quarta-feira, 11 de março de 2015

As falhas, incoerências e falácias do arcabouço intelectual de Karl Marx por Eugen von Böhm-Bawerk,


Marx-Fussnagel.jpgO principal trabalho teórico de Marx é sua grande obra em três volumes, sobre o capital. Os fundamentos de sua teoria da exploração estão expostos no primeiro destes volumes, o único a ser publicado em vida do autor em 1867.  O segundo, editado postumamente por Engels, em 1885, está em total harmonia com o primeiro, quanto ao conteúdo. Menos harmônico é sabidamente o terceiro volume, publicado novamente após um intervalo de vários anos, em 1894. Muitas pessoas, entre elas o autor destas linhas, acreditam que o conteúdo do terceiro volume seja incompatível com o do primeiro, e vice-versa. Mas, como o próprio Marx não admitiu isso e, ao contrário, também no terceiro volume exigiu que se considerassem totalmente válidas as doutrinas do primeiro, a crítica deve considerar as teses expostas nesse primeiro livro expressão da verdadeira e permanente opinião de Marx. Mas é igualmente válido — e necessário — abordar no momento adequado as doutrinas do terceiro volume, como ilustração e crítica.
A teoria de Marx sobre o valor
Marx parte do principio de que o valor de toda mercadoria depende unicamente da quantidade de trabalho empregada em sua produção.  Marx coloca este princípio no ápice de sua teoria, dedicando-lhe uma explicação extensa e fundamentada.
O campo de pesquisa que Marx se propõe a examinar para entender a origem do valor dos bens fica limitado originalmente às mercadorias, o que, para Marx, não significa todos os bens econômicos, mas apenas os produtos de trabalho criados para o mercado.  Ele começa com uma análise da mercadoria.  A mercadoria é, por um lado, uma coisa útil cujas qualidades satisfazem algum tipo de necessidade humana, um valor de uso; por outro, constitui o suporte material do valor de troca.  A análise passa agora para este último.  
O valor de troca aparece de imediato como a relação quantitativa, a proporção na qual valores de uso de um tipo se trocam com valores de uso de outro tipo, relação essa que muda constantemente, conforme tempo e lugar.
Portanto, parece ser algo casual. Mas nessa troca deveria haver algo de permanente, que Marx trata de pesquisar. E faz isso na sua conhecida maneira dialética:
Tomemos duas mercadorias, por exemplo, trigo e ferro. Seja qual for a sua relação de troca, pode-se representá-la sempre numa equação segundo a qual uma quantidade dada de trigo é igualada a uma quantidade de ferro, p. ex., um moio de trigo x quintais de ferro. O que significa essa equação? Que existe algo de comum, do mesmo tamanho, em duas coisas diferentes, ou seja, em um moio de trigo e x quintais de ferro. Portanto, as duas coisas se equiparam a uma terceira, que em si não é nem uma nem outra. Cada uma das duas, portanto, na medida em que tem valor de troca, deve ser reduzível a essa terceira.
Dialética do valor em Marx
Esse elemento comum não pode ser uma característica métrica, física, química, ou outra característica natural das mercadorias. Suas características corporais, aliás, só entram em consideração na medida em que as tornam úteis, e são, portanto, valores de uso. Mas, por outro lado, a relação de troca das mercadorias aparentemente se caracteriza por se abstrair dos valores de uso dessas mercadorias. Segundo ela, o valor de uso vale tanto quanto qualquer outro, desde que apareça na proporção adequada. Ou, como diz o velho Barbon: "... Um tipo de mercadoria é tão bom quanto outro, quando seu valor de troca for igual. Não existe distinção entre coisas do mesmo valor de troca.' Como valores de uso, as mercadorias são principalmente de qualidades diferentes, como valores de troca só podem ser de quantidades diferentes e, portanto, não contêm um átomo sequer de valor de uso.
Abstraindo o valor de uso das mercadorias, elas guardam ainda uma característica, a de serem produtos de trabalho. No entanto, também o produto de trabalho já se transformou em nossas mãos. Se abstrairmos o seu valor de uso, também estaremos abstraindo os elementos e formas corporais que o tornam valor de uso. Não se trata mais de mesa, ou casa, ou fio, ou outra coisa útil. Todas as suas características sensoriais estão apagadas. Ele também já não é o produto da marcenaria, ou da construção, ou da tecelagem, ou de qualquer trabalho produtivo. Com o caráter utilitário dos produtos de trabalho, desaparece o caráter utilitário dos trabalhos neles efetuados, e somem também as diversas formas concretas desses trabalhos. Eles já não se distinguem entre si [p.283]: reduziram-se todos ao mesmo trabalho humano, trabalho humano abstrato.
Consideremos agora o que restou dos produtos de trabalho. Nada resta deles senão aquela mesma objetualidade espectral, mera gelatina de trabalho humano indistinto, ou seja, o gasto de forças de trabalho humanas sem consideração pela forma desse dispêndio. Essas coisas apenas nos dizem que na sua produção se gastou força de trabalho humano, se acumulou trabalho humano. Como cristais dessa substancia social comum, eles são valores.
Assim se define e se determine o conceito de valor.  Segundo a teoria dialética, ele não é idêntico ao valor de troca, mas relaciona-se com ele de maneira íntima e inseparável: ele é uma espécie de destilado conceitual do valor de troca. Para usar as palavras do próprio Marx, ele é "a parte comum que aparece na relação de troca ou valor de troca das mercadorias".  O reverso é igualmente válido: "o valor de troca é a expressão necessária ou a manifestação do valor".
O "tempo de trabalho socialmente necessário" de Marx
Marx passa da determinação do conceito de valor para a exposição de sua medida e grandeza.  Como o trabalho é a substância do valor, consequentemente a grandeza do valor de todos os bens se mede pela quantidade de trabalho neles contido, ou seja, pelo tempo de trabalho.  Mas não aquele tempo de trabalho individual, que aquele indivíduos que produziu o bem casualmente precisou gastar, mas o "tempo de trabalho necessário para produzir um valor de uso, nas condições sociais normais de produção disponíveis, e com o grau de habilidade e intensidade do trabalho possíveis nessa sociedade".
Só a quantidade de trabalho socialmente necessário ou o tempo de trabalho socialmente necessário para produzir um valor de uso é que determina o seu valor. A mercadoria isolada vale aqui como exemplo médio da sua espécie. Mercadorias contendo igual quantidade de trabalho, ou que podem ser produzidas no mesmo tempo de trabalho, têm por isso o mesmo valor. O valor de uma mercadoria relaciona-se com o valor de outra mercadoria, da mesma forma que o tempo de trabalho necessário para a produção de uma delas se relaciona com o tempo de trabalho necessário para a produção da outra. Como valores, todas as mercadorias são apenas medidas de tempo de trabalho cristalizado.
A "lei do valor" de Marx
De tudo isso, deduz-se o conteúdo da grande "lei de valor", que é "imanente à troca de mercadorias" e que domina as condições de troca.  Essa lei significa — e só pode significar — que as mercadorias se trocam entre si segundo as condições de trabalho médio, socialmente necessário, incorporado nelas.  Há outras formas de expressão da mesma lei: nas palavras de Marx, as mercadorias "se trocam entre si conforme seus valores" ou "equivalente se troca com equivalente".
É verdade que, em casos isolados, segundo oscilações momentâneas de oferta e procura, também aparecem preços que estão acima ou abaixo do valor.  Só que essas "constantes oscilações dos preços de mercado (...) se compensam, se equilibram mutuamente e se reduzem ao preço médio, que é sua regra interna".  Porém, no longo prazo, "nas relações de troca casuais e sempre variáveis", "o tempo de trabalho socialmente necessário acaba sempre se impondo à força, como lei natural imperante".
