sexta-feira, 7 de junho de 2024

O UTILITARISMO DE JEREMY BENTHAM




Bentham (1748-1832) é considerado um dos primeiros juristas a estudar o homem econômico, sendo reconhecido como uma das figuras mais importantes da história intelectual ocidental, apesar de ter recebido menos atenção que John Locke, Thomas Hobbes, Adam Smith e John Stuart Mill e por ter sido alvo de críticas de Karl Marx e Michel Foucault[1].

Não obstante o aparente demérito, Bentham foi um dos grandes juristas dedicados à filosofia e à construção de uma teoria geral do direito, ainda muito influente nas Universidades inglesas e norte-americanas, como constata Ronald Dworkin[2]. Em sua vida profissional, Bentham desistiu da prática advocatícia por se sentir repelido pela natureza do direito inglês, a qual o pensador inglês via como “uma intratável e desordenada acumulação de precedentes e práticas, atirada através de técnicas e ficções incompreensíveis para todos, excetos os juristas profissionais”[3]. A partir de 1770, influenciado pelas leituras de Helvécios e Beccaria, dedicou-se ao estudo da legislação, tendo como objeto de análise, ao contrário de William Blackstone, o direito deontológico[4] utilitarista (como deveria ser), e não o ontológico (como ele era).

Em sua obra An Introduction to the Principles of Moral and Legislation, publicada pela primeira vez em 1786, Jeremy Bentham defende a tese de que os princípios da moral e da legislação são construídos a partir de considerações a respeito do indivíduo, e não da sociedade. Esta última, aliás, nada mais é do que a soma dos indivíduos que a integram, ou seja, um corpo fictício. Analisando-se o indivíduo, é possível afirmar que as ações humanas são guiadas pelos sentimentos de prazer e dor. Bentham ressalta que estes são os dois senhores soberanos das ações e do pensamento do homem:

A natureza colocou o gênero humano sob o domínio de dois senhores soberanos: a dor e o prazer. Somente a eles compete apontar o que na realidade faremos. Ao trono desses dois senhores está vinculada a norma que distingue o que é certo do que é errado, e por outra, a cadeia das causas e dos efeitos.[5]
           
Nesse sentido, a grande premissa do pensamento jusfilosófico de Jeremy Bentham é de que os seres humanos agem como maximizadores racionais de suas satisfações em todas as esferas da vida. Neste viés, o utilitarismo, ou princípio da utilidade, é aquele que aprova ou desaprova qualquer ação, segundo a tendência que tem a aumentar ou diminuir a felicidade da pessoa cujo interesse está em jogo. Assim, uma ação estará em conformidade com o princípio da utilidade, quando a tendência que ela tem para aumentar a felicidade for maior do que qualquer tendência que tenha a diminuí-la.

Bentham propunha que o princípio da utilidade (prazer/dor; felicidade/tristeza) deveria ser uma norteador não só para as ações dos indivíduos, mas do próprio Estado, no tocante à nomogênese jurídica. Deste modo, entendendo os interesses da comunidade como as somas dos interesses de seus diversos membros, caberia aos governantes e legisladores propor leis e políticas públicas no sentido de gerar o máximo de felicidade para todos.

O filósofo John Rawls, um dos maiores críticos do utilitarismo e responsável pelo desenvolvimento da teoria da justiça como equidade, identifica que a ideia principal desta corrente é de que “a sociedade está ordenada de forma correta e, portanto, justa, quando suas instituições mais importantes estão planejadas de modo a conseguir o maior saldo líquido de satisfação obtido a partir da soma das participações individuais de todos os seus membros”[6].

Mas qual a consequência do utilitarismo benhtamiano para a análise econômica do direito? A grande herança deixada por Bentham é a fundamentação filosófica e moral que legitima o cálculo individualista (maior satisfação) para a obtenção de justiça através das instituições: se os homens são maximizadores racionais de suas satisfações pelo viés individual, com base no contraste entre prazer e dor, caberia ao Estado - ao Legislativo e, em última instância, ao Judiciário - atuar com o escopo de maximizar a riqueza na sociedade, garantindo maior felicidade para um maior número de pessoas (the greatest happiness for the greatest number), e consequentemente, promovendo o bem-estar social.

Ao analisar o conceito de justiça na perspectiva utilitarista, John Rawls critica um ponto fundamental desta teoria: o utilitarismo não leva a sério as diferenças entre as pessoas, elemento essencial para o desenvolvimento de sua teoria de justiça distributiva. Assim aduz Rawls:

Nessa concepção da sociedade os indivíduos isolados são vistos como um número correspondente de linhas ao longo das quais direitos e deveres devem ser atribuídos e os parcos meios de satisfação distribuídos de acordo com certas regras, de modo a permitir o preenchimento máximo de carências. A natureza da decisão tomada pelo legislador ideal não é, portanto, substancialmente diferente da de um empreendedor que decide como maximizar seus lucros por meio da produção desta ou daquela mercadoria, ou da de um consumidor que decide como maximizar sua satisfação mediante a compra desta ou daquele conjunto de bens. Em cada um desses casos há uma única pessoa cujo sistema de desejos determina a melhor distribuição de meios limitados. A decisão correta é essencialmente uma questão de administração eficiente. Essa visão da cooperação social é a conseqüência de se estender à sociedade o princípio da escolha para um único ser humano, e depois, fazer a extensão funcionar, juntando todas as pessoas numa só através dos atos criativos do observador solidário e imparcial. O utilitarismo não a sério a diferença entre as pessoas.[7]

