quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Teoria da comunicação – Wikipédia, a enciclopédia livre


A teoria da comunicação é uma descrição proposta dos fenômenos da comunicação, as relações entre eles, um enredo descrevendo essas relações e um argumento para esses três elementos. A teoria da comunicação fornece uma maneira de falar e analisar os principais eventos, processos e compromissos que juntos formam a comunicação. A teoria pode ser vista como uma forma de mapear o mundo e torná-lo navegável; a teoria da comunicação nos dá ferramentas para responder a questões de comunicação empíricas, conceituais ou práticas.[1]

A comunicação é definida tanto no senso comum quanto nas formas especializadas. A teoria da comunicação enfatiza seus aspectos simbólicos e de processo social vistos de duas perspectivas – como troca de informações (a perspectiva da transmissão) e como trabalho feito para conectar e, assim, possibilitar essa troca (a perspectiva ritual).[2]

A pesquisa sociolinguística nas décadas de 1950 e 1960 demonstrou que o nível em que as pessoas mudam a formalidade de sua língua dependendo do contexto social em que estão. Isso foi explicado em termos de normas sociais que ditavam o uso da linguagem. A maneira como usamos a linguagem varia de pessoa para pessoa.[3]

As teorias da comunicação surgiram de vários pontos históricos de origem, incluindo tradições clássicas de oratória e retórica, concepções da sociedade e da mente do Iluminismo e esforços pós-Segunda Guerra Mundial para entender a propaganda e as relações entre mídia e sociedade.[4][5][6] Proeminentes teóricos da comunicação fundamental histórica e moderna incluem Kurt LewinHarold LasswellPaul LazarsfeldCarl HovlandJames CareyElihu KatzKenneth BurkeJohn DeweyJurgen HabermasMarshall McLuhanTheodor AdornoAntonio GramsciRobert E. ParkGeorge Herbert MeadJoseph WaltherClaude Shannon and Stuart Hall — embora alguns desses teóricos possam não se associar explicitamente à comunicação como disciplina ou campo de estudo.[4][6][7]

Primeira Fase

Os primeiros estudos da área de Comunicação em seu sentido estrito (significando basicamente as "mídias") começaram ainda no século XIX, na Europa. Em 1910, ocorreu o I Congresso de Sociólogos, em Frankfurt (Alemanha), ocasião em que o sociólogo Max Weber propôs a constituição de uma "sociologia da imprensa", a precursora da "sociologia da comunicação".[8] Mas foi nos Estados Unidos que esses estudos se consolidaram efetivamente como ciência, especialmente com a fundação do Bureau of Applied Social Research, em 1941, na Universidade de Columbia, por Paul Lazarsfeld.[9] Nesse momento de consolidação, os estudos em Comunicação Social dedicaram-se principalmente ao papel e efeito social do rádio, uma vez que este veículo fora a primeira mídia a alcançar proporções e popularidade suficientes para ser caracterizado como meio de comunicação de massa. Além disso, seu alcance o levou a ser amplamente utilizado pelos estados totalitários que emergiram na Europa no período entre-guerras, daí o crescente interesse pelo tema.

Teoria Hipodérmica

Ver artigo principal: Teoria hipodérmica

Também conhecida como "Teoria da Bala Mágica", a Teoria Hipodérmica estudou o fenômeno da mídia a partir de premissas behavioristas. Seu modelo comunicativo é baseado no conceito de "estímulo/resposta": quando há um estímulo (uma mensagem da mídia), esta adentraria o indivíduo sem encontrar resistências, da mesma forma que uma agulha hipodérmica penetra a camada cutânea e se introduz sem dificuldades no corpo de uma pessoa. Daí o porquê de esta teoria também ser conhecida como "Teoria da Bala Mágica", pois a mensagem da mídia conseguiria o mesmo efeito "hipodérmico" de uma bala disparada por uma arma de fogo.

O conceito de "massa" é fundamental para se compreender a abordagem da teoria hipodérmica. Segundo os estudiosos desta corrente, a massa seria um conjunto de indivíduos isolados de suas referências sociais, agindo egoisticamente em nome de sua própria satisfação. Uma vez perdido na massa, a única referência que um indivíduo possui da realidade são as mensagens dos meios de comunicação. Dessa forma, a mensagem não encontra resistências por parte do indivíduo, que as assimila e se deixa manipular de forma passiva.

Modelo de Lasswell

cientista político Harold Lasswell desenvolveu um modelo comunicativo que, embora baseado na teoria hipodérmica, apontava suas lacunas e contribuiria posteriormente para a sua superação. Para Lasswell, compreender o alcance e efeito das mensagens transmitidas pela mídia requer responder às seguintes questões: Quem? Diz o quê? Através de que canal? A quem? Com que efeito? Os desdobramentos das indagações correspondem: o "quem" está ligado aos emissores da mensagem; o "diz" corresponde ao conteúdo da mensagem; o "canal" à análise dos meios; "A quem" corresponde ao receptor da mensagem e, por último, o "efeito" à análise da audiência e reflexos na sociedade.

Características do modelo de Lasswell:

  • A comunicação é intencional, consciente e voluntária;
  • A comunicação é individual, ou seja, os papéis do emissor e receptor surgem isolados;
  • Não há reciprocidade.

Mais tarde, e como forma de aprofundar, Lasswell e outros investigadores criaram a Comunication Research que se centrou na forma como os meios de comunicação de massas alteravam os indivíduos. Com a evolução dos estudos observou-se uma superação da Teoria Hipodérmica, embora ela ainda seja bastante aceita no senso comum.

Teoria da Persuasão

Ver artigo principal: Teoria da persuasão

Diferentemente da abordagem hipodérmica, a Teoria da Persuasão afirma que a mensagem da mídia não é prontamente assimilada pelo indivíduo, sendo submetida a vários filtros psicológicos individuais. Portanto, os efeitos da mídia não seriam de manipulação, mas de persuasão. O modelo comunicativo desta teoria é bastante semelhante ao behaviorista – porém, acrescido de processos psicológicos que determinam a resposta. Tais processos psicológicos são relativos à audiência e à mensagem.

Em relação à audiência, o indivíduo ficará interessado pelos assuntos aos quais estiver mais exposto; além disso, tenderá a consumir as informações com as quais esteja de acordo. Em algumas ocasiões, o indivíduo até mesmo distorcerá o conteúdo das mensagens recebidas, de forma a adequa-las à sua forma de entender a questão.

Em relação à mensagem, o indivíduo a consumirá de acordo com o grau de prestígio e de confiança que depositar naquele que a transmite (o comunicador). Conta também a maneira como os argumentos são distribuídos; se todos ou apenas parte dos argumentos estão presentes; a exposição implícita ou explícita das intenções da mensagem; e o grau de envolvimento do indivíduo com o assunto.

