segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Resumo. O Ensino da Linguagem Escrita:Myriam Nemirovsky

 


 

O Ensino da Linguagem Escrita:Myriam Nemirovsky


O livro de Myriam Nemirovsky destina-se aos professores, principalmente àqueles que têm como tarefa a alfabetização das crianças nos primeiros anos de escolarização. A autora define alfabetização como a “[...] responsabilidade da escola de aprendizagem da leitura e da escrita durante todos e em cada um dos níveis e ciclos educativos.” (p.07) Ressalta, ainda, que se trata de um processo contínuo que não se encerra nos primeiros anos de escolarização.
1 Antes de começar: Que hipóteses fazem as crianças sobre o sistema da escrita?
Baseada em Emília Ferreira, a autora traça os três níveis pelos quais passam todas as crianças no seu processo de alfabetização, lembrando-nos que a idade cronológica não é o fator que determina o nível de sua escrita, mas as características apresentadas pela sua escrita.
Nos diferentes níveis são encontrados fatores quantitativos e qualitativos. Os quantitativos são: sem controle da quantidade de letras, com controle da quantidade de letras, hipótese silábica (cada letra representa uma sílaba), hipótese silábico-alfabética (uma letra para cada sílaba alternando com uma letra para cada som), hipótese alfabética (cada letra representa um som). Os aspectos qualitativos são: sem diferenciação no traçado (traços contínuos ou descontínuos), com diferenciação no traçado (grafias, semiletras, letras), com valor sonoro convencional. No processo de alfabetização pode ser que a criança se encontre num determinado estágio referente ao aspecto quantitativo e em outro no aspecto qualitativo.
Essa classificação parte do princípio de que, como afirma Nemirovsky “[...] existem níveis prévios ao uso do sistema convencional de escrita – não determinados pela forma nem pelo método de ensino...” (p.18).
No processo de alfabetização o professor tem um papel de suma importância: cabe a ele a função de elaborar e por em prática as situações didáticas que contribuam “[...] no âmbito da instituição escolar, para a aprendizagem do sistema de escrita mediante a produção e a interpretação de textos.” (p.17).
2 Como organizar o ensino da linguagem escrita? Uma proposta de planejamento.
Na década de 1970 iniciou-se um processo de alfabetização. Nessa revisão deslocou-se o objeto de ensino da ação educativa colocando a centralidade do processo educativo na criança como produtora de seu caminho. No final da década de 1980, incorporou-se ao trabalho pedagógico uma preocupação maior com o processo de alfabetização, principalmente com a linguagem escrita. É nesse contexto que a autora elabora uma proposta de planejamento para o ensino da linguagem escrita cujo conteúdo apresenta nesta obra.
Sua primeira questão foi determinar a finalidade do ensino da leitura e da escrita que, para ela, “[...] consiste em formar sujeitos que sejam capazes de produzir e interpretar textos, sendo progressivamente, ainda, melhores usuários do sistema de escrita convencional” (p.22).
A base, portanto, do trabalho pedagógico deve ser diferentes textos com funções diferenciadas. A autora utiliza dois critérios para selecionar esses textos: a maior incidência de circulação na comunidade da qual a escola faz parte e as possibilidades que apresentam para o trabalho didático. Após a seleção dos textos, procede-se à escolha das propriedades a serem trabalhadas, assim elencadas por Nemirovsky:

Propriedades do texto
A que se refere
Função Qual a função do texto? Para que foi escrito?
Autor/autores Quem escreveu o texto? Quem é essa pessoa?
Público Potencial A quem se destina o texto? Qual seu leitor potencial?
Relações com a realidade O texto corresponde a fatos verídicos ou imaginários? Qual seu grau de relação com a realidade? É um texto científico? De ficção?
Extensão Qual o tamanho do texto? Breve, médio, mais longo?
Fórmulas fixas Como se inicia o texto? Qual o estilo (conto, carta, convite, etc.)?
Vocabulário Explorar a riqueza do vocabulário de cada texto.
Categorias gramaticais Quais categorias gramaticais se quer trabalhar? Em cada tipo de texto há uma incidência maior ou menor de categorias gramaticais.
Estrutura Qual a estrutura do texto?
Tipografia Quais os tipos de letras utilizadas? Quando é usada, no texto, um determinado tipo de letra?
Formato Qual a organização do texto no espaço gráfico?
