DIALOGANDO SOBRE INTERVENÇÕES INSTITUCIONAIS – Mesa redonda realizada na I JORNADA INTEGRADA ABPp-SP e APTFFamília como sistema à luz da PsicopedagogiaMaria
Luiza Puglisi Munhoz
O nosso mundo está mudando e se transformando cada vez mais rápido, mas mesmo assim, face a essas mudanças, o homem moderno ainda se mantém fiel a um conjunto de valores que pertence a uma sociedade em que vive. E, nesse contexto, a família ao desempenhar sua função de elo de ligação entre a sociedade e seus membros, torna-se importante e necessária. A partir dessas mudanças, as características básicas das comunicações, das ações, dos ideais e dos estudos pertinentes passam a ser mais complexos em todos os campos de conhecimento, tornando-se visível a necessidade de uma abordagem global, que dê conta da complexidade das relações, para a compreensão das enfermidades do indivíduo e da família: é quando surge o pensamento sistêmico nos estudos dos sistemas humanos.
A família como um sistema dinâmico de interações, parte do sistema social, é constituída por subsistemas: membros que agem e interagem numa estrutura funcional ao se inserir nos outros sistemas humanos. São compostos pelos elementos da própria família, como: esposo/esposa, denominado de subsistema conjugal; o casal de pais, como subsistema parental e o grupo de irmãos, como subsistema fraternal. Esses subsistemas ao se articularem e interagirem, de maneira flexível e adaptável, desempenham as funções de um sistema que evolui através das etapas dos ciclos vitais: individual e familiar.
Sendo o indivíduo e a família dois sistemas em constante interação, será no contexto familiar que se darão as primeiras experiências de aprendizagem, demonstrando que muito mais do que o conteúdo a ser ensinado, está o modelo relacional que se imprime sobre a subjetividade de quem aprende. Isto confirma que o padrão de funcionamento interacional em um sistema familiar torna-se o aspecto fundamental para compreender como se dá a circulação do conhecimento e acesso à aprendizagem naquele dado contexto, visto que cada membro da família tem uma forma de operar ao construir o próprio conhecimento, que consiste na maneira pessoal de se aproximar do novo, do desconhecido para agregá-lo a seu saber. Processo esse, denominado por Fernandez de “ modalidade de aprendizagem” (1990).
Para a autora modalidade de aprendizagem é o resultado de uma história das experiências de aprendizagem do indivíduo em interação com o grupo familiar, refletindo, não somente, como ocorreram as experiências, mas também, como foram interpretadas por ele próprio e pelos seus pais. Isto porque a aprendizagem acontecerá justamente na produção das diferenças dos pais e dos filhos, ou seja, entre quem ensina e quem aprende. Cada uma das partes vai interpretar e passar conhecimentos de acordo com sua modalidade de aprendizagem, mantendo como referencial o significado que o aprender tem para o grupo familiar.
Partindo do enfoque de que a aprendizagem no contexto familiar opera de acordo com o modelo sistêmico, onde seus membros desempenham funções e criam expectativas mútuas, há necessidade de se estabelecer fronteiras nítidas entre os subsistemas para que a modalidade de aprendizagem ocorra naturalmente. Por funcionar como um sistema, como uma totalidade, a família tem um papel importante no desenvolvimento da autoria de pensamento de seus membros, ao oferecer a possibilidade de se individualizarem, diferenciando-se do grupo familiar. Cada subsistema evolui de maneira funcional ao se diferenciar uns dos outros em suas interrelações, propiciando a formação do ”eu sou” diferenciado, que se constrói na diversificação de papéis. A diferenciação se dá quando cada elemento de um sistema torna-se capaz de se posicionar com pensamentos e idéias próprias, como um ser pensante, que indaga, nega, questiona, faz as próprias escolhas e por elas se responsabiliza. Da mesma forma, o nível de diferenciação dos pais influencia os filhos, mantendo a possibilidade de continuidade de desenvolvimento no processo evolutivo. Quando é dado a cada membro o poder de escolha, de decisão e oportunidade de crescimento, então o pensar se torna mais crítico e criativo (Munhoz, 2001).
