veja.
Vale também registrar uma
nova onda de estudos quantitativos financiados por ONGs. Por exemplo, Instituto
Unibanco, Fundação Victor Civita, Fundação Lemann e Itaú Social têm produzido
pesquisas sobre assuntos importantes, com grande qualidade técnica e boa
divulgação dos resultados.
Não obstante, a
intelectualidade de esquerda, por muito tempo, teve papel negativo, pregando
fatalismo e teorias conspiratórias. Felizmente, perderam seus decibéis nos últimos
tempos. Possivelmente, estão também perdendo seguidores.
As redes sociais apenas
aparecem, em temas educativos. O exemplo mais conhecido é o Twitter da
secretária de Educação do Município do Rio de Janeiro.
Empresariado
O empresariado vem assumindo
um papel cada vez mais forte. Prevalece ainda a ação direta nas escolas
públicas, por parte das fundações empresariais. A melhoria de muitos sistemas
municipais e até estaduais está associada à presença e atuação de algumas
dessas filantropias. Delas vêm ideias modernizantes e técnicas eficazes. Diante
de observadores externos, é razoável afirmar que essa é uma das realizações
mais curiosas no nosso ensino.
Mais recentemente, o
empresariado inicia um papel de advocacy que cresce, mas ainda é modesto. O exemplo
mais conhecido é o Todos pela Educação.
Certamente, essas fundações
empresariais ganham espaço crescente em todas as mídias. São grandes empresas,
com boa capacidade de produzir fatos jornalísticos.
Pais
Dentre todos os fatores que
podemos arrolar, o protagonismo dos pais é o mais decepcionante. De certa forma
é inevitável, pois o descaso pela educação é um atavismo da cultura brasileira,
herdada de um país com mínimas realizações educacionais e um clero algo
obscurantista. A educação, exceto aquela que atende o topo da sociedade, jamais
foi realmente valorizada. Talvez um discurso aqui ou uma promessa ali, mas nada
de muito substancial.
Os pais são herdeiros dessa
tradição de pouco caso pela educação. No fundo, os pais são porta-vozes mudos
da falta de valorização do bom ensino que empapa a cultura brasileira.
Os dados são eloquentes. Os
pais brasileiros, em sua maioria pouco educados, estão satisfeitos com a
educação dos seus filhos. Uma pesquisa recente mostra que 70% acham a escola
boa, a despeito das avaliações mostrarem exatamente o contrário. Os que
discordam são os pais melhor educados, muito pouco numerosos no país.
Os pais educados – que
poderiam ser uma força política importante – põem os filhos em escolas
privadas. Portanto, não são agentes de mudança no sistema público.
No todo, a falta de demanda
por qualidade por parte dos pais é um dos fatores mais sérios que bloqueiam as
mudanças. Suas demandas são por vagas e confortos na escola. Mas como isso está
razoavelmente bem atendido nos dias de hoje, são atores inexpressivos para
melhorar a educação. Nunca vimos, por exemplo, pais de alunos reclamando das
sucessivas greves de professores.
Conclusões?
Temos três níveis de
educação – MEC, estados e municípios. Perguntamos onde está o poder? Para
oferecer uma resposta minimamente satisfatória, distinguimos o poder de fazer
acontecer, o poder de não deixar acontecer e o poder de pautar a opinião
pública.
Falamos também do poder das
instituições e do poder discricionário dos seus incumbentes. Na nossa análise,
essa diferença se revelou importante, pois no nível central os administradores
criam regras (universalistas), mas têm relativamente pouco poder para escapar
delas e agir com critérios particularistas.
Como grande generalização, o
MEC é cada vez mais poderoso. Podemos mesmo falar de um aumento no seu alcance
sobre estados e, mais ainda, sobre municípios. Ou seja, há algum tipo de
recentralização. Contudo, sua influência resulta do impacto da avaliação sobre
os sistemas de ensino ou de linhas de financiamento disponíveis para estados e
municípios. E seguindo uma trajetória benigna que se inicia na década de 1990,
a maioria dos financiamentos são baseados em critérios objetivos e
mecanicamente outorgados. Ou seja, o MEC se torna mais poderoso, mas suas
autoridades têm poderes limitados de alterar os gastos autorizados.