Teoria Empírica de Campo (Teoria dos Efeitos Limitados)

A Teoria Empírica de Campo ou Teoria dos Efeitos Limitados (nome dado como resposta à Teoria dos Efeitos Ilimitados de Lasswell) baseia suas pesquisas na sociologia, concluindo que a mídia cumpre papel limitado no jogo de influência das relações comunitárias. Em outras palavras, a mídia é apenas mais um instrumento de persuasão na vida social, uma vez que é apenas parte desta. Assim, a Abordagem Empírica de Campo abandona a relação direta de causa e efeito entre a mensagem e o comportamento do indivíduo. Antes, enfatiza a influência indireta que a mídia exerce sobre o público tal como faria qualquer outra força social (igrejafamíliapartido político, etc.). O alcance das mensagens midiáticas depende do contexto social em que estão inseridas, ficando sujeitos aos demais processos comunicativos que se encontram presentes na vida social. Neste caso, os filtros individuais pelos quais as mensagens passam seriam de origem muito mais social do que psicológica.

O estudo dos efeitos dos meios de comunicação teve início nos anos 1930 com a chegada dos centros de ciências sociais empíricas aos Estados Unidos. Paul Lazarsfeld, integrante do Bureau of Applied Social Research da Universidade de Columbia, foi o principal nome da pesquisa sobre os efeitos. Teve um papel central no desenvolvimento da pesquisa social organizada em todo o mundo e também na constituição da disciplina de comunicação.

Os estudos de Lazarsfeld sobre formação da opinião pública e sobre a influência dos líderes de opinião em campanhas comerciais e eleitorais foram modelos para as pesquisas sobre os efeitos limitados que dominaram o campo da comunicação por muitos anos. Estes estudos procuravam compreender como as campanhas veiculadas por meios de comunicação influenciavam as tomadas de decisões.

Numa pesquisa sobre as eleições presidenciais de 1940, Lazarsfeld e outros pesquisadores descobriram que os líderes de opinião tinham papel de destaque na tomada de decisões e assim formularam o chamado "two-step flow", ou “modelo de comunicação em duas etapas”: os conteúdos partiam da mídia para os líderes de opinião e destes para segmentos menos ativos da população. O tal modelo também apontou que a mídia tende a reforçar predisposições em vez de alterá-las, visto que através do processo de exposição seletiva as pessoas tendem a consumir informações que confirmem suas crenças.

Lazarsfeld e seus pares encontraram assim efeitos de curto prazo e concluíram que os efeitos políticos e sociais da mídia eram pouco significativos. Porém, a pesquisa sobre os efeitos limitados da mídia não chegou às estruturas mais complexas, como as empresas de comunicação, porque vinha delas boa parte do financiamento para as pesquisas de Lazarsfeld. Mesmo com as limitações econômicas, é notório que dentre as contribuições mais significativas do pesquisador e de seu grupo está a constatação que a comunicação é um processo complexo e mediado por vários fatores. As pesquisas anteriores tratavam a mídia como dotada de onipotência. A partir desses estudos, a pesquisa sobre os efeitos foi sendo aprimorada para abranger estruturas mais complexas, que passaram a analisar os efeitos de longo prazo da mídia.

Efeitos de longo prazo

A partir da década de 1950, os estudos no campo dos efeitos da mídia evoluíram para compreensões mais sistemáticas. Três características sugerem uma reviravolta na pesquisa sobre os efeitos. São elas:

  1. ênfase maior nos efeitos de longo prazo;
  2. maior atenção aos efeitos cognitivos;
  3. atenção aos efeitos mais significativos.

Algumas teorias foram elaboradas a partir desse período para dar suporte a esses estudos. São elas: teoria do agendamento, teoria do cultivo, teoria dos usos e gratificações e teorias do processamento da informação.[10]

Teoria do Agendamento

Ver artigo principal: Agendamento

A teoria do agendamento defendia a tese que a mídia determinava os temas nas campanhas políticas e salientava a importância dos temas para a opinião pública. A partir do agendamento surgiram novos estudos para ampliar a pesquisa sobre os efeitos da mídia. A teoria foi importante e inovadora para o campo de estudos, mas desconsiderou importantes variáveis relacionadas ao conteúdo da mídia que podem ser importantes na formação da opinião pública. Ela não levou em conta, inicialmente, que as formas de apresentação da informação tem papel fundamental na sua apreensão pelo público. Para suprir essas carências, surgiu o conceito de enquadramento. Com esse complemento, os estudos passaram a abordar não só como a mídia afeta sobre o que o público pensa, mas como ele percebe os temas que lhes são apresentados.

Teoria do cultivo ou Análise do cultivo

A análise do cultivo foi outro enfoque que enfatizou os efeitos de longo prazo e sugeriu que a mídia seria ainda mais poderosa. Como exemplo de pesquisa utilizando essa teoria, George Gerbner analisou programas de ficção da televisão norte-americana desde 1967 e conduziu uma série de estudos com outros pesquisadores a fim de descobrir como esses programas influenciavam a visão de mundo dos telespectadores. Por fim, Gerbner concluiu que a exposição a esses conteúdos leva ao cultivo de concepções compartilhadas da realidade entre diversos públicos.

Apesar de não compreender a comunicação como uma via de mão única, os teóricos da análise do cultivo concebiam os conteúdos televisivos com certa homogeneidade e ignoravam a divergência quanto ao que era exibido, principalmente entre os usuários mais fieis, chamados de heavy viewers. Outro questionamento levantado sobre a teoria do cultivo diz respeito à concepção simplista sobre a recepção da televisão, levando em conta apenas a exposição, deixando de lado as interpretações e ressignificações que as pessoas fazem sobre os conteúdos.

Teoria dos usos e gratificações

A teoria dos usos e gratificações adotou outro ponto de vista acerca da pesquisa sobre a relação entre a mídia e seus receptores. Essa mudança ocorreu a partir do final da década de 1940, quando as pesquisas passaram a considerar a escolha da população em consumir, ou não, produtos midiáticos; quais fatores levavam a essas escolhas e no que elas implicavam.

Dessa forma, as pesquisas, nessa teoria, “rejeitam os efeitos totais” dos meios de comunicação sobre o usuário, considerando apenas que esses efeitos dependem de como o uso da mídia satisfaz as necessidades do receptor.

O cientista comportamental Bernard Berelson foi um dos pioneiros na observação dos aspectos que levavam as pessoas a optarem por consumir algum meio de comunicação. São eles:

  1. A busca por informação sobre questões públicas.
  2. A busca por orientação acerca de questões públicas.
  3. A procura por uma válvula de escape da realidade pessoal.
  4. A tentativa de obter “status social” por meio da informação.
  5. A necessidade de ter um contato com outras pessoas.[11]

Wilbur Schramm, estudioso do campo de comunicação de massa, também observou que a busca da população pelo consumo das mídias de massa  estava relacionada à necessidade que as pessoas têm de estarem em contato com outras e de se sentirem parte da vida social.[12]

Katz, Blumler e Gurevich, em um artigo de 1970, definiram os principais aspectos da teoria dos usos e gratificações. São eles:

  1. Não somente a mídia é ativa, a audiência também é ativa e faz escolhas sobre o que ela quer, ou não, ver.
  2. No processo de recepção, grande parte das escolhas é feita pelo receptor.
  3. Os meios de comunicação não satisfazem completamente o receptor, visto que ele tem necessidades que a mídia não é capaz de satisfazer.
  4. A mídia proporciona ao indivíduo aquilo que ele diz que deseja consumir.
  5. É o receptor quem define o juízo de valor da mídia. Ele decide como irá interpretar aquilo que absorveu do emissor.[13]

O pesquisador alemão Karl Rosengreen reuniu essas características dos usos e gratificações de modo que o receptor ficasse no centro do processo de comunicação, diferentemente do modelo de Lasswell, no qual a mídia era o centro ou o ponto de partida. Assim, ele definiu que o estudo dos usos e gratificações partia da seguinte pergunta: “Quem usa qual mídia, sob quais circunstâncias, por quais razões e com quais efeitos?”.[12]

Teorias sobre o processamento da informação

Foram desenvolvidas a partir de  teorias da psicologia cognitiva, o que representou um avanço nos campos conceituais e metodológicos do campo dos estudos da mídia. Alguns estudiosos dessa corrente questionavam a afirmação de que a televisão é a principal fonte de informação do público por ela enfrentar dificuldades de se fazer presente na memória coletiva. As teorias do processamento da informação estão baseadas na “concepção da comunicação como transporte” na qual a decodificação da mensagem não é considerada problemática ou capaz de transformar o significado da mensagem.

