sexta-feira, 5 de junho de 2015

Por que ensinar a partir da Teoria dos Gêneros Textuais?





Por que ensinar a partir da Teoria dos Gêneros Textuais?


GODENY, Juliana (G)
PEREIRA, Liliane (G)
SAITO, Cláudia L. N. (Orient.)

  Introdução

Do início da década de 80, pudemos observar uma crescente tendência de questionamento ao ensino tradicional de produção e recepção textuais, presenciamos também  inúmeras discussões sobre o papel da escola no desenvolvimento de competências e habilidades de linguagem dos alunos.
 Pesquisas  desenvolvidas recentemente, no campo da Lingüística e Lingüística Aplicada, revelaram um ensino comprometido por problemas de ordem conceitual, conteudística, pedagógica, o que resultou conclusões alarmantes sobre as condições de produção e recepção de textos na escola (Pécora, 1983; Brito, 1985; Geraldi, 1993 e 1998).
A partir daí, os documentos oficiais passaram a fazer indicação explícita do ensino de leitura e produção de textos orientados por gêneros textuais. Nesta comunicação, pretendemos apresentar o resultado das discussões sobre a utilização de uma abordagem lingüística- enunciativa nas práticas pedagógicas, realizadas durante os encontros do projeto de pesquisa “Gêneros Textuais no Ensino Médio: uma abordagem para o ensino de língua materna”, desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina.


1- A tipologia clássica e as práticas pedagógicas

À luz do conceito bakhtiniano de gêneros discursivos, pesquisadores europeus do chamado “Grupo de Genebra” propuseram a utilização dos gêneros textuais como instrumento , como ponto de partida para o ensino. Dentre eles, Dolz e Scheneuwly (1996) e Pasquier e Dolz (1996) se posicionaram contrários à utilização da tipologia clássica (narração, descrição e dissertação) para o desenvolvimento de habilidades de escrita e leitura, considerando-a inadequada para uma ação pedagógica voltada ao desenvolvimento de competências comunicativas amplas, uma vez que não contempla o escopo social dos textos, baseia-se apenas na sua organização textual. A tipologia clássica não dá conta das inúmeras práticas sócio-discursivas de nossa sociedade. Afinal, na vida cotidiana não é solicitado a alguém que faça uma dissertação , ou uma descrição ou narração. O que se exige é um certo domínio dessas “modalidades retóricas” (cf. Swales, 1994/1999 ) para se defender uma idéia , um ponto de vista no caso da dissertação; ou para se fazer um boletim de ocorrência no caso da  narração; ou para se escrever um anúncio de classificados no caso da descrição.
Logo, restringir os textos, nas práticas pedagógicas, apenas pelo modo como se organizam é um risco de limitá-los a fórmulas ou esquemas que os descaracterizem de seus propósitos comunicativos. Devemos, então, pensar o quanto uma mudança de concepção de ensino e aprendizagem se faz necessária. Ainda mais, em um momento histórico como o que vivemos agora, em que mudanças  econômicas e políticas trazidas a reboque do fenômeno da “globalização” trazem a todo instante profundas conseqüências culturais e diretamente, novas práticas sociais.


2- Novas formas de interação: nova concepção de letramento

De acordo com Dionísio (2005, p.159), o desenvolvimento tecnológico fez surgir  novas formas de interação, a comunicação passa a ser muito mais mediada. Em conseqüência disso, diferentes habilidades de linguagem são exigidas: há necessidade de leitores não apenas  do texto verbal , mas de uma gama de textos multimodais., ou seja, de textos que têm vários sistemas de linguagem ( verbal+ visual; verbal+ audiovisual;  verbal+ gestual, etc ) em sua constituição. Pudemos constatar que a relação palavra/ imagem mantêm uma relação cada vez mais estreita, assim não havendo  mais lugar para a velha concepção de letramento, que se detinha apenas à habilidade de ler e escrever.
Segundo a autora, é necessário “uma ampliação, uma revisão em conceitos basilares no âmbito dos estudos do processamento textual”, uma vez que a noção de letramento não abrange todos os tipos de representação do conhecimento existentes em nossa sociedade. Para ela:

“na atualidade, uma pessoa letrada deve ser capaz de atribuir sentidos a mensagens oriundas de múltiplas fontes de linguagem, bem como ser capaz de produzir mensagens, incorporando múltiplas fontes de linguagem.”


