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sexta-feira, 14 de março de 2008

Metáfora Terapêutica


Metáfora terapêutica
Uma discussão sobre os métodos capazes de levar o cliente do estado atual desejado estaria
incompleta se não oferecesse uma explicação sobre o uso da metáfora terapêutica, uma técnica especial de contar histórias que propicia à pessoa descobertas importantes, conscientes ou inconscientes, que gera novos comportamentos produtivos.
A arte da metáfora terapêutica foi ricamente desenvolvida por Milton H. Erickson, M.D., um especialista tanto na construção quanto na enunciação de metáforas terapêuticas. Recomendo sua leitura. Gostaria de oferecer aqui apenas os fundamentos mais elementares da construção de metáforas, juntamente com alguns exemplos, para que cada um possa entender o processo geral e começar a desenvolver sua própria habilidade.
Para ser eficaz, uma metáfora deve:
Ser isomorfa ao conteúdo do problema. Ser isomorfa é ter uma estrutura idêntica ou semelhante. Seguir à risca uma dieta é uma situação isomorfa a manter-se dentro de um orçamento – as duas têm componentes similares.
Oferecer uma experiência substitutiva na qual a pessoa tenha a oportunidade de operar a partir de um conjunto diferente de filtros, que lhe possibilite o acesso a escolhas antes desconhecidas.
Oferecer uma solução, ou conjunto de soluções, para a situação isomorfa, que possa ser generalizada para o problema, levando o cliente a fazer as mudanças adequadas.
Por se tratar de um método seguro e inofensivo de lidar com assuntos que as pessoas têm dificuldades em abordar , as metáforas podem ser extremamente eficazes em problemas cuja solução é difícil através de outras técnicas.
As etapas básicas de construção de uma metáfora são:
Identificar completamente o problema.
Definir as partes estruturais do problema e as "personagens" adequadas.
Encontrar uma situação isomorfa. (David Gordon recomenda praticar com analogias, isto é, "Você sabe, a vida é como vinho: manejando bem ela fica melhor com a idade".
Oferecer uma solução lógica. Determinar o que seria útil descobrir e então encontrar contextos nos quais essas descobertas seriam evidentes.
Acomodar esta estrutura em uma história divertida, ou que disfarce a intenção (para evitar a resistência do cliente).
O caso que narro a seguir é um exemplo pertinente do uso da metáfora para ajudar um cliente a alcançar uma mudança pessoal.
Uma mulher atraente chamada Dot procurou-me em busca de aconselhamento. Queria ajuda para aprender a controlar seu comportamento promíscuo. Era casada com um homem bom (sua descrição) e tinha dois filhos adoráveis, mas mantinha relações extraconjugais quando e com quem fosse possível. Queria parar com este comportamento. Utilizei os elementos da sua descrição, expostos a seguir, para criar uma metáfora terapêutica. Como tantas mulheres atraentes hoje, Dot também se preocupava com o excesso de peso (problema que ela não tinha), e assim usei este conteúdo para que a metáfora aparentasse ser uma extensão natural da nossa interação terapêutica.
Descrição do problema
Metáfora terapêutica
A promiscuidade está fazendo Dot perder o marido e a auto-estima.
Uma mulher a caminho da obesidade
Dot não resiste à tentação dos outros homens
Uma mulher que não consegue resistir a sobremesas e pratos tentadores quando come fora.
Dot acha mais excitante o sexo fora do casamento.
Esta mulher adora comer fora.
Dot está insatisfeita com suas relações sexuais conjugais.
Esta mulher mal toca na comida que faz em casa.
Cada experiência extra-conjugal gera mais culpa e aumenta a possibilidade de Dot perder o marido.
Cada vez que come fora a mulher fica mais gorda.
A culpa de Dot torna-se tão dolorosa que ela tem que fazer algo a esse respeito. Ela tem insônias etc.
A mulher gorda tem que tomar alguma providência quanto a seus hábitos. Ela não entra mais em nenhuma roupa.
Dot nunca desenvolveu comportamentos sexuais satisfatórios com o marido.
A mulher gorda nunca aprendeu a cozinhar bem para si mesma.
Cada um dos elementos da metáfora construída até aqui é isomorfo (isto é, há uma correspondência estrita na estrutura) ao problema apresentado. Eles acompanham o problema apresentado de modo tal que ambos têm a mesma forma. O passo seguinte é passar do acompanhamento do problema à busca de uma solução comportamental.