Uso posterior da leitura
Modo de leitura
Qual o destinado que é dado ao texto após sua leitura? Por quê?
Qual o tipo de texto e por que o estamos lendo? Isso define as condições em que lemos.
Relação título-conteúdo Qual a relação entre o título do texto e seu conteúdo? O título tem dupla função: antecipar o conteúdo e chamar a atenção do leitor.
Relação imagem-texto Qual a relação da imagem com o texto? Para que se usa a imagem?
Suporte Onde é escrito determinado tipo de texto: tipo e tamanho da folha, encadernação, capa. Cada tipo de texto requer um suporte específico.
Tempos, modos ou formas verbais Quais os tempos, modos e formas verbais que predominam no texto?
Personagens Quem são os personagens do texto? Reais? Fictícios?
Temática Qual o tema central do texto?
Propriedades do sistema de escrita A que se refere
Diferença desenho-escrita Onde está a escrita? Onde está o desenho?
Propriedades qualitativas Quantas letras têm determinada palavra?
Propriedades quantitativas Quais letras têm determinada palavra?
Direcionalidade do sistema Direção da escrita: da esquerda para a direita, de cima para baixo.
Tipos de letra Imprensa ou cursiva; maiúscula ou minúscula.
Ortografia Priorizar, em cada produção, os aspectos ortográficos que pretende-se que o aluno melhore.
Pontuação Que pontuação usar? Quando? Por quê?
Separação entre palavras Refletir sobre os espaços vazios entre as palavras através da análise do texto.
Antes de se iniciar o trabalho acerca das propriedades do texto e do sistema de escrita deve-se considerar o tipo de texto escolhido e a etapa na qual se encontra a criança no processo de alfabetização.
Para planejar o trabalho didático Nemirovsky aponta quatro etapas: 1) Escolha do tipo de texto; 2) Definir as propriedades do texto que serão trabalhadas; 3) Escolher as propriedades do sistema de escrita que serão abordadas; 4) Elaborar a sequência didática com a previsão de atividades/situações a serem desenvolvidas. Situações pontuais, por exemplo, um fato social importante, envolvendo as situações planejadas, as imprevistas e situações de rotina devem ser consideradas para garantir um bom desenvolvimento do trabalho.
3 Quem participa da organização do ensino da linguagem escrita?
Para Nemirovsky, no processo de ler e escrever participam e interagem diferentes sujeitos envolvidos em contextos diversos.
O professor ocupa um papel de suma importância já que é ele “[...] que articula o trabalho educativo e coordena o processo de ensino” (p.47). Para a autora, a estratégia do professor alfabetizador deve partir de evidenciar seu próprio interesse pela leitura e pela escrita. Outra estratégia é o professor ler em voz alta, escolhendo textos que despertem interesse e emocione os alunos.
A interação entre os alunos é fundamental para a construção do conhecimento da leitura e da escrita, assim, a estratégia de trabalho em grupo é central. Mas, adverte a autora, o trabalho em grupo requer a atenção a quatro fatores na organização de atividades coletivas: 1) O professor deve organizar a constituição do grupo atentando para as necessidades, habilidades e dificuldades de cada; 2) Limitar o grupo em dois a três alunos para melhor desenvolvimento do trabalho; 3) Variar os critérios para selecionar os membros do grupo; 4) Para cada tarefa a ser desenvolvida constituir um novo grupo.
A interação entre alunos de turmas diferentes na escola também é uma experiência de trabalho em grupo que pode enriquecer o desenvolvimento da linguagem escrita. Nemirovsky descreve três sequências didáticas que ela vem desenvolvendo, com resultados positivos, quais sejam: trabalho com vocabulário, leitura em voz alta, escrita de ditado. Nesses grupos, os alunos maiores cumprem o papel de tutores e os menores de tutorandos.
A participação de outros membros da escola significa ampliar a participação de outros alunos e professores. Instrui-se os alunos para que comentem sobre o tema que estão desenvolvendo, peçam colaboração de materiais, leituras, dicas aos colegas de outras turmas. O professor, por sua vez, compartilhe com seus colegas o trabalho que está fazendo.
A participação das famílias dos alunos no processo de escolarização é fundamental. Reuniões entre pais e professores, regularmente, é uma estratégia positiva. Outra maneira de aproximar a família é abrindo horários específicos para que os familiares possam observar o trabalho realizado e, até mesmo, participarem de atividades, por exemplo, leitura de contos.
