terça-feira, 19 de setembro de 2023

A (in)eficácia das medidas sócio-educativas do ECA | Jusbrasil Publicado por Eunice Barros



RESUMO: O presente artigo tem por objetivo geral compreender a problemática da (in) eficácia na aplicabilidade das medidas socioeducativas sob à ótica da Lei 8.069/90, intitulada de Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). A princípio, é importante entender o ECA, bem como, o SINASE (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo), levantando questões a respeito das suas aplicações, apontando a finalidade de tais medidas e a apresentando dados estatísticos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para posteriormente compreender não só as suas contribuições mais relevantes, bem como seus avanços, e diante disso, entender suas colaborações sociais e culturais, uma vez que uma lei, por si só não dispõe de mecanismos capazes de sanar nenhum tipo de problema de caráter educacional, conforme o entendimento socioeducativo. Quanto à metodologia, foram utilizados para este trabalho os procedimentos de pesquisa bibliográfica.

Palavras-chave: Adolescente. Criança. ECA. Educar. Punir.

Introdução

A Lei 8.069/90 intitulada de Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), foi um marco legislativo na ordem jurídica brasileira. Nela estão dispostas as medidas socioeducativas, as quais foram propostas pelo legislador como instrumentos a serem aplicados aos adolescentes que praticarem ato infracional.

Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, prevê seis modalidades socioeducativas, a saber: advertência, reparação do dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semi-liberdade e internação. O objetivo era não só proteger as crianças e adolescentes, mas tratá-los como sujeitos de direitos.

Ocorre que, infelizmente na prática, muitos equívocos ocorrem e as medidas que a priori deveriam ter uma caráter educativo e pedagógico, acabam tendo um caráter sancionatário e punitivo.

Dessa forma, o objetivo geral deste trabalho consiste em expor e compreender a problemática a (in) eficácia na aplicabilidade das medidas socioeducativas sob à ótica da Lei 8.069/90, intitulada de Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).

Quanto aos objetivos específicos são: a) refletir os aspectos controversos da referida lei; b) analisar o papel do Estado em ressocializar efetivamente, como proposto na legislação em comento; c) compreender como o Sistema Nacional de Atendimento Sócio-educativo (SINASE) altera o ECA.

Quanto à metodologia, foram utilizados para este trabalho os procedimentos de pesquisa bibliográfica, utilizando como fonte de pesquisa materiais que foi elaborado por outros autores, interligando-os com a discussão do tema trabalho, ou seja, para alcançar os objetivos propostos para este estudo, bem como, para respaldar a fundamentação teórico-metodológica, realizou-se uma pesquisa bibliográfica em livros, dissertações, teses e periódicos nacionais e internacionais, sendo o acesso aos documentos obtidos por meio de bibliotecas locais ou na internet, em bibliotecas digitais e bases de dados científicas.

Este artigo se justifica por conta de sua relevância socioeducativa, pelo compromisso ético que todo agente do direito precisa ter com a justiça e pela busca incessante por melhoria do sistema socioeducativo, para oferecer um mundo melhor a população infanto-juvenil.

Esta pesquisa está dividida em seções. Sendo assim, na primeira seção é apresentado um panorama histórico das legislações do menor, dando destaque ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), por ser objeto de estudo deste trabalho e perpassando pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE).

Na segunda seção é exposta a diferença entre a medida protetiva e medida socioeducativa, apontando a finalidade de tais medidas e explanando sobre as seis medidas socioeducativa elencadas no ECA, foco deste estudo.

Na terceira seção é explanado sobre a (in) eficácia das medidas socioeducativas, expondo os pontos controversos no que tange à sua aplicabilidade. E por fim, são feitas as considerações finais.

1 Panorama Histórico

Ao longo da história muitas legislações demonstraram preocupação e cuidado com os menores. A preocupação com os as crianças, jovens e adolescentes vem dos tempos mais remotos.

Para compreensão dos momentos históricos da educação é importante a contextualização com o fenômeno existente, e essa regra não é diferente quando se trata das políticas públicas para crianças e adolescente em conflito com a lei. Sendo assim, neste trabalho serão apresentadas as legislações do menor, mediante uma contextualização histórica.

Em 1808 no período colonial, o sistema jurídico em vigor no Brasil, era o mesmo que vigorava em Portugal. No âmbito do Direito Penal, as Ordenações Filipinas.

De acordo com as Ordenações Filipinas, a imputabilidade penal iniciava-se aos sete anos, eximindo-se o menor da pena de morte e concedendo-lhe redução da pena. Entre dezessete e vinte e um anos havia um sistema de "jovem adulto", o qual poderia até mesmo ser condenado à morte, ou, dependendo de certas circunstâncias, ter sua pena diminuída. A imputabilidade penal plena ficava para os maiores de vinte e um anos, a quem se cominava, inclusive, a pena de morte para certos delitos (SOARES, 2003, p. 2).

As ordenações, assim como as demais legislações penais europeias, traziam em seu texto o peso dos suplícios e das penas desmesuradas contra o apenado, demonstrando praticamente a falta de equilíbrio entre o delito e a pena.

Neste período, aqueles que cometiam crimes dos 17 anos aos 21 anos de idade ficaria a critério do julgador a aplicação ou não da pena de morte, no caso de cometimento de algum crime, aos 21 anos atingia-se a imputabilidade penal plena, na qual se aplicava a pena de morte a depender do delito cometido.

Em 1830 surge o primeiro código penal brasileiro, o qual inovou a legislação pátria com a realização de avaliações sobre o discernimento dos menores infratores de 14 anos, os quais, em regra geral, não poderiam ser julgados criminosos, conforme artigo 13. Dispunha, que os crimes cometidos por menores de quatorze anos de idade, seriam entendidos como atitude consciente e com discernimento e sendo assim, deveriam “ser recolhidos às casas de correção, pelo tempo que ao Juiz parecer, com tanto que o recolhimento não excedesse a idade de dezessete anos”.