Teoria Funcionalista

Ver artigo principal: Teoria funcionalista

A Teoria Funcionalista estuda as funções exercidas pela mídia na sociedade, e não os seus efeitos. Em lugar de pesquisar o mero comportamento do indivíduo, estuda-se a sua ação social enquanto consumidor de valores e modelos que se adquire comunitariamente. Seus métodos de pesquisa distanciam-se dos métodos da teoria Hipodérmica, Empírico-Experimental e de Efeitos Limitados por não estudar a mídia em casos excepcionais, como campanhas políticas, mas em situações corriqueiras e cotidianas.

Teoria Crítica

Ver artigo principal: Teoria Crítica

Inaugurada pela Escola de Frankfurt, a Teoria Crítica parte do pressuposto das teorias marxistas e investiga a produção midiática como típico produto da era capitalista. Alguns dos seus principais fundadores foram Theodor Adorno e Max Horkheimer. Os mesmos desenvolveram pressupostos teóricos com postura crítica, que era oposta ao determinismo comum às teorias positivistas. Os teóricos foram capazes de considerar fatores sociais que o próprio Marx não previu anteriormente em suas bases teóricas. Desvendam assim a natureza industrial das informações contidas em obras como filmes[4] e músicas: temas, símbolos e formatos são obtidos a partir de mecanismos de repetição e produção em massa, que tornam a arte adequada para produção e consumo em larga escala.

Assim, a mídia padroniza a arte como faria a um produto industrial qualquer. É o que foi denominado indústria cultural. Nesta, o aspecto artístico da obra é perdido. O imaginário popular é reduzido a clichês. O indivíduo consome os produtos de mídia passivamente. O esforço de refletir e pensar sobre a obra é dispensado: a obra "pensaria" pelo indivíduo.

Indústria midiática[14] pressupõe três dimensões básicas: os processos midiáticos, que configuram as técnicas de produção e difusão de conteúdos; Divulgação e projetos elaborados e conteúdos culturais que justificam as mensagens elaboradas.

Teoria Culturológica

Ver artigo principal: Teoria Culturológica

A Teoria Culturológica parte de uma análise à Teoria Crítica e desenvolve assim um pressuposto diferente das demais teorias. No lugar de pesquisar os efeitos ou as funções da mídia, procura definir a natureza da cultura das sociedades contemporâneas. Conclui assim que a cultura de massa não é autônoma, como pretende as demais teorias, mas parte integrante da cultura nacional, religiosa ou humanística. Ou seja, a cultura de massa não impõe a padronização dos símbolos, mas utiliza a padronização desenvolvida espontaneamente pelo imaginário popular.

cultura de massa atende assim a uma demanda dupla. Por um lado, cumpre a padronização industrial exigida pela produção artística, por outro, corresponde à exigência por individualização por parte do espectador. É o que se define como sincretismo. Os produtos da mídia transitam entre o real e o imaginário, criando fantasias a partir de fatos reais e transmitindo fatos reais com formato de fantasia.

Segunda Fase

Gatekeeper

Os estudos sobre os gatekeepers ("guardiões do portão") analisam o comportamento dos profissionais da comunicação, de forma a investigar que critérios são utilizados para se divulgar ou não uma notícia. Isso porque estes profissionais atuariam como guardiões que permitem ou não que a informação "passe pelo portão", ou melhor, seja veiculada na mídia. A decisão de publicar algo ou não publicar depende principalmente dos acertos e pareceres entre os profissionais, que estão subordinados a uma cultura de trabalho ou uma política empresarial e ainda aos critérios de noticiabilidade. E que não raro exclui o contato com o público. Nesta teoria é levado muito em conta a percepção do próprio editor (gatekeeper) sobre como ele planeja anunciar a noticia e qual caminho este dará a ela. Ou seja o editor não leva em conta o contexto social em que a notícia será publicada e sim sua própria percepção e suas experiências.

Newsmaking

Os estudos sobre os emissores desenvolveram-se de forma progressiva, ao contrário dos estudos sobre os meios de comunicação de massa. A abordagem desses estudos é essencialmente sociológica, com metodologias que podem variar do questionário à observação participante. Mauro Wolf afirma que, inicialmente, os estudos sobre os emissores exploraram pouco os níveis mais altos, os fatores políticos e econômicos relacionados aos mass media, de onde vem questões extremamente relevantes para a compreensão dos processos de produção de notícias. Posteriormente esses estudos evoluíram a partir de duas abordagens: uma ligada à sociologia das profissões, que analisa características sociológicas, culturais e profissionais dos emissores e outra, que observa a lógica dos processos de produção da comunicação de massa e a organização do trabalho jornalístico, onde ocorre a construção das mensagens.[15]

Os estudos sobre os emissores passaram da análise dos critérios utilizados pelos jornalistas para selecionar as notícias (gatekeeping) para a observação dos fatores influenciadores da produção de notícias (newsmaking).

newsmaking utiliza-se da técnica da observação participante para reunir dados fundamentais sobre as rotinas produtivas dos mass media. Esta observação deve ser teoricamente orientada e fazer parte de um projeto de pesquisa. A metodologia utilizada, aliada ao período da observação, permite observar as mudanças adotadas pelas redações em épocas de crise, contrariando a ideia de um processo automático da produção noticiosa. O newsmaking articula-se entre a cultura profissional dos jornalistas e a organização dos processos produtivos. Gaye Tuchman afirma que, para produzirem notícias, os órgãos de informação devem obedecer a três premissas básicas. São elas:

  1. tornar relevante um fato até então desconhecido;
  2. tentar relatar os acontecimentos de forma clara, evitando refletir valores pessoais;
  3. organizar, temporal e espacialmente, o trabalho, de modo que os acontecimentos noticiáveis possam seguir uma linha de apresentação.

A aptidão de um acontecimento para ser transformado em notícia (noticiabilidade) é determinada de acordo com imposições ligadas à organização do trabalho e de acordo com o profissionalismo dos jornalistas. Em suma, notícias são aquilo que os jornalistas definem como tal.

As notícias são responsáveis pela criação de uma memória fragmentada que indica elementos básicos para a compreensão de um fato. Geralmente não apontam causas e consequências de um acontecimento. A noticiabilidade é um critério baseado em decisões dos grupos de comunicação, não individuais, contido na cobertura informativa dos mass media. Este fator sempre está atrelado aos interesses das organizações e dos jornalistas.