O último aspecto discutido neste capítulo é o da transcrição que significa a reescrita dos textos dos alunos que ainda não escrevem de acordo com as normais convencionais. Não são todos os textos das crianças que deverão ser transcritos, somente aqueles que serão compartilhados. Para a reescrita, se faz necessário observar determinados aspectos: a) Quem transcreve pode ser o próprio docente, um aluno que já usa convencionalmente a escrita ou algum familiar; b) A transcrição deve ser feita ao mesmo tempo em que a criança escreve, pois crianças muito pequenas não conseguem se lembrar, com clareza, o que escreveram; c) a transcrição pode ser na mesma folha em que o aluno redigiu seu texto e com o mesmo material ou escrever em outra folha e anexar à folha do aluno; ou ainda transcrever em uma folha transparente observando a mesma sequência e espaço utilizados pelas crianças.
Reconhece Nemirosvsky que não são em todos os lugares que se pode contar com a participação de todos os que estão, de alguma forma, envolvidos no processo de alfabetização das crianças. “Por isso, todos os professores que adotam esse enfoque em alfabetização devem ser reconhecidos por seu esforço e compromisso profissional” (p.76).
4 Com o que organizar o ensino da linguagem escrita?
Para uma concepção já superada de educação, os materiais didáticos são, em geral, aqueles que se utilizam estritamente no ambiente escolar e não guardam relação nenhuma com os objetos usados na vida social. Criticando essa idéia reduzida, Nemirovsky entende materiais didáticos como os “[...] objetos que são utilizados como apoio para ensinar, na medida em que possibilitam uma contribuição ao processo de aprendizagem” (p.79). Dentre essa variedade a autora destaca e discute três: materiais lúdicos, decorativos e impressos.
A respeito dos materiais lúdicos propõe que os jogos e os objetos utilizados na vida social sejam utilizados no processo pedagógico, nas escolas. Cabe ao professor analisar as propriedades de cada material e avaliar quais aspectos didáticos podem ser trabalhados.
Quanto à decoração que, em geral, é feita pelos docentes, Nemirovsky aconselha usar reproduções das obras de artistas, além de, em vários momentos, a própria produção dos alunos. Assim, o professor, por um lado, ganha tempo para desenvolver atividades relacionadas ao seu trabalho pedagógico e, por outro, possibilita aos alunos o contato com obras consagradas que lhe fornecerão o desenvolvimento mais aguçado da dimensão estética.
Referente aos materiais impressos a crítica da autora se dirige à perda de sentido da leitura e da escrita uma vez que se abstraem dos textos seus usos e funções sociais. Os textos, em sua maioria, são utilizados para responder algumas perguntas de interpretação ou de gramática. Desse modo, “durante a escolaridade, o aluno que utiliza esses materiais não assume a leitura de textos de forma verdadeira, nem sequer quando no livro escolar existem fragmentos de textos de uso social” (p.89). Para superar essa situação é sugerido que se utilizem materiais escritos de uso social: contos, receitas, enciclopédia, obras teatrais, anúncios publicitários, jornais, etc. Além disso, objetivando o aprendizado de que existe uma diversidade lingüística, é importante disponibilizar materiais escritos em diferentes línguas.
Encerrando, são discutidas duas idéias centrais: primeiro, a inserção, na escola, de materiais, livros, textos e práticas de uso social; segundo, “trata-se de fazer da escola uma instituição que represente os níveis mais altos de cultura, da arte, da tecnologia, da ciência, dos valores humanos.” (p.95).
5 Sequências Didáticas
Nemirovisky destaca que o que diferencia um projeto das outras propostas é o papel central que se atribui ao aluno em sua organização. A autora discorda tanto desta atribuição quanto do fato de caber ao aluno a função de estabelecer o projeto que vai ser trabalhado. Ela justifica afirmando que é o professor quem detêm os elementos necessários para definir o que será trabalhado em aula. Ainda que, supostamente, a origem de um projeto tenha sido a sala de aula o que leva à sua organização são a valorização e a relevância que o docente lhe atribui. Para a autora, o mais importante é discutir e analisar sobre o que e quais são os conteúdos de ensino a serem trabalhados. Em princípio, as temáticas sobre as quais os alunos trabalham fora da sala de aula não merecem constituir-se em conteúdos de ensino. O que se deve priorizar são as temáticas socialmente relevantes para sua participação na sociedade.
