A formação inicial de professores, que se dá no nível do ensino superior, precisa, necessariamente dialogar mais de perto com a educação básica. Esta é uma das propostas do professor Antonio Ibañez Ruiz, membro do CNE e um dos autores do relatório Escassez de professores no Ensino Médio: propostas estruturais e emergenciais, para superar os impasses existentes atualmente. "Quando o recém-formado chega à sala de aula, ele se depara com uma realidade muito diferente de tudo o que aprendeu na faculdade. Ele tem de se relacionar com os pais dos alunos, há o problema da violência na escola, além das questões relacionadas à diversidade socioeconômica da clientela. Nenhum curso prepara o aluno para enfrentar isso tudo", analisa Ruiz. Nesse sentido, ele defende a criação de um período de transição entre a graduação e o ingresso definitivo no mercado de trabalho, em que o recém-formado passa pela experiência de atuar em sala de aula sob orientação de um docente na ativa. Esse trabalho deve também ser acompanhado pela instituição na qual o aluno estudou, reforçando a orientação e avaliação do profissional. "Não são estágios, porque eles são relegados a um plano secundário. A idéia é dar a chance de o recém-formado complementar sua formação com uma vivência da realidade da sala de aula."
Em paralelo a essa proposta, tramita no Congresso Nacional um projeto que propõe a criação de uma residência educacional, com o objetivo de assegurar aos graduandos em cursos de formação de professores uma complementação, de ordem prática, da formação recebida na universidade. Em linhas gerais, a proposta do senador Marco Maciel (DEM-PE) é que os estudantes passem por 800 horas em sala de aula, recebendo bolsas de estudo, adquirindo experiência e aprimorando sua formação por meio do contato com a realidade da sala de aula. O público-alvo são os professores que vão atuar na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental. A expectativa é que a residência educacional melhore a formação do professor e que isso acarrete a melhoria da qualidade da aprendizagem dos alunos.
Uma experiência nessa linha que é vista com bons olhos é o programa Ler e Escrever, do governo do Estado de São Paulo, que prevê a contratação de professores auxiliares para atuar juntamente com os titulares das salas de aula na 1ª série do ensino fundamental. Os auxiliares são selecionados entre estudantes de licenciatura de instituições de ensino superior conveniadas com a secretaria estadual de Educação. Essa iniciativa, na opinião de Carbonari Netto, tem grande mérito e pode funcionar como um estímulo para o aluno de licenciatura permanecer no curso. "Com auxílios financeiros adicionais, é possível que esses alunos terminem seus cursos", aponta o vice-presidente da Abmes.
Paralelamente a esse tipo de ação, existe um consenso quanto à necessidade de se implantar uma política nacional de formação de professores. O relatório do CNE defende a criação de centros de formação inicial e continuada em todos os Estados, regiões metropolitanas e em localidades consideradas estratégicas, além do estabelecimento de metas a serem cumpridas por Estados e municípios. "Não é suficiente oferecer cursos. É preciso haver uma cooperação entre todos os envolvidos, dos munícipios ao governo federal, e, mais do que isso, é fundamental ter contato com a escolas para captar suas necessidades", pontua o professor Ruiz, enfatizando novamente a necessidade de que a formação de professores se mantenha em sintonia com a realidade.
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Ibañez Ruiz, do CNE: recém-formado deve passar por período de transição |
A Anfope defende a criação de um sistema nacional de formação de professores que defina, com clareza, o lócus da formação, a remuneração, a carreira, a progressão e o aprimoramento profissional dos educadores, conforme explica a presidente da entidade, Helena Freitas. "Sabemos que há duas condições perversas que degradam uma profissão: a má qualidade da formação e a baixa remuneração. Em nosso país essa combinação tem degradado há décadas o exercício da profissão docente", diz ela. Assim sendo, continua a presidente da Anfope, atuar nestes dois pólos, definindo uma política de formação, é uma exigência que está posta para o poder público em diferentes esferas - municipal, estadual e federal. Dessa forma, o Ministério da Educação tem um papel central, na medida em que atua como instância indutora e mobilizadora.
Nesse contexto, as instituições públicas, principalmente as federais, têm um papel relevante a desempenhar, somando-se à rede privada. Essas instituições, aponta o relatório do CNE, devem estimular e priorizar a formação inicial e continuada de professores, desenvolvendo ações e projetos para suprir as principais carências do sistema educacional. Além disso, complementa o conselheiro Ruiz, é importante ampliar a oferta de cursos de licenciatura no período noturno para atender os segmentos da população que não têm outra oportunidade de estudar. "Isso sempre foi uma dificuldade, pois as universidades são autônomas e o governo federal nunca se sentiu, de fato, responsável pela definição dos rumos da formação de professores no Brasil", assinala Ruiz. Contudo, afirma ele, o Ministério pode ajudar nesse sentido, além de ter a responsabilidade legal pela coordenação política, conforme estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
Na visão de Ronaldo Mota, titular da Secretaria de Ensino Superior (Sesu), o Ministério está cumprindo este papel. "As ações sobre formação de professores estão sendo realizadas num ritmo que há muito tempo o Brasil não via ou, talvez, nunca tenha visto", afirma ele, ressaltando o início das operações da Universidade Aberta do Brasil (UAB), que começa a funcionar este ano com 60 mil alunos e priorizando, justamente, a oferta de cursos de formação docent
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