Segundo Mauro Wolf,[16] as fontes são um dos pilares básicos para a qualidade da informação transmitida. Por isso, é importante cultivar fontes estáveis e ter um bom relacionamento com elas. Essas fontes fixas podem, muitas vezes, dar preferência a determinado repórter, além de que o jornalista passa a ter maior confiança nas informações repassadas. As fontes mais confiáveis a partir do ponto de vista dos jornalistas são as institucionais, oficiais.

A escolha das fontes também é uma decisão ideológica do grupo de comunicação, da mesma forma que tantas outras decisões tomadas no processo produtivo. Citando Herbert J. Gans, Wolf diz que “a relação entre fontes e jornalistas se assemelha a uma dança, com as fontes a tentarem ter acesso aos jornalistas e estes a tentarem aproximar-se das fontes”.

Os fatores mais importantes na relação jornalista-fonte são os incentivos, o poder da fonte, a sua capacidade de fornecer informações credíveis e a proximidade social e geográfica em relação aos jornalistas. Para Wolf, dos quatro, o mais relevante é o quarto, os outros são complementares.

Já do ponto de vista dos jornalistas com a conveniência na utilização das fontes, os fatores são: a oportunidade revelada com antecedência (fontes que forneceram materiais credíveis outras vezes têm preferência e continuam a ser utilizadas até se tornarem fontes regulares); a produtividade (explica que as fontes institucionais são as que mais normalmente se recorre, porque são elas que fornecem material suficiente para as matérias, evitando um excesso de fontes); a credibilidade (fontes institucionais e regulares são mais confiáveis); a garantia (se o jornalista não tem como confirmar a informação, ele procura a credibilidade da fonte); a respeitabilidade (preferência em fazer referência às fontes oficiais ou que ocupam posição de autoridade, por serem mais credíveis e por representarem o ponto de vista oficial).

Além das fontes comuns, a agenda dos outros veículos de comunicação e as agências de notícias também são fontes importantes, mas diferem das comuns por serem empresas de comunicação e trabalharem com notícias

Referências

  1.  Miller, Katherine (2005). Communication theories : perspectives, processes, and contexts 2nd ed. Boston: McGraw-Hill. ISBN 0072937947
  2.  Carey, James W. (2009). Communication as culture : essays on media and society Rev. ed. New York: Routledge. ISBN 9780415989763
  3.  «Communication Theory», Thousand Oaks, California : SAGE Publications, The SAGE Encyclopedia of Online Education, consultado em 17 de março de 2022
  4. ↑ Ir para:a b Peters, John Durham (1 de dezembro de 1993). «Genealogical Notes on 'The Field'». Journal of Communication43 (4): 132–139. doi:10.1111/j.1460-2466.1993.tb01313.x
  5.  Cohen, Herman (1994). The history of speech communication : the emergence of a discipline, 1914-1945. Annandale, VA: Speech Communication Association. ISBN 0944811140
  6. ↑ Ir para:a b Schramm, Wilbur (1 de setembro de 1983). «The Unique Perspective of Communication: A Retrospective View». Journal of Communication33 (3): 6–17. doi:10.1111/j.1460-2466.1983.tb02401.x
  7.  Rogers, Everett M. (1997). A history of communication study : a biographical approach. New York: Free Press. ISBN 0684840014
  8.  SERRA, J. Paulo (2007). Manual de Teoria da Comunicação (PDF). Covilhã: Universidade de Beira Interior. 2014 páginas. Consultado em 5 de outubro de 2020
  9.  SERRA, J. Paulo (2007). Manual de Teoria da Comunicação (PDF). Covilhã: Universidade de Beira Interior. 13 páginas. Consultado em 27 de setembro de 2018
  10.  Porto, Mauro. «A pesquisa sobre recepção e os efeitos de mídia: propondo um enfoque integrado» (PDF)XXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação (INTERCOM), Belo Horizonte, Brasil, 2 a 6 de setembro de 2003
  11.  Martino, L. M. S. (2011). Teoria da Comunicação - Ideias, escolas e métodos. Petrópolis: Vozes
  12. ↑ Ir para:a b Martino, L. M. S. (2009). Teoria da Comunicação - Ideias, escolas e métodos. Petrópolis: Vozes
  13.  Correia, J.C. (2011). O admirável mundo das notícias: teorias e métodos. (PDF). [S.l.: s.n.]
  14.  SOUZA, Rubens (21 abr 2008). «Indústria midiática» (PDF). Rubens de Souza. Consultado em 18 set. 2014
  15.  Wolf, Mauro (1985). Teorias da Comunicação de Massa. Portugal: Presença
  16.  Wolf, Mauro (1985). Teorias da Comunicação de Massa. Portugal: [s.n.]

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Invasão Vertical dos Bárbaros: livro analisa fundamentos da cultura. Resenha

Invasão Vertical dos Bárbaros

Invasão Vertical dos Bárbaros é um livro extraordinário de um dos mais importantes filósofos brasileiros: Mário Ferreira dos Santos. A obra tece uma reflexão acerca dos fundamentos da cultura e de que forma os bárbaros entram em territórios civilizados.

Com apresentação de Luiz Felipe Pondé, a publicação faz parte da instigante Coleção Abertura Cultural e está dividido em duas partes:

  • Parte I: Invasão Vertical dos Bárbaros na Sensibilidade e na Afetividade
  • Parte II: O Barbarismo e a Intelectualidade

Para o filósofo brasileiro Luiz Felipe Pondé, que escreve na apresentação intitulada “O homem é a consciência da crise”, o livro é um manifesto e uma denúncia. Acima de tudo, tem a “urgência em passar uma ideia”.

A ideia a qual se refere Pondé é a de que a condição humana está sendo esmagada pela superficialidade; o que para o pensador contemporâneo é uma forma de barbárie.

Em Invasão Vertical dos BárbarosMário Ferreira dos Santos explica quais são as duas formas de barbárie: a horizontal e a vertical.

A primeira, trata-se da ocupação territorial geográfica, que costuma acontecer de forma lenta e gradual. A segunda, por sua vez, refere-se à tomada de posse da cultura e sua corrupção.

Leitura indispensável para quem deseja compreender os tempos atuais, em Invasão Vertical dos Bárbaros é possível apreender, com exemplos empíricos e históricos, o que vem a ser essa “invasão”.

Veja alguns temas abordados na publicação:

  • Sensibilidade
  • Afetividade
  • Valores
  • Valorização exagerada do corpo
  • Supervalorização romântica da intuição
  • Sensualidade
  • Mau gosto
  • Credos primitivos
  • Razão e caos
  • Desumanização do homem
  • Desvalorização da inteligência
  • Desvalorização da vontade
  • O conceito de Deus

São mais de 50 reflexões, entre ensaios e aforismos, que desvelam separadamente — e juntos! —, o que significam os conceitos: invasão, vertical e bárbaro. O termo completo “invasão vertical dos bárbaros” foi tomado do político alemão Walther Rathenau.