Nemirovisky alerta para a limitação dos temas caso leve-se em conta somente os assuntos sobre os quais os alunos manifestem interesse. O aluno pode interessar-se por temas que desconhece, dos quais não conceba sequer a existência? Partindo dessa perspectiva, a função do professor não é partir dos interesses dos alunos, mas gerar interesses neles.
Entendendo a seqüência didática como “organização do trabalho em sala de aula, mediante conjuntos de situações didáticas estruturadas e vinculadas entre si por sua coerência interna e sentido próprio, realizada em momentos sucessivos”, Nemirovisky afirma que planejá-la implica analisar seu andamento, fazer trocas, incorporar situações não previstas, modificar seu rumo. Porém, ressalta a autora, ao elaborá-la deve-se saber se a sequência será integradora ou globalizadora de diferentes áreas do conhecimento. Contudo, trata-se de não forçar situações para abarcar diferentes áreas do conhecimento em uma mesma sequência didática. É perfeitamente viável organizar sequências didáticas centradas em conteúdos de uma só área. Por outro lado, há casos nos quais a integração de conteúdos de ensino que correspondem a diferentes áreas do conhecimento pode ser pertinente. Contudo, se o objetivo da integração for promover a aprendizagem de conteúdos de diferentes áreas de conhecimento, é fundamental que as atividades desencadeiem múltiplas, rigorosas e sucessivas situações de análise, de comparação, de exploração, de verificação, de argumentação, acerca dos conteúdos que se quer ensinar. Resumindo, existem três possibilidades: 1) Seqüências didáticas centradas em aprendizagens de uma área do conhecimento. 2) Seqüências didáticas que podem integrar conteúdos de mais de uma área de conhecimento. 3) Seqüências didáticas centradas em determinada área do conhecimento que podem incluir uma fase em que se trabalham conteúdos de outra área do conhecimento.
Uma vez definida a forma e a temática da sequência didática, é imprescindível fazer um determinado recorte, estabelecendo certos limites que constituem o objeto de estudo. O critério básico para determinar o recorte pode ser: uma área de conhecimento, um tema específico ou uma tarefa em grupo. Sob essa perspectiva a autora apresenta nos capítulos 6 a 10 cinco exemplos de sequências didáticas.
6 Personagem Prototípico do Conto
A professora Carla trabalha com alunos de 3 a 4 anos. Seu objetivo foi fazer com que seus alunos avançassem na aprendizagem como bons ouvintes de contos. Para tanto ela partiu de algumas premissas: não permitia interrupções durante a leitura; não agregava explicações; sentavam-se cômoda e relaxadamente; atenuava a iluminação da sala; escolhia versões originais, de boa qualidade, com vocabulário realmente literário, bem estruturado – início, trama central e desenlace; presença de elementos fantásticos; não mostrava as imagens. Isto porque ela acreditava que o objetivo exclusivo da leitura de textos literários é o prazer. Inicialmente parecia. No entanto, ela foi incorporando, gradualmente, hábitos e promovendo mudanças que despertaram o interesse das crianças, além de impor algumas normas.
Quando todos estavam participando satisfatoriamente, Carla elaborou a sequência didática. Detectou o personagem de maior interesse das crianças: as fadas. Organizou a seqüência em três fases: 1ª) Leitura de contos com fadas. Comentários e análises desses personagens; 2ª) Escrita individual de contos nos quais apareçam fadas; 3ª) Edição de um livro de contos de fadas.
As atividades desenvolvidas foram: na primeira fase, leitura, seguindo suas premissas, e elaboração de um cartaz – o quadro das fadas – onde anotavam as características das fadas de cada conto. A segunda fase foi a da escrita dos contos. Como nenhum membro do grupo escrevia de maneira convencional – tinha desde uma escrita indiferenciada até escritas silábicas – a professora sentava-se junto a cada um para realizar a transcrição. Nesta fase a professora promoveu uma reflexão em relação ao tamanho das palavras, organizou um fichário com os nomes dos personagens, promoveu a leitura pelos autores e finalizou com a “reescrita” dos contos. À terceira fase coube a edição, a apresentação e o uso social do livro elaborado. A professora sabia que quanto mais relevante fosse essa fase, maior seria o entusiasmo com a proposta seguinte.