O código apresentava a aplicação de sanções mais flexíveis a esta faixa etária, com a implementação de atenuantes, conforme, artigo 18 que expunha as circunstâncias atenuadoras. “Quando o réu for menor de dezessete anos, e maior de quatorze, poderá o Juiz, parecendo-lhe justo, impor-lhe as penas da cumplicidade. 10. Ser o delinquente menor de vinte e um anos”.

Neste período a criança deixa de ser meramente um objeto de sua família e passa a ser motivo de preocupação do Estado, podendo este, inclusive, intervir na sua higiene e saúde, tanto física quanto mental. Sendo assim, o Estado com um aparato médico-jurídico-assistencial, objetiva cumprimento das funções de prevenção, educação, recuperação e também repressão.

Em 1890, depois da Proclamação da República é promulgado o Código Penal Republicano, também conhecido como Código Penal dos Estados Unidos do Brasil – Decreto nº 847 – o qual estabelecia:

Art. 27. Não são criminosos: § 1º. Os menores de 9 anos completos. § 2º. Os maiores de 9 anos e menores de 14, que obrarem sem discernimento.
Art. 30. Os maiores de 9 anos e menores de 14, que tiverem obrado com discernimento, serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriais, pelo tempo que ao juiz parecer, com tanto que o recolhimento não exceda à idade de 17 anos (SOARES, 2003, p. 8).

Porém, na falta da Casa de Correção ou da Instituição Disciplinar Industrial, as crianças, na época identificadas como menores, eram lançadas nas prisões dos adultos o que ensejava em deplorável promiscuidade.

Código Penal de 1890, foi o pioneiro em classificar biologicamente, conforme idades. A classificação biológica, fica da seguinte maneira: Infância: tinha seu término em 9 anos; Impuberdade: durava dos 9 aos 14 anos; Menoridade: dos 14 aos 21 anos incompletos; Mairoridade: a partir dos 21 anos completos.

Porém, o referido código foi muito criticado e considerado um retrocesso em relação ao Código Penal de 1830, uma vez que rebaixou a idade penal de 14 para 9 anos de idade, num momento em que se discutia a importância de se evitar a punição aplicada à crianças e adolescentes.

No final do século XIX, o Estado já na República Velha enfatizava modernizar a economia e focava no trabalho formal, começou a se preocupar com o futuro da nação: as crianças (FERREIRA, 2009).

O Estado criou em 7 de setembro de 1913 a primeira instituição destinada aos menores abandonados, cuja finalidade era disciplinar os menores para voltar ao mercado de trabalho, então, foram criados locais onde o menino aprendia uma profissão.

Em 1921 houve importantes mudanças com o advento da Lei nº 4242, de 5 de janeiro, que oportunizou transformações na responsabilização criminal, bem como melhorias no amparo à infância brasileira. Uma das mudanças que se destaca é a extensão da inimputabilidade para 14 anos de idade.

O menor de 14 anos, indigitado autor ou cúmplice de crime ou contravenção, não será submetido a processo de espécie alguma e que o menor de 14 a 18 anos, indigitado autor ou cúmplice de crime ou contravenção será submetido a processo especial (REBELO, 2010).

Com a Lei n.º 4.242/1921, houve relevantes melhorias na proteção dos menores, bem como na aplicação das penas destinadas a estes.

Em 12 de outubro de 1927, o Decreto n.º 17943-A, surge o primeiro Código destinado aos menores da América Latina, intitulado de Código de Mello Mattos, cujo titular foi o Magistrado José Cândido Albuquerque Mello Mattos. Junto com criação do juizado eis que surge a ideia de adotar medidas, que apesar de não terem as garantias de devido processo legal, misturava assistencialismo com um “ideal” de justiça, para um saneamento moral de justiça.

E como fruto dessa experiência, e em função do debate acerca da delinquência juvenil, instituiu-se o Código de Menores por meio do Decreto Federal 17.943 de 12 de outubro de 1927. Tendo em vista a importante participação do juiz na elaboração da lei, o Código ficou conhecido como Código de Mello Mattos (SHECAIRA, 2008, p. 35).

Em 1927, o 1º Código de Menores muda a idade mínima para 18 anos, proíbe a "Roda dos Expostos", cria a "escola de preservação para delinquentes" e a "escola de reforma para o abandonado".

Na época, o código de menores estava mais focado em tratar os abandonados e os que cometiam infração.

Enfim, o código de menores se dedicou apenas a controlar e disciplinar os delinquentes e os abandonados, não se comprometendo com a prevenção e fomentação de nenhum tipo de direito aos menores.

No entanto, o código de menores foi um marco para a preocupação da sociedade com as crianças e um visionário diante da evolução das políticas públicas que vigora hoje (PERRI, 2010, p. 15).

A nomenclatura “de menor”, passa a ser associada à imagem de uma criança pobre e potencialmente perigosa.

Com o Decreto-Lei n.º 2848, de 7 de dezembro de 1940, entrou em vigor o Código Penal o qual, entre outras mudanças, foi o responsável por uma nova etapa na questão da inimputabilidade criminal no Direito pátrio, estipulando a idade em 18 anos.

No período de 1937 a 1945, conhecido como período do Estado Novo e marcado pelas políticas sociais no país, especificamente em 1942, é criado o Serviço de Assistência ao Menor – SAM.

O atendimento do SAM (Serviço de Assistência ao Menor) criado para dar assistência aos menores, com o passar do tempo, foi muito criticado pela sociedade, pela sua ineficácia na reinserção do menor e os maus tratos causados a estes. Então o modelo de correção deste atendimento se tornou defasado, em função das constantes denúncias (COSTA, 2009, p.48).

Importante destacar, que em 1959 a ONU (Organização das Nações Unidas) organiza a Declaração do Direitos da Infância.

Em 1964, depois do Golpe Militar e do governo de Castelo Branco, foi criada a FUNABEM (Fundação Nacional para o Bem Estar do Menor) que era embasada na lei 4.513, de 1º de dezembro de 1964.

A Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor tinha como objetivo formular e implantar a Política Nacional do Bem Estar do Menor, herdando do SAM prédio e pessoal e, com isso, toda a sua cultura organizacional. A FUNABEM propunha-se a ser a grande instituição de assistência à infância, cuja linha de ação tinha na internação, tanto dos abandonados e carentes como dos infratores, seu principal foco (PERRI, 2010, p.16).