Confira o que Mário Ferreira dos Santos escreve no prefácio da obra:

“Esta obra é uma denúncia dessa invasão, que, preparando-se e desenvolvendo-se há quase quatro séculos, atinge agora um estágio intolerável, e que nos ameaça definitivamente. Como obra de denúncia, e que aspira alcançar o maior número de pessoas, dela afastamos, tanto quanto possível, o tecnicismo da linguagem científica, que cabe às disciplinas abordadas aqui, temas que são próprios do seu objeto formal. Nossa linguagem é o mais geral possível, o suficiente para tornar claros os aspectos em exame.”

Leia trechos das duas partes do livro Invasão Vertical dos Bárbaros, exclusivo do catálogo da É Realizações.

Invasão Vertical dos Bárbaros
Invasão Vertical dos Bárbaros, de Mário Ferreira dos Santos.

Parte I: Invasão Vertical dos Bárbaros na Sensibilidade e na Afetividade

“O barbarismo vertical processa uma supervalorização do visual, de modo que os espetáculos são mais organizados para os olhos do que para os ouvidos. A música popular, para exemplificar, é relativamente carente de aspectos cultos, embora plena de contribuições preciosas à catarse humana. Em períodos, como o nosso, em que a invasão vertical dos bárbaros se processa, a valorização do visual sobre o auditivo é crescente, e até o livro está ameaçado de nele o visual superar a leitura, que é mais auditiva, porque a palavra é para ser ouvida não para ser vista.”

“Um dos preconceitos românticos, mas que atua em sentido verdadeiramente bárbaro, consiste em afirmar que a Razão nos leva ao Caos, à desordem do pensamento, e que só a Intuição nos libertará desse final terrível. Esse aspecto se desenvolve em pseudomorfoses aparentemente cultas e será examinado na Segunda Parte desta obra: ‘O barbarismo e a Intelectualidade’.”

“Em nossa obra Filosofia e Romantismo, juntamos amplos aspectos da exagerada valorização romântica sobre a sensibilidade, a sensação, os sentimentos comuns, a intuição sensível, a fantasia e a sem-razão, e os estragos que o romantismo realizou, não só no filosofar, como em todas as outras manifestações superiores do homem, que foram deploráveis e cujos frutos ácidos colhemos agora.”

Para Mário Ferreira dos Santos, o romantismo se caracteriza pelos “seguintes aspectos:

  • Valorização da sensibilidade sobre a intelectualidade.
  • A sensação é mais rica do que a razão. Esta é estéril, apenas classificadora de estruturas despojadas de vida. A vida afetiva é mais profunda e, pela intuição sensível e afetiva, o homem penetra mais na intimidade das coisas. A razão apenas rotula, cataloga, não invade o âmago das coisas.
  • A sensibilidade é criadora. A arte é superior ao pensamento especulativo. O artista não é um visionário qualquer, é um profeta e antecede as criações da ciência e da técnica (o que não é historicamente verdadeiro). O artista cria mundos novos; o especulador apenas reúne num museu de ideias os resultados obtidos, as fichas do conhecimento.
  • A vida supera razão — As razões da vida são superiores às da razão. Aquela é criadora, e não esta.
  • A sem-razão supera os esquemas mecânicos e geométricos da racionalidade, e é muito mais rica de intuições e de descobertas que aquela.”

Parte II: O Barbarismo e a Intelectualidade

“O bárbaro, por suas condições, em verdadeira ojeriza da inteligência. Sua inteligência permanece quase totalmente dentro do campo da esfera cogitativa, que é um grau primário daquela. Sua esquemática é fundada nos sentidos, e seu pensamento situa-se apenas nos dados da memória e no material oferecido pela fantasia, pela imaginação, sobre os quais ele trabalha, construindo esquemas de primeiro grau de abstração, já que os esquemas de segundo e terceiro graus exigem maiores esforços, aos quais, em geral, não os alcança em seu conteúdo noemático, mas apenas nominaliter. Usa as palavras correspondentes, sem que haja precisão na representação. O resultado é a dificuldade que tem em compreender tais esquemas e, como a raposa ante a uva, toma a atitude de desprezo. Procura esconder a sua insuficiência, negando valor ao que o suplanta.”

“A religião, a filosofia e a ciência têm novamente de entrosar-se. O que precisamos são de homens que façam essa tarefa não daqueles que se excluem num especialismo vesgo e deformador. O que precisamos são de mentes fortes, de mentes poderosas, capazes de realizar as coisas, e não meros repetidores, porque essa repetição é característica do bárbaro.”

Quem foi Mário Ferreira dos Santos?

Mário Ferreira dos Santos nasceu em Tietê, interior de São Paulo, em 3 de janeiro de 1907. Durante sua trajetória, atuou como filósofo, tradutor e escritor.

Considerado um dos mais importantes pensadores do conservadorismo brasileiro, chegou, contudo, a ser militante anarquista em algum momento de sua vida.

Formado em Direito e Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, traduziu para a língua portuguesa obras de Platão, Santo Tomás de Aquino e Friedrich Nietzsche.

Mário Ferreira dos Santos morreu de doença cardiovascular, em 11 de abril de 1968.

Sua obra, cada vez mais procurada entre os leitores brasileiros, é parte especial do catálogo da É Realizações, que possui, inclusive, uma seção dedicada exclusivamente ao filósofo.

Biblioteca Mário Ferreira dos Santos oferece livros em edições críticas — com fac-símiles de documentos originais e acervo iconográfico — e conta com coordenação de João Cezar de Castro Rocha e projeto gráfico de Alexandre Wollner.

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Contra um Bicho da Terra tão PequenoChorar por Dido É Inútil

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Resumão: O Conceito Filosófico de Educação: pelo professor doutor em filosofia Renato Noguera


Neste vídeo, que fez parte da programação da ANPOF( Associação de pós-graduação em Filosofia) 2021, o professor Renato Noguera nos dá um panorama da Educação como um fenômeno filosófico. Algumas Referências ABBAGNANO, N. & VISALBERGUI, A. História da pedagogia. Vol. I. Lisboa: Livros Horizonte, 1981. GOMES, Nilma Lino. “Diversidade étnico-racial, inclusão e equidade na educação brasileira: desafios, políticas e práticas” In RBPAE, v. 27, n. 1, p. 109-121, jan./abr. 2011. Disponível em: http://www.anpae.org.br/iberolusobras.... KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015; MBEMBE, Achille. Crítica da razão negra. Tradução Sebastião Nascimento. São Paulo: N – 1 edições, 2018a. MBEMBE, Achille. Necropolítica: Biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte. Rio de Janeiro: n-1 edições, 2018b. MONGA, Célestin. Niilismo e negritude. Tradução de Estela dos Santos Abreu. São Paulo: Martins Fontes, 2010. NASCIMENTO, Elisa Larkin (Org.). Afrocentricidade: uma abordagem epistemológica inovadora. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. São Paulo: Selo Negro, 2009. OLIVEIRA, Eduardo David de. “Filosofia da ancestralidade como filosofia africana: Educação e cultura afro-brasileira” In Revista Sul-Americana de Filosofia e Educação, n. 18, maio-out/2012, p. 28-47. ROUSSEAU, J.J. Emílio: ou, da educação. Tradução de Sérgio Milliet. 3.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995. SANT’ANA, Antônio Olímpio. “História e conceitos básicos sobre o racismo e seus derivados. In: MUNANGA, Kabengele (Org.). Superando o racismo na escola. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. SANTOS, Antônio Bispo dos. Colonização, quilombos: modos e significações. Brasília. INCTI, UnB, 2015. SANTOS, Ana Katia Alves. Infância afrodescendente: epistemologia crítica no ensino fundamental. Salvador: Edufba, 2006. SARR, Felwine. Afrotopia. Tradução Sebastião Nascimento. São Pualo: n – 1 Edições, 2019. TRINDADE, Azoilda Loretto da. “O racismo no cotidiano escolar”. In: BARROS, José Flávio Pessoa de; OLIVEIRA, Luiz Fernandes de. (Org.). Todas as cores na educação: contribuições para uma reeducação das relações étnico-raciais no ensino básico. Rio de Janeiro: Quartet, 2008. UNESCO. Relações raciais na escola: reprodução de desigualdades em nome da igualdade. ABRAMOVAY, Miriam; CASTRO, Mary Garcia de. (Coord.). Brasília: Unesco/Inep/Observatório de Violências nas Escolas, 2007 #filosofia #educação #brasil #amor #relacionamento #vida