Esta revisitação do conceito de letramento, proposta por Dionísio, está atrelada às novas tecnologias, mais propriamente à expansão da mídia eletrônica. Hoje o termo letramento está sendo empregado em sentido amplo, abrangendo “as variedades terminológicas como letramento científico, letramento visual, novo letramento, letramento midiático e etc”.
Para Dionísio e Bezerra (2002), “necessitamos falar em letramentos, no plural mesmo, pois a multimodalidade é um traço constitutivo do discurso oral e escrito”. Ainda para  as autoras, “a diversidade de arranjos não-padrões que a escrita vem apresentando na mídia em função do desenvolvimento tecnológico”, conseqüentemente, leva a novos hábitos de ler um texto. Portanto, para elas, na sociedade contemporânea, “à prática de letramento da escrita, do signo verbal, deve ser incorporada à prática de letramento da imagem, do signo visual”. Dessa forma, somente um enfoque teórico dirigido ao ensino da língua (agem) para seu uso e funcionamentos discursivos, contextualizado e determinado sócio-historicamente instrumentalizará os alunos para essa nova realidade que nos cerca.


2.1- O ensino tradicional


Partindo dos resultados obtidos nas observações realizadas em turmas do ensino médio, uma das atividades do projeto de pesquisa "Gêneros Textuais no Ensino Médio: uma abordagem para o ensino da língua materna", desenvolvido na UEL, constatamos que, em relação às atividades propostas em sala de aula em torno das três tipologias narração, descrição e dissertação:

ü      Há falta de autenticidade nos textos produzidos em sala de aula
ü      O aluno fica descaracterizado como sujeito, visto que apenas reproduz o que o professor transmite em sala de aula, tornando - se desmotivado no momento de elaborar suas produções textuais.
ü      As produções de textos não são veiculados para fora da sala de aula (falta de um real leitor).
ü      O professor apenas executa o papel de corretor.


Além de todos esses fatores citados, é de suma importância destacar a dependência do professor em relação ao livro didático, seja por deficiência de formação, seja pela falta de infra-estrutura no ensino do país, fato que depõe contra, uma vez que grande parte dos livros didáticos mantém a tipologia textual clássica da narração, descrição e dissertação como eixo organizador do ensino.
Entretanto, essa realidade pode ser transformada, basta o professor querer. Atividades em sala de aula, em que o aluno é inserido a contextos e práticas de linguagem significativas, podem colaborar para que uma grande transformação ocorra. Transformação essa que ultrapassará os muros das escolas, influenciando também as práticas sociais. 
 O ensino sob essa orientação se inspira “no sócio-interacionismo, na teoria enunciativa e na lingüística textual, cujos enfoques teóricos dirigem o ensino da língua (gem) para seu uso e funcionamento discursivos, enquanto sistema semiótico e simbólico, contextualizado e determinado sócio- historicamente", como cita Lopes- Rossi ( 2002, p. 65-68).
Através dos gêneros que circulam na sociedade (fábula, artigo de opinião, resenha de filmes, etc.) os alunos poderão distinguir um texto formal de um informal, isto é, saberão qual gênero é mais adequado à determinada interação verbal e, assim, suas interações sociais poderão, cada vez mais, ocorrer de forma mais eficientes.


2.2- Gêneros  textuais: um mega- instrumento de ensino


Tomando como base o que foi visto até aqui, podemos constatar que cabe ao professor a tarefa de gerar  possibilidades para que os alunos se apropriem de características discursivas e lingüísticas de gêneros diversos, em situações reais, inseridas num determinado contexto. Para isso, o professor deve promover, por meio de projetos pedagógicos que visem ao conhecimento e à leitura, a discussão sobre o uso, as funções sociais dos gêneros escolhidos,  sua composição, seu estilo, seu tema, assim como também a maneira como o “texto diz o que diz” (Groupe d’Entrevernes, 1998), ou seja, a sua discursivização. 
Dolz e Schneuwly (1998) acreditam que somente:


 “uma proposta de ensino/ aprendizagem organizada a partir de gêneros textuais permite ao professor a observação e a avaliação das capacidades de linguagem dos alunos; antes e durante sua realização, fornecendo-lhe orientações mais precisas para sua intervenção didática. Para os alunos, o trabalho com gêneros constitui, por um lado, uma forma de se confrontar com situações sociais efetivas de produção e leitura de textos e, por outro, uma maneira de dominá-los progressivamente".