A cultura institucional da FUNABEM no compasso da abertura política e da luta pela redemocratização do país, passou a ser questionada.

Em 1979 é instituído o Código de Menores, ocorrendo assim o segundo momento da etapa tutelar no Brasil. Tratando-se, portanto, de uma revisão do código de 1927.

Decretado pela Lei nº 6.697, em 10 de outubro de 1979, sob domínio do regime militar, entrou em vigor o segundo Código brasileiro destinado aos menores de idade.

Foi também muito criticado, primeiramente por não diferenciar menor pobre de delinquente, depois por conta da atuação dos Juízes de Menores ter se ampliado, e, dessa forma, não se dividia a atuação com outras esferas da sociedade e da administração pública, ficando a cargo do juiz toda a condução inclusive pedagógica, que não é o campo de atuação de um juiz de direito. Ademais, o Código de Menores tinha um caráter único e exclusivamente punitivo.

O momento de culminância na evolução histórica no que tange à legislação brasileira do menor, acontece com a promulgação da Constituição Federal de 1988, e posterior regulamentação da Lei 8.069/90, que criou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

As leis brasileiras anteriores à Constituição Federal de 1988 emprestavam ao menor uma assistência jurídica que mais pareciam penas disfarçadas em medidas de proteção; não havia direito efetivo, a não ser sobre a assistência religiosa; não existia um trabalho de suporte à família; cuidavam da situação irregular da criança e do jovem, que, na verdade, eram seres privados de seus direitos. Na verdade, em situação irregular estão à família, que não tem estrutura e que abandona a criança, o pai, que descumpre os deveres do pátrio poder; o Estado, que não cumpre as suas políticas sociais básicas; nunca a criança ou o jovem.

constituição Federal adere a proteção integral, expressa especialmente em seu artigo 227. A imputabilidade penal foi mantida em 18 anos de idade e, no ano de 1990, foi promulgada a Lei 8.069/90, denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O critério adotado pelo legislador, protegendo a pessoa até os dezoito anos, foi baseado no art. 1º da Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 26/01/1989, assinada pelo governo brasileiro em 26/01/1990. A responsabilidade penal também encontra respaldo no art. 228 da Constituição Federal de 1988, bem como no art. 27 do Código Penal Brasileiro (NASCIMENTO, 2008, p. 25).

Exatamente em 13 de julho de 1990, estabelecido pela Lei n.º 8.069, nasce o Estatuto da criança e do Adolescente, e as crianças e adolescentes, as quais passam a ser sujeitos de direitos.

Na Doutrina da Proteção Integral dos Direitos, as crianças passam a ser definidas de maneira afirmativa, como sujeitos plenos de diretos. Já não se trata de “menores”, incapazes, meias-pessoas ou incompletas, senão de pessoas cuja única particularidade é a de estar em desenvolvimento. Por isso lhes reconhecem todos os diretos que têm os adultos mais diretos específicos por reconhecer-se essa circunstância evolutiva (SARAIVA, 2010, p.24).

O princípio da condição peculiar da pessoa em desenvolvimento mostra, que a criança e o adolescente por ainda estar em uma fase de desenvolvimento, encontra-se em condições peculiares, o que acarreta em um tratamento especial, tendo os direitos dos adultos como também privilégios a mais, isso para manter condições para o seu desenvolvimento, garantindo, por exemplo, ensino e profissionalização.

ECA representa um marco divisório extraordinário no trato da questão da infância e juventude no Brasil, através da doutrina da proteção integral, veio substituir o velho paradigma da situação irregular que vigia no antigo Código de Menores (Lei 6.697/79), promovendo mudanças de referenciais, com reflexos inclusive no trato da questão infracional (SILVA, 2011, p, 1).

Insta salientar, a diferença entre criança e adolescente. Tal diferenciação, inclusive, é apresentada pelo art. 2º da lei em comento: “Considera -se criança, para efeitos desta lei, a pessoa de doze anos de idade incompletos, e adolescente, aquele entre doze e dezoito anos de idade”.

Ou seja, criança, até 12 anos de idade, e adolescente, até os 18 anos de iadde, são então definidos como “pessoas em fase de desenvolvimento”, foram banidas as expressões estigmatizantes de “menor”, “infrator”, “carente”, “abandonado”, crianças e adolescentes em situação de risco. O doutrinador Nascimento, a despeito deste assunto, explana que:

ECA não se restringe ao menor em situação de risco, visa principalmente a proteção integral à criança e ao adolescente. A proteção integral há de ser entendida como aquela que abrange as necessidades de um ser humano para o pleno desenvolvimento de sua personalidade. Assim, às crianças e aos adolescentes devem ser prestadas a assistência material, moral e jurídica, cujo 24 objetivo, como está expresso, é prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade (NASCIMENTO, 2008, p. 24).

Sendo assim, toda assistência deve ser, de preferência, ofertada no seio de sua família, se possível à biológica (arts. 25 a 27ECA). Caso não seja possível, numa família substituta (arts. 28 a 52ECA).

Insta salientar, que há três sistemas considerados basilares para sustentação do Estatuto da Criança e do Adolescente, a saber:

I. Sistema primário – que trata das Políticas Públicas de Atendimento a criança e ao adolescente;

II. Sistema secundário – que cuida das medidas protetivas de crianças e adolescentes em situação pessoal ou social, enquanto vítimas que têm direitos violados;

III. Sistema terciário – que trata das medidas sócio-educativas, aplicáveis aos adolescentes em conflito com a lei que passam à condição de vítimas.

O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), é destinado a regulamentar a forma como o Poder Público. Foi originalmente instituído pela Resolução nº 119/2006, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), e foi recentemente aprovado pela Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, que trouxe uma série de inovações no que diz respeito à aplicação e execução de medidas socioeducativas a adolescentes autores de ato infracional.

Ou seja, quando um adolescente comete um ato infracional e, após o devido processo legal, recebe uma medida socioeducativa, esta deve estar em conformidade com a Lei 12.594/2012.