Sabemos que as famílias podem ser facilitadoras ou inibidoras desse processo, portanto compreendê-la em suas interações e significados sobre o que consiste a autoria de pensamento na formação do sujeito autor, como poder diferenciar-se de suas famílias de origem acaba sendo um ponto crucial nos estudos sobre a família, no desempenho de sua função educativa.Visão psicopedagógica sistêmicaAo situarmos a emergência e a evolução da Psicopedagogia no quadro geral das ciências podemos estabelecer com mais clareza as mudanças de paradigmas, posicionando-a numa nova forma de saber.
A ciência tradicional se apóia em uma metodologia de verificação objetiva do que pode ser controlado e manipulado, na busca de conhecer um só aspecto do fenômeno pesquisado, inspira-se num mecanismo causal e seqüencial de causa e efeito de um pensamento mecanisista. Subjaz a concepção de mundo de relações permanentes e imutáveis, regidas por regras simples, inspira-se no paradigma da simplificação. O que nos parece fundamental é a relação estabelecida entre o sujeito/objeto, caracterizada como posições distintas e independentes, na qual o pesquisador se aproxima do fenômeno a pesquisar de forma neutra, controlando as variáveis, a fim de manipulá-las, em busca da objetividade, reduzindo o diverso, o diferente a uma única dimensão.Sendo a Psicopedagogia um todo único, com uma dinâmica específica, fruto da integração de disciplinas que abordam os fenômenos humanos em suas interrelações, não se ajusta a essa concepção de mundo e, por si só, escapa às limitações impostas pelos objetivos, leis e paradigmas da simplificação, portanto, evolui para uma concepção mais ampla, definida, atualmente, como ciência contemporânea, que acompanha o mundo em sua trajetória: da estabilidade para a instabilidade; do simples para o complexo; do mundo estável para o mundo do processo, enquanto ocorrem os comportamentos humanos no seu percurso evolutivo de aprendizagem, com presença constante das interações e interligações dos eventos. E será nesse momento histórico que a Psicopedagogia procura romper com a ligação ensino-aprendizagem simplesmente, ao considerar tanto o aprender como processo, quanto o processo de construção de conhecimento, como ações conjuntas que não se detém somente ao ensinar.
É possível ensinar e aprender sem relacionar-se, sem influenciar e ser influenciado por alguém? E em todo o processo de aprendizagem não estão implicados os quatro níveis: o organismo, o corpo, a inteligência e o desejo? Não seria já um sistema interagindo com seus elementos?
Em resposta: consideramos a aprendizagem como a “ensinagem” ações que perpassam por muitas questões de ordem objetiva e subjetiva, que se articulam com o significado do que se quer conhecer, conectado aos vínculos internos e externos na relação com o conhecimento e a Psicopedagogia, área de estudo que se encontra entre os espaços existentes nessas relações, dá sentido às interações dessa rede complexa, pois o indivíduo não aprende sozinho e como conseqüência: os ensinantes, a família e a escola também aprendem juntos. Isso confirma que o conhecimento não é único e finito, ele se amplia, se modifica em suas interações familiares, escolares e socioculturais.
Referências Bibliográficas:
ALMEIDA, M. C. & CARVALHO, E.A (orgs.) Educação e complexidade, os sete saber e outros ensaios. São Paulo: Cortez Editora, 2002
FERNANDEZ, A. A inteligência aprisionada, Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
MUNHOZ,M.L.P. Casamento: ruptura ou continuidade dos modelos familiares?, 2a. ed. São Paulo: Expressão e Arte editora, 2001
_____________. Bases teóricas da visão sistêmica, in Métodos e técnicas de pesquisa em psicopedagogia,São Paulo: Mennon edições científicas, 2002.
POLITY, E. Dificuldade de Ensinagem que história é essa...?, São Paulo: Vetor editora, 2002.
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