Marx considera essa lei como sendo a "eterna lei de troca de mercadorias", como "racional", como "a lei natural do equilíbrio".  Os casos eventuais em que mercadorias são trocadas a preços que se desviam do seu valor são considerados "casuais" em relação à regra, e os próprios desvios devem ser vistos como "infração da lei de troca de mercadorias".
A "mais-valia" de Marx
Sobre essa base da teoria do valor, Marx ergue a segunda parte de sua doutrina, a sua famosa doutrina da mais-valia.  Ele examina a origem dos ganhos extraídos pelos capitalistas dos seus capitais.  Os capitalistas tomam determinada soma em dinheiro, transformam-na em mercadorias, e, por meio da venda, transformam as mercadorias em mais dinheiro — com ou sem um processo intermediário de produção.  De onde vem esse incremento, esse excedente da soma de dinheiro obtida em relação à soma originalmente aplicada, ou, como diz Marx, essa mais-valia"?
Marx começa limitando as condições do problema, na sua peculiar maneira de exclusão dialética.  Primeiro, ele explica que a mais-valia não pode vir do fato de que o capitalista, como comprador, compra as mercadorias regularmente abaixo do seu valor e, como vendedor, regularmente as vende acima do seu valor.  Portanto, o problema é o seguinte: "Nosso ( ... ) dono do dinheiro tem de comprar as mercadorias pelo seu valor, e vendê-las pelo seu valor, mas, mesmo assim, no fim do processo, tem de extrair delas um valor mais alto do que o que nelas aplicou. . .  Essas são as condições do problema. Hic Rhodus, hic salta!" [Aqui é Rodes, então salte aqui!" (N. do T.)]
Marx encontra a solução dizendo que existe uma mercadoria cujo valor de uso tem a singular faculdade de ser uma fonte de valor de troca.  Essa mercadoria é a 'capacidade de trabalho', ou seja, a força de trabalho.  Ela é posta à venda no mercado sob dupla condição: a primeira, de que o trabalhador seja pessoalmente livre — caso contrário não seria a força de trabalho o que ele estaria vendendo, mas ele próprio, sua pessoa, como escravo; e a segunda, de que o trabalhador seja destituído "de todas as coisas necessárias para a realização de sua força de trabalho", pois, se delas dispusesse, ele preferiria produzir por conta própria, pondo à venda seus produtos, em vez de sua força de trabalho.  
Pela negociação com essa mercadoria, o capitalista obtém a mais-valia. O processo se dá da seguinte forma:
O valor da mercadoria "força de trabalho" depende, como o de qualquer outra mercadoria, do tempo de trabalho necessário para sua produção, o que, nesse caso, significa que depende do tempo de trabalho necessário para produzir todos os alimentos que são indispensáveis à subsistência do trabalhador.  Se, por exemplo, para os alimentos necessários para um dia for preciso um tempo de trabalho de seis horas, e se esse tempo de trabalho corporificar três moedas de ouro, a força de trabalho de um dia poderia ser comprada por três moedas de ouro. Caso o capitalista tenha efetuado essa compra, o valor de uso da força de trabalho lhe pertence, e ele a concretiza fazendo o trabalhador trabalhar para ele.  Se o fizesse trabalhar apenas as horas diárias corporificadas na força de trabalho pelas quais ele teve de pagar quando comprou essa força de trabalho (seis horas), não existiria a mais-valia.
Ou seja, as seis horas de trabalho não podem atribuir ao produto em que elas se corporificam mais do que três moedas, uma vez que foi isso que o capitalista pagou como salário.  Contudo, os capitalistas não agem dessa maneira.  Mesmo que tenham comprado a força de trabalho por um preço que corresponde só a seis horas de trabalho, fazem o trabalhador trabalhar o dia todo.  Então, no produto criado durante esse dia, se corporificam mais horas de trabalho do que as que o capitalista pagou, o que faz o produto ter valor mais elevado do que o salário pago. A diferença é a "mais-valia", que fica para o capitalista.
Tomemos um exemplo: suponhamos que um trabalhador possa tecer em seis horas cinco quilos de algodão em fio, com o valor de três moedas.  Suponhamos, também, que esse algodão tenha custado vinte horas de trabalho para ser produzido e que, por isso, tem um valor de dez moedas; suponhamos, ainda, que o capitalista tenha despendido, por meio de sua máquina de tecer utilizada para estas seis horas de tecelagem, o correspondente a quatro horas de trabalho, que representam um valor de duas moedas. Assim, o valor total dos meios de produção consumidos na tecelagem (algodão + máquina de tecer) equivalerá a doze moedas, correspondentes a vinte e quatro horas de trabalho.  Se acrescentarmos a isso as seis horas do trabalho de tecelagem, o tecido pronto será pois, no total, produto de trinta horas de trabalho, e terá, por isso, valor de quinze moedas.  Se o capitalista deixar o trabalhador trabalhar apenas seis horas por dia, a produção do fio vai custar-lhe 15 moedas: 10 pelo algodão, 2 pelo gasto dos instrumentos, 3 em salário.  Não existe mais-valia.
Muito diferente seriam as circunstâncias se este mesmo capitalista fizesse o trabalhador cumprir 12 horas diárias. Nestas 12 horas, o trabalhador processaria 10 quilos de algodão, nos quais já teriam sido corporificadas, anteriormente, 40 horas de trabalho, com um valor de 20 moedas.  Os instrumentos teriam consumido o produto de 8 horas de trabalho, no valor de 4 moedas, mas o trabalhador acrescentaria ao material bruto um dia de 12 horas de trabalho, ou seja, faria surgir um valor adicional de 6 moedas.  As despesas do capitalista — 20 moedas pelo algodão, 4 moedas pelo gasto dos instrumentos, e 3 pelo salário — somariam apenas 27 moedas.  Iria, então, sobrar uma "mais-valia" de 3 moedas.
Portanto, para Marx, a mais-valia é uma consequência do fato de o capitalista fazer o trabalhador trabalhar para ele sem pagamento durante uma parte do dia.  O dia de trabalho se divide, assim, em duas partes: na primeira, o "tempo de trabalho necessário", o trabalhador produz seu próprio sustento, ou o valor deste; por essa parte do trabalho, ele recebe o equivalente em forma de salário.  Durante a segunda parte, o "superávit em tempo de trabalho", ele é "explorado", e produz a "mais-valia", sem receber qualquer equivalente por ela.  
Portanto, o capital não é apenas controle sobre o trabalho, como diz Adam Smith.  É essencialmente controle sobre o trabalho não-pago.  Toda a mais-valia, seja qual for a forma em que vá se cristalizar mais tarde — lucro, juro, renda etc. — é, substancialmente, materialização de trabalho não pago.  O segredo da autovalorização do capital reside no controle que exerce sobre determinada quantidade de trabalho alheio não pago.