3- As práticas pedagógicas e os gêneros textuais: a leitura e a produção de textos de acordo com os documentos oficiais e as pesquisas mais atuais de linguagem.

         A partir do conceito de gênero textual como unidade de ensino,  tanto em relação à leitura quanto à produção, quando  pretendemos trabalhar com os textos, torna-se fundamental abordar os gêneros em que eles se concretizam, tomando como base seu aspecto temático, composicional e estilístico.
Os PCN e os PCNEM – Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental e  Médio, respectivamente, partem da proposta que um trabalho pedagógico desta ordem  explicita as vantagens de se abandonar o tradicional esquema das estruturas textuais (narração, descrição e dissertação) para adotar a perspectiva de que a escola deve incorporar em sua prática os gêneros ficcionais ou não-ficcionais que circulam socialmente.De acordo com Bakhtin (1992, p. 274):


 “os gêneros constituem formas relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura, caracterizados por três elementos: conteúdo temático, estilo e construção composicional. As intenções comunicativas, como parte das condições de produção dos discursos, geram usos sociais que determinam os gêneros que darão forma aos textos”.


Para Bronckart, os gêneros são compreendidos como toda unidade de produção verbal, oral ou escrita, contextualizada, que transmite uma mensagem lingüisticamente organizada e que produz um efeito de coerência no seu destinatário. Já segundo Schneuwly e Scheneuwly (1996, p.152 ), o gênero textual é caracterizado por formas lingüísticas estáveis e convencionais que correspondem a situações de comunicação precisas. Nesse sentido, pode ser comparado a um “mega-instrumento” utilizado pelos interlocutores nas diferentes situações de linguagem, sendo diferenciado por três dimensões: conteúdos veiculados, estrutura comunicativa comum ao gênero e configurações específicas das unidades lingüísticas que compõem o texto.
Os gêneros textuais que são práticas textuais vinculados à vida social, entidades sócio-discursivas e formas de ação social  fazem parte da situação comunicativa. Surgem lado a lado às necessidades interacionais. Nesse sentido, há , constantemente, uma explosão de gêneros.
Assim, o trabalho pedagógico com os gêneros presentes na sociedade podem tornar as aulas muito mais interessantes e significativas, desenvolver nos alunos sua competência textual e contribuir para que o aluno, de certa forma, sejam preparados  para fazer o uso da comunicação nas muitas esferas de comunicação humana que se constituem na interação social.


.4- A escolha dos gêneros mais adequados


 De repente, perguntamo-nos: quais serão os gêneros textuais que devemos escolher quando vamos planejar nossas atividades pedagógicas? Será que posso trabalhar um mesmo gênero no ensino fundamental (séries iniciais e  5ª a 8ª) e no ensino médio? Dúvidas como estas são constantes entre os professores, fazendo parte de seu cotidiano. Portanto, é importante que saibamos bem como respondê-las.
Primeiro, em relação à escolha dos gêneros, podemos dizer que todos os gêneros são bons para trabalharmos em sala de aula, mas de preferência aqueles de maior circulação social ou aqueles que detém maior complexidade, os gêneros secundários. Bakhtin (1992, p. 281) divide os gêneros em primários – aqueles que ocorrem em situações cotidianas - e secundários – que ocorrem em contextos comunicativos mais complexos.
Entretanto, se pensarmos em como a vida do homem contemporâneo cercada pelos meios de comunicação de massa e suas mensagens e de como é de extrema importância o letramento midiático, deveremos sempre dar um lugar especial aos gêneros  textuais da esfera  da mídia  (gêneros jornalísticos, publicitários, etc), mas sem esquecer daqueles gêneros da esfera da criação artística que são veiculados nas rádios, nos canais de televisão, nos jornais , nas revistas, na Internet.
Quanto ao trabalho pedagógico com  alguns gêneros  em detrimento a outros de acordo com a série a ser  aplicada encontramos a resposta na  proposta de Bronckart, Dolz e Schneuwly. Para estes autores, devemos organizar as transposições dos gêneros textuais para o ensino tendo em vista um ensino em espiral. O ensino espiral, ao contrário do  linear em que se trabalha com um “tipo de texto” e depois vai passando a outro e outro “subindo degraus” em dificuldades, é aquele em que um mesmo gênero pode ser trabalhado em qualquer série, variando apenas a forma de abordagem, isto é, o aprofundamento e enfoque dado. A diferença de um nível escolar para outro está nas dimensões ensináveis desse gênero, que  vão progredindo em complexificação, sendo aprofundadas  de acordo com o avanço do aluno.