A reação desejada é que Dot mude seu comportamento de modo a resolver seu problema. Assim, a partir da mulher obesa, a história deve de algum modo propiciar uma mudança de comportamento adequada, uma vez que metaforicamente a mulher obesa representa Dot.
Solução do problema
Solução metafórica
Para Dot aplicar sua energia no desenvolvimento de experiências sexuais satisfatórias com o marido.
A mulher dedicou-se a rearrumar a cozinha. Começou a ler livros de receita, para escolher pratos apetitosos, e começou a experimentar refeições saudáveis e satisfatórias.
Para Dot encontrar a satisfação necessária em casa.
Com o tempo, mais rápido do que se imagina, ela descobriu que não havia nos restaurantes nada comparável às suas refeições caseiras e perdeu a vontade de empanturrar-se em outros lugares, satisfazendo-se em casa.
Para Dot orgulhar-se de sua relação conjugal e encontrar satisfação sexual com o marido.
Agora esbelta, esta mulher outrora gorda orgulha-se muito de suas habilidades culinárias, bem como da sua figura.
São esses os elementos de uma metáfora terapêutica criada para suscitar um resultado específico. Para garantir a eficácia desse processo de contar histórias, são utilizadas a ancoragem e várias outras técnicas, verbais e não-verbais. Enquanto relatava essa história a Dot, procurei torná-la realmente interessante para que ela se identificasse com o assunto. Ela então vivenciou as emoções provocadas pela história, o que me permitiu ancorar (cinestésica, visual e auditivamente) as experiências internamente geradas para fazer a mudança. Utilizei também a sobreposição para tornar a metáfora mais rica e atraente.
Um casal, Don e Iris, procurou aconselhamento conjugal para melhorar uma relação que se vinha deteriorando há algum tempo. Don era seis anos mais velho que Iris. Estavam casados havia seis anos e tinham dois filhos, de quatro e dois anos. Durante o namoro Iris era uma mulher esbelta e atraente; desde então, contudo, ela engordara cerca de vinte e cinco quilos. Ganhara peso durante os dois períodos de gravidez e não o perdera depois. Don não gostava de sua aparência e havia alguns meses não tomava qualquer iniciativa sexual. Como ocupava uma posição de gerência numa grande empresa, tinha compromissos sociais relativos ao trabalho. Decidiu escondê-los de Iris, preferindo ir sozinho a arriscar-se ao embaraço que a aparência da mulher lhe causaria.
Fora Don quem decidira ter filhos, e ele havia convencido Iris de que isto seria bom pra eles. Mas à medida que ela engordava durante sua primeira gravidez, Don começou a trabalhar além do expediente. Mesmo na época do aconselhamento, as flutuações de peso de Iris estavam diretamente relacionadas ao tempo que Don passava com ela, e suas orgias alimentares ocorriam nas noites em que ele fazia horas extras. Embora não houvesse indícios de que ele estivesse tendo um caso (ou tivesse tido), era óbvio que a idéia lhe ocorrera.
Don era cuidadoso com sua aparência e falava sobre como via a si mesmo, Iris, por outro lado, falava sobre como sua vida era vazia e de como precisava de algo que a preenchesse. A representação da experiência de Don era tipicamente visual; a de Iris, primordialmente cinestésica. Eram ambos congruentes quanto ao amor que sentiam um pelo outro, embora Don quase tivesse arrepios ao olhar para Iris. Ambos descreviam a experiência sexual que haviam tido juntos antes como " idílica". Com duas crianças pequenas em casa, Iris era extremamente dependente de Don para tudo que excedesse seu papel de mãe.
O estado desejado, para Don e Iris, era que ela emagrecesse, reavivando assim seu desejo físico por ela. Para Iris, o desejo de Don (ou a falta dele) exercia um forte controle sobre a condição de sua experiência subjetiva. Quanto mais ele se afastava dela, mais ela comia para preencher aquele vazio doloroso, o que, por sua vez, fazia-o afastar-se ainda mais.
Já que uma maior atenção da parte de Don ajudaria muito a fazer com que Iris emagrecesse, tornando-a também mais feliz e melhorando sua auto-estima, eu poderia simplesmente Ter explicado a ele o resultado de suas atitudes, e confiado em suas boas intenções para resolver o problema. Mas elas não estavam bastando. De algum modo, sua experiência de estar com Iris, do jeito que ela era, precisava ser realçada. Eu tinha certeza de que, se Don pudesse dar a Iris um apoio carinhoso, protetor mesmo, ela reagiria a isso emagrecendo e "sendo mais ela mesma" (suas próprias palavras). Entretanto, sua aparência atual impedia qualquer um dos dois de suscitar a reação desejada do outro.