Marx escolheu um método de análise defeituoso
Alguém que busque uma verdadeira fundamentação da tese em questão poderá encontrá-la por meio de dois caminhos naturais: o empírico e o psicológico.  O primeiro caminho nos leva a simplesmente examinar as condições de troca entre mercadorias, procurando ver se nelas se espelha uma harmonia empírica entre valor de troca e gasto de trabalho.  O outro — com uma mistura de indução e dedução muito usada em nossa ciência — nos leva a analisar os motivos psicológicos que norteiam as pessoas nas trocas e na determinação de preços, ou em sua participação na produção.  Da natureza dessas condições de troca poderíamos tirar conclusões sobre o comportamento típico das pessoas.  Assim, descobriríamos, também, uma relação entre preços regularmente pedidos e aceitos, de um lado, e a quantidade de trabalho necessária para produzir mercadorias de outro.  Mas Marx não adotou nenhum desses dois métodos naturais de investigação.  É muito interessante constatar, em seu terceiro volume, que ele próprio sabia muito bem que nem a comprovação dos fatos nem a análise dos impulsos psicológicos que agem na "concorrência" teriam bom resultado para a comprovação de sua tese.
Marx opta por um terceiro caminho de comprovação, aliás, um caminho bastante singular para esse tipo de assunto: a prova puramente lógica, uma dedução dialética tirada da essência da troca.
Marx já havia encontrado no velho Aristóteles que "a troca não pode existir sem igualdade, e a igualdade não pode existir sem a comensurabilidade".  Marx adota esse pensamento.  Ele imagina a troca de duas mercadorias na forma de uma equação, deduz que nas duas coisas trocadas — portanto igualadas — tem de existir "algo comum da mesma grandeza", e conclui propondo-se a descobrir o que é essa coisa em comum, à qual as coisas equiparadas podem ser reduzidas como valores de troca.
Fatos que antecedem uma troca devem evidenciar antes desigualdade do que igualdade
Gostaria de intercalar aqui um comentário.  Mesmo a primeira pressuposição — a de que na troca de duas coisas existe uma "igualdade" das duas, igualdade essa que se manifesta, o que, afinal, não significa grande coisa — me parece um pensamento muito pouco moderno e também muito irrealista, ou, para ser bem claro, muito precário. Onde reinam igualdade e equilíbrio perfeitos não costuma surgir qualquer mudança em relação ao estado anterior.  Por isso, quando no caso da troca tudo termina com as mercadorias trocando de dono, é sinal de que esteve em jogo alguma desigualdade ou preponderância que forçou a alteração.
Exatamente como as novas ligações químicas que surgem a partir da aproximação entre elementos de corpos: muitas vezes o "parentesco" químico entre os elementos do corpo estranho aproximado não é forte, mas é mais forte do que o "parentesco" existente entre os elementos da composição anterior.  De fato, a moderna ciência econômica é unânime em dizer que a antiga visão escolástico-teológica da "equivalência" de valores que se trocam é incorreta.  Mas não darei maior importância a esse assunto, e volto-me agora ao exame crítico daquelas operações lógicas e metódicas através das quais o trabalho termina por surgir como aquela coisa em "comum" à qual as coisas equiparadas se poderiam reduzir.
Método intelectual errôneo de Marx
Para a sua busca desse algo em "comum" que caracteriza o valor de troca, Marx procede da seguinte maneira: coteja as várias características dos objetos equiparados na troca e, depois, pelo método de eliminação das diferenças, exclui todas as que não passam nessa prova, até restar, por fim, uma única característica, a de ser produto de trabalho.  Conclui, então, que seja esta a característica comum procurada.
É um procedimento estranho, mas não condenável.  É estranho que, em vez de testar a característica de modo positivo — o que teria levado a um dos dois métodos antes comentados, coisa que Marx evitava —, ele procure convencer-se, pelo processo negativo, de que a qualidade buscada é exatamente aquela, pois nenhuma outra é a que ele procura, e a que ele procura tem de existir.  Esse método pode levar à meta desejada quando é empregado com a necessária cautela e integridade, ou seja, quando se tem, escrupulosamente, o cuidado necessário para que entre realmente, nessa peneira lógica, tudo o que nela deve entrar para que depois não se cometa engano em relação a qualquer elemento que porventura fique excluído da peneira.
Mas como procede Marx?
Desde o começo, ele só coloca na peneira aquelas coisas trocáveis que têm a característica que ele finalmente deseja extrair como sendo a "característica em comum", deixando de fora todas as outras que não a têm.  Faz isso como alguém que, desejando ardentemente tirar da urna uma bola branca, por precaução coloca na urna apenas bolas brancas.  Ele limita o campo da sua busca da substância do valor de troca às "mercadorias".  Esse conceito, sem ser cuidadosamente definido, é tomado como mais limitado do que o de "bens" e se limita a produtos de trabalho, em oposição a bens naturais. Consequentemente, fica óbvio que, se a troca realmente significa uma equiparação que pressupõe a existência de algo "comum da mesma grandeza", esse "algo comum" deve ser procurado e encontrado em todas as espécies de bens trocáveis: não só nos produtos de trabalho, mas também nos dons da natureza, como terra, madeira no tronco, energia hidráulica, minas de carvão, pedreiras, jazidas de petróleo, águas minerais, minas de ouro etc.[1]
Excluir, na busca do algo "comum" que há na base do valor de troca, aqueles bens trocáveis que não sejam bens de trabalho é, nessas circunstâncias, um pecado mortal metodológico.  É como se um físico que quisesse pesquisar o motivo de todos os corpos terem uma característica comum, como o peso, por exemplo, selecionasse um só grupo de corpos, talvez o dos corpos transparentes, e, a seguir, cotejasse todas as características comuns aos corpos transparentes, terminando por demonstrar que nenhuma das características — a não ser a transparência — pode ser causa de peso, e proclamasse, por fim, que, portanto, a transparência tem de ser a causa do peso.
A exclusão dos dons da natureza (que certamente jamais teria ocorrido a Aristóteles, pai da ideia da equiparação na troca) não pode ser justificada, principalmente porque muitos dons naturais, como o solo, são dos mais importantes objetos de fortuna e comércio. Por outro lado, não se pode aceitar a afirmação de que, em relação aos dons naturais, os valores de troca são sempre casuais e arbitrários: não só existem preços eventuais para produtos de trabalho, como também, muitas vezes, os preços de bens naturais revelam relações nítidas com critérios ou motivos palpáveis.  É conhecido que o preço de compra de terras constitui um múltiplo da sua renda segundo a porcentagem de juro vigente.  É também certo que, se a madeira no tronco ou o carvão na mina obtêm um preço diferente, isso decorre da variação de localização ou de problemas de transporte e não do mero acaso.
Marx se exime de justificar expressamente o fato de haver excluído do exame anterior parte dos bens trocáveis. Como tantas vezes, também aqui sabe deslizar sobre partes espinhosas de seu raciocínio com uma escorregadia habilidade dialética: ele evita que seus leitores percebam que seu conceito de "mercadoria" é mais estreito do que o de "coisa trocável".  Para a futura limitação no exame das mercadorias, ele prepara com incrível habilidade um ponto de contato natural, através de uma frase comum, aparentemente inofensiva, posta no começo do seu livro: "A riqueza das sociedades em que reina a produção capitalista aparece como uma monstruosa coleção de mercadorias."  Essa afirmação é totalmente falsa se entendermos o termo "mercadoria" no sentido de produto de trabalho, que o próprio Marx lhe confere mais tarde.  Pois os bens da natureza, incluindo a terra, são parte importante e em nada diferente da riqueza nacional.  Mas o leitor desprevenido facilmente passa por essas inexatidões, porque não sabe que mais tarde Marx usará a expressão "mercadoria" num sentido muito mais restrito.