Noutro aspecto, o problema da utilização da teoria utilitarista benthamiana é a vagueza do conceito de utilidade (ou amplitude semântica) e a ausência de critérios de mensurabilidade de felicidade. Como aponta o pesquisador português Nuno Garoupa, o conceito econômico de utilidade é bastante abrangente, não havendo, no utilitarismo clássico, uma medida exata de utilidade individual:

O bem-estar social mede-se pela agregação do bem-estar dos indivíduos. Também aqui não há uma medida única de agregação, sendo o utilitarismo puro (a soma simples e não ponderada da utilidade individual) apenas uma possibilidade, talvez a mais habitual e não menos isenta de polémica. Outra medida possível é aquela que se designa por rawlsiano e consiste na preponderância absoluta dos indivíduos com menor utilidade na função de bem-estar social.[8]

No tocante aos estudos e teorias sobre a legislação, Ronald Dworkin afirma que Bentham é o “fundador da forma inglesa de positivismo jurídico” em razão da compreensão do ponto fundamental e verdadeiro valor da legalidade. Constata Dworkin que:

Sua concepção da virtude da legalidade não estava baseada na exatidão, mas na eficiência. A moralidade política, pensava ele, encontra-se no bem maior para o maior número, e a melhor maneira de assegurar que isso aconteça não é por meio das diferentes decisões coercitivas ou políticas tomadas por diferentes autoridades com base em seus julgamentos imediatos e divergentes, mas sim por meio de esquemas políticos detalhados cujas conseqüências complexas podem ser objeto de um cuidadoso estudo preliminar, e que podem ser formulados detalhadamente, de preferência em complexos códigos jurídicos, e aplicados ao pé da letra.[9]

Bentham pensava, portanto, que um complexo sistema de normas estabelecidas pelos detentores do poder e da legalidade seria a forma mais eficiente de instrumentalizar um sistema capaz de garantir a maximização da riqueza e do bem-estar[10] dos homens.

Esta concepção utilitarista do ordenamento jurídico, fundada em princípios modernos individualistas, além de influenciar alguns economistas como David Ricardo[11], serviu de pressuposto moral para a estruturação lógico-racional das teorias jurídico-econômicas da Escola de Chicago, como constata Carlos Santiago Niño[12]. Neste sentido, compreender o utilitarismo benthamiano é um pressuposto para a análise da teoria da eficiência da law and economics.

É possível observar elementos centrais do pensamento utilitarismo benthamiano na análise econômica do direito (law and economics), corrente acadêmica norte-americana que tem como Richard Posner um dos seus principais expoentes e que será analisada num momento posterior.

É a partir de Bentham que se pode compreender de que forma Richard Posner substitui o conceito de maximização das satisfações individuais (utilitarismo na forma clássica) pelo conceito de maximização da riqueza (eficientismo econômico) como critério de decidibilidade e avaliação do próprio sistema Judiciário.