Assim, tendo em mente dois objetivos – um a curto prazo, de aumentar a intenção de Don para com Iris, e outro a longo prazo, de fortalecer um relacionamento mutuamente enriquecedor - , decidi usar a metáfora terapêutica com eles. Para construí-la, utilizei informações obtidas deles quanto ao seu comportamento e incorporei expressões verbais específicas usadas por Don para torná-la ainda mais eficaz.
Na metáfora desenhada para Don e Iris, apresentada em seguida, Don está representado por tio Ronnie, enquanto a terra e as alcachofras representam Iris. O relacionamento básico de um fazendeiro que cuida de sua terra e obtém uma resposta dela mantém-se constante em toda a história. Metaforicamente, essa relação é congruente com o relacionamento de Don e Iris. A história foi contada assim:
Você diz que seu pai era fazendeiro. Meu tio Ronnie é fazendeiro. Quero dizer, é assim que eles são chamados na Califórnia, não importa o que cultivem. Mas ele não foi sempre fazendeiro. Antes era negociante, e era bom nisso também. Um sujeito realmente promissor. O pai dele – meu avô – tinha um pedaço de terra grande e bonito na costa da Califórnia. Bem, Ronnie sabia que um dia provavelmente tudo seria dele. E ficou de olho, à medida que o tempo passava.
Mas sua carreira nos negócios tomava-lhe muito tempo. Sabe como é. Finalmente, um dia o pai o chamou à Califórnia e disse-lhe que o trabalho estava pesado demais pra ele, e que precisava que Ronnie tomasse conta das coisas. Ronnie achou que aquela poderia ser uma grande oportunidade. Financeiramente, o lugar era promissor, e era uma terra tão bonita! Ele não pôde resistir.
Durante algum tempo, ele apenas usufruiu de sua nova posição de fazendeiro. Então decidiu que estava na hora de voltar ao trabalho. O pai havia plantado principalmente flores, muito bonitas. Mas, do ponto de vista de Ronnie, não muito produtivas. Depois de examinar várias possibilidades, decidiu que cultivar alcachofras seria a melhor opção para a terra. Elas eram resistentes, perfeitas para o clima, consideradas uma iguaria sofisticada e obtinham um bom preço no mercado.
Então, mandou arar os campos de flores e plantou sementes de alcachofra. Sentiu que estava tomando uma iniciativa sábia e prudente. Mas as alcachofras demoram algum tempo antes de começar realmente a produzir, e Ronnie era um homem impaciente. Seu interesse começou a se dispersar. Um dia, enquanto olhava para os campos, achou-os muito feios. Ele se dizia que aquilo era mais prático, mas ainda assim sentia falta das lindas flores. Afastou-se cada vez mais da terra, deixando-a aos cuidados de outros. Obviamente, a terra sofreu. Os empregados não se importavam tanto com a terra; afinal, não era deles. E os resultados da negligência de Ronnie logo surgiram.
Ronnie me contou que um dia foi aos campos e olhou em volta. Ficou assustado com os montículos granulados e as plantas de alcachofra sem graça, com as folhas espalhadas por toda parte. Disse a si mesmo: ‘Meu Deus, o que foi que eu fiz? Isso é horrível. Não quero nem mesmo chamar isso de meu. Devia ter deixado a terra em paz. Queria nunca ter tocado nela’.
Mas ele tinha tocado. E o que ia fazer com ela agora? Certo, estava produzindo alcachofras e havia um bom mercado para elas. Mas a terra precisava de mais atenção e cuidados para se tornar realmente produtiva. Bem no fundo, ele sabia que isso era verdade.
Enquanto voltava para casa, estendeu a mão e colheu uma alcachofra, levando-a consigo. Enquanto pensava em seus problemas, sentado à mesa da cozinha, começou a estudar atentamente a alcachofra. Era meio feia. Todas aquelas folhas protuberantes, incomíveis do lado de fora. Flagrou-se pensando por que alguém se sentiria atraído por uma coisa assim.
Mas então começou a descascar suavemente a alcachofra. E, à medida que retirava as camadas, ficava cada vez mais encantado com o que descobria. Era lindo! As folhas internas, suaves e macias, o conduziam ao coração da alcachofra. Certamente, era isso o que atraía as pessoas e as levava a comprar e a plantar alcachofras. Sabiam que dentro delas havia um lindo e suculento coração.
