O complexo de Édipo é um dos conceitos mais famosos de Sigmund Freud, que passou anos e anos pensando e repensando-o, elaborando e reelaborando até chegar ao conceito final. Inicialmente, o complexo de Édipo era articulado com a chamada escolha de objeto e, lentamente, torna-se central para a psicanálise com o desenvolvimento do conceito de identificação.
Neste texto, refaço o longo percurso de elaboração feito por Freud, com a ajuda do livro de Renato Mezan, um dos maiores psicanalistas brasileiros, Freud: a trama dos conceitos, que deve ser comprado por todos aqueles que se interessam por psicanálise e psicologia.
O Complexo de Édipo em Freud
Inicialmente, o termo nem sequer aparecia na primeira elaboração da teoria da sexualidade infantil, embora Freud, em uma carta a Fliess, desde 1897, relate “ter descoberto em si mesmo impulsos carinhosos quanto à mãe e hostis em relação ao pai, estes complicados pelo afeto que lhe dedicava”. (Mezan, 2003: 189). A peça teatral de Sófocles, enquanto origem mitológica do tema, assim como o Hamlet de Shakespeare, são tomados como exemplo da universalidade do conflito edipiano, desde então.
Segundo Renato Mezan, Freud já reconhecia a preponderância da sexualidade na década de 1890, no entanto, o desenvolvimento deste conceito se correlaciona com o próprio desenvolvimento e constituição da psicanálise. (Mezan, 2003:128). “O tema do Édipo, se aparece praticamente desde os inícios da psicanálise, só recebe uma elaboração definitiva na fase final da obra de Freud” (Mezan, 2003: 189).
O termo Complexo de Édipo enquanto tal aparece apenas em 1910 em seu artigo Sobre um Tipo Especial de Escolha de Objeto no Homem.
Em 1905, o conflito típico do Édipo ainda não esta formulado, e, embora esta passagem dos Três Ensaios sobre a sexualidade apresente-o, o esquema não menciona o termo posteriormente adotado por Freud:
Ao mesmo tempo em que estas fantasias claramente incestuosas são superadas e repudiadas, completa-se uma das conquistas mais significativas, mas também mais dolorosas, do período puberal: a emancipação da autoridade dos pais, único processo que permite o surgimento da oposição entre a velha e a nova geração, tão fundamental para o progresso da civilização. (Freud apud Mezan:2003:136)
Segundo Mezan, neste período “a própria concepção da sexualidade infantil como um feixe desorganizado de pulsões parciais impede a colocação do problema edipiano na sua totalidade (…) posteriormente, a introdução das organizações pré-genitais permitiria uma reformulação completa do problema”. (Mezan, 2003: 137)
No caso clinico intitulado o Pequeno Hans, que Freud não analisou diretamente, mas interviu através do pai do garoto, este, no momento maior de sua crise para Freud “é verdadeiramente um pequeno Édipo, que gostaria de fazer seu pai desaparecer para ficar sozinho com sua mãe e dormir com ela”. (Freud apud Mezan: 2003: 189).
Neste caso, ainda que o termo e conceito complexo de Édipo não tivesse sido elaborado, segundo Mezan,
“o conceito inicial já era empregado por Freud. Chamamos de conceito inicial a forma dita ‘simples e positiva’ do complexo, em que a criança se sente atraída pelo progenitor do sexo oposto e hostiliza o do mesmo sexo” (Mezan, 2003: 190)
No entanto, embora com a experiência do caso anteriormente citado, Freud manteve sua posição de que o conflito se desenrolava verdadeiramente na adolescência, ou melhor, na puberdade, como expresso nas conferencias de 1910, ainda que neste texto e nas Teorias Sexuais Infantis, Freud já estabelecesse a relação entre pais e filhos como “complexo nuclear das neuroses”.
Mezan (2003: 191) analisa esta questão temporal, que até então era colocada na puberdade, como se dando em conseqüência da ausência do conceito de identificação; em virtude disso, o complexo de Édipo seria teorizado apenas com relação à escolha de objeto, pois neste momento da elaboração teórica da psicanálise a escolha de objeto era tida no período em que havia a subordinação das pulsões parciais à zona genital, período este que coincide com a puberdade.
No texto Sobre um tipo Especial de Escolha de Objeto, Freud utiliza, como já foi dito, o termo Complexo de Édipo”:
As revelações sexuais (que situamos nos anos imediatamente anteriores à puberdade) despertam no menino as recordações das impressões e desejos infantis mais precoces, reanimando consequentemente determinados impulsos psíquicos. Começa, pois, a desejar a mãe, no sentido descoberto, e a odiar o pai, como um rival que estorva a realização deste desejo. Em nossa terminologia, dizemos que o sujeito fica dominado pelo Complexo de Édipo. (Freud apud Mezan, 2003: 192).
Somente com a elaboração dos conceitos de narcisismo e a lenta elaboração do conceito de identificação é que o Complexo de Édipo passa gradativamente de uma situação secundaria na teoria psicanalítica para a posição primordial que teria no final da obra freudiana. Isso se dá na medida em que o narcisismo implica em que a escolha narcisista de objeto recai sobre o sujeito, e por outro lado, a identificação (que em um primeiro momento é relacionada à identificação às figuras paternas) leva ao questionamento quanto a origem do ego. Segundo Mezan, “é no terreno do ego que o Complexo de Édipo assumirá sua significação completa” (Mezan, 2003:194).
No Caso Schreber, Freud se depara com o problema da chamada forma “negativa” do Édipo, no qual o sujeito ama o progenitor cujo sexo é o mesmo que o seu, e hostiliza o que possui sexo oposto ao seu. Mesmo permanecendo não explorado o Édipo infantil é colocado como a mola mestre da doença, e tal correlação entre doença e Édipo se deve à conceituação do narcisismo, ou seja, na etapa narcisista e na escolha narcísica de objeto. Para Mezan “o conceito de ‘escolha narcisista de objeto’ fornece uma ponte para a identificação” (Mezan, 2003: 196), e por isso, o passo seguinte de Freud na elaboração da temática edipiana é dado na analise do Homem dos Lobos.
Na analise do Homem dos Lobos, pode-se depreender a dita forma completa do Édipo, na medida em que tanto a identificação como a escolha de objeto incidem sobre o pai, fonte então de ambigüidade para o garoto, de forma que o pai é hostilizado e amado. Embora este caso especifico, bem como o Caso Schreber, não tenham o Édipo por temática privilegiada, pois cada um dos casos cumpre a elaboração de outros conceitos freudianos.
O texto que vincula explicitamente o Édipo na primeira infância, ou melhor, por volta dos dois anos de idade é intitulado: Batem em uma criança. Este artigo datado de 1919, por vincular o complexo tão precocemente “abre pela primeira vez (…) a possibilidade do seu efeito estruturante sobre a personalidade total, seja no plano pulsional, seja no do ego” (2003:201). No entanto, “será preciso esperar pelo tournant de 1920, a partir de Além do Principio do Prazer, para que o Édipo ascenda ao primeiro plano da teoria psicanalítica” (Mezan, 2003:202).
Referências Bibliográficas
MEZAN, R. Freud: A trama dos conceitos. Editora Perspectiva, 4°edição, 2003.
http://www.psicologiamsn.com/2012/03/complexo-de-edipo-historia-conceito.html
Obrigado pela visita, volte sempre.
2 comentários:
muito bom! bjs
Mais uma vez Cristiane, obrigado por comentar.
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