O programa determinou um conjunto de diretrizes que almeja, a padronização dos procedimentos jurídicos relacionados aos crimes praticados por menores, regulando desde a apuração do ato infracional até a aplicação das medidas socioeducativas, de acordo com os princípios de direitos humanos e em consonância com a Constituição Federal de 1988 e com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O SINASE é dirigido pela União e integrado pelos sistemas estaduais, distrital e municipais encarregados de executar os programas de atendimento a adolescente ao qual seja aplicada medida socioeducativa.

A Lei 12.594/2012 determinou, expressa e peremptoriamente, a responsabilidade de cada ente público, a saber:

A União cabe a formulação e coordenação da política nacional de atendimento socioeducativo; aos Estados cabem não só criar, mas manter os programas para as medidas de semiliberdade e internação; aos Municípios também criação e manutenção dos programas para as medidas socioeducativas só que em meio aberto.

Insta salientar, que conforme o art. 85 da lei supracitada, a não transferência de programas de atendimento para os devidos entes responsáveis, no prazo determinado em lei, ensejará em interdição do programa bem como será caracterizado ato de improbidade administrativa do agente responsável. Além disso, cabe ao Poder Judiciário e ao Poder Executivo municipal, ao final do referido prazo, a realização de despesas para a sua manutenção.

ECA rompeu juridicamente com “política de menorização”, em vigor há quase um século, moldada dentro de uma ótica repressiva de internação e confinamento, prevendo uma participação ativa da comunidade organizada na formulação das políticas e no controle das ações das instituições públicas de assistência e proteção.

2 Medidas sócio-educativas no Brasil.

Por uma questão didática, para abordar sobre medidas socioeducativas, antes abriremos um espaço para tecer algumas linhas sobre as medidas protetivas, a fim de diferenciá-las das medidas socioeducativas as quais são objeto deste trabalho.

As medidas protetivas estão previstas no ECA nos artigos 98 ao 102. Serão aplicados em caso de ameaça, violação aos direitos, ação ou omissão da sociedade ou Estado, falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis, bem como por própria conduta, da seguinte maneira:

a) encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; b) orientação, apoio e acompanhamento temporários; c) matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; d) inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; e) requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; f) inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos.

As medidas protetivas, como o próprio nome diz, têm cunho educativo e se propõem “a fazer cumprir os direitos da criança e do adolescente por aqueles que os estão violando, sejam eles os pais ou responsáveis, a sociedade ou o Estado” (LIBERATI, 2012).

O artigo 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente regula a aplicação das medidas de proteção, salientando que são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos na mencionada lei forem ameaçados ou violados.

I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III - em razão de sua conduta.

Sendo assim, as medidas de proteção objetivam, precipuamente, a preservação ou a recomposição dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes.

Quanto ao ato infracional, trata-se de um ato ilícito, praticado por criança ou adolescente, e diz respeito a um crime ou contravenção. Insta salientar, que as medidas protetivas só podem ser aplicadas nos casos em que o agente do ato infracional for criança.

No que diz respeito às medidas socioeducativas, o ECA apresenta seis medidas, destinadas aos jovens em situação de risco, as quais são aplicadas aos adolescentes infratores. O objetivo é recuperar o jovem de sua condição, após devido processo legal.

Importante frisar, que não se trata de punição, mas reeducação. O objetivo é possibilitar um conjunto de condições que possam viabilizar ao adolescente, com base no respeito à sua condição de sujeito de direitos, a ter uma vida digna, com respeito à sua comunidade, sendo protagonista de uma cidadania baseada na paz, despertando o adolescente para a sua responsabilidade social, libertando-o da marginalização e reinserindo-o na sociedade.

Para o adolescente autor de ato infracional a proposta é de que, no contexto da proteção integral, receba ele medidas socioeducativas sem punições com tendência interferir no seu processo de desenvolvimento, visando melhoria da compreensão e entendimento da realidade e, portanto, efetiva integração social.

Sobre as medidas socioeducativas o artigo 112 da Lei 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente, disciplina que são sete, ilustradas na tabela a seguir: advertência, obrigação de reparar o dano; prestação de serviços à comunidade; inserção em regime de semiliberdade; liberdade assistida;

Como dito anteriormente em outras palavras, apenas aos adolescentes são aplicadas medidas socioeducativas. Caso uma criança pratique um ato infracional poderá ser aplicada apenas medida (s) protetiva (s).

A política de atendimento ao adolescente em conflito com a lei, é de responsabilidade do Estado e deve obrigatoriamente, garantir as condições (art 94) de ações que visem o fortalecimento dos vínculos familiares de modo a garantir ao adolescente acesso a oportunidades que lhe proporcionem superar sua condição de exclusão e construir valores positivos de participação na vida familiar e social (BRASIL, CF 1988).

A aplicação e execução dessas medidas é garantia do respeito aos direitos humanos. Infelizmente, muitos são os equívocos que permeiam a aplicação e a execução das medidas socioeducativas, muitas são as violações.

As medidas sócio-educativa são respostas da sociedade para o adolescente infrator, porém, nesta resposta precisa prevalecer o caráter sociopedagógico, ou seja, ir além da punição, objetiva a recuperação, evitando a reincidência.

Abaixo segue tabela ilustrativa comparativa (não perfeita), da Lei 12.594/2012 teria função semelhante à que é desempenhada pela Lei 7.210/84 Lei de Execução Penal (LEP) aos adultos.

Importante destacar, que o ECA separa as medidas socioeducativas em dois grupos: o primeiro, das medidas em meio aberta, não privativas de liberdade (advertência, reparação do dano, prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida) e o segundo, das medidas privativas de liberdade (semiliberdade e internação). Essas medidas estão previstas no Capítulo IV, nos artigos 112 a 130 do Estatuto. Sendo assim, o artigo 112. Do ECA dispõe que: “Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente medidas”

Por conta do objetivo de proteção integral e reinserção à sociedade, utiliza-se de métodos pedagógicos, psiquiátricos e psicológicos, na execução das penas. A despeito da finalidade pedagógica, Saraiva elucida:

A sanção socioeducativa tem finalidade pedagógica, em uma proposta de sócio-educação. Não há, porém, sendo sanção, deixar de lhe atribuir natureza retributiva, na medida em que somente ao autor de ato infracional se lhe reconhece a aplicação (SARAIVA, 2010, p. 65).