[1] John Dinwiddy aponta que um dos motivos de Jeremy Bentham ter sido negligenciado e duramente criticado por alguns autores é que, na academia em geral, somente seus primeiros trabalhos são analisados (A fragment on Government An Introduction to the Principles of Morals and Legislation) e não toda sua obra: “From this partial perspective there emerged an image of a thinker whom some hostile commentators depicted as simplistic, shallow, philistine, extreme, and easy to criticize. Karl Max dismissed Bentham as ‘the insipid, leather-tongued oracle of the commonplace bourgeois imagination’; Charles Dickens satirized Bentham’s followers in Hard Times through the character of Mr. Gradgrin, portraying them as mechanistic social engineers who suppressed all aspects of the imagination in favour of brute facts. In modern times, Michel Foucault further damaged Bentham’s reputation by making his design for prisons and like institutions (the Panopticon) the archetypal symbol for repressive authoritarian control. Finally, Bentham’s remains are publicly displayed, fully clothed, in a cupboard in University College London and this ‘auto-icon’ is often treated with a mixture of bewilderment and disgust or is dismissed as an example of English eccentricity combined with bad taste”. DINWIDDY, John. Bentham: selected writings of John Dinwiddy. Stanford: Stanford University Press, 2004, p. 2.
[2] “Pode-se encontrar em sua obra uma parte conceitual e uma parte normativa de uma teoria geral do direito e, na parte normativa, teorias bem definidas da legitimidade, da justiça legislativa, da jurisdição e da controvérsia, todas adequadamente articuladas por uma teoria política utilitarista e uma teoria metafísica empiricista mais geral. Cada componente desta teoria foi desde então desenvolvido e aprimorado por diferentes autores, mas a teoria do direito que prevalece nas universidades inglesas e norte-americanas continua sendo uma teoria benthamiana.” DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. XI.
[3] DINWIDDY, John. Op. Cit., p. 12.
[4] Segundo a pesquisa do Desembargador Arnaldo Lazzarini, “o vocábulo deontologia, ainda hoje, é considerado um neologismo, introduzido por Jeremy Bentham, na nomenclatura filosófica. Esse filósofo e economista inglês, com efeito, o adotou no título de uma de suas obras, aliás publicada postumamente no ano de 1834, ou seja, a sua ‘Deontology or the Science of Morality’. E foi o próprio Jeremy Bentham que explicou o significado do seu neologismo, composto de duas palavras gregas: ‘deon’, que significa o que é conveniente, obrigatório, que deve ser feito, o dever; e ‘logia’, ou seja, o conhecimento metódico, sistemático e fundado em argumentos e provas”. LAZZARINI, Alvaro. Magistratura: deontologia, função e poderes do juiz. Caderno de doutrina e jurisprudência da Escola da Magistratura da 15ª Região, Campinas, v. 1, n. 4, jul./ago. 2005, p. 119. Entretanto, Bentham desenvolve seu conceito de deontologia com base no utilitarismo, diferentemente da deontologia kantiana baseada na dignidade de um dever moral a ser cumprido: “The principle, then, on which Deontology is grounded, is the principle of Utility; in other words, that every action is right or wrong – worth or unworth – deserving approbation or disapprobation, in proportion to its tendency to contribute to, or to diminish the amount of public happiness”. BENTHAM, Jeremy. Deontology; or The Science of Morality. London: Edinburgh, 1834, p. 24.
[5] BENTHAM, Jeremy. Uma Introdução aos Princípios da Moral e da Legislação. tradução Luiz João Baraúna. São Paulo: Editora Victor Civita, 1984, p. 10.
[6] RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Trad. Almiro Pisetta e Lenita Maria Rimoli Esteves. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 25.
[7] Idem, Ibidem, p.29-30.
[8] GAROUPA, Nuno. Combinar a Economia e o Direito: A Análise Económica do Direito. Systemas - Revista de Ciências Jurídicas e Econômicas, América do Norte, 1, jul. 2009. Disponível em: http://www.revistasystemas.com.br/index.php/systemas/article/view/11/12 . Acesso em: 19 Abr. 2010.
[9] DWORKIN, Ronald. A Justiça de Toga. São Paulo: Martins Fontes, 2010, p. 248.
[10] Não cabe aqui aprofundarmos a discussão sobre o conceito de bem-estar social, pois foge ao objeto de análise deste trabalho, mas é preciso frisar que o utilitarismo clássico proposto por Bentham e sistematizado posteriormente por John Stuart Mill, implica que o Estado deve proporcionar de forma eficiente a maximização da felicidade dos indivíduos, principalmente através de um complexo sistema de normas previamente estabelecidas.
[11] A análise da influência do utilitarismo clássico de Bentham no pensamento econômico de Ricardo foi realizada pelo Prof. Stark da Universidade de Edinburgo já na década de quarenta: “It is permitted to use modern jargon, the matter can be summed up by saying that Bentham and the Ricardians had a common ideology. They shared the belief that man is essentially a selfish animal; that it is useless to fight that selfishness, and unnecessary at the same time, because, where freedom is guaranteed, a conflict between personal and public welfare is precluded by the admirable mechanism of modern market relations”. STARCK, Werner. Jeremy Bentham as an Economist. The Economic Journal, v. 56, n. 224, pp. 583-608, dez., 1946.
[12] Niño entende que é difícil mensurar a influência que a concepção utilitarista tem exercido sobre o pensamento ocidental, principalmente nos países de língua inglesa: “Con ciertos altibajos a través del tempo y hasta hace muy pocos años, en que comenzó a desarrollarse en los medios intelectuales una ponderosa reacción en contra de esta concepción, se presuponía corrientemente, en esos ámbitos, que la apelación a consideraciones utilitaristas constituía la única alternativa válida para justificar institicuiones y cursos de acción, y que la negativa a hacerlo era muestra de obscurantismo , confusión conceptual o indiferencia hacia los intereses de otros. La difusión práctica de esta filosofía fue randemente favorecida por el desarrollo de ciertas concepciones económias que tienen al utilitarismo como presupuesto moral. Por otra parte, en lo que nos interesa más directamente a nosotros, el utilitarismo ha influido de innumerables maneras en el derecho; una de ellas es, como veremos más tarde, a través de los enfoques económicos recién mencionados, que han sido aplicados al derecho, principalmente en los Estados Unidos, dando lugar a lo que se ha dado en llamar en los últimos años “el análisis económico del derecho”. NIÑO, Carlos Santiago. Introducción al análisis del derecho. 2ª ed. Buenos Aires: Astrea, 2003, p. 391.


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O pai dos burros – SAPIENTIAM AUTEM NON VINCIT MALITIA Olavo de Carvalho Jornal da Tarde, 19 de junho de 2003


O Dicionário Houaiss define “socialismo” como “conjunto de doutrinas (a) de fundo humanitário que visam reformar a sociedade capitalista (b) para diminuir um pouco de suas desigualdades; conjunto de doutrinas que, (c) tendo por objetivo o bem comum, (d) preconizam uma reforma radical da organização social, mediante a supressão das classes e a coletivização dos meios de produção e de distribuição“.

As características aí assinaladas são quatro. Só a última é um traço definitório: as outras três são virtudes autoproclamadas que o socialismo emprega na sua propaganda, mas que não o definem de maneira alguma. Não o definem, acima de tudo, porque não lhe são próprias, mas comuns a pelo menos dois de seus concorrentes: o liberalismo e a doutrina social da Igreja.

Nada mais expressivo do humanitarismo do que os primeiros passos com que o capitalismo emergente no século XIX marcou, por atos e não por promessas, seu ingresso na história do mundo: o governo constitucional, os tribunais livres, a liberdade de imprensa.

Para diminuir as desigualdades, o socialismo nunca fez — aliás nem imaginou — nada de comparável à abolição da escravatura e das servidões territoriais, à universalização do trabalho livre e à supressão dos privilégios de casta, três realizações tipicamente capitalistas.

Por fim, muito antes da difusão das idéias socialistas o conceito de “bem comum”, que remonta a Aristóteles e a Sto. Tomás, já estava integrado na doutrina social da Igreja, que dele deduzia, precisamente, a necessidade da propriedade privada dos meios de produção em vez de sua concentração em mãos de uma burocracia estatal onipotente.