Quando ele então olhou pela janela, começou a ver um mar de corações de alcachofras sobre os campos. E riu, porque em vez de plantas feias, granulosas e deselegantes, podia ver agora uma imensidão de plantas trabalhando duro, com todas aquelas camadas externas, para proteger o precioso coração interno, que era, afinal de contas, o que todos queriam delas. Aquelas camadas externas, grossas e espinhosas, protegiam o coração da alcachofra de todos os que não quisessem esperar para chegar ao tesouro escondido.
Alguma coisa naquilo tudo comoveu Ronnie, que era sensível à idéia de vulnerabilidade. Além disso, a alcachofra não podia descascar-se sozinha. Não podia expor seu tesouro oculto sem ele. Aqueles eram seus campos, suas plantas e subitamente ele sentiu o forte desejo de cuidar delas, zelar por elas, para garantir seu crescimento e sua produtividade. Ele se certificaria de que as plantas seriam tratadas com carinho, a fim de que o precioso coração não fosse destruído.
Hoje, é claro, meu tio Ronnie é um fazendeiro bem-sucedido e está muito orgulhoso da sua terra e do que ela produz. Quanto aos primeiros tempos, ele diz que quase perdeu de vista sua direção porque se deixou distrair quando as coisas não pareciam ir bem. E aquela distração custou-lhe tempo e problemas extras para recolocar as coisas no lugar.
Quando olhou bem para o que tinha, sentiu que preferia dar tudo o que possuía a correr o risco de perder tudo o que sempre quisera. Naturalmente, a terra respondeu-lhe tornando-o um homem rico e orgulhoso. Todo mundo podia ver que ele tinha algo de valor."
Esta metáfora funcionou muito bem, suscitando as reações desejadas. Don tornou-se mais atencioso com Iris. Começou a encorajá-la e até participou de um programa de emagrecimento com ela. Segundo suas próprias palavras, ele havia "investido no casamento" e teria que "dedicar-lhe algum tempo e energia para fazer o investimento render".
A vantagem das metáforas é que as pessoas reagem espontaneamente. Seus processos conscientes não interferem e, embora saibam que algo aconteceu, não têm muita certeza do que (ou como) aconteceu.
Se eu tivesse escolhido um resultado desejado diferente, a metáfora teria sido construída de modo diverso. Se a reação desejada fosse que Iris mais segura e independente, na metáfora a terra poderia tornar-se selvagem devido à negligência, recobrindo-se de plantas lindas e estranhas, até que tio Ronnie não mais soubesse andar por sua própria terra: "E era como uma fronteira virgem a ser descoberta, e talvez domada e cultivada por ele, pois o havia superado, e, no máximo, aceitaria domá-lo e cultivá-lo para atender às suas próprias necessidades".
Uma metáfora como essa teria certamente suscitado um resultado diferente do anterior. Na minha opinião, uma reação realmente segura e independente por parte de Iris teria, naquela ocasião, sido mais destrutiva do que benéfica para o seu relacionamento. Esta opinião orientou-me a construir uma metáfora que suscitasse uma reação útil. Quando utilizamos a metáfora terapêutica, devemos Ter sempre em mente o resultado desejado, durante toda a construção e narração da metáfora.
As histórias que narro a seguir, juntamente com trechos de transcrições de terapias, demonstram melhor o uso eficaz de metáforas terapêuticas.
Bud sofria de impotência. Nunca tivera uma ereção suficiente para o coito ou a ejaculação. Aos catorze anos, fora seduzido pela tia, que vivia com ele e a mãe. Essa tia costumava humilhá-lo pela sua falta de habilidade no desempenho sexual. O pai saíra de casa quando Bud tinha doze anos e a mãe nunca soube desses incidentes sexuais. Embora Bud estivesse casado havia seis meses, o casamento não se consumara. A descrição que fazia da esposa encaixava-se perfeitamente na de sua tia, mas Bud aparentemente não tinha a menor consciência dessa semelhança. Ele tinha fotos da esposa e da tia na carteira, e a semelhança física era impressionante. A tia morrera alguns anos antes de ele me procurar em busca de ajuda. A metáfora que utilizei foi construída usando estes componentes:
Descrição do problema
Metáfora terapêutica
A tia é ameaçadora e agressiva.
A igreja está queimando.
Bud é importante para se proteger, mesmo agora que a tia está morta.
Os bombeiros não conseguem usar a água do hidrante e a igreja é destruída.