No que tange a natureza jurídica, as medidas socioeducativas possuem natureza sancionatória, impositiva e retributiva, mas cumprem um papel presidido pelo princípio educativo.

ECA em seu artigo 115, dispõe que: “Art. 115. A advertência consistirá em admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada.”

A imposição desta medida poderá ocorrer de maneira individual, quando somente um adolescente comete o ato infracional, ou de forma coletiva, quando o delito é cometido por um grupo de menores. Em ambas as situações, o juiz irá advertir os menores e impor limites acerca de suas ações, sempre com caráter pedagógico.

Sendo assim, a medida da advertência, diz respeito a repreensão verbal aplicada pela autoridade judicial que deverá ser reduzida a termo e assinada. A medida de advertência é aplicada e executada pelo próprio Juiz da Infância e Juventude. Dessa forma, o efeito é imediato e esgota-se em si mesmo.

A medida em comento está vinculada a atos infracionais leves. Como resposta estatal, a advertência estaria caracterizando apenas um próximo passo depois do perdão, concedido por meio da remissão. Adverte-se o adolescente que o ato não está de acordo com a norma e que sua reincidência poderá implicar sanções. Então, a sanção está no ato de autoridade, de poder, como antigamente eram as advertências familiares.

Insta salientar que esta medida possui caráter educativo e sancionatório pois visa orientar o jovem, através da internalização de valores sociais que induzam a comportamentos considerados adequados para a vida em sociedade, ao mesmo tempo em que censura sua conduta, prevenindo dessa forma a reincidência.

A obrigação de reparar o dano é devidamente disposta no artigo 116, do ECA, o qual diz que:

Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima.

Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada.

Este artigo é aplicado nas situações em que o ato infracional resulta em danos patrimoniais. Nesses casos, o juiz pode determinar que o adolescente repare ou restitua o bem, ou ainda compense o prejuízo financeiro causado à vítima, ou seja, é uma medida de contraprestação.

A reparação do dano há que resultar do agir do adolescente, de seus próprios meios, compondo com a própria vítima, muitas vezes, em um agir restaurativo. Daí sua natureza educativa e restaurativa, enquanto espaço de concertação entre vitimizado e vitimizador, mediado pelo Sistema de Justiça juvenil.

Insta salientar, que haja vista a não necessidade de programas estruturados para sua execução, as medidas de advertência e obrigação de reparar o dano são comumente executadas pelo Poder Judiciário sem intervenção da equipe de CREAS ou das demais políticas intersetoriais envolvidas. De acordo com Meneses:

A impossibilidade social do cumprimento desta medida descola, de imediato, à abordagem das restantes em meio aberto: a prestação de serviços à comunidade e a liberdade assistida, utilizadas em boa escala nas respostas estatais aos atos em conflito com a lei (MENESES, 2008, p. 101).

Embora a medida de reparação do dano tenha caráter personalíssimo e intransferível, o Código Civil prevê que, caso o adolescente infrator tenha 16 anos de idade na época do fato, a responsabilidade em reparar o dano será exclusivamente de seus pais ou responsável.

Tendo de 16 a 21 anos de idade, responderá solidariamente com seus pais, pela reparação dos danos causados. Dispõem os artigo do Código Civil:

Art. 180. O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior.
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições [...]

A medida poderá ser aplicada também juntamente com a remissão, instituto descrito no artigo 126 do ECA, ou seja, é permitida a exclusão do processo pelo perdão da vítima, podendo ocorrer na fase pré-processual ou após a instauração do processo. Importante destacar, que o objetivo é a resolução do conflito.

São diversificadas e divergentes as opiniões e os discursos referentes a natureza da medida de prestação de serviço à comunidade, direcionadas a aplicação ao menor em situações de conflito com a Lei. Segundo Gobbo e Muller (2009) levantam-se fortes discussões sobre a presença ou não do caráter punitivo e/ou pedagógico no cenário das medidas socioeducativas

Dispõe o artigo 117, do ECA que: “A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses”.

As tarefas devem ser atribuídas de acordo com as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho.

Trata-se de uma medida alternativa, que diz respeito ao cumprimento de tarefas gratuitas de interesse da sociedade em entidades assistenciais, hospitais, escolas ou instituições afins. A medida deve ser aplicada durante uma jornada máxima de oito horas semanais, em horário que não prejudique a frequência à escola ou o turno de trabalho, não podendo ultrapassar seis meses.

A aplicação da medida de prestação de serviços à comunidade depende exclusivamente do Juiz da Infância e Juventude, mas em sua operacionalização recomenda-se um programa de atendimento que: estabeleça parcerias entre órgãos públicos e organizações não-governamentais, visando à construção de uma rede socioeducativa eficaz; tenha uma proposta pedagógica bastante consistente; e ofereça a capacitação permanente dos profissionais envolvidos na sua execução (SPOSATO, 2004, p. 157).

Esta medida tem caráter educativo e não punitivo, haja vista a necessidade de oferecer ao adolescente oportunidade de crescimento social e intelectual, objetivando a inserção em novas possibilidades de vida e oportunidades de relacionamentos e trabalho.

Esta modalidade é grande valia pois apresenta uma efetiva utilização dom o preenchimento com algo útil, o costumeiramente ocioso tempo dos adolescentes em conflito com a lei, por outro apresenta de alguma forma à coletividade a resposta social pela conduta infracional praticada.

O adolescente será acompanhado por um profissional, com constância, bem como efetivar sua responsabilização de acordo com a proposta pedagógica e metodológica proposta. Os locais de prestação de serviço devem ser avaliados conforme a característica individual de cada adolescente, podendo ser desenvolvido em organizações da sociedade civil, escolas, hospitais, equipamentos públicos e outros, inclusive prestando relatório.