 Conclusão:

A partir do que é preconizado pelos documentos oficiais (PCN e PCNEM), "nas funções sociodiscursivas da escrita e nas condições de produção das diferentes interações verbais" , constatamos que o trabalho com gêneros textuais de circulação na sociedade pode tornar as aulas muito mais produtivas e interessantes para os alunos.
Assim, o trabalho pedagógico com gêneros textuais pode ser o caminho para um ensino e aprendizagem efetuados de forma eficaz, contribuindo de maneira significativa para que os estudantes sejam mais competentes não só em suas atividades escolares mas, principalmente, em suas práticas sociais.


Bibliografia:

BAKHTIN, Michael. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua           Portuguesa,  área de linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: MEC/ SEF. 1998.
BRONCKART, Jean Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio discursivo. EDUC- São Paulo: PUC, 2003.
DOLZ, J. et  SCHNEUWLY, B. (1996). Genres et progression em expression orale et écrite:       elements de réflexions à propôs d’une expérience romande, Emjeux,  1996. (Tradução provisória            de Roxane Rojo).
GROUPE D’ ENTREVERNES. Análise narrativa de textos. Paris, 1998.
LOPES-ROSSI, Maria Ap. G. (org). Gêneros Discursivos no Ensino de Leitura e Produção de Textos. Taubaté- SP: Cabral, 2002.
SWALES, J. & C. FEAK.  A course for Nonnative Speakers of English. Michigan, 1994/1999.


fonte; http://www.faccar.com.br/eventos/desletras/hist/2005_g/2005/textos/019.html

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APRESENTAÇÃO DE PROJETO DE MONOGRAFIA Tema:A importância dos contos de fada na educação infantil Maria Conceição Bacelar