Nada novo no Fronte, indicação de 75 e indicação de filmes 23. Podcast

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Nada de novo no front’: os 90 anos de um clássico Indicação de filmes 23 e indicação de livros 75.


O livro “Nada de novo no front”, de Erich M. Remarque, acaba de completar 90 anos. Lançada pela primeira vez em alemão, em janeiro de 1929, a obra (Im Westen nichts Neues, no original) vendeu um milhão de cópias em menos de um ano na Alemanha, e mais outro milhão no exterior. O sucesso foi tanto que o livro foi adaptado para o cinema um ano depois pela Universal Pictures, com um orçamento enorme para a época, um recorde de US$ 40.000. O filme venceu quatro prêmios Oscar na edição de 1931: melhor filme, melhor diretor, melhor fotografia e melhor roteiro.

Desde seu lançamento, “Nada de novo no front” já foi traduzido para 58 línguas e soma mais de 10 milhões de exemplares vendidos. Em escolas localizadas em diferentes partes do mundo, o livro de Remarque é um dos mais utilizados pelos professores de História quando o assunto é o horror da Primeira Guerra Mundial.

Cena do filme "Nada de novo no front", de 1930.
Cena do filme “Nada de novo no front”, de 1930.

O enredo do livro ajuda a explicar o sucesso: “Paul Baumer é filho de uma humilde família alemã durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Convencido por professores quanto ao seu dever patriótico, o jovem abandona os bancos escolares e junta-se às trincheiras de soldados alemães. Em pouco tempo, Paul se vê cercado por um ambiente de horror, vê meninos como ele perecerem e percebe que trocou a sua juventude por uma única e cruel certeza: a do absurdo da guerra, esteja-se do lado que se estiver.

Por que “Nada de novo no Front” é importante?

Há muitos motivos que explicam a importância de “Nada de novo no front”. A principal razão – acredito eu – tem a ver com aquilo que os alemães chamam de Zeitgeist, que em português significa “espírito de um tempo “. O livro de Remarque captura justamente a ambientação dos primeiros anos depois da Primeira Guerra Mundial.

“A Grande Guerra” foi uma guerra que mobilizou, direta ou indiretamente, todos os continentes. Isso jamais tinha acontecido. O conflito também foi inédito quanto às fatalidades: matou pouco mais de 37 milhões de pessoas, entre militares e civis, e deixou outras milhões feridas, desabrigadas e traumatizadas.[1] Foi nela ainda que se usou pela primeira vez gases tóxicos, blindados, minas e aviões. E, embora as metralhadoras automatizadas fossem conhecidas desde o último quarto do século XIX, foi na Primeira Guerra que elas foram popularizadas no campo de batalha.

Em 1918, quando a guerra acabou, as pessoas buscavam desesperadamente entender como algo desta magnitude tinha sido possível no coração de uma Europa que se considerava o centro irradiador da civilização. Afinal de contas, o projeto iluminista de um mundo baseado na cultura e na razão, desenhado um século e meio por filósofos que se tornaram cânones do pensamento filosófico moderno, parecia derrotado depois de uma guerra que usou o conhecimento industrial e científico para fabricar a morte e não o progresso. Quem sobreviveu à Primeira Guerra Mundial estava ávido por respostas: como explicar tudo o que acabara de acontecer. É aí que entra o mérito de Remarque.

“Nada de novo no front” não explica a guerra, mas é uma reflexão provocativa sobre a guerra e a condição humana naquele início do século XX. Indo na direção contrária da exaltação militarista da época, Remarque constrói personagens que são mais vítimas do que heróis. Paul Baumer, o protagonista, assim como muitos outros nomes do livro, era um jovem que foi induzido a pensar que a guerra era um dever patriótico. Instituições como a escola e a família foram fundamentais para o seu alistamento. “Naquela época”, diz o personagem, “até os nossos próprios pais usavam facilmente a palavra covarde”.[2]

Cena do filme "Nada de novo no front", de 1930.
Cena do filme “Nada de novo no front”, de 1930.

Quando Baummer e seus colegas chegaram ao campo de batalha, descobriram que tudo era muito diferente. O livro fala de soldados amputados em minas, angustiados pelo medo, pela privação de sono, pela forma e por “epidemias” de piolho. Nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial, os homens de transformavam. Assemelham-se a mortos-vivos: “Lá está nosso companheiro Kemmerich, que até há pouco ainda assava carne de cavalo e se agachava junto conosco nos buracos abertos pelas granadas; ainda é ele, porém já não é mais ele; suas feições ficaram imprecisas, indistintas, como duas fotografias sobrepostas na mesma chapa. Até sua voz soa como se viesse do túmulo”.[3]

Um dos trechos mais impressionantes e assustadores do livro é quando o narrador fala sobre a necessidade da metralhadora trabalhar sem interrupções. Essas máquinas atingiam altas temperaturas depois de algumas rodadas de tiro. Quando isso acontecia, os soldados tinham que jogar água nela para que fosse refrigerada. No campo de batalha, a prioridade era da arma e não dos soldados que a operavam. Quando essa água acabava, era preciso improvisar: “Ouvimos as explosões das granadas que se aproximam. Nossa metralhadora varre o semicírculo avançado. A água de refrigeração evapora; passamos o reservatório vazio de mão em mão, apressadamente, para que todos urinem; assim, arranjamos líquido e podemos continuar a atirar. Mas, atrás de nós, as detonações aproximam-se cada vez mais. Daqui a alguns minutos, estaremos perdidos”.[4]

Desta forma, “Nada de novo no front” é um choque de realidade, um alerta para a sociedade. A guerra não é uma aventura e muito menos uma prova de patriotismo ou mesmo de coragem e masculinidade. Ela também não é uma “diplomacia por outros meios”. A guerra mata mesmo quando se sai vivo dela. Este é o grande recado de Remarque, que, se não é capaz de responder o porquê da guerra (talvez ninguém o possa, de verdade), ofereceu uma reflexão poderosa para uma sociedade ainda paralisada diante do luto de quatro anos de conflito.  