Sobra, portanto, para definir o socialismo, só a coletivização dos meios de produção. Já que o Houaiss não diz o que ela é, digo-o eu: é suprimir a existência do poder econômico independente, concentrando todas as riquezas e o seu controle nas mãos dos que têm o poder político. Tal é, rigorosamente, a definição do socialismo: a unificação de poder econômico e político. No capitalismo há uma classe burguesa, dona dos meios de produção, e uma classe política que ora se alia com ela, ora lhe faz oposição (como já se vê pelo simples fato de serem tão numerosos os políticos socialistas). Há ricos fora da política e políticos sem poder econômico. No socialismo não há uma coisa nem outra: quem tem o poder político tem o econômico, e quem não tem este nem aquele não tem nada. Por isso, enquanto cada cidadão das repúblicas socialistas na década de 80 comia menos proteínas que um súdito do tzar, cada membro da nomenklatura soviética possuía uma casa de campo do tamanho do Museu da República e os chazinhos íntimos que a sra. Brejnev dava para suas amigas às quintas-feiras eram abrilhantados por nada menos que a Sinfônica de Moucou. Por isso surgiram tantos milionários das cinzas de um regime em que, nominalmente, ninguém tinha riqueza pessoal. Isso era absolutamente inevitável, sendo o socialismo o que é.

Que tantas pessoas tenham chegado a imaginar que o socialismo fosse um bom modo de reduzir as desigualdades, eis um daqueles grandes mistérios da alma humana que nem o próprio Dr. Freud jamais ousou sondar. Calemo-nos portanto diante da majestas imbecilitatis, e voltemos ao dicionário.

Uma boa definição deve dizer o essencial do seu objeto e nada além dele. O Houaiss omite a definição do socialismo e o adorna de qualidades que não são dele. Millôr Fernandes dizia que Antonio Houaiss conhecia todas as palavra do idioma, só lhe faltando saber juntá-las. Aqui, ao contrário, ele as juntou muito bem, mas só para separá-las infinitamente da realidade a que fingem aludir.

Que o verbete assim redigido acabasse sendo usado na propaganda do Partido Socialista Brasileiro na TV, nada mais natural. O próprio Houaiss era membro desse Partido. As sucessivas edições do seu dicionário constituem, portanto, uma espécie de militância de além-túmulo.

Em seu clássico Tratado da Desinformação, Vladimir Volkoff assinala que, desde a década de 30, a KGB já realçava a importância dos dicionários como instrumentos de dominação cultural, deformando a linguagem para embotar as consciências. É assim que esses grossos repertórios de palavras vão merecendo cada vez mais a denominação de “pais dos burros”: pois geram leitores que pensam como seus autores.

fonte: https://olavodecarvalho.org/o-pai-dos-burros/acessadodia07/062024às18:46


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Projeto de Ensino: Empreendedorismo em Pequena Escala: Capacitação e Apoio para Microempreendedores

quinta-feira, 6 de junho de 2024

Resolução CNE/CP N°4, de 29 de maio de 2024. Comentando e lendo comentáios


CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO CONSELHO PLENO RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 4, DE 29 DE MAIO DE 2024 (*
https://archive.org/details/rcp004_24

A verdadeira causa das mudanças climáticas


Enquanto a esquerda ataca hábitos e costumes, conservadores focam em um estranho mecanicismo aleatório do clima


A


narrativa oficial das mudanças climáticas é a de que elas são causadas pela ação humana, que vai desde a industrialização e suas emissões de gás carbônico até pequenas ações, hábitos, costumes e até crenças religiosas que têm levado o homem a uma relação predatória com a natureza. Por trás dessa corrente, está tanto o paganismo clássico da ideologia da modernidade, que conclamaram o dogma mecanicista da realidade e deram origem ao globalismo financista, cientificista e transumanista, como também o seu upgrade pós-moderno, que parte da crítica ao mecanicismo e propõe uma visão “mais humana” e sistêmica. Esta última é a ecologia, que se baseia na rebelião contra sua irmã mais velha, a modernidade cientificista. Ambas fazem parte do grande projeto da modernidade, cujo objetivo inicial era sepultar do imaginário a explicação tradicional da Igreja sobre a atuação de Deus no mundo.

O grande erro da maioria dos conservadores atuais é querer jogar a irmã mais velha contra a mais nova. A modernidade cientificista é, por definição, uma etapa inicial do mesmo processo que culmina no culto à natureza, expresso por declarações recentes como a de que as enchentes no Rio Grande do Sul são “a vingança da Mãe Terra contra o estado mais comedor de carne do país”. Mas tal aproveitamento da tragédia para avançar na agenda neopagã não conta com um combate efetivo da parte conservadora, que prefere dizer que as mudanças climáticas são, na verdade, fruto de uma coincidência ou de um movimento cíclico e desconhecido, explicável pela simples ignorância humana a respeito das leis naturais.

Esta é efetivamente a agenda “negacionista” dos conservadores, que resgatam a modernidade científica contra a pós-modernidade. Ora, mas este é precisamente o inimigo mais conhecido dos ambientalistas, uma vez que toda a sua ideologia é exatamente um conjunto de argumentos elaborados para derrubar essas mesmas prerrogativas. Mas então por que os conservadores recorrem a essa arma tão inútil? A resposta é complexa, mas pode ser facilmente simplificada numa palavra: medo.

Afinal, qual a dificuldade de se retornar à cosmovisão cristã atacada inicialmente pela modernidade? A dificuldade está na histórica omissão dos conservadores que, no anseio de conciliar-se com a modernidade, incapacitaram-se moralmente para sustentar que as mudanças climáticas são, no fundo, uma resposta do próprio Deus para a imoralidade crescente. Nunca a humanidade viveu um tal grau de imoralidade como agora. Experimente quantificar o número de divorciados vivendo em segunda união, duplas homossexuais, abortos, contracepção e uma enormidade de monstruosidades que a grande maioria das pessoas acostumou-se a ver com naturalidade.