Tema:A importância dos contos de fada na educação infantil

Maria Conceição Bacelar
Levando-se em consideração a grande importância nas dimensões, social, afetiva, histórica e pedagógica dos contos de fadas, faz-se necessário pesquisar como esses textos têm sido trabalhados, se a ideologia implícita nessas narrativas está sendo discutida com as crianças, em que medida os contos de fadas podem contribuir para as produções textuais infantis, em fim, qual a verdadeira intenção pedagógica da utilização dessa literatura infantil junto às crianças pequenas.
Os contos de fadas ensinam pouco sobre as condições de vida na moderna sociedade de massa; eles foram inventados muito antes que ela existisse. Daí surge a necessidade de um estudo aprofundado sobre a importância dos mesmos na educação infantil, visto que através deles podem-se aprender mais sobre os problemas interiores dos seres humanos e as soluções corretas para as situações difíceis do que com qualquer outro tipo de estória, dentro de uma compreensão infantil.
A criança deve receber ajuda para dar sentido ao seu turbilhão de sentimentos. Ela encontra este significado nos contos de fadas. Daí sua relevância social.
Todos nós em algum momento de nossas infâncias, já vivemos sob os encantos dos contos de fadas. Porém observa-se em nossa sociedade um crescente processo de banalização desses históricos. Sob o império de Walt Disney e outros, os contos, herança cultural da humanidade, têm sido deturpados, perdendo suas características originais. Nesse sentido surgiu o nosso interesse pela realização dessa pesquisa, aprofundando os conhecimentos quanto da importância dos contos de fadas, para assim recuperar e ressignificar o uso dos contos de fadas na educação infantil. Uma vez que trabalhamos um projeto de pesquisa e estágio na Educação Infantil abordando o tema.
Bruno Bettelhein (¹) (1980) um dos maiores psicólogos infantis coloca que os contos de fadas são de fundamental importância, pois enquanto diverte a criança a esclarece sobre se e favorece o desenvolvimento da sua personalidade. Oferece significados em todos os níveis diferentes, e enriquece a existência da criança de tantos modos que nem um livro pode fazer justiça à multidão e diversidade de contribuições que esses contos dão à vida da criança.
Nesse contexto é fundamental que o professor seja conhecedor da importância dos contos de fadas no desenvolvimento da criança para assim fazer uso pedagógico dos mesmos na educação infantil.
Investigar o uso dos contos de fadas na educação infantil engloba uma série de questões complexas. Os contos de fadas são pouco utilizados na instituição escolar e, quando são, devem servir como modelo de uma tarefa escolar. Não é contar ou não uma história de fadas o que importa, mas a forma como isto é feito e a sua finalidade em uma instituição escolar. Percebe-se que o que está em jogo no desenvolvimento dessa atividade é uma concepção de infância que permeia o discurso pedagógico. A infância institucionalizada deve moldar-se a um padrão cientificamente determinado. A emoção, a fantasia e a criatividade tanto dos alunos como dos professores devem ser normatizados e encaixados em um modelo idealizado do que se determinou como cultura e sociedade.
Transformados em tarefas escolares os contos de fadas perdem sua função lúdica e estética e impedem que as emoções sejam vivenciadas. Ao mesmo tempo, acredita-se que impulsos mais primitivos podem ser aprisionados e impedidos de se manifestarem. O que amedronta os professores quando deixam que a fantasia e emoção fluam livremente? Parece que o medo maior é de que os impulsos mais primitivos surjam e não possam ser controlados. Impulsos que eles aprendem duramente a controlar e que correm o risco de serem revividos.
Para dominar desejos insatisfeitos, os contos de fadas, desde suas origens, representam importantes formas de expressão. Como representações psíquicas, encerram os dramas pertencentes aos homens e, em uma linguagem poética, transformam nossos desejos, tornando-os aceitáveis à nossa consciência. De forma artística, os contos de fadas simbolizam fantasias infantis universais. Exercem uma importante fusão no desenvolvimento infantil e auxiliam a criança a conhecer o mundo e a se reconhecer. Os contos de fadas sempre tiveram a função de distrair e instruir, podendo ser um valioso instrumento auxiliar na educação da criança. Ao mesmo tempo em que aliviam pressões inconscientes, constroem um sistema metafórico e simbólico, podendo ser considerado um rico instrumento pedagógico.
A revolução industrial, deflagrada no século XVIII, se associa tanto o crescimento político quanto ao financeiro das cidades, com decadência paulatina do poder rural e do feudalismo remanescente desde a Idade Média. A urbanização por seu turno e faz de modo desigual, refletindo as diferenças sociais: do lado de fora localiza-se o proletariado, constituído inicialmente pelas pessoas que haviam se mudado do campo para a cidade: no coração do perímetro urbano, a burguesia, que financia, com os capitais excedentes da exploração das riquezas minerais das colônias americanas ou do comércio marítimo, as novas plantas industriais que se instalam e a tecnologia necessária ao seu florescimento.