Solução do problema
Solução metafórica
Bud precisa compreender, no seu inconsciente, que a impotência não é mais necessária como proteção.
Os bombeiros descobrem um modo de abrir a válvula do hidrante.
Bud precisa separar seus sentimentos em relação à tia do que sente pela esposa.
Os bombeiros notam que faíscas da igreja estão incendiando a casa vizinha.
Esta separação permitirá a Bud ser potente com sua esposa.
Os bombeiros apagam o fogo na casa sem problemas.
Minha mãe me contou uma história que sua irmã ouvira de um vizinho em Wichita, Kansas, sobre um incêndio. Parece que a maior igreja da cidade, a mais importante, tinha pegado fogo. Ninguém sabia como o incêndio começara, mas os bombeiros foram chamados para apagá-lo. Quando chegaram, era óbvio que o fogo já tomara tudo. E que calor provinha da igreja! Os bombeiros não eram profissionais, haviam sido mal treinados e estavam apavorados. Parece que todos os bombeiros profissionais estavam ausentes, no piquenique anual dos bombeiros. Inexperientes como eram, os bombeiros amadores fizeram tudo o que podiam, mas mal sabiam por onde começar. Com muita pressa conectaram a mangueira no hidrante, desenrolaram-na e aproximaram-se da igreja em chamas. Era sua intenção entrar assim que a mangueira estivesse funcionando e salvar o que pudessem.
Mas a água não chegou à mangueira e eles não ousaram entrar sem ela. Você, sendo um bombeiro, pode imaginar como foi frustrante. Os bombeiros ficaram desesperados e furiosos, perdendo tempo nessa agitação enquanto o fogo destruía a igreja.
Foi somente quando tinham aceitado a derrota e desistido que ficou óbvio o que tinham que fazer. Aproximando-se do hidrante com curiosidade, sem agitação porque já não havia mais esperança de salvar a igreja, os bombeiros facilmente descobriram o jeito de abrir a válvula, liberando um jato d’água muito forte. Mas, que droga, era tarde demais!
Entretanto, quando se voltaram para observar a igreja, que ruía, carbonizada, notaram que a casa vizinha se incendiara com as centelhas dispersas – e havia vida dentro dela. A igreja estava destruída – esforçar-se por ela não levaria a nada. Ao ouvir os gritos dos que estavam dentro da casa, os bombeiros correram com a mangueira para apagar as chamas sedentas. Com a mangueira funcionando com sua capacidade plena, entraram e apagaram completamente o fogo, não deixando sequer uma fagulha.
Os bombeiros estavam cansados e satisfeitos quando se retiraram da casa. Todas as vidas haviam sido salvas, e o único sinal que restava do fogo era a fumaça que saía pelas janelas abertas.
A igreja ficara completamente destruída, mas mesmo os bombeiros regulares haviam concordado que ela já estava perdida desde o início, e que eles haviam agido bem ao se ocuparem da casa vizinha. Antes de ir embora, contudo, os bombeiros checaram o hidrante mais uma vez, para ter certeza de que não havia qualquer problema com as ligações... para o caso de precisarem voltar.
Em um seminário realizado alguns anos atrás, um jovem, Allen, implorou-me ajuda para um problema muito pessoal. Embora eu lhe tivesse dito que o seminário não era o local apropriado para buscar uma consulta particular, seus pedidos insistentes e perseverantes convenceram-me a dedicar-lhe alguns minutos de atenção particular.
O problema urgente que o pressionava era ejaculação precoce. Ele vinha sofrendo disso havia alguns anos sem procurar ajuda. Mas agora estava apaixonado, realmente apaixonado, e era muitíssimo importante para ele ser um bom amante para sua nova mulher. Baseada no que eu já sabia sobre o comportamento consciente e inconsciente de Allen no contexto do seminário em curso – e também porque o tema daquela noite seria a metáfora terapêutica - , decidi usá-la como intervenção oculta com ele.
No seu nível consciente, eu apenas o consolei, dizendo que não havia muito a fazer com a ejaculação precoce. Com a intenção de remodelar seu comportamento em relação à nova mulher, sugeri-lhe que dissesse a ela que era tão atraente, tão excitante, que ele simplesmente não podia se controlar, que as suas ejaculações precoces eram apenas uma reação à habilidade sexual dela. Allen ficou atordoado com a sugestão, mas educadamente aceitou-a, e começou até a planejar como iria expressar seus comentários após a relação sexual.