Análise da sequência didática: está centrada na linguagem escrita; o tipo de texto é o conto, com uma fase de trabalho sobre o sistema de numeração. Embora os alunos tivessem participado da elaboração de letreiros e cartazes isso não indica que tenham se constituído em objetos de reflexão e análise. Em relação aos contos, foram quatro as propriedades centrais: modo de leitura, as personagens prototípicas, a estrutura e o suporte.
7 Reunião de Pais
A professora Marta trabalha com uma turma de cinco anos. Seu objetivo foi realizar a primeira reunião com os pais, a fim de informá-los sobre a modalidade de trabalho, trocar pontos de vista, estabelecer algumas formas de intervenção e abordar algum outro tema que ela e os alunos achassem conveniente.
Junto com seus a alunos planejou a reunião. Pediu opiniões sobre o que eles gostariam que fosse contado a seus familiares, tomou nota das propostas dos alunos, e assim delimitou os temas centrais, horário e data da reunião. O passo seguinte foi a elaboração dos convites, a partir de modelos que foram lidos e analisados. O modelo escolhido foi escrito na lousa, após debates e sugestões foi reelaborado e copiado pelos alunos. Nesta ocasião a professora aproveitou para promover uma reflexão sobre tipos de letra.
Agora tinham que organizar a reunião. Decidiram que fariam uma exposição dos trabalhos plásticos realizados pela turma. Depois de rever todos os trabalhos, listaram as técnicas que conheciam, escolheram e revisaram os trabalhos, montaram a exposição, organizaram o espaço, fixaram cartazes explicativos sobre as técnicas plásticas, decoraram o espaço e preparam o lanche que serviriam aos participantes.
Análise da sequência didática: trata-se de uma tarefa complexa realizada pelo grupo. Em relação à linguagem escrita, abordou o texto epistolar, especificamente o convite; em relação às artes plásticas obteve um avanço nas distintas técnicas conhecidas; ainda que tenham feito certos cálculos matemáticos estes não caracterizaram situações didáticas geradoras de avanços; em relação ao texto epistolar foram três as propriedades centrais: modo de leitura, estrutura e léxico.
8 O Fundo do Mar
A professora Lúcia trabalha com uma turma do ensino fundamental. Ao propor a eles um estudo sobre o fundo do mar percebeu que não tinham conhecimentos anteriores e nem curiosidade sobre o tema; porém, ela decidiu prosseguir. Organizou um cartaz com duas colunas – o que sabemos e o que queremos saber - e como não houvesse iniciativa dos alunos, ela mesma começou com algumas anotações. A professora assumiu esse papel porque acreditava que “o papel do professor não pode limitar-se ao de um mero transmissor de informação”, pois uma coisa é ser mero transmissor e outra é negar aos alunos as informações que não têm. Ela cuidou de despertar o interesse da turma que acabou se envolvendo e à medida que coletavam os materiais, surgiam mais perguntas e mais informações que eram agregadas ao quadro inicial.
Quando ambas as listas tinham cerca de dez anotações, Lucia organizou a turma em duplas e trios, cada qual encarregado de verificar uma informação e responder a uma pergunta. Revisaram, selecionaram e distribuíram os materiais que já possuíam. As dúvidas e questões eram levadas para o círculo de discussão comum. Para expor os trabalhos, revisaram e organizaram, também, textos publicitários. Durante a exposição o quadro inicial foi colocado para que todos pudessem agregar informações e perguntas nas colunas.
Análise da sequência didática: quanto à linguagem escrita o tipo de texto trabalhado foi o expositivo, com uma parcial aproximação com texto publicitário; com relação ao tema, destacou-se a existência da vida marinha; em relação ao texto expositivo, foram quatro as propriedades centrais: modo de leitura, relação título/conteúdo como organizadores do texto; relação imagem/texto; e extensão dos textos.