Não seria necessário recorrer a hábitos e costumes de reciclagem de lixo, como fazem os ambientalistas. Bastaria olhar para a destruição dos costumes e as aberrações sexuais que, no último requinte da vanguarda diabólica, já conduziu o mundo moderno aos rituais satânicos públicos, cultos diabólicos muitas vezes expressos em termos eufemisticamente indiferentista. A última etapa da Revolução total está muito bem explícita na atual ideologia russa, que une o gnosticismo guenoniano responsável pela islamização da Europa, com todo o lixo do misticismo neonazista, para seduzir os jovens cansados da abominação pós-moderna. O tradicionalismo das trevas é a alternativa criada pelo demônio para enlaçar conservadores e católicos.

E o que eles estão fazendo em relação a isso? Enquanto satanistas como Dugin seduzem centenas de jovens desorientados pela modernidade em busca de um sentido mais radical para suas vidas, os conservadores oferecem um “deixa disso”, uma resposta sem sal e sem força, repetindo os mesmos erros modernos contra os quais esses jovens estão sendo vacinados. Só que lutarão pelo império gnóstico e não pela Santa Igreja.

Em breve, porém, o “negacionismo do clima” será criminalizado e os conservadores terão novamente que migrar as suas queixas para a censura, defesas da liberdade de expressão etc, pautas bem conhecidas da própria esquerda e que já contam com antídotos bem simples: entre os principais defensores da liberdade de expressão  na internet atualmente estão neonazistas e criminosos da internet, que serão facilmente associados aos demais reclamantes. Tudo isso por culpa do medo. O sucessivo retrocesso como estratégia de combate de narrativas. Uma tática sem dúvidas genial, que está levando a história a um caminho extremamente previsível.

A ideia é a de que, se há elementos racionais, científicos, que expliquem ou refutem as teses ambientalistas, eles são preferíveis antes de se entrar em um argumento religioso. A simples vontade de Deus, expressa tantas e tantas vezes na Biblia, se torna o último recurso. Mas será que depois de conciliar-se com o mundo em grau tão elevado haverá coragem disponível para se recorrer a Deus na última hora?

A grande ilusão da modernidade se expressa na tese da informação e do conhecimento como elemento indispensável para um “avanço” ou evolução da humanidade em direção a uma verdade final. É verdade que o próprio Santo Tomás escreveu a Suma Contra os Gentios dirigindo-se aos pressupostos leigos para convence-los. Mas vejamos a enorme diferença: se é necessário caminhar pelas premissas CORRETAS dos hereges e dos ateus para conduzi-los às conclusões corretas, isso não implica em considerar premissas FALSAS como verdadeiras na esperança de transformar a mentira em verdade tendo a mentira como meio.

Essa ideia do conhecimento, iniciado pelos anticristãos enciclopedistas, conduziu-nos à utopia da “era da informação”, já fracassada pelo imenso vácuo de trevas e ignorância que gerou. Desinformação, mentiras, fake news e um sistema inteiro de mídia montado para enganar são os efeitos desse projeto enciclopedico, cujo último suspiro foi a internet.

Ao contrário do que se pensa, a verdade não se encontra afirmando-se tudo o que possa conduzir, potencialmente, a ela. Isso gera a conclusão que estamos vendo à nossa volta, a de que todos os caminhos levam à verdade igualmente. O que nenhum conservador moderno está disposto a admitir é que a Verdade se alcança muito mais facilmente na negação de si mesmo do que na gostosa entrega aos estímulos, na orgia imaginativa sonhada apenas nos porões dos hereges medievais que a modernidade empoderou e a pós-modernidade encastelou no coração do homem moderno.

Autor

  • Cristian Derosa

    Jornalista e escritor, autor do livro O Sol Negro da Rússia: as raízes ocultistas do eurasianismo, além de outros 5 títulos sobre jornalismo e opinião pública. Editor e fundador do site do Instituto Estudos Nacionais

fonte: https://www.estudosnacionais.com/40225/a-verdadeira-causa-das-mudancas-climaticas/acessadoem06/06/2024às21:00


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quarta-feira, 5 de junho de 2024

Unifatecie segunda licenciatura em pedagogia em 2024 vale à pena? Por João Maria andarilho utópico. Podcast



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Bençãos e Glórias do Srimad Bagavat Gita Gita Mahatmia Lendo capítulo 1 podcast.




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Bhagavata Mahatmya: A Jornada e Rejuvenescimento de Bhakti Devi



De volta ao Supremo

Por Satyaraja Dasa

Uma seção do Padma Purana glorificando o Bhagavatam apresenta um relato alegórico das viagens de Bhakti.

Nos textos tradicionais de sabedoria da Índia, bhakti, ou devoção, às vezes é apresentada como uma pessoa. Isto é especialmente verdade na literatura Gaudiya Vaishnava. No Chaitanya-candrodaya-natakam de Kavi Karnapura, por exemplo, vemos bhakti personificada como personagem de uma peça. Na era moderna, o Bhakti-tattva-viveka de Bhaktivinoda Thakura a descreve como uma personificação da svarupa-shakti, a energia interna do Senhor e, portanto, uma manifestação de Sri Radha, a potência espiritual última de Krishna. Nos outros escritos de Thakura e nos de seu filho, Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati, entre outros mestres espirituais da linha de Chaitanya Mahaprabhu, Bhakti Devi é alternadamente considerado uma manifestação de Vrinda Devi (uma gopi primária associada de Sri Radha) e uma personalidade não identificada simplesmente conhecida como Bhakti Devi.