Durante a sessão de treinamento da noite, produzi em Allen um leve estado hipnótico e contei-lhe algumas histórias, todas elas construídas para suscitar uma reação específica. Conto a seguir uma dessas histórias, que ilustra as demais. Tenho certeza de que a reação pretendida ficará óbvia para o leitor, embora não tivesse ficado clara para os outros participantes do seminário. Na verdade, a grande maioria dos presentes achou que se tratava de uma indução hipnótica, cuja reação desejada era um profundo estado hipnótico.
Há muitas maneiras de chegar a um lugar. Um homem que trabalhou arduamente o ano todo tem férias de apenas duas semanas. Duas breves semanas, nas quais deve fartar-se de prazeres depois de um ano de trabalho. Que frustração concentrar o prazer aguardado durante um ano em duas semanas! Em geral ele escolhe um lugar onde passar seu período de férias. Uma vez escolhido o lugar, ele talvez o localize num mapa e, nesse mesmo mapa, talvez escolha o caminho mais rápido para alcançar seu destino. Talvez até mesmo encontre um atalho, tão grande é o desejo de chegar ao destino escolhido. E talvez tudo corra muito bem.
Mas é assim que ele passa toda a sua vida – decidindo para onde quer ir e escolhendo o caminho mais curto para chegar lá. E os outros que talvez queiram viajar com ele? E as aventuras e prazeres imprevistos, ignorados porque a atenção estava toda voltada para o ponto de chegada? E este homem, por que este homem tomaria o mesmo atalho para o mesmo destino após ano? Isto é, até um certo ano.
Quando uma coisa boa aconteceu. Naquele ano um amigo ia para o mesmo local. O Grande Canyon. Era para lá que ambos iam. E era lá que ambos haviam estado. Mas o amigo ia dirigindo. E não tinha pressa de chegar. Nem mesmo tinha um mapa ou uma rota, mas mesmo assim tinha absoluta certeza de que chegaria ao lugar desejado e estava feliz em demorar todo o tempo do mundo para chegar lá.
No início, o homem estava impaciente. Mas depois ficou curioso e mesmo seduzido pelo que aquele jeito tão estranho de viajar tinha a oferecer. Pois faziam qualquer coisa que tivessem vontade de fazer. Desviavam-se do caminho, surpreendendo-se e adorando o que encontravam.
E, não importa aonde fossem, aproximavam-se cada vez mais do Grande Canyon. Às vezes, quando o homem gostava especialmente de um desses desvios, não queria ir embora. O amigo o convencia a prosseguir lembrando-o de que "sempre se pode voltar a um lugar especial. E se pode deixá-lo, sabendo que será possível voltar sempre que se quiser". Só assim o homem prosseguia. Ficaram ambos surpresos quando chegaram ao Grande Canyon. Tinham estado tão absorvidos em cada fase da viagem que a chegada foi um prazer inesperado.
O amigo desenhou o caminho por que tinham vindo: "Você pode vir por este caminho, por este ou por aquele. Há tantos caminhos para se chegar quanto são os prazeres que se pode Ter. Todos podem levá-lo aonde quer ir. Alguns rapidamente, outros devagar. Não importa. O que importa é estar no lugar em que se está no momento, em vez de estar no lugar aonde se quer antes de chegar lá. Não se perde nada em estar sempre no lugar em que se está".
E, ano após ano, ele e o amigo viajaram para lugares conhecidos e desconhecidos, confortavelmente e com muito prazer.
Esta metáfora mostrou-se eficaz na alteração do comportamento sexual de Allen. Mais tarde, ele relatou não ter tido qualquer dificuldade com a ejaculação precoce nas semanas seguintes. Seu comportamento na aprendizagem também mudou em resposta à metáfora, de maneira que, ao invés de usar métodos com os quais estava bem familiarizado, ele começou a explorar vários aspectos dos processos que estávamos trabalhando no seminário. À medida que fazia isso, seu prazer aumentava com a expressão da sua criatividade.
Allen nunca tomou consciência de que fizera terapia sexual. Quando posteriormente o encontrei ele presunçosamente comentou que não havia motivo para preocupação, pois descobrira outros modos de lidar com o problema. Respondi que acreditava piamente nele. Ele calou-se, olhou-me pelo canto do olho, começou a falar, então interrompeu-se. Deu de ombros e disse: "Estou me sentindo bem, sabe como é".
Do livro: SOLUÇÕES - Antídotos Práticos para Problemas Sexuais e de Relacionamentos - Leslie Cameron-Bandler - Summus Editorial

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