domingo, 1 de fevereiro de 2009

Matemática – Espaço e forma – 6º e 7º anos


A geometria que faz a diferença

Com a sequência da Educadora Nota 10, a garotada aprende a identificar as características que distinguem os sólidos

Beatriz Santomauro

Uma sequência didática eficiente segue um passo-a-passo bem determinado: com base em um diagnóstico inicial, o professor avalia os conhecimentos que os alunos já têm e planeja quais serão as primeiras atividades. Propõe situações- problema, procura desenvolver procedimentos de aprendizagem e valoriza a diversidade das soluções. Concebe uma aula atrelada a outra, com graus de dificuldade progressivos, para aproveitar os saberes adquiridos pelos alunos e aprofundá-los sempre um pouco mais. A cada etapa, o educador identifica os raciocínios desenvolvidos e o domínio das estratégias, verificando o que já foi aprendido por todos, o que precisa ser reforçado e qual intervenção deve fazer para chegar aos que parecem estar ficando para trás. Nas avaliações, reflete sobre qual direção as atividades devem seguir.

Kriz Knack

CONSTRUIR FIGURAS Na EEEFM Carlos Drumond de Andrade, a turma prevê o total de vértices e arestas do cubo


Parece – e é – um bocado de trabalho. Mas o esforço vale a pena, pois o impacto na aprendizagem é enorme. Que o diga Andréia Silva Brito, professora de Matemática em Presidente Médici, a 412 quilômetros de Porto Velho. Seguindo o caminho descrito acima, ela desenvolveu uma sequência didática para a turma de 6º ano na EEEFM Carlos Drumond de Andrade (registrada assim mesmo, com um único “m” em Drummond) e enviou o projeto para o Prêmio Victor Civita – Educador Nota 10 de 2008 (leia o quadro abaixo). A qualidade lhe conferiu o título de Educadora do Ano. Selecionada entre 4.866 inscritos de todo o país, ela recebeu 10 mil reais e uma bolsa para cursar pós-graduação.

Múltiplas estratégias para ensinar

Nascida em Umuarama, a 580 quilômetros de Curitiba, a Educadora Nota 10 morou em Cascavel até os 10 anos. Na década de 1980, mudou-se para Rondônia – foi a época em que o estado recebeu uma leva de migrantes vindos de vários estados, principalmente da Região Sul, em busca de terras desocupadas e ricas em minério e madeira. No caso da família de Andréia, as promessas de riqueza não vingaram: enquanto a mãe passou a lecionar, o pai virou trabalhador rural e depois inspetor escolar. Após morar em Ji-Paraná e Castanheiras, a professora se estabeleceu em Presidente Médici, cidade de 20 mil habitantes que vive da agricultura e da pecuária. Casada e mãe de dois filhos, formou-se em Matemática na Universidade Federal de Rondônia em 1998. Hoje, aos 33 anos, leciona para o 6º ano e forma professores de Ensino Fundamental na EEEFM Carlos Drumond de Andrade. O projeto vencedor do Prêmio Victor Civita – Educador Nota 10 foi desenvolvido ao longo de dois meses. Metade do tempo foi dedicada à prática em sala, com as atividades apresentadas nesta reportagem, e em encontros semanais fora do horário para sanar dúvidas. A outra metade envolveu uma pesquisa de campo, quando a garotada teve como tarefa visitar construções da cidade e, em grupos, montar maquetes com base no formato das obras. “Eu queria que a turma percebesse que poliedros e corpos redondos não são apenas conteúdos escolares. São conhecimentos úteis no cotidiano”, afirma a professora. Para apurar o olhar das crianças durante essa pesquisa, Andréia chamou um engenheiro civil para falar sobre a forma das construções. “Ele contou como os sólidos eram importantes no trabalho dele e mencionou áreas em que as figuras geométricas são fundamentais, como a Química, a Biologia e a Geografia.” Com as maquetes prontas, as crianças escreveram fichas explicativas sobre o que foi apresentado. Essa multiplicidade de abordagens sobre o mesmo conteúdo encantou os jurados do prêmio. “Os alunos construíram ideias mais completas sobre as figuras geométricas e suas propriedades porque tiveram diversas possibilidades de identificação com alguma estratégia para aprender”, afirma Daniela Padovan, selecionadora dos projetos de Matemática do 6º ao 9º ano.

