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domingo, 6 de dezembro de 2020
quinta-feira, 3 de dezembro de 2020
quarta-feira, 2 de dezembro de 2020
O QUE PORTO FELIZ TEM A ENSINAR AO BRASIL O sucesso de uma administração que foi contra o 'lockdown'
REVISTA
Quase uma unanimidade. O prefeito de uma pacata cidade no interior paulista foi reeleito com 92% dos votos válidos nestas eleições municipais. O segredo para o sucesso nas urnas? Pelo menos no quesito “crise sanitária”, fazer tudo ao contrário do que pregou a gestão do Estado de São Paulo e da maior parte dos governos estaduais e municipais no país.
Porto Feliz, cidade de pouco mais de 50 mil habitantes localizada na região metropolitana de Sorocaba (SP), é administrada desde 2017 pelo médico Antônio Cássio Habice Prado (PTB), de 61 anos, responsável por adotar um posicionamento inovador frente à pandemia. O médico entendeu que para conter os avanços da covid-19 era preciso agir rápido. E mais, agir com a lógica que permeia a medicina: como em todo e qualquer tratamento, a intervenção precoce em uma doença pode evitar mortes.
Em vez de apostar na rigidez do isolamento social para regular a sociedade, Prado foi na contramão das políticas de gabinete e optou por políticas públicas de saúde no enfrentamento da covid-19. Formado pela Universidade de São Paulo e com especialidade em cirurgia geral, gastrocirurgia e UTI, o médico já trabalhou em diversos hospitais tanto em Porto Feliz quanto em outras cidades do interior paulista, e ajudou a fundar a UTI da Santa Casa do município de Capivari. Casado com uma médica, é pai de dois filhos e começou na vida pública em 2001, quando foi secretário de Saúde do município na gestão de Erval Steiner (PL). Em 2016, já filiado ao PTB, candidatou-se pela primeira vez a um cargo público e venceu a eleição para a prefeitura de Porto Feliz.
A cidade, situada a 100 quilômetros da capital paulista, ficou famosa no Brasil inteiro por oferecer à população um tratamento gratuito que, pelo número de casos e mortes registrados até o momento, tem se mostrado eficaz e seguro. Mas não só da “fama da covid-19” vive Porto Feliz. A cidade, que contou com o trabalho de imigrantes belgas nas lavouras no século 19 e chegou a receber a visita do imperador dom Pedro II em 1846, também foi considerada o quinto município mais bem administrado do país, segundo o Índice CFA de Governança Municipal divulgado em 2019, que avalia critérios como finanças, gestão e desempenho. É ainda uma das cem cidades mais desenvolvidas do Brasil, de acordo com Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal.
Experiência no tratamento precoce
Ainda no final de fevereiro, enquanto muitas prefeituras centralizavam esforços nos dividendos das festas de Carnaval, Prado reuniu o secretário da Saúde e o time de profissionais da cidade para organizar as estratégias de combate ao novo coronavírus. A ação foi baseada nos protocolos médicos aplicados em países da Europa e começou a ser adotada nas chamadas Unidades Sentinelas — unidades de saúde utilizadas para receber e avaliar pacientes com sintomas da doença. “Desde 28 de março, quando foi confirmado o primeiro caso na cidade, nós começamos com o tratamento precoce de todos os pacientes com sintomas leves da covid-19”, diz Prado.
Do lado de fora dos postos de saúde de Porto Feliz, tendas ao ar livre foram montadas para que a população pudesse aguardar atendimento em ambiente arejado e sem aglomeração. Aos primeiros sintomas, os pacientes da rede pública de saúde recebem atendimento médico, realizam eletrocardiograma, coleta de sangue e tomografia do pulmão. Após a bateria de exames, conforme prescrição médica, recebem um kit com medicamentos que incluem o vermífugo ivermectina, o antibiótico azitromicina e a hidroxicloroquina — o kit é chamado de Protocolo de Tratamento Precoce (PTP). O tratamento não é compulsório. “Todas as pessoas que entraram no PTP são acompanhadas diariamente por equipe médica e de enfermagem, além de receber telemonitoramento da equipe sentinela e da vigilância epidemiológica. Todos fazem eletrocardiograma antes e o realizam novamente, a critério médico”, destaca a prefeitura, em nota.
Além da distribuição gratuita de mais de 1.500 kits, outra medida adotada foi a profilaxia intradomiciliar, para evitar a disseminação viral. Assim, não apenas o paciente infectado é tratado, mas também os contactantes, ou seja, pessoas que tiveram contato com pacientes contaminados pela covid-19. Os profissionais de saúde também tomaram a medicação como medida preventiva. Ainda, testou-se a profilaxia de moradores em um bairro da cidade. “Demos ivermectina para toda essa quadra, perto de 290 moradores. Nas quadras ao redor, houve casos de covid-19; nessa quadra, nenhum caso”, conta Cássio Prado, em live promovida pelo jornalista Alexandre Garcia e pelo grupo de médicos Covid-19 – DF no mês de junho. A prefeitura também disponibilizou alojamentos para os profissionais de saúde que atuam na linha de frente da rede pública. Assim, médicos e enfermeiros que não querem retornar para casa podem usar o espaço, minimizando o risco de contaminação de familiares. Na dianteira, Porto Feliz foi uma das primeiras cidades a exigir o uso de máscara, ainda no fim de março.