Importante destacar, que a prestação de serviços à comunidade é uma também do direito penal adulto, introduzida como pena alternativa à privação de liberdade, o que muda é a questão operacional.

O artigo 118, do ECA dispõe a medida socioeducativa de liberdade assistida, a qual diz respeito ao acompanhamento, orientação e auxílio ao menor infrator, conforme artigo 118 do ECA. Intitulada para muito doutrinadores de “medida de ouro” pelo motivo, segundos eles, de ter um alto nível ressocializador e de reintegração social. Sobre este assunto explana Saraiva:

A liberdade assistida constitui-se naquela que se poderia dizer "medida de ouro". De todas as medidas socioeducativas em meio aberto propostas pelo Estatuto, é aquela que guarda maior complexidade, a reclamar a existência de uma estrutura de atendimento no programa de Liberdade Assistida apta a cumprir as metas estabelecidas no art. 119 do Estatuto. Ao mesmo tempo se constitui na medida mais eficaz quando adequadamente executada, haja vista sua efetiva capacidade de intervenção na dinâmica de vida do adolescente e de sua família (SARAIVA, 2010, p. 160).

A medida em comento é utilizada em casos intermediários, ou seja, nos casos em que a aplicação de uma medida mais leve seria ineficaz, porém o menor infrator não apresenta perigo a sociedade, não justificando uma medida privativa de liberdade. O destaque é o orientador judiciário, o qual é responsável pelo acompanhamento do menor infrator. Sendo escolhidos, preferencialmente, entre agentes de serviços estatais de assistência social ou conselheiros tutelares.

Promove ao adolescente infrator inúmeros benefícios, como educação, inserção no mercado de trabalho, entre outros, promovendo sua ressocialização, através do bom exemplo e apoio.

Quanto às medidas privativas de liberdade, é a última alternativa e deverá ser pelo período mais breve possível, enquanto resposta do Estado à conduta infracional de modo a minimizar os danos resultantes dessa opção.

Insta salientar, que aplicação das medidas privativas de liberdade (semi-liberdade e internamento) são somente aplicáveis diante de circunstâncias efetivamente graves, enquanto o mecanismo de defesa social, observando-se com rigor o estabelecido nos incs. I a III do art. 122, devendo reservar-se para os casos de ato infracional praticado com violência à pessoa ou grava ameaça ou reiteração de atos infracionais graves.

O artigo 120 do ECA dispõe o regime de semi-liberdade, o qual pode ser determinado desde o começo ou transitar para o meio-aberto. Trata-se de uma medida parcialmente privativa de liberdade, que possibilita a saída do menor infrator durante o período diurno para atividades externas, como o estudo e o trabalho. Diz respeito ao direito de ir e vir do adolescente, Sposato a respeito dessa medida explana que:

[...] responsabilidade e diligência ao adolescente, a fim de que este exercite seu direito de ir e vir; respeito às normas de convivência, com o cumprimento de horários e limites das atividades externas; e promover a articulação de entidades governamentais e não governamentais por meio de políticas públicas, para que a inserção social se concretize (SPOSATO, 2004).

Existe a obrigatoriedade do menor estudar e/ou trabalhar para aplicação desta medida.

A medida de semiliberdade, desde que pautada sob um bom alicerce institucional, contribui para o redirecionamento pessoal e pela inclusão social do menor infrator, através da prática de suas atividades diárias, como o estudo e o trabalho e pelo convívio na comunidade onde reside, respectivamente.

O artigo 121 o ECA dispõe sobre a internação, que é uma medida privativa da liberdade, porém sujeita a três princípios, a saber: brevidade, excepcionalidade e respeito à condição da pessoa em desenvolvimento.

Trata-se de uma medida de caráter excepcional, ou seja para atos mais graves. A respeito de tal medida, Moraes explana que: “A internação precisa ser breve”. Isso quer dizer, que deve alcançar o menor período possível da vida do adolescente, o qual está em processo de formação e tem no seu direito fundamental à liberdade um dos mais relevantes fatores para a construção do seu caráter. A vida em sociedade, os direitos de expressão, de se divertir e de participação na vida polícia são exemplos da importância do gozo da sua liberdade, em um momento singular da sua existência.

A adolescência é a menor fase da vida, um verdadeiro rito de passagem. Compreende a idade entre doze e os dezoito, durante apenas seis de todos os anos da existência da pessoa. Por isso a preocupação do legislador com a internação, limitando a sua duração a três anos, o que já se constitui em metade deste período de amadurecimento. A internação precisa ser excepcional.

Deve ser aplicada com bom senso e norteada pelos princípios da brevidade, excepcionalidade e do respeito, haja vista a aplicação envolver uma pessoa em desenvolvimento. Sobre tal medida, explana Meneses:

Não sugiro o fim da internação, pelo mal necessário que ela representa. Mal, porque existe bondades na punição. Necessário, porque a contenção também se identifica com a paz social. O que estou a desfrutar é a existência de qualquer propósito educativo na medida, pois em nada constrói o sujeito, nem individual, nem socialmente. Não há pedagogia na medida e, por muito menos, na execução. A contenção que priva a liberdade poderá ser um início de repressão ao comportamento compulsivo-agressivo de adolescente, mas que só terá sentido se houver convivência com o estudo e o trabalho, meios que podem complementar a privação de liberdade na busca da construção da cidadania (MENESES, 2008, p. 97).

Ou seja, para o doutrinador a medida tema caráter apenas punitivo, ferindo o propósito educativo e protetor.

O artigo 122 explana sobre quando a medida de internação pode ser aplicada, a qual está sujeita à observância de garantias especiais, haja vista adolescentes serem titulares da Doutrina da Proteção Integral, conforme o ordenamento jurídico pátrio.

O artigo 123, diz que: “A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração”.

De acordo ao referido artigo a medida em comento deverá ser cumprida em ambiente exclusivamente juvenil, como por exemplo centros socioeducativos, sendo separados os infratores de acordo com a idade, capacidade física e gravidade da infração cometida, conforme artigo supracitado.

O artigo 124 do ECA, aborda sobre os direitos do adolescente privado de liberdade.