Sua aparição mais significativa é, sem dúvida, no Bhagavata Mahatmya do Padma Purana,1 um pequeno texto de seis capítulos que glorifica o Bhagavata Purana (Srimad-Bhagavatam), conhecido como o fruto maduro da árvore védica do conhecimento. Este mahatmya (“glorificação”) às vezes é posicionado como um prefácio às edições contemporâneas em sânscrito e hindi do próprio Bhagavatam ou publicado como um livreto separado.

A Jornada de Bhakti

O Bhagavata Mahatmya do Padma Purana começa com Bhakti contando a história de sua manifestação na era de Kali, nossa atual época de disputas e hipocrisia. Ela nasceu em Dravidadesha, diz ela, que se refere à porção sul do subcontinente indiano, e logo iniciou sua jornada para o norte. Tradicionalmente, o seu “nascimento” no sul é visto como uma referência ao Vaishnavismo dos Alvars, os doze famosos santos-poetas do sul da Índia. Embora bhakti seja, obviamente, um princípio eterno, Bhakti Devi faz sua aparição manifesta em Kali-yuga com a espiritualidade dos Alvars.

Bhakti Devi continua para o norte até Karnataka, e isso é considerado uma referência ao desenvolvimento da tradição bhakti por Madhvacharya, que ocorreu na costa sudoeste da Índia no século XIII. Com o estabelecimento de seus ensinamentos, bhakti ficou firmemente enraizado no solo indiano, e os devotos de Bhakti Devi prosperaram de várias maneiras. Ela diz que atingiu um ponto alto em Karnataka. Na verdade, as várias sampradayas, linhagens tradicionais, foram sistematizadas durante este período geral – nomeadamente as de Ramanuja, Nimbarka e Vishnu Swami – e outros devotos também alimentaram a tradição de bhakti para todos os que tiveram a sorte de abraçar os seus ensinamentos.

Mas algo estranho aconteceu enquanto ela se dirigia para o norte, para Maharashtra e depois para Gujarat. Bhakti Devi nos conta que ela estava enfraquecida naquela parte da Índia – um processo de envelhecimento prematuro foi estabelecido – e ela ficou quase irreconhecível devido à doença. Seus dois “filhos”, Jñana (conhecimento) e Vairagya (renúncia), afirma ela, também adoeceram.

Historiadores de Bhakti, como Shrivatsa Goswami e Krishna Sharma, exploraram exatamente por que Bhakti experimentou dificuldades durante sua estada em Maharashtra/Gujarat, mas as respostas não estão disponíveis. Alguns dizem que a grande riqueza associada a Gujarat poderia ter levado à distração dos princípios devocionais, e há certamente um elemento de verdade nessa perspectiva.

Do ponto de vista Gaudiya Vaishnava, entretanto, o envelhecimento prematuro de Bhakti Devi teria mais a ver com elementos especulativos que surgiram entre os praticantes de bhakti naquela época e lugar. Embora existam grandes Vaishnavas associados a essas regiões, uma nova perspectiva engolfou a tradição que comprometia temporariamente as virtudes de Bhakti: nirguna-bhakti, ou uma perspectiva devocional onde a forma de Deus não é enfatizada em favor de uma força impessoal, praticamente suplantou a saguna mais tradicional. -bhakti, que enfatiza a adoração a Krishna ou a uma de Suas manifestações, ou seja, um absoluto pessoal. Em outras palavras, embora renomados poetas-santos maharashtrianos como Kabir, Jnanadev e Namadev levassem a tradição adiante, sua poesia destacava uma divindade sem forma, uma ênfase não endossada pelas linhagens padrão.

No entanto, à medida que Bhakti Devi viajava mais ao norte, para Vrindavan, ela foi rejuvenescida, reintegrada em sua forma original e feliz. O Bhagavata Mahatmya menciona cuidadosamente sua renovação, especialmente observando que ela começou a dançar: dhanya vrindavanam tena bhaktir nrityati yatra, “Louvado seja Vrindavan, onde bhakti está sempre dançando”. (1.61) O professor John Stratton Hawley comenta esta referência à dança, que ele diz associar claramente o ressurgimento de Bhakti Devi em Vrindavan com o avatara dourado, Sri Chaitanya Mahaprabhu, conhecido por Seu canto e dança extática.

Shrivatsa Goswami também, ao recontar a jornada de Bhakti ao norte, destaca o componente Chaitanya da história:

Então isso dá, lindamente, o desenvolvimento histórico da tradição medieval de bhakti. O movimento bhakti nasceu no sul da Índia com os santos dravidianos, os Alvars, e assim por diante. Então, um pouco mais tarde, Ramanuja, o primeiro filósofo sistemático de bhakti, apareceu no país Tamil. . . . Depois de Ramanuja, o próximo grande pensador devocional foi Madhva, que nasceu em Karnataka no final do século XII. Depois disso, o movimento recebeu um grande impulso de diferentes santos que apareceram em toda a Índia, incluindo Maharashtra, durante os séculos XIV, XV e XVI. Esses séculos foram cruciais para o crescimento do movimento bhakti. Mas o movimento bhakti não atingiu o seu desenvolvimento mais elevado, como a passagem indica, até chegar a Vrindavan. [Bhakti alcançou Vrindavan], é claro, na forma de Chaitanya Mahaprabhu porque foi Chaitanya quem, junto com seus seguidores, os Seis Goswamis, foi o fundador de Vrindavan no início do século XVI. Portanto, toda a história do movimento bhakti está resumida aqui de maneira muito bela.2

Mas a narrativa do Bhagavata Mahatmya se desenvolve a partir daí: enquanto Bhakti Devi é reanimada em Vrindavan, seus dois filhos só pioram. A condição deles parece irreparável, e ela se preocupa com o bem-estar deles, pedindo ao santo Narada que a aconselhe sobre o curso de ação apropriado.