Aliás, esse sentido também não fica claro no que se segue a essa frase.  Ao contrário, nos primeiros parágrafos do primeiro capitulo fala-se alternadamente de "coisa", de "valor de uso", de "bem" e de "mercadoria", sem que seja traçada uma distinção nítida entre estes termos. "
A utilidade de uma coisa", escreve ele na p. 10, "faz dela um valor de uso". "A mercadoria. . . é um valor de uso ou bem". Na p. 11, lemos: "o valor de troca aparece... como relação quantitativa... na qual valores de uso de uma espécie se trocam por valorem de uso de outra."
Note-se que aqui se considera primordialmente no fenômeno do valor de troca também a equação 'valor de uso = bem'.  E com a frase "examinemos a coisa mais de perto", naturalmente inadequada para anunciar o salto para outro terreno, mais estreito, de análise, Marx prossegue:  "Uma só mercadoria, um 'moio' de trigo, troca-se nas mais diversas proporções por outros artigos."  E ainda: "tomemos mais duas mercadorias" etc.  Aliás, nesse mesmo parágrafo ele volta até com a expressão "coisas", e logo num trecho muito importante, em que diz que "algo comum da mesma grandeza existe em duas coisas diferentes" (que são equiparadas na troca).
A falácia de Marx consiste em uma seleção tendenciosa de evidências
No entanto, na p. 12, Marx prossegue na sua busca do "algo comum" já agora apenas para o "valor de troca das mercadorias", sem chamar a atenção, com uma palavra que seja, para o fato de que isso estreitará o campo de pesquisa, direcionando-o para apenas uma parcela das coisas trocáveis. 
Logo na página seguinte (p. 13), ele abandona de novo essa limitação, e a conclusão, a que há pouco havia chegado para o campo mais restrito das mercadorias, passa a ser aplicada ao círculo mais amplo dos valores de uso dos bens. "Um valor de uso ou bem, portanto, só tem um valor, na medida em que o trabalho humano abstrato se materializa ou se objetiva nele!"
Se, no trecho decisivo, Marx não houvesse limitado sua pesquisa aos produtos de trabalho, mas tivesse também procurado o "algo comum" entre os bens naturais trocáveis, ficaria patente que o trabalho não pode ser o elemento comum.  Se Marx houvesse estabelecido essa limitação de maneira clara e expressa, tanto ele quanto seus leitores infalivelmente teriam tropeçado nesse grosseiro erro metodológico.  Teriam sorrido desse ingênuo artifício, através do qual se "destila", como característica comum, o fato de "ser produto de trabalho", pesquisando num campo do qual antes foram indevidamente retiradas outras coisas trocáveis que, embora comuns, não são "produto do trabalho".  
Só seria possível lançar mão deste artifício da maneira como o fez — ou seja, sub-repticiamente — com uma dialética ríspida, passando bem depressa pelo ponto espinhoso da questão.  Expresso minha admiração sincera pela habilidade com que Marx apresentou de maneira aceitável um processo tão errado, o que, sem dúvida, não o exime de ter sido inteiramente falso.
Continuemos.
Por meio do artifício acima descrito, Marx conseguiu colocar o trabalho no jogo.  Através da limitação artificial do campo de pesquisa, o trabalho se tomou a característica "comum".  No entanto, além dele, há outras características que deveriam ser levadas em conta, por serem comuns.  Como afastar essas concorrentes?
Marx faz isso por meio de dois raciocínios, ambos muito breves, e ambos contendo um gravíssimo erro de lógica
No primeiro, Marx exclui todas as "características geométricas, físicas, químicas ou quaisquer outras características naturais das mercadorias".  Isso porque "suas características físicas só serão levadas em conta na medida em que as tornam úteis, portanto as transformam em valores de uso.  Mas por outro lado, a relação de troca das mercadorias aparentemente se caracteriza pela abstração de seus valores de uso".  Pois "dentro dela (da relação de troca) um valor de uso cabe tanto quanto outro qualquer, desde que exista aí em proporção adequada".
O que diria Marx do argumento que segue?  Em um palco de ópera, três cantores, todos excelentes — um tenor, um baixo e um barítono —, recebem, cada um, um salário de 20.000 moedas por ano.  Se alguém perguntar qual é a circunstância comum que resulta na equiparação de seus salários, respondo que, quando se trata de salário, uma boa voz vale tanto quanto outra: uma boa voz de tenor vale tanto quanto uma boa voz de baixo, ou de barítono, o que importa é que a proporção seja adequada.  Assim, por poder ser, "aparentemente", afastada da questão salarial, a boa voz não pode ser a causa comum do salário alto.
É claro que tal argumentação é falsa.  É igualmente claro também que é incorreta a conclusão a que Marx chegou, e que foi por mim aqui transcrita.  As duas sofrem do mesmo erro.  Confundem a abstração de uma circunstância em geral com a abstração das modalidades específicas nas quais essa circunstância aparece.  Em nosso exemplo, o que é indiferente para a questão salarial é apenas a modalidade específica da boa voz, ou seja, se se trata de voz de tenor, baixo ou barítono.  Mas não a boa voz em si.
Da mesma forma, para a relação de troca das mercadorias, abstrai-se da modalidade específica sob a qual pode aparecer o valor de uso das mercadorias, quer sirvam para alimentação, quer sirvam para moradia ou para roupa. Mas não se pode abstrair do valor de uso em si.  Marx deveria ter deduzido que não se pode fazer abstração desse último, pelo fato de que não existe valor de troca onde não há valor de uso.  Fato que o próprio Marx é forçado a reconhecer repetidamente.[2]
Mas coisa pior acontece com o passo seguinte dessa cadeia de argumentação.  "Se abstrairmos do valor de uso das mercadorias", diz Marx textualmente, "resta-lhes só mais uma característica: a de serem produtos de trabalho".  Será mesmo?  Só mais uma característica?  Acaso bens com valor de troca não têm, por exemplo, outra característica comum, qual seja, a de serem raros em relação à sua oferta?  Ou de serem objetos de cobiça e de procura?  Ou de serem ou propriedade privada ou produtos da natureza?
E ninguém diz melhor nem mais claramente do que o próprio Marx que as mercadorias são produtos tanto da natureza quanto do trabalho: Marx afirma que "as mercadorias são combinação de dois elementos, matéria-prima e trabalho", e conclui dizendo que "o trabalho é o pai (da riqueza) e a terra é sua mãe".
Por que, pergunto eu, o princípio do valor não poderia estar em qualquer uma dessas características comuns, tendo de estar só na de ser produto de trabalho?  Acresce que, a favor dessa última hipótese, Marx não apresenta qualquer tipo de fundamentação positiva.  A única razão que apresenta é negativa, pois diz que o valor de uso, abstraído, não é princípio de valor de troca.  Mas essa argumentação negativa não se aplica, com igual força, a todas as outras características comuns, que Marx ignorou?
E há mais ainda!  Na mesma p. 12, em que Marx abstraiu da influência do valor de uso no valor de troca, argumentando que um valor de uso é tão importante quanto qualquer outro, desde que exista em proporção adequada, ele nos diz o seguinte sobre o produto de trabalho:
Mas também o produto de trabalho já se transformou em nossas mãos.  Se abstrairmos do seu valor de uso, abstrairemos também dos elementos materiais e das formas que o tornam valor de uso.  Ele já não será mesa, casa ou fio, ou outra coisa útil.  Todas as suas características sensoriais serão eliminadas.  Ele não será produto de trabalho em marcenaria, construção ou tecelagem, ou outro trabalho produtivo.  O caráter utilitário dos trabalhos corporificados nos produtos de trabalho desaparece se desaparecer o caráter utilitário destes produtos de trabalho, da mesma forma que desaparecem as diversas formas concretas desse trabalho: elas já não se distinguem; são reduzidas a trabalho humano igual, a trabalho humano abstrato.