O trabalho começou com uma prova para diagnosticar o que de fato os alunos sabiam. Na análise do bloco com os piores resultados, deu espaço e forma na cabeça: o índice de acertos foi de apenas 46%. O resultado não chegou a ser surpreendente. “Esse é um dos eixos de conteúdo mais negligenciados no ensino de Matemática. Costuma ser deixado para o fim do ano e muitas vezes não é nem abordado, com a desculpa de que faltou tempo”, diz Daniela Padovan, psicopedagoga e selecionadora do Prêmio Victor Civita – Educador Nota 10. O “esquecimento” cobra seu preço: os alunos não atingem as expectativas de aprendizagem – nesse caso, compreender as propriedades de figuras bi e tridimensionais, descrever suas características e utilizar a nomenclatura da área.

A turma concebe hipóteses. Em seguida, busca a comprovação
Norteada pelo estudo das características dos sólidos, a sequência criada por Andréia teve como objetivo principal levar a turma a distinguir dois tipos de figura espacial, os poliedros e os corpos redondos – as principais diferenças entre eles são descritas ao longo desta reportagem. Como pontapé inicial, a professora colocou diversos sólidos à disposição da classe e pediu que a turma os organizasse em dois grupos de acordo com alguma semelhança: de tamanho, cor ou forma, por exemplo. “Expliquei que classificar é algo que fazemos naturalmente e exige critério”, afirma. O agrupamento por forma, justamente o que mais interessava do ponto de vista geométrico, foi pouco utilizado. “Era preciso insistir nessa explicação”, conta Andréia.

Para isso, a estratégia foi usar os sólidos como carimbos. Lambuzando as figuras de tinta, a garotada encostou em um papel as diferentes partes de cada uma. A descoberta era intrigante: algumas estampavam na folha marcas como quadrados, triângulos e círculos, mas esferas marcavam apenas um ponto. Por quê? A indagação foi a deixa para que a professora explicasse outra distinção: enquanto os poliedros são formados apenas por faces planas com contornos retos – o cubo, a pirâmide e o prisma, por exemplo –, os corpos redondos são compostos por superfícies curvas (como a esfera) ou por uma combinação de planos e curvas (os cilindros).

Atividades práticas ajudam a aprender termos da área
Com essas informações, era possível um novo avanço: entender a relação entre bi e tridimensionalidade. Para isso, a professora preparou moldes de poliedros e corpos redondos em uma folha de papel que, quando cortados e colados, davam origem a figuras com volume. A experiência da montagem revelou mais uma diferença: com os poliedros, era necessário dobrar o papel para fechar as figuras (uma situação que reforçava a existência de contornos retos). No caso dos corpos redondos, isso não ocorria.


O passo final foi fazer com que os jovens reconhecessem outros dois elementos exclusivos dos poliedros: as arestas e os vértices – respectivamente, os segmentos que formam a figura (as populares quinas) e os pontos de junção de três ou mais faces de um poliedro. O desafio para a turma, agora, era prever quantos palitos de churrasco e bolinhas de massinha eram necessários para a montagem de objetos como pirâmides e prismas – cada palito correspondia a uma aresta, e cada bolinha, a um vértice. Durante a montagem dos esqueletos das figuras, um dos alunos fez a pergunta que Andréia esperava ouvir:

– Professora, para fazer a esfera vou precisar de palitos?

– O que você acha?

– Acho que não porque ela não tem arestas – concluiu, cheio de razão.

Na hora da avaliação, a certeza do sucesso: as provas demonstraram um nível de acertos na casa dos 90%, quase o dobro do índice inicial. Para a Educadora Nota 10, a experiência demonstrou que os conteúdos matemáticos são aprendidos quando o aluno participa da construção de um conhecimento que é significativo para ele. O processo exigiu mais aulas do que a maneira convencional de ensinar, mas, na opinião de Andréia, a dedicação extra compensou. “Tenho certeza de que vou economizar tempo lá na frente, quando recuperar alguns dos conteúdos já dominados por eles hoje.”

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Contatos
Daniela Padovan,
danielap@superig.com.br
EEEFM Carlos Drumond de Andrade, R. Maringá, 2340, 76916-000, Presidente Médici, RO, tel. (69) 3471-2474
Bibliografia
Didática da Matemática Como Dois e Dois,
Marília Toledo e Mauro Toledo, 336 págs., Ed. FTD, tel. (11) 3611-3055, 60,80 reaisto

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Matemática | geometria | sólidos


Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0219/aberto/geometria-faz-diferenca-415458.shtml

Índice da edição 219 - jan/2009

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