Importante destacar, que o instituto da internação provisória, que visa a garantia da segurança pessoal do adolescente apontado como infrator e ainda garantindo a manutenção da ordem pública.

Dessa forma a medida de internação, apresentada pelo ordenamento jurídico pátrio é bem estruturada. Porém na prática, a presente medida socioeducativa é, muitas vezes precária e ineficaz, diante do descaso do Estado no investimento em estabelecimento de qualidade, que de fato ressocializem o menor infrator.

3 A (in) eficácia na aplicabilidade das medidas sócio-educativas

A finalidade das medidas socioeducativas é a ressocialização. Tem caráter pedagógico e não punitivo. A ideia principal não é punir o adolescente pelo ato infracional praticado, mas sim, procurar responsabilizar o adolescente pelas consequências dessas condutas, sempre com o objetivo principal de reeducar e reintegrar este menor para a sua família e sociedade.

Infelizmente, na prática não é assim. Aquilo que está vinculado à instituição para ela cumprir, em muitos casos não é cumprido, como veremos ainda nesse capítulo. Sobre essa carência, Paula Gomide (1998, p.28) diz:

Uma breve consulta aos estatutos das instituições de proteção ao menor existentes em nosso país colocará o leitor diante de objetivos gerais bastante semelhantes. Todas elas apresentam como seus principais objetivos a reeducação e a reintegração do menor à sociedade e à família. Semelhantes também são as justificativas encontradas para o não cumprimento desses objetivos, a saber, a ausência de infraestrutura, o despreparo da equipe técnica e de apoio, a falta de verbas, o sistema capitalista atrasado, etc.

Na prática, a ineficácia das medidas socioeducativas acontecem por não ser promovidas efetivamente o desenvolvimento do menor em situação de risco, no que tange à sócio-educação e a superação da prática infracional.

No que diz respeito especificamente às medidas socioeducativas não privativas de liberdade serão bem realizadas se aplicadas a casos de menor gravidade e para jovens que cometeram o primeiro ato infracional, já que se trata de uma medida somente de repreensão verbal.

Quanto à obrigação de reparar o dano, quando é aplicada proporciona a auto-correção do jovem infrator, uma vez que este terá que reparar as consequências de seu ato ilícito. Além disso, há uma satisfação e senso de punição pela vítima, que é ressarcida de seu prejuízo.

No que tange à medida de prestação de serviços à comunidade, como relata Mezzomo (2004) “é sem dúvida uma das medidas mais eficazes”. Fazer com que o menor seja responsável em realizar serviços comunitários enseja a ele responsabilidade para exercitar as atividades, sendo forte artifício para a ressocialização.

A aplicação dessa medida a menores infratores da classe média/alta tem bons resultados, haja vista o choque da realidade fria e palpitante das instituições públicas de assistência, levando-os repensar de maneira mais intensa o ato infracional por eles cometido, afastando a reincidência. A ressocialização nesses casos é perceptívell e frequente. Afinal, a segregação raramente recupera e o trabalho comunitário é positivo para adolescentes e a sociedade. Institui naqueles o instinto da responsabilidade e o estimula a interessar-se pelo trabalho, além do impulso extra imposto pela autoridade judiciária no sentido da retomada aos estudos por aqueles que o abandonaram.

Quanto à liberdade assistida, que é uma alternativa à privação de liberdade e que visa “vigiar, orientar e tratar o menor, de forma a coibir a sua reincidência e obter a certeza da recuperação”, segundo Oliveira (2013) não apresenta resultados eficazes, haja vista oportunizar a impunidade, por conta de não haver boa infraestrutura para receber os menores infratores.

A situação atual é de amplo descrédito em relação à Liberdade Assistida, que, em alguns casos, chega a ser vista por juízes, promotores, mídia, opinião pública e até mesmo pelos próprios adolescentes como uma forma de (des) responsabilização e de impunidade. A falta de investimento na capacitação do corpo técnico encarregado de orientar os adolescentes inseridos nessa modalidade de atenção contribui para que sua efetividade como alternativa eficaz e humana à privação de liberdade seja questionada em face dos baixos níveis de eficiência e eficácia verificados no dia a dia (COSTA, 2008, p. 53).

Diante disso, percebe-se que as medidas a maioria das medidas de caráter não privativo são eficazes, especialmente com a obrigação de reparar o dano e com a prestação de serviços à comunidade, pois dão a oportunidade do adolescente evoluir e ressocializar-se.

Em relação à medidas privativas de liberdade são delicadas e polêmicas. Pois para a sociedade, de modo geral só faz piorar.

Na medida de semiliberdade, há saída dos menores no período diurno para estudar e/ou trabalhar. Porém, na prática isso não é muito eficaz, por não ter muitas instituições preparadas e por conta do alto índice de fugas.

Quanto à internação é muito ineficaz por conta do índice altíssimo de reincidentes.

A situação atual é que o sistema de internação além de privar os adolescentes em conflito com a lei de sua liberdade (direito de ir e vir), acaba privando-os também dos direitos ao respeito, à dignidade, à privacidade, à identidade e à integridade física, psicológica e moral (COSTA, 2008).

Na prática existe uma infraestrutura precária e a estrutura operacional fica a desejar. Falta o amparo necessário para ressocialização. Oliveira (2003) ressalta que: “deveriam ser unidades especiais, dotadas de todos os serviços psicossociais, as mais variadas e modernas formas de terapias, sejam elas com fins exclusivamente terapêutico ou de ocupação, recreação e educação religiosa.”

Diante disso, o caráter educativo disposto no ECA para as medidas privativas de liberdade ficam só no papel, na prática são ineficazes.

Quanto à questão da reincidência os dados apontados pela Fundac mostra que, dos 2.002 adolescentes que deram entrada nas unidades em 2014, mais de 82% (1.642) se declararam negros ou pardos e mais de 85% (1.704) cursavam o nível fundamental ou aceleração. O ato infracional mais cometido foi roubo (32,5%) seguido de tráfico de drogas (21,88%).