Já em São Paulo, cidade com 12 milhões de habitantes, o prefeito Bruno Covas (PSDB) penou para definir medidas que, ou foram logo abandonadas em questão de dias por absoluta ineficiência, ou foram tomadas tardiamente, agravando os efeitos da pandemia. Ou, pior ainda, nem sequer foram implementadas. A campanha #FiqueemCasa e #trancatudo não evitou a morte de mais de 14 mil pessoas só na cidade de São Paulo até o momento. Gastaram-se milhões de reais na construção de hospitais de campanha, na montagem de leitos de UTI e na compra de respiradores — medidas importantes para equipar o sistema de saúde, sem dúvida. Mas, não se sabe se por questões político-ideológicas, o investimento na intervenção precoce no tratamento de pacientes com covid-19 não foi prioridade na cidade epicentro da pandemia no país.
Cássio Prado não está sozinho
Porto Feliz foi agraciada pela combinação de um gestor público com formação em medicina bem quando a maior pandemia do século atingiu o país. Não é o único prefeito com essa credencial, mas certamente um dos poucos que enfrentaram as críticas para pôr de pé um conjunto de medidas a fim de evitar o colapso no sistema de saúde e combater o vírus.
Entretanto, Cássio Prado não está sozinho. Há diversas iniciativas de médicos em todo o país defensores do tratamento precoce. É o caso do Médicos pela Vida, grupo formado por 43 profissionais de saúde de diferentes especialidades e do Covid-19 – DF, idealizado pela médica Carine Petry e constituído por 296 pessoas. Há também o movimento Médicos contra a Covid-19, que afirma reunir 10 mil profissionais de saúde no Brasil e que se comunica por meio de aplicativos para trocar informações sobre o tratamento contra o coronavírus a partir da experiência clínica de cada um no atendimento aos pacientes. Em comum, todos acreditam que o tratamento precoce salva vidas. “O tratamento precoce é como uma queda de avião. Quanto mais rápido você abrir seu paraquedas, mais chance vai ter de sobreviver”, afirmou a Oeste Alessandro Loiola, médico formado pela Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória. “Por isso, é importante iniciá-lo quando o paciente apresenta os sintomas da covid-19, que ocorrem nos primeiros três dias depois da infecção. Essa é a hora em que será possível salvar quase 100% das pessoas”, explicou Loiola.
Paulo Zanotto, virologista e professor no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, assegura que o tratamento precoce salva vidas, pois evita a chamada tempestade inflamatória. “[Depois que os médicos aprenderam a lidar com o vírus,] ocorreu redução de mortalidade em relação ao número total de casos”, explicou, ao mencionar que mais pessoas poderiam ter sobrevivido, se parte da comunidade médica não ignorasse o potencial da hidroxicloroquina e de outras drogas por causa de paixões políticas. “Remédios passaram a ser vinculados a políticos e não à ciência, o que é um absurdo. O país vive uma polarização intensa. E isso prejudicou seriamente a saúde”, observou Zanotto.
Apesar das evidências de que medicamentos como a ivermectina e a hidroxicloroquina funcionam para deter o avanço do coronavírus, os estudos ainda são inconclusivos por não ter havido tempo para cumprir os protocolos exigidos pela ciência. Mas, em tempos excepcionais, o prefeito de Porto Feliz resolveu apostar no tratamento precoce, e o resultado da gestão da crise sanitária traduz-se em números: até o momento, o município registra 2.308 casos confirmados, 2.270 curados e 15 mortes decorrentes da covid-19. Na cidade de São Paulo, mais de 14 mil pessoas morreram por conta da covid-19. Relativamente, se a cidade do interior paulista tivesse os mesmos 12 milhões de habitantes da capital, o saldo de mortes seria de 3.396 pessoas. Ou seja, a gestão de Cássio Prado mostrou-se quatro vezes mais eficaz que a de Bruno Covas no que diz respeito ao combate à pandemia.
Lockdown não é a solução
A estratégia de Covas e de tantos outros prefeitos país afora baseou-se em provar que o confinamento da população iria deter a epidemia. Oito meses se passaram e mais de 166 mil vidas foram ceifadas no Brasil. Estudo do banco norte-americano J. P. Morgan divulgado em junho mostrou que os lockdowns não conseguiram alterar o curso da pandemia. Afinal, o confinamento não faz o vírus desaparecer, apenas evita que várias pessoas fiquem doentes ao mesmo tempo, sobrecarregando o sistema de saúde.
Em meio às notícias de aumento no número de casos da covid-19 no Brasil, o momento é de cautela. O relaxamento de medidas como o uso de máscara e álcool em gel, a lavagem das mãos e o distanciamento social pode estar por trás do crescimento de internações em razão da doença, principalmente nas redes privadas de saúde de São Paulo. Embora o termo “segunda onda” esteja em alta por aqui, especialistas consideram que a expressão é pouco técnica, porque ela requer que se defina quando acabou a primeira, o que não é consenso. Muitos profissionais de saúde acreditam que o Brasil nem mesmo passou da primeira onda. Mas está clara a mudança no rumo de uma pandemia que estava se desacelerando, e já não está mais. Isso mostra que, muito provavelmente, o coronavírus veio para ficar.
Enquanto uma vacina capaz de imunizar a população não chega ao mercado, será preciso combater o vírus chinês com as armas disponíveis. O exemplo de Porto Feliz indica que o caminho pode estar no investimento do tratamento pré-hospitalar como modo de atacar a doença em suas fases iniciais, evitando a progressão para as formas graves, que são mais custosas para o sistema de saúde, além de minimizar o risco de morte do paciente. A população local respondeu com o voto o que achou da gestão municipal no combate ao coronavírus. O desafiante do prefeito reeleito nestas eleições, com 5,70% dos votos, chama-se Marola e só fez isso mesmo: marola.
Sobre o tema, leia também:
“A verdade sobre a CoronaVac”
“O erro do lockdown“
terça-feira, 1 de dezembro de 2020
sábado, 28 de novembro de 2020
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