Será que se pode dizer, de modo mais claro e explícito, que, para a relação de troca, não apenas um valor de uso, mas uma espécie de trabalho, ou produto de trabalho, "vale tanto quanto qualquer outro, desde que exista na proporção adequada"?  E que se pode aplicar ao trabalho exatamente o mesmo critério em relação ao qual Marx antes pronunciou seu veredito de exclusão contra o valor de uso?  Trabalho e valor de uso têm, ambos, um aspecto quantitativo e outro qualitativo.  Assim como o valor de uso é qualitativamente diverso em relação a mesa, casa ou fio, assim também são qualitativamente diferentes os trabalhos de marcenaria, de construção ou de tecelagem.  Por outro lado, trabalhos de diferentes tipos podem ser diferenciados em função de sua quantidade, enquanto é possível comparar valores de uso de diferentes tipos segundo a magnitude do valor de uso.  É absolutamente inconcebível que circunstâncias idênticas levem, ao mesmo tempo, à exclusão de alguns elementos e à aceitação de outros!
Se, por acaso, Marx houvesse alterado a sequência de sua pesquisa, teria excluído o trabalho com o mesmo raciocínio com que exclui o valor de uso.  Com o mesmo raciocínio com que premiou o trabalho, proclamaria, então, que o valor de uso, por ser a única característica que restou, é aquela característica comum tão procurada.  A partir daí poderia explicar o valor como uma "cristalização do valor de uso".
Creio que se pode afirmar, não em tom de piada, mas a sério, que nos dois parágrafos da p. 12 onde se abstrai, no primeiro, a influência do valor de uso e se demonstra, no segundo, que o trabalho é o "algo comum" que se buscava, esses dois elementos poderiam ser trocados entre si sem alterar a correção lógica externa.  E que, sem mudar a estrutura da sentença do primeiro parágrafo, se poderia substituir "valor de uso" por "trabalho e produtos de trabalho", e na estrutura da segunda colocar, em lugar de "trabalho", o "valor de uso"!
Assim é a lógica e o método com que Marx introduz em seu sistema o princípio fundamental de que o trabalho é a única base do valor.  Julgo totalmente impossível que essa ginástica dialética fosse a fonte e a real justificativa da convicção de Marx. Um pensador da sua categoria — e considero-o um pensador de primeiríssima ordem —, caso desejasse chegar a uma convicção própria, procurando com olhar imparcial a verdadeira relação das coisas, jamais teria partido por caminhos tão tortuosos e antinaturais.  Seria impossível que ele tivesse, por mero e infeliz acaso, caído em todos os erros lógicos e metodológicos acima descritos, obtendo, como resultado não conhecido nem desejado, essa tese do trabalho como única fonte de valor.
Creio que a situação real foi outra.  Não duvido de que Marx estivesse sinceramente convencido de sua tese. Mas os motivos de sua convicção não são aqueles que estão apresentados em seus sistemas.  Ele acreditava na sua tese como um fanático acredita num dogma.  Sem dúvida, foi dominado por ela por causa das mesmas impressões vagas, eventuais, não bem controladas pelo intelecto, que antes dele já tinham desencaminhadoAdam Smith e David Ricardo, e sob influência dessas mesmas autoridades.  E ele, certamente, jamais alimentou a menor dúvida quanto à correção dessa tese.  Seu princípio tinha, para ele próprio, a solidez de um axioma.  No entanto, ele teria de prová-lo aos leitores, o que não conseguiria fazer nem empiricamente nem segundo a psicologia que embasa a vida econômica.
Voltou-se, então, para essa especulação lógico-dialética que estava de acordo com sua orientação intelectual.  E trabalhou, e revolveu os pacientes concertos e premissas, com uma espécie de admirável destreza, até obter realmente o resultado que desejava e que já de antemão conhecia, na forma de uma conclusão externamente honesta.
Conforme vimos acima, Marx teve pleno sucesso nessa tentativa de fundamentar convincentemente sua tese, enveredando pelos caminhos da dialética. Mas será que teria obtido algum amparo se tivesse seguido aqueles caminhos específicos que evitou, ou seja, o empírico e o psicológico?

Leia também: A teoria marxista da exploração e a realidade

[1] Karl Knies objeta com muito acerto contra Marx: "Na exposição de Marx não há nenhum motivo pelo qual a equação 1 "moio" de trigo = x quintais de madeira produzida na floresta não permita uma segunda equação, também válida, que diga: 1 "moio" de trigo = w quintais de madeira virgem = y acres de terra virgem = z acres de terra cultivada com prados naturais." (Das Geld, Iª ed. p. 121;1 2ª ed p. 157).
[2] Por exemplo, na p. 15, final: "Por fim, nenhuma coisa pode ter valor sem ser objeto de uso. Se for inútil, o trabalho nela contido será inútil, não valerá como trabalho (sic!), e por isso não constituirá valor."
Já Karl Knies chamara atenção para o erro lógico do texto. Veja-se Das Geld, Berlim, 1873, p. 123 ss. (2ª ed. p. 160 ss). Estranhamente, Adler (Grundlagen der Karl Marxschen Kritik, Tübingen, 1887, p. 211 ss) entendeu mal meu argumento, quando me censura dizendo que "boas vozes" não são mercadorias no sentido marxista. Para mim, não se tratava de considerar "boas vozes" como bens econômicos, segundo a lei marxista de valor, mas sim de dar o exemplo de um silogismo que revela o mesmo erro de Marx. Eu poderia muito bem escolher outro exemplo, que não tivesse nenhuma relação com o terreno econômico. Por exemplo, poderia ter demonstrado que, segundo a lógica marxista, o "algo comum" está em haver colorido em sabe-Deus-o-quê, mas não em haver uma mistura de várias cores. Pois uma mistura de cores — por exemplo, branco, azul, amarelo, preto, violeta — vale para a qualificação "colorido" o mesmo que a mistura de verde, vermelho, laranja, azul etc., desde que as cores apareçam em proporção adequada. Portanto, vamo-nos abstrair, no momento, das cores e das misturas de cor!

Eugen von Böhm-Bawerk (1851-1914) foi um economista austríaco da Universidade de Viena e ministro das finanças.  Desvendou a moderna teoria intertemporal das taxas de juros em sua obra Capital and Interest. Em seu segundo livro, The Positive Theory of Capital, ele continuou seus estudos sobre a acumulação e a influência do capital, argumentando que há um período médio de produção em todos os processos produtivos.  Sua ênfase na importância de se pensar claramente sobre taxas de juros e sua natureza intertemporal alterou para sempre a teoria econômica.  Böhm-Bawerk tornou-se famoso por ser o primeiro economista a refutar de forma completa e sistemática a teoria da mais-valia e da exploração capitalista.  Veja sua biografia.
fonte: http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1600
 



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segunda-feira, 9 de março de 2015

Fatores de risco e fatores de proteção ao desenvolvimento infantil: uma revisão da área



Fatores de risco e fatores de proteção ao desenvolvimento infantil: uma revisão da áreaI

Risk and protective factors for child development


Joviane Marcondelli Dias MaiaII; Lucia Cavalcanti de Albuquerque WilliamsIII
Universidade Federal de São Carlos - Brasil



RESUMO
O presente estudo teve como objetivo analisar a literatura existente sobre fatores de risco e fatores de proteção ao desenvolvimento infantil, e destacar a importância de que os profissionais que atuam junto à infância e adolescência conheçam tais fatores de forma a exercer sua prática de modo mais efetivo, atuando preventivamente frente a problemas de comportamento na infância e adolescência, bem como respeitando os direitos desta população. Destaca-se a vasta literatura existente sobre os fatores de risco, porém, os estudos do desenvolvimento infantil necessitam incluir os fatores de proteção, com a mesma ênfase dada aos fatores de risco, visando promover a resiliência. Tal revisão da literatura deu subsídios para um estudo com o objetivo de avaliar a capacitação de Conselheiros Tutelares no sentido de habilitá-los a identificação de fatores de risco e de proteção ao desenvolvimento infantil.