Nos estados, tamanho e
consolidação das estruturas de poder subtraem a capacidade de mandar dos
governadores e secretários de Educação. Ou seja, estados grandes e velhos às
vezes conseguem mudar, mas trata-se de proeza que requer liderança e dedicação
excepcional à causa da educação.
Naturalmente, quanto mais
oligárquica a estrutura política, mais difícil mudar.
Já nos novos estados, há
muito mais espaço de manobra. Se aparece um governador ou secretário
entusiasmado e poderoso, grandes mudanças são possíveis.
Mas com ínfimas exceções, os
estados não mandam na educação dos seus municípios. O sistema não lhes dá
ferramentas hábeis para tal.
O MEC é poderoso, pela via
dos fundos e das avaliações que não são facilmente manipuláveis pelos seus
dirigentes. Em contraste, nos municípios, sobretudo os menores, os prefeitos
podem tudo – e os secretários de Educação tendem a ser figuras menores. Nessas
cidades, há pouca burocracia – não que isso seja necessariamente uma virtude.
Os grupos de interesse são menos organizados e aos sindicatos tende a faltar
massa crítica.
Se há liderança, se há
vontade política, se o clima de opinião do município vê educação com bons
olhos, ali estão os desempenhos mais superlativos. Alguns têm níveis de OCDE
nas avaliações acadêmicas.
Mas se é verdade que os
prefeitos podem mandar e o fazem para o bem, o oposto também acontece, mandam
para o mal. Os piores exemplos de clientelismo estão nos municípios. Os piores
desempenhos estão também nos municípios menores.
Igualmente, no microcosmo da
escola, o resultado parece ser especialmente vinculado à figura do diretor,
sobretudo nas redes estaduais. Nos municípios pequenos, o poder do diretor é
menor, pois dependem diretamente do secretário e do prefeito.
Se tem entusiasmo e
liderança, tudo é possível, mesmo diante de um ambiente hostil e de regras
burras. A mesma incapacidade das secretarias para fiscalizar os desmandos pode
ser usada por um bom diretor para descumprir regras imbecis.
Resumindo ainda mais, no
nível central mandam as regras objetivas e universalistas. E quanto mais local
o nível, mais depende de pessoas, de lideranças, de decisões discricionárias,
seja para melhorar, seja para usar a escola como TERRENO de manobra do mais vil
clientelismo. E quanto menor, mais fácil mudar.
Resta falar do entorno da
escola e de suas burocracias. O que se pode e o que não se pode fazer é
influenciado pelo clima de opinião do momento ou das normas vigentes. Os
próprios políticos e administradores são fruto dessa complexa rede de valores e
atitudes. Além disso, e não menos importante, auscultam os humores da sociedade
ANTES de decidir ou decidir não decidir.
Tradicionalmente, os
sindicatos de professores são uma força inercial para todas as mudanças que não
sejam de salários maiores para todos. Seu poder de bloquear mudanças ainda é
grande, mas os resultados das greves tendem a ser pífios. Nada de novo nesse
aspecto.
Igualmente, nada de
novidades do lado dos pais de alunos. Continuam passivos, exceto se não houver
vaga, problema hoje resolvido.
A grande transformação
recente é a presença de outros grupos da sociedade civil. O empresariado inovou
em muitas linhas de atuação direta nas escolas públicas. Os recursos da
filantropia empresarial para a educação tornaram-se muito substanciais. No caso
das grandes empresas, tendem a ser dirigidos a programas com bom impacto.
Recentemente, empresas começam a esquentar os motores para um movimento de
advocacy mais consistente.
Também a imprensa passou a
se preocupar com os reais problemas da educação e menos com o piolho nas
escolas. No caso da grande imprensa, sua participação hoje é valiosa.
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