9 Pintores
A professora Carmem trabalha em uma escola rural com alunos de 4 a 9 anos. Embora não tivesse nenhum conhecimento sobre os pintores consagrados, professora resolveu pôr em prática a proposta que fora apresentada em um seminário de formação docente. Considerando que o vínculo afetivo do docente com a temática é uma variável determinante, Carmem começou a buscar e revisar reproduções de obras de arte. Sentindo-se atraída por algumas obras de Pablo Picasso decidiu que trabalharia este pintor com seus alunos. Propôs o tema e durante as semanas seguintes desenvolveram dois tipos de atividades: reunir mais reproduções, além daquelas que ela havia levado; recolher e ler fragmentos de biografias sobre Picasso. Nas atividades de leitura a professora chamou a atenção para a freqüência de verbos e para o tempo verbal empregado nos textos. Trabalhou a estrutura das biografias,os sinais de pontuação, um fichário com o título das obras, reprodução das obras, sistema de medidas e proporção. Foram desenvolvidas diferentes atividades considerando a diferença de idade dos alunos. Finalizaram com uma exposição na qual os quadros pintados pelos alunos foram vendidos e o dinheiro arrecadado doado a uma ONG.
Análise da sequência didática: o tipo de texto trabalhado foi o biográfico; alunos avançaram em aspectos vinculados com a atividade plástica; aprenderam sobre um pintor consagrado; quanto à matemática houve avanços significativos referentes à reflexão sobre proporção e medição; com respeito às atividades de contar os cartões e colocar os preços nas reproduções, ambas foram excessivamente pontuais, sem um o rigor e a consistência necessários para considerá-los como aporte para o conhecimento; em relação ao texto biográfico, foram cinco as propriedades centrais: o suporte, a estrutura, variadas extensões, categorias gramaticais e tempos verbais.
10 Contos Clássicos
A professora Aline trabalha com alunos de 4 e 5 anos. Aproveitando-se do interesse de seus alunos pelos contos clássicos, a professora elaborou uma sequência didática acerca deste tema. Foram realizadas leituras de vários contos; às vezes essas leituras eram interrompidas e as crianças deveriam criar a continuação da história que no dia seguinte era comparada com a versão original. Foram feitas atividades envolvendo a análise dos títulos sem conhecer o conteúdo; leitura e análise do conto, sem conhecer o título; leitura e análise de diferentes versões de um mesmo conto estabelecendo-se quadros comparativos entre eles. Ao final dessas atividades os alunos escreveram o seu próprio conto que também foram lidos e comparados entre eles e com as versões “oficiais”. Trabalharam ainda a biografia dos diferentes autores de um mesmo conto e, no sistema de escrita, a separação das palavras e o uso de letras iniciais maiúsculas.
Análise da sequência didática: o a seqüência se sentou exclusivamente na linguagem escrita, o tipo de texto trabalhado foi o conto clássico; em relação ao conto, foram três as propriedades centrais: modo de leitura, autor e relação imagem/texto.
11 Sobre as Sequências Didáticas Apresentadas
A função dos diferentes tipos de texto é trabalhada nas cinco sequências didáticas, pois cada tipo de texto se lê e se escreve na escola com a mesma função que tem no uso social. No entanto, em certas ocasiões, podem-se complementar com momentos didáticos específicos. Também nas cinco sequências didáticas, propicia-se o avanço dos alunos em relação ao sistema de escrita.
A inclusão das cinco propostas tem por objetivo oferecer um panorama mais amplo para a análise, colocando em evidência as sustentações teóricas dessa proposta de alfabetização. Também objetiva oferecer modelos ao professor que encontra dificuldades para projetar seu trabalho e às vezes tem de escolher propostas já elaboradas para, progressivamente, ir avançando na elaboração de suas próprias sequência didáticas.
A escolha do conto como eixo articulador em duas sequências deve-se a que esse é um tipo de texto muito usado nas salas de aula. O elemento inovador consiste na maneira de aproveitar o conto na tarefa de alfabetização.
Concluindo, afirma Nemirovsky, cabe ao professor indagar sobre as opções com uma autêntica atitude reflexiva e comprometida, pois é no conjunto dessas ações que o trabalho docente torna-se um espaço de crescimento profissional e pessoal.
Maria Angélica Cardoso
Pedagoga, especialista em Formação Docente pela UNIDERP, mestre em Educação pela UFMS, doutoranda em Filosofia e História da Educação pela UNICAMP. Membro do Grupo de Pesquisa HISTEDBR
Luciana Cristina Salvatti Coutinho
Pedagoga pela Faculdade de Educação da Unicamp. Mestranda em Filosofia e História da Educação pela FE/Unicamp. Membro do grupo de estudos e pesquisas HISTEDBR.

 Fonte: http://www.professorefetivo.com.br/resumos/O-Ensino-da-Linguagem-Escrita.html

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