Língua materna influencia a mente. Idioma teria mais força sobre pensamento e cultura do que se acredita.
A ideia de Benjamin Lee Whorf de que a língua materna influencia e restringe o modo como as pessoas pensam seduziu muitos e foi objeto de debates de toda uma geração.
Há 70 anos, em 1940, um pequeno artigo em uma revista científica deu início a umas das maiores modas intelectuais do século XX. Nem o título do texto, “Ciência e linguística”, nem a revista, “Technology Review”, do MIT, eram exemplos de glamour, muito menos o autor, um engenheiro químico que trabalhou para uma companhia de seguros e virou antropólogo. Mas, ainda assim, a ideia de Benjamin Lee Whorf ganhou muitos adeptos, servindo de debate no mundo todo.
Segundo Whorf, a língua dos índios americanos impunha a essas populações uma visão de mundo totalmente diferente da do resto da sociedade americana, tornando-os incapazes de entender conceitos para os quais não tinham palavras, como o fluxo do tempo e a distinção entre um objeto e a ação realizada. Durante décadas, a teoria intrigou cientistas e leigos, dando origem a outras, como a de que a natureza dura do judaísmo estaria ligada ao tenso sistema gramatical do hebreu antigo.
Com o tempo, no entanto, as ideias de Whorf foram abandonadas, desmentidas pelos fatos ou pelo puro bom senso. Seu principal erro foi presumir que a língua, por não ter uma palavra dedicada a um conceito, impediria as pessoas de pensarem na direção deste determinado padrão conceitual. Por exemplo, se uma língua não fizesse diferença na conjugação de passado, presente ou futuro, seus nativos não teriam a noção da passagem do tempo, e assim em diante.
Derrubadas, as ideias de Whorf foram imbuídas como exemplos da loucura cientificista. Agora, porém, elas começam a ser retomadas, embora sob novo viés.
Como bem definiu o linguista Roman Jakobson há 50 anos, as línguas diferem basicamente no que elas têm que comunicar, e não no que podem comunicar. O gênero é um exemplo disso. Ao dizer em inglês que foi visitar um vizinho, não é preciso especificar se se trata de um homem ou uma mulher. Em francês ou alemão, porém, a informação faz parte da frase, isto é, é preciso dizer que se visitou um vizinho ou uma vizinha.
Associações entre palavras e imagens são diferentes. Ainda na questão do gênero, muitas línguas, ao contrário do inglês, designam um sexo a um objeto inanimado, que também costuma variar de uma língua para outra. Desta forma, enquanto uma ponte é feminina em alemão, é masculina em espanhol.
E estudos recentes mostram que, incutidos com esta classificação desde cedo, um alemão e um espanhol associam ideias diferentes para a palavra ponte. Enquanto o primeiro deriva dela conceitos como elegância, o segundo traz à mente imagens másculas, como força.
E as amostras da influência da língua sobre o pensamento e a cultura não param aí. Até recentemente, imaginava-se como natural que todas as línguas tivessem indicações de direção autoreferenciadas pelos indivíduos, na forma de direita, esquerda, à frente e atrás. Mas descobriu-se que não é o caso. A língua aborígene Guugu Yimithirr, assim como outras descobertas depois, contam apenas com referências dos pontos cardeais.
Pesquisas mostraram que esta diferença faz com que falantes de Guugu Yimithirr, ou outra língua de referencial geográfico, tenham uma noção e visão do espaço bem mais apurada que uma pessoa que fala uma língua “comum”. Isso porque, para falar estas línguas, o indivíduo deve ter a todo tempo consciência de sua posição relativa aos pontos cardeais. Tal consciência, construída desde cedo com base em sinais sutis do ambiente, fazem com que pareçam ter uma capacidade sobre-humana de orientação. E, caso sejam levados a dois quartos de hotel idênticos, mas de lados opostos no corredor, verão quartos diferentes, pois um terá a cama na parede norte enquanto no outro ela estará no sul, etc.
Fonte: O Globo
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