A burguesia se consolida como classe social apoiada num patrimônio que não mais se mede em hectares, mas em cifrões. E reivindica um poder político que conquista paulatinamente, procurando evitar confrontos diretos e sangrentos, como o que ocorre na França, em 1789, mas utilizando também essa solução, quando é o caso. Entretanto, é uma camada social pacifista, em princípio. Ou , por outra, procura tornar sua violência menos visível. Para isso, incentiva instituições que trabalham em seu favor, ajudando-a a atingir metas desejadas.
A primeira dessas instituições é a família, cuja consolidação depende, em alguns casos, da interferência do Estado absolutista que, interessado em fraturar a unidade do poder feudal, ainda atuante, estimula um modo de vida mais doméstico e menos participativo publicamente. Esse padrão vem a ser qualificado como moderno e ideal, elevando-se como modelo a ser imitado por todos.
A manutenção de um estereótipo, familiar, que se estabiliza através da divisão do trabalho entre seus membros (ao pai cabendo a sustentação econômica, e a mãe a gerência da vida doméstica privada), converte-se na finalidade existencial do indivíduo. Contudo para legitimá-la, ainda foi necessário promover, em primeiro lugar, o beneficiário, maior desse esforço conjunto: a criança. A preservação da infância impõe-se enquanto valor e meta de vida; porém, como sua efetivação somente pode se dá no espaço restrito, mas eficiente da família, esta canaliza em prestigio social até então inusitado.
A criança passa a ter um novo papel na sociedade, motivando o aparecimento de objetos industrializados (o brinquedo) e culturais (o livro) e nos ramos da ciência (a psicologia infantil, a pedagogia ou pediatria) de que ela é destinatária. Todavia a função que lhe cabe desempenhar é apenas de natureza simbólica, pois se trata antes de assumir uma imagem perante a sociedade, a de alvo de atenção e interesse dos adultos, que se exercem uma atividade econômica ou comunitariamente produtiva, da qual adviesse alguma importância política e reivindicatória. Como decorrência, se a faixa etária equivalente à infância o individuo que atravessa recebe uma série de atributos que o promove coletivamente, são esses mesmos fatores que o qualificam de modo negativo, pois ressaltam, em primeiro lugar, virtudes como a fragilidade, a desproteção e a dependência.
A segunda instituição convocada a colaborar para a solidificação política e ideológica da burguesia é a escola. Tendo sendo facultativa, e mesmo dispensável até o século XVIII, a escolarização converte-se aos poucos na atividade compulsória das crianças, bem como a freqüência as salas de aula, seu destino natural.
Essa obrigatoriedade se justifica como uma lógica digna de volta: postulados e fragilidade e o despreparo dos pequenos, urgia equipá-los para o enfrentamento maduro do mundo. Como a família, a escola se qualifica como espaço de mediação entre as crianças e a sociedade, o que mostra a complementaridade entre essas instituições e a neutralização do conflito possível entre elas.
Entretanto, a escola incorpora ainda outros papéis, que contribuem para reforçar sua importância, tornando-a, a partir de então, imprescindível ao quadro da vida social. É que, por força de dispositivos legais, ela passa a ser obrigatória para crianças de todos os segmentos da sociedade, e não apenas para as da burguesia. Ajuda assim a enxugar do mercado um contingente respeitável de operários mirins, ocupantes, nas fábricas, dos lugares dos adultos, isto é, dos desempregados que na situação dos subversivos ou criminosos, agitavam a ordem social sob o controle dos grupos no poder.
Numa sociedade que cresce por meio da industrialização e se moderniza em decorrência de novos recursos tecnológicos disponíveis, a literatura infantil assume, desde o começo, a condição de mercadoria. No século XVIII, aperfeiçoa-se a tipologia e expande-se a produção de livros, facultando a proliferação dos gêneros literários que, com ela, se adequam a situação recente. Por outro lado, porque a literatura infantil trabalha sobre a língua escrita, ela depende da capacidade de leitura das crianças, ou seja, supõe terem estas passadas pelo crivo da escola.
Os laços entre a literatura e a escola começam desde este ponto: a habilitação da criança para o consumo de obras impressas. Isto aciona um circuito que coloca a literatura, de um lado, como intermediária entre a criança e a sociedade de consumo que se impõe aos poucos; e, de outro, como caudatária da ação da escola, a quem cabe promover e estimular como condição de viabilizar sua própria circulação.
Como podemos perceber, os primórdios da literatura infantil são marcados pela intenção de formar a criança, de ensinar comportamentos e atitudes e de sedimentar uma ideologia. Durante muito tempo, as obras infantis serviram principalmente a esse propósito e só aos poucos deixaram de lado o pedagogismo e o moralismo para conquistar seu status artístico.
A aproximação entre a instituição e o gênero não é fortuita. Sintoma disto é que os primeiros textos para crianças são escritos por pedagogos e professoras, com marcante intuito educativo. Fica evidenciado a estrita ligação da literatura infantil com a pedagogia, quando vemos, em toda a Europa, a importância que assumem os grandes educadores da época, na criação de uma literatura para crianças e jovens. Suas intenções eram fundamentalmente formativas e informativas, até enciclopédicas. Bons exemplos disso são as obras de Comenius, Basedow, Campe, Fénelon entre outros. E, até hoje, a literatura infantil permanece como uma colônia da pedagogia, o que lhe causa grandes prejuízos: não é aceita como arte, por ter uma finalidade pragmática; e a presença deste objeto didático faz com que ela participe de uma atividade comprometida com a dominação da criança.