Retrato do militarismo e do nacionalismo da época

Outro fator que faz “Nada de novo no front” um livro marcante é a forma como ele desmonta o nacionalismo e o militarismo tão vigentes na época. Entre o final do século XIX e início do século XX, militarismo e nacionalismo eram valores aprendidos cegamente nas escolas europeias. Era comum nesse período, por exemplo, professores incentivarem seus alunos a entoarem canções que exaltavam fuzis e a guerra. Em maio de 1882, o jornal francês L’École, especializado em educação, publicou o canto marcial “Aluno-Soldado”, ensinado da escola maternal ao curso elementar. Ele dizia: “Para ser um homem é preciso saber escrever / E em pequeno, aprender a trabalhar / Pela pátria, uma criança deve instruir-se / E na escola aprender a trabalhar /Soou a hora, marchemos a passo / Jovens crianças, sejamos soldados”.[5]

Remarque soube fazer muito bem a crítica a esse modelo educacional que buscava formar não cidadãos, mas soldados. Um dos personagens de “Nada de novo no front” é Kantorek, o professor ufanista de Paul Baumer. Kantorek, às vésperas do conflito, foi o maior incentivador para que Baumer e outros tantos jovens alunos se alistassem: “Kantorek nos leu tantos discursos nas aulas de ginástica que a nossa turma inteira se dirigiu, sob o seu comando, ao destacamento do bairro e alistou-se. Vejo-o ainda à minha frente, e lembro-me de como o seu olhar cintilava através dos óculos, quando, com a voz embargada, perguntava: “vocês vão todos, não é, companheiros?”.[6]

‘Nada de novo no front’: 90 anos de um clássico 1
Erich Maria Remarque (1898-1970).

“Nada de novo no front” é também importante por outros motivos: ele é muito bem escrito, tendo uma narrativa ágil, com ótimos diálogos e personagens demasiadamente humanos – com medos, ansiedades, raiva, dor e apatia. A obra se notabiliza finalmente por servir como um divisor de águas para o movimento pacifista que se estruturaria nos anos seguintes e para o “romance de guerra”, um gênero literário que naquele início do século XX ainda era muito marcado pelo olhar romantizado da guerra e do patriotismo.

O autor, Erich Maria Remarque

Erich Maria Remarque nasceu em 22 de junho de 1898, em Osnabrück, na Alemanha. Depois de concluir os estudos escolares em sua cidade natal, começou a frequentar a Universidade de Münster. A vida acadêmica, no entanto, foi bruscamente interrompida quando, aos 18 anos de idade, ele se juntou ao exército alemão para combater na Primeira Guerra Mundial. Foi ferido três vezes nas trincheiras, uma delas gravemente, mas conseguiu se recuperar.

Depois da guerra, Remarque, assim como muitos outros ex-combatentes, enfrentou uma segunda guerra: pela dignidade. A Alemanha encontrava-se destruída e humilhada. Tinha perdido territórios e precisava pagar reparações de guerra a diversos países. Remarque lutou para sobreviver. “Foi pedreiro, organista, motorista e agente de negócios, até estabilizar-se, mais ou menos, no jornalismo, exercendo funções de crítico teatral e repórter esportivo, entre outras, em alguns jornais de Hannover e Berlim”.[7]

Os nazistas causaram um alvoroço na estréia do filme. A polícia foi chamada para garantir a segurança no cinema.
Polícia protege cinema que passava “Nada de novo no front”. Nazistas causaram um alvoroço na estréia do filme.

Os traumas da Primeira Guerra Mundial persistiam em não passar. Remarque tinha dificuldades para dormir. Passava noites em claro escrevendo, tentando colocar no papel as memórias dos anos em que passou trincheiras. Na época, o diagnóstico ainda não existia, mas é muito provável que sofresse com neurose de guerra. Os papéis escritos foram se acumulando ao longo dos anos e Remarque percebeu que o material poderia ser publicado como livro. Sua história apareceu primeiro em folhetins do jornal Wossiche Zeitung, em 1928. O relato duro e cruel da guerra fez um enorme sucesso, garantindo a publicação do livro em janeiro de 1929, também com sucesso enorme, e a adaptação para os cinemas em 1930.

A narrativa de Remarque provocou revolta entre setores nacionalistas alemães, sobretudo dos nazistas, que acreditavam que tanto o filme quanto o livro sujavam a memória dos ex-combatentes. Em 1933, com a ascensão de Hitler ao poder, o filme foi proibido e os livros queimados em praça pública. Temendo pela própria segurança, o autor exilou-se na Suíça e, depois, nos Estados Unidos. Em 1938, sua cidadania foi retirada pelo governo alemão, por “ter arrastado na lama” a imagem dos soldados e apresentado uma visão “antigermânica” dos acontecimentos da grande guerra. Cinco anos depois, Remarque sofre uma violenta perda: sua irmã, Elfriede, uma costureira, foi condenada à morte em 1943 e decapitada na Alemanha nazista porque um cliente a denunciara: ela teria dito que poderia dar um tiro na cabeça de Hitler. [8]

Erich Maria Remarque não foi autor de um único livro. Sua carreira de escritor foi produtiva. Ele também é autor de “O caminho sem volta” (1931), “Três camaradas” (1937) , “Náufragos” (1941), “Arco do triunfo” (1946), e “O obelisco preto” (1956), além de um romance póstumo, “Sombras do paraíso”, publicado em 1971.

‘Nada de novo no front’: 90 anos de um clássico 2
Capa da edição alemã de “Nada de novo no front”.

Traduções e outros livros

Na Alemanha, “Nada de novo no front” foi lançado pela primeira vez em 29 de janeiro de 1929 pela editora alemã Propyläen Verlag. A primeira versão em língua portuguesa foi publicada no Brasil, em 1951, publicada pela José Olympio e com tradução de José Geraldo Vieira. Três anos depois, em 1954, o livro foi publicado em Portugal pela Editora América, com tradução de Mário de C. Pires. No Brasil, o livro conheceu ainda várias outras edições, como a da Editora Abril, dentro da coleção “Grandes Sucessos”, publicada no início dos anos 1980, e a mais atual, da L&PM Pockets, de 2004.

Para Tereza Faustino de Brito e Janete Santa Maria Ribeiro, um dos maiores legados de “Nada de Novo no Front” é que o livro se tornou uma “fonte histórica” para aqueles que estudam a Primeira Guerra Mundial. Para as autoras, a obra “torna vivo o conflito não apenas baseado nos discursos de historiadores em livro didáticos, mas sim, no testemunho de um participante deste evento bélico, que esteve na frente de batalhas, lugar onde o conflito se concretiza não apenas de forma burocrática, mas onde se manifestam questões pertinentes como a constância da morte, a decepção dos jovens soldados, a violência degenerada que ceifa vidas.” [10]

Notas

[1] Enciclopédia Britânica: https://www.britannica.com/event/World-War-I/Killed-wounded-and-missing

[2] REMARQUE, Erich Maria. Nada de novo no front. São Paulo: Abril Cultural, 1981. p.15.

[3] Ibidem, p.18.

[4] Ibidem, p.18.

[5] MARTIN, Hervé; BOURDÉ, Guy. As escolas históricas. Lisboa: Editora Europa-América, 2000. p.111.