Tentando desesperadamente reanimá-los, Narada canta mantras védicos, os Upanishads e até mesmo o Bhagavad-gita, mas nada funciona. Finalmente, os quatro Kumaras chegam e recomendam fortemente a recitação do Bhagavatam – certamente esta será a cura, pois somente o Bhagavatam tem a pureza necessária para tirar o melhor proveito de jñana e vairagya. Os sábios cantam o Bhagavatam e a tarefa está cumprida – seus filhos estão curados.

Assim, o Bhagavata Mahatmya faz o que se propõe a fazer: glorificar o Srimad-Bhagavatam. O ensinamento culminante desta cena vem da boca de Sanat Kumara: “Bhakti produz o néctar do amor divino somente quando se canta o som espiritual do Srimad-Bhagavatam. E nesse momento, esse amor é acompanhado por jñana e vairagya perfeitos, que como resultado dançarão em cada coração e em cada lar.” (Bhagavata Mahatmya 63)

A narrativa prossegue, dizendo que Bhakti Devi inunda toda a Índia, movendo-se mais ao norte, para Hardwar e outros lugares, incluindo “outros países”. Dadas as realizações de Sua Divina Graça AC Bhaktivedanta Swami Prabhupada, especialmente ao trazer o movimento bhakti para o Ocidente em 1965, esta é uma declaração significativa.

O texto é claro: idam sthanam parityajya videsham gamyate maya, “Deixando este lugar, vou para o exterior”. (Bhagavata Mahatmya 1.50) De acordo com Shrivatsa Goswami3 e Satyanarayana Baba, em seu comentário sobre o Bhagavata Mahatmya,4 esta afirmação poderia facilmente apontar para a jornada de Srila Prabhupada ao mundo ocidental. É interessante, também, observa Satyanarayana (p. 244), que o verbo sânscrito usado nesta frase esteja no passivo (gamyate), talvez indicando que ela (Bhakti) será carregada por alguém, não que ela viaje sozinha. .

Da mesma forma, se houver alguma dúvida de que a jornada de Bhakti Devi incluiu uma ida ao exterior, em oposição a apenas qualquer outro lugar na Índia, deve-se notar que o Bhagavata Mahatmya usa especificamente a palavra sânscrita videsham, que, de acordo com o autoritário Monier-Williams (Um sânscrito -Dicionário de Inglês) se traduz como “outro país, país estrangeiro, no exterior”. Estas são definições primárias.5

Ruminações Filosóficas

Gaura Govinda Maharaja (1929–1996), um guru da ISKCON, enquanto lecionava sobre este Bhagavata Mahatmya ( https://tvpbooks.com/2012/04/the-story-of-bhakti-devi/ ), citou Narada Muni falando com Bhakti Devi: “É uma sorte sua ter vindo para Vrindavan Dhama e ter se tornado jovem novamente. Bhakti Devi está sempre dançando em Vrindavan. Não há clientes para jñana e vairagya em Vrindavan, porque todos querem bhakti.”

De acordo com o Srimad-Bhagavatam (1.2.7), jñana e vairagya surgem naturalmente como resultado da devoção ao Senhor. O conhecimento transcendental e o desapego da gratificação dos sentidos seguem naturalmente bhakti. (11.2.43) É por isso que eles são apresentados como filhos de Bhakti Devi no Bhagavata Mahatmya. Dito isto, ensina-se ainda que sem bhakti, o conhecimento e o desapego são inadequados. Eles podem servir a um propósito preliminar, mas sem bhakti ficam aquém. Os professores Gaudiya Vaishnava ao longo da história enfatizaram esse ponto. Como escreve Srila Prabhupada em O Néctar da Devoção (Capítulo 14): “Na verdade, o cultivo do conhecimento ou da renúncia, que são favoráveis ​​para alcançar uma base na consciência de Krishna, pode ser aceito no início, mas no final também pode vir a ser rejeitado, pois o serviço devocional não depende de nada além do sentimento ou desejo por tal serviço”.

Uma vez informados pela devoção, no entanto, o conhecimento e o desapego atingem o seu ritmo: “Nessa posição de autorrealização, pela prática do conhecimento e da renúncia no serviço devocional, vê-se tudo na perspectiva correta; ele se torna indiferente à existência material, e a influência material age com menos poder sobre ele”. (Bhagavatam 3.25.18) Além disso, “Jñana e vairagya podem ser alcançados simplesmente tornando-se um devoto de Vasudeva [Krishna]. Esse é o veredicto do Srimad-Bhagavatam. Vasudeve bhagavati bhakti-yoga? Prayojita?, janayaty ashu vairagyam [Bhagavatam 1.2.7]. Ashu. . . muito em breve. Tal como estes rapazes, estes rapazes americanos, estes rapazes europeus, eles são jovens. Agora eles adotaram sannyasa e dedicaram suas vidas ao serviço de Krishna. Eles são vairagya.” (palestra de Prabhupada, Calcutá, 30 de junho de 1973)

Em outras palavras, todos os fins espirituais são alcançados adotando-se bhakti, e uma prática primária de bhakti é recitar o Srimad-Bhagavatam, pois é idêntico ao reino espiritual. Este é o ensinamento do Bhagavata Mahatmya. Em todos os casos, bhakti deve ser abraçada como a própria fonte de todos os outros bens espirituais. Na verdade, estes bens não mostram a sua verdadeira face até que bhakti seja totalmente abraçada.