Em reportagem ao G1 em 2016, o Ministério da Justiça (MJ) o Ministério da Justiça (MJ) disponibilizou os últimos dados publicados no Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que são referentes ao ano de 2012 e que foram divulgados em 2014.

Em todo o Brasil, foram registrados 20.532 atendimentos a adolescentes, entre internações definitivas, internações provisórias e medidas de semiliberdade. Os dados são da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH) e foram obtidos por meio do Levantamento Nacional do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei.

Dentre os 26 estados e o Distrito Federal, São Paulo lidera disparado o número de apreensões: 8.497. Em seguida, aparecem Pernambuco (1.400) e Minas Gerais (1.411). A Bahia desponta na 9ª colocação, com 469. Em todo o país, conforme o levantamento, as infrações mais recorrentes foram os roubos (8.416), tráfico (5.881) e homicídios (1.963). Na Bahia, os atos infracionais mais praticados por adolescentes foram roubo (132), homicídio (85) e tráfico de drogas (80).

De acordo o MJ, os números ofertados no levantamento apontam que as infrações cometidas por adolescentes correspondem a cerca de 1% dos crimes registrados no Brasil. Se forem considerados apenas os homicídios e tentativas de homicídio, o índice cai para 0,5%. Em todo o país, a população carcerária, composta por pessoas acima de 18 anos, ultrapassa os 600 mil.

Considerações Finais

Este artigo teve por objetivo expor e compreender a problemática da (in) eficácia na aplicabilidade das medidas socioeducativas sob à ótica da Lei 8.069/90, intitulada de Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).

Não há como negar que o ECA ampliou a consciência dos direitos das crianças e adolescentes e criou um movimento de renovação no atendimento destes, mas ainda está longe de conseguir que a mentalidade educativa comande o processo em relação ao adolescente que comete ato infracional.

O Estatuto, à partir do seu primeiro dispositivo, elenca uma série de direitos fundamentais especiais da Criança e do Adolescente, como por exemplo à saúde, educação, lazer e convívio com uma família que lhe dê atenção e carinho. Todos esses direitos têm uma grande importância na formação do caráter desses menores, logo, devem ser garantidos sempre e em hipótese alguma violados. Qualquer violação à um direito especial de um pessoa em desenvolvimento, pode acarretar, futuramente, na personalidade dela. Inclusive, pode levá-la ao mundo da marginalização.

Porém mesmo diante dos avanços do ECA e com a Lei do SINASE, restou claro que, a atual legislação menorista precisa ser aperfeiçoada. Assim sendo, a eficácia das medidas socioeducativas, em relação ao adolescente em conflito com a lei, ficará dependente dos meios que irão possibilitar a sua execução e que forneçam condições para sua reintegração ao meio social. reincidência do jovem, aliados ao compromisso de transformar a sua realidade. A falta de políticas públicas eficazes, é um dos o maiores problemas para cuidar dos jovens, que buscam a integração entre os órgãos, família e sociedade, conscientizando-os de suas responsabilidades em relação aos adolescentes.

Como anteriormente explanado, as medidas socioeducativas de caráter não privativo de liberdade, em sua maioria são consideradas eficazes, como por exemplo a medida de advertência, obrigação de reparação do dano e prestação de serviços à comunidade, pois possuem um caráter sancionatório e pedagógico ao mesmo tempo, contribuindo com o desenvolvimento pessoal e social dos adolescentes em cumprimento de tais medidas. Dessa forma, comportam aspectos de natureza coercitiva e educativa, levando o adolescente a reconhecer e reparar o erro cometido.

A medida de liberdade assistida, apesar de ser conhecida como a “medida de ouro”, para alguns doutrinadores não vem atingindo sua real eficácia, haja vista a falta de preparação do corpo técnico que orienta o menor infrator, aumentando, dessa forma, o senso de impunidade da população.

No que tangem às demais medidas de internação e ao regime de semiliberdade, pode-se evidenciar neste trabalho que, não asseguram unidades de atendimento dignas que promovam eficientes ações pedagógicas, e dessa forma não há como ressocializar, muito pelo contrário violam e não acolhem.

Dessa forma, os meios são similares à forma de punitiva, do sistema penal. Apesar de muitos entenderem que o Estatuto em comento, simplesmente não tem condições de resolver um problema tão sério que são as nossas crianças e adolescentes, não quer seja um fracasso, todavia, significa dizer que o Estado não está conseguindo efetivá-lo.

Faz-se necessária implantação de mecanismos eficazes, e promoção de mudanças culturais, para que péssimas casa de atendimentos aos menores seja considerado algo "natural".

As medidas socioeducativas, no texto legislativo do Estatuto da Criança e do Adolescente são bem redigidas e elaboradas, que pode oportunizar um trabalho multifuncional se for realizado com seriedade, certamente contribuiria para reeducação do menor infrator. Entretanto, o que se observa na prática é que, durante o cumprimento da maioria das medidas, há uma grande má estrutura física, pouca preparação dos auxiliares na sua execução e um descaso do Estado em promover políticas públicas que, de fato, deem novas oportunidades para que o menor infrator possa trilhar novos caminhos, longe das estradas do crime

Por fim, é tudo isso, deverá vir acompanhado de políticas públicas que lhes garantam uma ressocialização digna, livre de preconceitos e que impossibilite a reincidência do jovem, aliados ao compromisso de transformar a sua realidade.

Referências

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________. Secretaria Especial de Direitos Humanos. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Brasília: CONANDA, 2006a.

________. Lei do Sistema de Atendimento Socioeducativo. Lei Federal 12.594, de 18 de Janeiro de 2012. Brasília: 2002.

MAIOR, Sotto Olimpio. Medidas socioeducativas. In: CURY, Munir (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2004

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SPOSATO, Karyna Batista. Guia Teórico e Prático de Medidas Socioeducativas. Disponível em: http://www.conselhodacrianca.al.gov.br/sala-de-imprensa/publicacoes/Guia-MedidasSocioeducativas.Pdf. Acesso em: 21/10/2017.

LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e ato infracional: medida socioeducativa é pena? 2. Ed. Malheiros Editores: São Paulo, 2012.

Eunice Barros, Professor

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