[6] REMARQUE, Erich Maria. Nada de novo no front. São Paulo: Abril Cultural, 1981. p.15.

[7] Idem.

[8] REMARQUE, Erich Maria. Nada de novo no front. São Paulo: L&PM Pockets, 2004.

[9] Idem.

[10] DE BRITO, Tereza Faustino; RIBEIRO, Janete Santa Maria. O uso do romance “Nada de novo no front” como eixo integrador nas aulas de história. Revista Eletrônica Científica Inovação e Tecnologia, v. 1, n. 1, 2017. Disponível aqui.

Referências Bibliográficas

DE BRITO, Tereza Faustino; RIBEIRO, Janete Santa Maria. O uso do romance “Nada de novo no front” como eixo integrador nas aulas de história. Revista Eletrônica Científica Inovação e Tecnologia, v. 1, n. 1, 2017.

MARTIN, Hervé; BOURDÉ, Guy. As escolas históricas. Lisboa: Editora Europa-América, 2000.

REMARQUE, Erich Maria. Nada de novo no front. São Paulo: L&PM Pockets, 2004.

REMARQUE, Erich Maria. Nada de novo no front. São Paulo: Abril Cultural, 1981.

Como citar este artigo

CARVALHO, Bruno Leal Pastor de Carvalho. ‘Nada de novo no front’: um clássico faz 90 anos (Artigo) In: Café História – História feita com cliques. Publicado em 4 de março de 2019. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/nada-de-novo-no-front

www.cafehistoria.com.br/nada-de-novo-no-front/

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CONFISCO COLLOR

O dia que o professor Olavo de Carvalho citou meu Blog do João Maria andarilho. Jornal Diário do Comércio. ed.13/10/2013




Reuven Feuerstein



O idiota em sentido estrito Em 13 de outubro de 2013 / Artigos



Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 13 de outubro de 2013


Termos como “idiota”, “imbecil”, “mentecapto” etc. podem ser usados como meros xingamentos. Neste caso, não indicam nenhuma deficiência mental objetiva no indivíduo a que se aplicam, mas somente a raiva que os falantes sentem dele – a qual pode até mesmo ser, e freqüentemente é, causada pela percepção de uma superioridade intelectual que os incomoda e humilha.
Não uso jamais – repito: jamais – esses termos com esse sentido. Quando digo que alguém é idiota ou imbecil, ou quando o sugiro mediante outras palavras, é porque notei claramente, na pessoa de quem falo, uma ou várias das 28 deficiências intelectuais assinaladas pelo célebre educador romeno Reuven Feuerstein (v. por exemplo aqui), as quais resultam sempre em julgamentos impulsivos, deslocados da situação.
Esse erro, o mais freqüente hoje em dia entre os debatedores brasileiros de qualquer assunto, corresponde esquematicamente à falácia lógica que os antigos denominavam “ignoratio elenchi”, em que o sujeito pensa ter provado alguma coisa quando de fato provou, se tanto, outra completamente diversa. Isso acontece, evidentemente, quando o cidadão é incapaz de entender qual o ponto em debate. É impossível que um estudante não adquira esse vício quando adestrado desde pequeno para remeter tudo de volta, sempre e sistematicamente, a meia dúzia de chavões tidos como universalmente explicativos, em vez de tentar perceber o que está realmente em jogo na discussão. O apelo compulsivo a rótulos infamantes como “fascismo”, “fundamentalismo religioso”, “preconceito e discriminação”, “racismo”, “homofobia”, “teoria da conspiração”, “elite exploradora” etc., é hoje praticamente obrigatório e funciona como substitutivo socialmente aprovado do esforço de compreender aquilo que se pretende impugnar mediante o emprego fácil e desesperadoramente mecânico desses termos.
O controle “politicamente correto” do vocabulário tenta vestir uma camisa-de-força verbal no adversário mas termina por aleijar intelectualmente o próprio usuário desse artifício, reduzindo-o à condição de repetidor histérico de insultos completamente despropositados.
Como o que no Brasil de hoje se chama “educação universitária” consiste eminentemente em adestrar os alunos nessa prática, não é de espantar que quatro entre cada dez estudantes das nossas faculdades sejam analfabetos funcionais, o que não significa que os outros seis tenham uma inteligência à altura das funções para as quais ali se preparam.
Demonstrações de inépcia em doses francamente escandalosas são freqüentes não só entre maus estudantes, mas entre pessoas que ocupam os postos mais destacados na esfera da alta cultura neste país. Quando, por exemplo, o escritor Luiz Ruffato é aplaudido pela mídia ao classificar como “genocídio” a redução do número de índios brasileiros de quatro milhões (número hipotético) para 900 mil desde os tempos de Pedro Álvares Cabral até hoje, tanto ele quanto sua platéia demonstram que não têm a menor idéia do que venha a ser um genocídio e só usam a palavra como reforço da identidade grupal dos “bons” contra os “malvados”. “Pensar”, no Brasil, significa que o sujeito se apaixona por um símbolo do que lhe parece “o bem” e “a justiça”, e imediatamente liga o gerador de lero-lero para acabar com o mal no mundo.


Outro tanto deve ser dito do dr. Miguel Nicolélis, que se escora na sua autoridade de neurocientista para dizer que Jesus, Abraão e Maomé eram apenas esquizofrênicos que imaginavam falar com Deus. Esse homem estuda o cérebro há décadas, mas ainda não se deu conta de que é impossível encontrar, nesse órgão, qualquer prova de que algum objeto pensado exista ou inexista fora dele
.

Isto aplica-se a Deus como a um gato, a uma pedra ou a uma banana. Aplica-se aliás até ao próprio cérebro. Com toda a evidência, o ilustre membro da Academia Pontifícia de Ciências não entende o alcance da sua própria afirmação, produzida no gerador de lero-lero para fazer bonito ante pessoas que também não a compreendem. Seis meses de estudo das “Investigações Lógicas” de Husserl não lhe fariam nenhum mal.
Já nem comento os palpiteiros enragés que, em explosões verbais de uma comicidade irresistível, aparecem a toda hora professando dar cabo do Olavo de Carvalho de uma vez por todas. Um deles, a quem eu tentava explicar que não é possível ter serviço públicos gratuitos e ao mesmo tempo “acabar com a desigualdade social”, não parecia entender que um serviço público só é gratuito quando custeado por alguém que não é o seu beneficiário: a redução da desigualdade social distribui as despesas mais equitativamente entre todos e acaba automaticamente com a gratuidade. Numa situação idealizada, onde todos tivessem ganhos equivalentes, das duas uma: ou todos pagariam contribuições iguais para custear os serviços independentemente de usá-los ou não, ou cada um pagaria proporcionalmente aos serviços que recebesse. No primeiro caso estaria imediatamente instaurada a desigualdade entre os que pagam sem usar e os que usam sem pagar. No segundo, os serviços não seriam gratuitos de maneira alguma. Por mais que eu explicasse, analisasse e desenhasse essa equação simples, o sujeito, homem de formação universitária, continuou esperneando e jurando que eu era um adepto da injustiça social.
Só pode haver divergência de opiniões entre pessoas com nível similar de inteligência e conhecimento. Com mentecaptos, só o que existe é uma dificuldade de comunicação quase invencível.

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