Elaborando sobre a essência da bhakti pura, o devoto erudito OBL Kapoor observa:

Diz-se que Prahlada praticou bhakti no ventre de sua mãe, Dhruva na infância, Ambarisha na juventude, Yayati na velhice, Ajamila na hora da morte e Citraketu no céu, após a morte. Mesmo aqueles condenados ao inferno ou aqueles que alcançaram a libertação após a escravidão praticaram a devoção e alcançaram o fim supremo. Bhakti é destinado tanto para aqueles que desejam a liberação quanto para aqueles que a alcançaram. . . . A superioridade de bhakti sobre os outros caminhos de realização é, portanto, aparente. Aqueles que preferem jñana a bhakti são, portanto, comparados a pessoas que correm atrás do joio e desprezam o grão. O Gita (6.46-47) afirma inequivocamente que yoga é superior a jñana e karma, e que bhakti é superior a todos eles.6

Deve-se notar que embora bhakti pura transcenda jñana, karma e vairagya comuns, eles permanecem parte de bhakti em suas formas purificadas. A bhakti pura dirigida ao Senhor Krishna pressupõe um certo conhecimento do objeto de devoção, Sua forma, Seus atributos e o relacionamento entre Ele e o resto do mundo, bem como o desapego concomitante que surge como resultado desse conhecimento. Chaitanya-charitamrita (Adi 2.117) alerta contra qualquer indiferença para com esse tipo de conhecimento, que é necessário para uma fé firme em Krishna e devoção exclusiva a Ele: “Um estudante sincero não deve negligenciar a discussão de tais conclusões, considerando-as controversas, pois tais discussões fortalecem a mente. Assim a mente fica apegada a Sri Krishna.”

É por isso que o Bhagavata Mahatmya descreve Bhakti Devi implorando aos sábios pelo bem-estar de seus filhos, e os sábios, por sua vez, recitam corretamente o Bhagavatam como o remédio prescrito. Pois, como afirmado, somente o Bhagavatam pode levar jñana e vairagya ao nível necessário para a prática de bhakti puro. A propósito disso, podemos contemplar as palavras finais do Bhagavata Mahatmya:

Sri Shukadeva Goswami falou o Bhagavatam enquanto estava em êxtase. Qualquer pessoa que recite ou ouça o Bhagavatam está qualificada para ir para o mundo espiritual. . . . Depois de estudar várias escrituras, eu [um dos quatro Kumaras] revelei este segredo para você, que é a essência de todas as escrituras. Não há nada superior a este Bhagavatam falado por Shukadeva Goswami. Para alcançar a bem-aventurança transcendental, você deve sempre beber o Bhagavatam, que é composto de doze cantos. Qualquer um que ouça o Bhagavatam dos lábios de um devoto puro, com fé e um coração puro, ou o recite aos devotos, alcançará o objetivo supremo. Nos três mundos não há nada inatingível para tal pessoa.

Portanto, no cerne da exaltação do Bhagavata Mahatmya está a afirmação quintessencial de Krishna: “Tudo o que parece ter algum valor [até e incluindo jñana e vairagya], se não tiver relação Comigo, não tem realidade.” (Bhagavatam 2.9.34)

Em outras palavras, para serem viáveis, jñana e vairagya devem apegar-se a Krishna bhakti. Caso contrário, em última análise, são simplesmente contingências de ilusão, moeda falsa sujeita a confisco. Pessoas infelizes que acreditam falsamente possuir algo de valor ficam tristemente desenganadas do erro quando a fraude é descoberta. Eles ficam lamentando. O Bhagavata Mahatmya, ao glorificar bhakti como o elemento indispensável na vida espiritual, protege assim contra esta triste reviravolta nos acontecimentos.

Esta conclusão deve ser vista como edificante, pois deixa claro o singular bálsamo espiritual conhecido como Srimad-Bhagavatam. O Bhagavata Mahatmya dá aos leitores inspiração para ler este melhor de todos os Puranas. “Depois da recitação do Bhagavatam”, diz-nos o Bhagavata Mahatmya, “Jñana, Vairagya e Bhakti estavam no seu melhor. Sendo jovens e entusiasmados, atraíram os corações de todas as entidades vivas. . . . No meio de todos, Bhakti, Jñana e Vairagya dançaram como artistas experientes.” Na verdade, com o tipo de estímulo que recebemos de textos como o Bhagavata Mahatmya do Padma Purana, poderemos um dia seguir o seu exemplo.

NOTAS

1. Mahatmyas constituem um gênero (Gita Mahatmya, Mathura Mahatmya, etc.), e existem outros Bhagavata Mahatmyas além daquele mencionado neste artigo.

2 Steven J. Gelberg, ed., “Entrevista com Shrivatsa Goswami” em Hare Krishna, Hare Krishna: Cinco Distinguished Scholars on the Krishna Movement in the West (Nova York: Grove Press, 1983), p. 212.

3 Ibidem, página 244.

4 Sri Satyanarayana Dasa, trad., Srimad Bhagavata Mahatmya: As Glórias do Srimad Bhagavatam (Vrindavan: BSI Gurukula, sd), p. 10.

5 Quando Gelberg questiona Shrivatsa Goswami sobre a palavra videsham, perguntando como sabemos que não se refere apenas a outra província na Índia, em oposição a “no exterior”, Shrivatsa argumenta que todos os outros lugares são mencionados pelo nome, um recurso comum em mahatmya literatura, mas de alguma forma, misteriosamente, este videsham fica vago, indicando que se trata de algum lugar desconhecido. Este pequeno facto, em conjunto com a forma como a palavra é definida pelos especialistas em sânscrito, aponta para “outro país”. Como observa Shrivatsa Goswami: Neste contexto, desha significa “país” e vi significa “outro”.

6 OBL Kapoor, “O Caminho de Bhakti”, De Volta ao Supremo, Vol. 65, maio de 1974.

Fonte:  http://www.dandavats.com/?p=84777

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