Palavras-chave: Fatores de risco, Fatores de proteção, Prevenção de problemas de comportamento.

ABSTRACT
A study was aimed at reviewing the existing literature on risk and protective factors for child development, as well as to highlight the need for professionals, who work with children and adolescents to know the above factors, so as to have a more effective practice, acting in a preventative way towards children and adolescents' behavior problems. The vast literature concerning risk factors is emphasized. Nevertheless, child development studies need to include protective factors with the same emphasis it is given to risk ones, in order to promote resilience. The literature review described here gave basis for an intervention program to assess training of Brazilian Child Protection Workers, teaching them to identify risk and protective factors for child development.
Keywords: Risk factors, Protective factors, Prevention of problem behaviors.



Em 1990, entra em vigor, no Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, Lei Federal n. 8069, 1990), responsável por muitas mudanças no cenário brasileiro, em relação à visão dos direitos das crianças e dos adolescentes, sendo esse um instrumento importante para a proteção de crianças e jovens. Cabe destacar a obrigatoriedade estabelecida pelo ECA em seu artigo 245 de que todo profissional das áreas social, educação ou saúde, deva comunicar à autoridade competente os casos de seu conhecimento envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra a criança ou adolescente, cabendo pena prevista caso tal comunicação não ocorra.
É necessário, porém, que todos os profissionais que atuem na área da infância e da adolescência tenham conhecimento dos direitos estabelecidos pelo ECA (1990), bem como dos fatores de risco envolvidos no prejuízo ao desenvolvimento infantil, para que possam intervir de forma precisa na prevenção e/ou interrupção do risco.
O presente estudo teve como objetivo analisar a literatura existente referente aos fatores de risco ao desenvolvimento infantil, bem como aos fatores de proteção, de forma a promover uma maior compreensão do próprio desenvolvimento, dos fatores do que possam prejudicá-lo, ou potencializá-lo.
A busca da literatura nacional e internacional da área foi realizada através das bases de dados PsycLIT, Scielo e Plataforma Lattes. As palavras-chaves utilizadas foram: fatores de risco, fatores de proteção, fatores protetivos, risco, proteção, desenvolvimento infantil, violência e resiliência. A maior parte da literatura consultada foi de artigos científicos, capítulos de livros, já monografias, dissertações de Mestrado e Anais de Congressos, representam a minoria desta literatura consultada.
Segundo Reppold, Pacheco, Bardagi e Hutz (2002), os fatores de risco são condições ou variáveis associadas à alta probabilidade de ocorrência de resultados negativos ou indesejáveis. Dentre tais fatores encontram-se os comportamentos que podem comprometer a saúde, o bem-estar ou o desempenho social do indivíduo.
Demais definições sobre fatores de risco são concordantes. Para Ramey e Ramey (1998), crianças portadoras de determinados atributos biológicos e/ou sob efeito de determinadas variáveis ambientais têm maior probabilidade de apresentar distúrbio ou atraso em seu desenvolvimento, quando comparadas com crianças que não sofreram efeitos de tais variáveis. Estas variáveis são denominadas fatores de risco. Para Garmezy (1985), os fatores de risco são aqueles fatores que, se presentes, aumentam a probabilidade de a criança desenvolver uma desordem emocional ou comportamental. Tais fatores podem incluir atributos biológicos e genéticos da criança e/ou da família, bem como fatores da comunidade que influenciam, tanto o ambiente da criança quanto de sua respectiva família.
Cabe salientar que os fatores de risco por si só não constituem uma causa específica, mas indicam um processo complexo que pode justificar a conseqüência de uma psicopatologia na criança (Holden, Geffner & Jouriles, 1998). Por outro lado, os fatores de proteção podem ser definidos como aqueles fatores que modificam ou alteram a resposta pessoal para algum risco ambiental que predispõe a resultado mal-adaptativo, como por exemplo: o estágio do desenvolvimento da criança, seu temperamento e a habilidade de resolução de problemas do indivíduo (Rutter, 1985).
Hutz, Koller e Bandeira (1996, apud Reppold et al., 2002) sinalizam mecanismos, fatores ou processos protetores como influências que melhoram ou alteram a resposta dos indivíduos a ambientes hostis, que predispõem a conseqüências mal adaptativas. Tais fatores são compreendidos como condições ou variáveis que diminuem a probabilidade de o indivíduo desenvolver problemas de externalização, tais como: agressão, uso de álcool ou drogas, raiva, desordem de conduta, crueldade para com animais, entre outros (Holden et al., 1998).

Fatores de risco ao desenvolvimento infantil
Segundo Reppold et al. (2002), os eventos estressantes da vida, considerados como quaisquer mudanças no ambiente que normalmente induzem a um alto grau de tensão e interferem nos padrões normais de resposta do indivíduo, têm sido associados a uma grande variedade de distúrbios físicos e mentais. Barnett (1997) afirma que nenhum outro fator de risco tem uma associação mais forte com a psicopatologia do desenvolvimento do que uma criança maltratada, ou seja, o abuso e a negligência causam efeitos profundamente negativos no curso de vida da criança. Segundo tal autor, as seqüelas do abuso e da negligência abrangem grande variedade de domínios do desenvolvimento, incluindo as áreas da cognição, linguagem, desempenho acadêmico e desenvolvimento sócio-emocional. As crianças maltratadas, geralmente, apresentam déficit em suas habilidades de regular afeto e no comportamento geral.
A temática da violência intrafamiliar está cada vez mais presente no cenário atual, sendo freqüentemente divulgada pela mídia. Diariamente, crianças e adolescentes vêm sendo submetidos, em seus próprios lares, a condições adversas, o que refletirá em prejuízos no seu desenvolvimento. Entende-se como fatores de risco ao desenvolvimento infantil todas as modalidades de violência doméstica, a saber: a violência física, a negligência e a violência psicológica, sendo que a última inclui a exposição à violência conjugal (Brancalhone, Fogo & Williams, 2004; Brancalhone & Williams, 2003; Cardoso, 2001; Maldonado & Williams, 2005) e a violência sexual (Azevedo & Guerra, 1989; Brino & Williams, 2006, Brino & Williams, 2003a; Brino & Williams, 2003b; Deslandes, 1994).
violência física envolve maus tratos corporais (espancamento, queimaduras, fraturas, contusões, etc). As conseqüências da vitimização física de crianças abrangem impactos deletérios para o desenvolvimento infantil (Barnett, 1997; Santos, 2001). Widom (1989) assinala que, as crianças maltratadas fisicamente, foram identificadas por agências de assistência social, como tendo o dobro de probabilidade (15,8%) em relação às outras crianças (7,9%) de serem presas mais tarde por cometerem crimes violentos. Maus tratos na infância constituem, deste modo, um fator que pode aumentar a probabilidade futura de crimes violentos. A violência doméstica é o fator que mais estimula crianças e adolescentes a viverem nas ruas.