São estes fatos que tornam problemáticas as relações entre literatura e educação. De um lado, o vínculo de ordem prática prejudica a recepção de obras: o jovem não quer ser ensinado por meio da arte literária; e a crítica desprestigia globalmente a produção destinada aos pequenos, antecipando a intenção pedagógica, sem avaliar os casos específicos. De outro, a sala de aula é um espaço privilegiado para o desenvolvimento do gosto pela leitura, assim como um importante setor para o intercâmbio da cultura literária, não podendo ser ignorada. Revela-se imprescindível e vital um redimensionamento de tais relações de modo a transformá-las eventualmente no ponto de partida para um novo e saudável diálogo entre o livro e seu destinatário mirim.
Vulgarmente a expressão “literatura infantil” sugere de imediato a idéia de belos livros coloridos destinados a distração e o prazer das crianças em lê-los ou ouvir suas histórias contadas por alguém. Devido a essa função básica, até bem pouco tempo, a literatura infantil foi minimizada como criação literária e tratada pela cultura oficial como um gênero menor.
No final da antiga década de 60 a produção infantil brasileira começou a trilhar um novo caminho, ainda que a renovação só se concretizasse efetivamente na década seguinte. Aos anos 60 iniciaram de forma culturalmente promissora, mas a revolução militar acabou reprimindo os segmentos da sociedade que, de alguma maneira, criavam produtos culturais que pusessem em risco ou questionassem o regime totalitário implantado. Diante da repressão, inúmeros escritores, e especialmente os livros infantis, recorreram à linguagem figurada como forma de exprimir o que não era permitido. Surgiram daí obras de grande criatividade no uso de metáforas e símbolos. Algumas, no entanto, por caminhos diversos das propostas pedagógicas que povoaram o início da literatura infantil no Brasil, também serviram a um fim que não era o de oferecer um texto literariamente adequado a criança. Foram obras que cumpriram o papel de canal por onde as vozes adultas, tolhidas, expressaram os não ditos da sociedade de então.
A partir dos anos 70, com a reforma do ensino, que abriu as portas da escola a todas as camadas da população (pelo menos em tese), eliminando os exames seletivos, o livro passou a ser privilegiado, e a criança, a ser vista como um consumidor em potencial, o que impulsionou publicações de obras infantis. Junto a edições de qualidade gráfica e estética, que propiciaram uma reorganização, pela criança, de suas precepções do mundo e das próprias experiências existenciais, surgiram obras que não tinham compromisso com o leitor infantil; pecaram pelo pedagogismo, pela imbecilização da infância ou pela incapacidade de promover a identificação da criança com as propostas ali contidas.
Na década de 80, quando a abertura política já estava em andamento, a escolarização espalhou-se pelo país, e a cultura letrada atingiu um público maior, apoiado pelos meios de comunicação. Porém em vez de servir preferencialmente a emancipação (Bordine, 1998), virou produto de consumo e perdeu seu sentido crítico. Houve uma explosão de publicações, e a produção de livros infantis tornou-se mais especializada, com ênfase em temas modernos e, em alguns casos, as denúncias sociais. Dependente das oscilações de moda e gosto, a literatura infantil, como bem de consumo, viu-se presa à constante apresentação de novidades, o que muitas vezes, enfraqueceu sua qualidade.
Esse quadro de larga produção de textos infantis pela industria editorial mantém-se com toda a força nos dias de hoje, fazendo com que seja necessário um olhar atento sobre a qualidade estético - literário das obras. Ao lado de escritores preocupados com a lerda comercialização dos livros da criança, é possível encontrar autores que se propõem representar o universo da infância, produzir, enfim, textos que propiciem uma expansão dos horizontes e das expectativas do leitor-mirim.
Dessa forma, a literatura infantil, a exemplo de outras modalidades de arte, lida com a compreensão do real e pode conceder ao pequeno leitor a possibilidade de suas capacidades efetivas e intelectuais, desde que bem adaptados às condições da criança. Quando se compromete com as necessidades e os interesses de seu destinatário, o texto infantil transforma-se num meio de acesso à realidade e facilita a ordenação das experiências existenciais do sujeito.
Neste sentido, a presença de elementos mágicos e o recurso a fantasia tem sido procedimentos recorrentes na literatura infantil para conquistar o leitor. Assinalamos que tal uso remota aos contos de fadas encontra-se vivo nas mais variadas produções para a criança na atualidade. Mudaram leitores, hábitos e gostos, mas a fantasia continua sendo um ingrediente precioso na sedução ao leitor. Para compreendermos sua importância na literatura infantil, precisamos retomar seu papel no gênero que a consagrou: os contos de fadas.


fonte; http://projetodemonografia.blogspot.com.br/2009/05/apresentacao-de-projeto-de-monografia.html


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REAGINDO A OLAVO DE CARVALHO #01