Barnett (1997) destaca que as crianças mais jovens ou bebês são mais vulneráveis a sofrerem abuso físico, pois não são capazes de escapar ou "apaziguar" pais eminentemente abusivos. Segundo tal autor, há várias razões para crer que os maus-tratos de crianças pequenas podem ser até mais extensos do que o estimado, pois, no geral, essas crianças não possuem contato diário com professores que poderiam detectar e comunicar suspeitas de abuso e negligência, e também por ser difícil distinguir em crianças pequenas, maus-tratos de injúrias acidentais. Vale destacar que tal tipo de violência permanece como principal causa de morte na infância (Azevedo & Guerra, 1995).
Segundo Hughes, Graham-Bermann e Gruber (2001), vários estudos identificam características da personalidade dos pais associadas ao comportamento abusivo. Aqueles que cometeram abuso físico em crianças relataram mais raiva e tiveram problemas no manejo desta raiva, quando comparados com os que não cometeram abuso físico. Os mesmos autores mencionam estudos sugerindo ligações entre adultos que abusam de crianças e características como: baixa tolerância à frustração, baixa auto-estima, rigidez, ausência de empatia, abuso ou dependência de substâncias, depressão e problemas físicos de saúde. Quando comparados com pais não abusivos, os pais abusivos possuíam menor compreensão da complexidade dos relacionamentos sociais, particularmente menor compreensão sobre o papel parental e sobre o atendimento às necessidades da outra pessoa. Tais pais apresentaram também, expectativa não realista e percepção negativa de seus filhos. Consideravam seu papel de pai como sendo estressante e interagiam menos com seus filhos do que pais os não abusivos. Segundo Williams (2003) pais que são portadores de deficiência mental tem maior probabilidade de agredir seus filhos.
Como características da criança que aumentam sua vulnerabilidade para o abuso físico, Hughes et al. (2001) destacam: idade menor do que cinco anos, complicações no nascimento, deficiências físicas e mentais e comportamentos considerados difíceis. Como variáveis de relacionamento que podem aumentar a probabilidade de abuso, os mesmos autores destacam: viver em um lar no qual há violência doméstica ou discórdia marital, crianças de famílias com histórias intergeracionais de abuso e baixo status sócio-econômico. Finalmente, como fatores da comunidade relacionados com o risco da criança vir a ser abusada fisicamente, Hughes et al. (2001) apontam para o senso de aprovação da violência pela sociedade, aprovação de punição corporal e distribuição desigual de poder dentro da família e da sociedade.
negligência, por sua vez, ocorre quando se priva a criança de algo que ela necessite, quando isto é essencial para o seu desenvolvimento sadio (alimentação, vestuário, segurança, oportunidade de estudo etc). Seus efeitos podem levar à desnutrição, ao atraso global no desenvolvimento e até mesmo à fatalidade (Monteiro, Abreu & Phebo, 1997a).
violência psicológica ocorre quando alguém é submetido a ameaças, humilhações e privação emocional. Esta violência pode consistir em ameaças de vários tipos (suicídio, morte, danificação de propriedade, agressão à vítima ou a seus entes queridos, entre outras) (França, 2003). Cabe mencionar que a pesquisa relativa a tal tema é ainda recente (O'Leary, 2001). Como conseqüências da violência psicológica, o Conselho Americano de Pediatria (American Academy of Pediatrics, 2002) destaca prejuízos nas seguintes áreas: pensamentos intrapessoais (medo, baixa-estima, sintomas de ansiedade, depressão, pensamentos suicidas etc), saúde emocional (instabilidade emocional, problemas em controlar impulso e raiva, transtorno alimentar e abuso de substâncias), habilidades sociais (comportamentos anti-social, problemas de apego, baixa competência social, baixa simpatia e empatia pelos outros, delinqüência e criminalidade), aprendizado (baixa realização acadêmica, prejuízo moral), e saúde física (queixa somática, falha no desenvolvimento, alta mortalidade).
A mesma fonte destaca que a severidade das conseqüências da violência psicológica é influenciada pela intensidade, gravidade, freqüência, cronicidade e apaziguamento, ou realce dos fatores relacionados aos cuidadores da criança, da própria criança ou do ambiente. O estágio do desenvolvimento da criança pode também influenciar as conseqüências da violência psicológica (American Academy of Pediatrics, 2002).
A violência psicológica é a mais difícil de ser identificada, apesar de ocorrer com significativa freqüência. Ela pode levar a pessoa a sentir-se desvalorizada, sofrer de ansiedade e adoecer com facilidade. Situações que se arrastam por muito tempo e se agravam, podem provocar o suicídio (Ministério da Saúde & Ministério da Justiça, 2001).
Como fatores de risco para a ocorrência da violência psicológica associados aos pais, pode-se destacar: habilidades parentais pobres, abuso de substâncias, depressão, tentativas de suicídio ou outros problemas psicológicos, baixa auto-estima, habilidades sociais pobres, pais autoritários, perda da empatia, estresse social, violência doméstica e disfunção familiar (American Academy of Pediatrics, 2002).
Uma criança que nasce em um lar violento está exposta a fatores de risco ao seu desenvolvimento (Koller, 1999). De modo geral, mesmo não sendo vítima direta da violência, a criança pode apresentar problemas em decorrência da exposição à violência conjugal.
Segundo Sinclair (1985), estudos realizados indicaram que a observação da violência doméstica afeta e interfere no desenvolvimento físico e mental das crianças. Cardoso (2001) salienta que a criança que observa a violência doméstica no lar vivenciará a ambivalência das emoções e reações entre amor e ódio, além de confusões, conflitos e outras vivências negativas. Outros efeitos nocivos da exposição da criança à violência conjugal indicados na literatura são: a agressão, uso de drogas e/ou álcool, distúrbio de atenção, baixo rendimento escolar (Brancalhone & Williams, 2003), ansiedade, depressão, Transtorno de Estresse Pós-Traumático e os problemas somáticos, entre outros (Barnett, 1997; Santos, 2001). Brancalhone, Fogo e Williams (2004) salientam que crianças que assistem à agressão do pai contra a mãe, no geral, assistem rotineiramente essa violência.
Para Sinclair (1985), uma criança que convive com a violência ou ameaça do pai contra a mãe é uma criança que precisa de proteção, pois tem risco de ser ela própria física e sexualmente abusada. Para Holden et al. (1998), a mulher agredida pode descontar sua raiva e frustração na criança, a criança pode machucar-se acidentalmente tentando parar a violência ou proteger sua mãe e, finalmente, a criança que testemunha a agressão contra a própria mãe poderá tornar-se um marido agressor ou uma mulher agredida.
Os efeitos da observação da violência podem ser entendidos com base na teoria da Aprendizagem Social. Tal teoria sustenta que padrões aprendidos por crianças em um lar violento agem como modelos de como se comportar em interações sociais (Bandura, 1976). Além disso, crianças expostas a ambientes estressantes podem apresentar quadros de dissociação a ponto de gerar rupturas bruscas e patológicas com a realidade (Caminha, 1999). Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (American Psychiatric Association, 2000), a característica essencial dos transtornos dissociativos é uma perturbação nas funções habitualmente integradas de consciência, memória, identidade ou percepção de ambiente.
violência sexual compreende toda situação na qual um ou mais adultos, do mesmo sexo ou não, utilizam a criança ou adolescente com a finalidade de obter prazer sexual. Tal ato pode incluir desde conversas ou telefonemas obscenos, passando por exibição dos órgãos sexuais, até relações sexuais impostas (vaginais, anais ou orais) (CRAMI, 2000).
Segundo Monteiro, Abreu e Phebo (1997b) tal tipo de violência pode abranger: a) abuso sem contato físico - abuso sexual verbal, telefonemas obscenos, exibicionismo, voyeurismo, mostrar para a criança fotos ou vídeos pornográficos, e fotografar crianças nuas ou em posições sedutoras; b) abuso sexual com contato físico - atos físico-genitais, relações sexuais com penetração vaginal, tentativa de relações sexuais, carícias nos órgãos genitais, masturbação, sexo oral e penetração anal; c) prostituição de crianças e adolescentes - essencialmente casos de exploração sexual visando fins econômicos.
Williams (2002) realizou uma revisão da literatura sobre os possíveis efeitos do abuso sexual. A curto prazo podem aparecer problemas tais como: comportamento sexualizado, ansiedade, depressão, queixas somáticas, agressão, comportamentos regressivos (enurese, encoprese, birras, choros), comportamentos auto-lesivos, problemas escolares, entre outros. A longo prazo há risco de: depressão, ansiedade, prostituição, problemas com relacionamento sexual, promiscuidade, abuso de substâncias, ideação suicida entre outros. Azevedo e Guerra (1989), também destacaram efeitos similares do abuso sexual a curto e a longo prazo.
Como fatores que influenciam o prognóstico dos casos de abuso sexual infantil, pode-se destacar, segundo Williams (2002), a proximidade do agressor em relação à vítima (os casos de incestos são os mais graves), o número de agressores, a intensidade da violência empregada (quanto maior, pior o prognóstico), a topografia do ato sexual em si (havendo penetração oral, vaginal ou anal, os resultados são mais graves do que sem penetração), a duração do abuso (quanto mais longo, maiores as dificuldades), a freqüência e o apoio dado à vítima pelo membro não agressor (no geral a mãe da criança).
No que se refere à identificação dos sintomas apresentados por uma criança que sofreu abuso sexual, Caminha (1999) destaca que os estudiosos da área parecem ter chegado a um consenso, porém, educadores, conselheiros tutelares e profissionais da saúde, ainda não estão capacitados para identificar o fenômeno da violência infantil e tão pouco para lidar com eles. Padilha (2002) afirma que a peculiaridade do abuso sexual reside no fato de não haver, muitas vezes, provas físicas de sua ocorrência e pela idéia errônea do abusador argumentar que não forçou a criança a fazer nada.
Barnett (1997) enfatiza quatro fatores de risco que estão associados à ocorrência de abuso infantil crônico e negligência: pobreza, história e personalidade dos pais e habilidades dos mesmos. A pobreza é destacada por incluir todo um ambiente de estresse gerando problemas situacionais que comprovadamente comprometam o desenvolvimento. Guralnick (1998) confirma que tal estado é um estressor freqüentemente associado a conseqüências sérias e globais para o desenvolvimento da criança. Aiello e Williams (2000) salientam que a grande desigualdade social brasileira faz com que: "a população de crianças consideradas de risco torna-se gigantesca, apenas levando-se em conta fator de condições econômicas" (Aiello & Williams, 2000, p. 24).
Com relação à história dos pais, Barnett (1997) destaca dados como: 30% das crianças maltratadas produzirão abuso ou negligência em suas crianças no futuro, já 70% de pais que maltratam seus filhos foram maltratados quando crianças. É importante destacar também fatores associados à gravidez com aumento de risco de maus tratos, como: gravidez de pais adolescentes sem suporte social, gravidez não planejada e/ou não desejada, gravidez de risco, depressão na gravidez, e falta de acompanhamento pré-natal, bem como pai/mãe com múltiplos parceiros, expectativas demasiadamente altas ou irrealista em relação à criança e prostituição.
No que se refere à personalidade dos pais, Barnett (1997) afirma que a maioria dos pais possui características que podem prejudicar seus filhos, no entanto, grande parte não permite que tais características interfiram no cuidado destinado a eles. O autor destaca também, que as pesquisas têm apontado para o egocentrismo e a imaturidade de pais que maltratam, particularmente no que diz respeito ao entendimento de seus papéis de cuidadores. Finalmente, no que se refere às habilidades dos pais, Barnett (1997) destaca que os pais que maltratam são menos positivos e dão menos suporte na educação de suas crianças, sendo mais negativos, hostis e punitivos do que pais que não maltratam. Tais pais tendem a reagir mais negativamente do que outros pais a desafios como o choro de uma criança.
Ainda dentro da noção de risco, Guralnick (1998) aponta para os estressores que podem afetar o desenvolvimento da criança, destacando: a) características interpessoais dos pais - grau de depressão, nível instrucional, experiências intergeracionais aprendidas sobre habilidades parentais, incluindo expectativas culturais; e b) características não diretamente relacionadas a alguma deficiência da criança, como a qualidade do relacionamento conjugal, o temperamento da criança, e fontes de apoio disponíveis, incluindo recursos e rede de apoio social da família.
Adicionalmente, outros fatores de risco ao desenvolvimento psicológico e social citados pela literatura são: pais portadores de deficiência mental (Aiello & Buonadio, 2003; Santos, 2001; Turnbull & Turnbull, 1990; Williams, 2003), baixa escolaridade dos pais, famílias numerosas, ausência de um dos pais, depressão materna, abuso de drogas (Barnett, 1997; Fox & Benson, 2003; Guralnick, 1998).
Segundo Gomide (2003), a fim de cumprir o papel de agentes de socialização dos filhos, os pais utilizam-se de diversas estratégias e técnicas para orientar seus comportamentos que são denominadas por muitos autores pela expressão: práticas educativas parentais. Tais práticas poderão desenvolver tanto comportamentos pró-sociais como anti-sociais, dependendo da freqüência e intensidade que o casal parental utiliza determinadas estratégias educativas. Em seu estudo sobre estilos parentais Gomide (2003), selecionou variáveis vinculadas ao desenvolvimento do comportamento anti-social, sendo as práticas educativas negativas: a) negligência - ausência de atenção e afeto; b) abuso físico e psicológico - disciplina por meio de práticas corporais negativas, ameaça ou chantagem de abandono ou humilhação do filho; c) disciplina relaxada - relaxamento das regras estabelecidas; d) punição inconsistente - pais que se orientam pelo seu humor para punir ou reforçar e não pelo ato praticado; e e) monitoria negativa - excesso de instruções independente de seu cumprimento, o que gera um ambiente de convivência hostil.
No que se refere ao engajamento em atos infracionais, cabe salientar que as crianças que iniciam precocemente comportamentos agressivos têm maior risco de cometer tais atos infracionais ou abusarem de drogas (Kumpfer & Alvarado, 2003). Os fatores de risco para problemas como atos infracionais por jovens têm sido tema de alguns estudos preocupados em identificar variáveis preditoras deste padrão. Reppold, Pacheco, Bardagi e Hutz (2002) destacam a revisão de literatura de Loeber e Dishion (1983) que culminou em quatro principais preditores: práticas parentais, presença de problemas de comportamentos durante a infância, ocorrência de comportamento anti-social em algum membro da família, e abandono ou pouco envolvimento escolar (Gallo & Williams, 2005).
Silva e Hutz (2002) assinalam para o fato de a criança ter sido vítima de abuso (físico, sexual, psicológico e/ou negligência) como risco para o surgimento de atos infracionais, aumentando as chances de que ela venha a apresentar tal comportamento. Kumpfer e Alvarado (2003) ressaltam que a probabilidade do jovem ter problemas no desenvolvimento aumenta rapidamente na presença de fatores de risco como: conflitos familiares, perda do vínculo pai-filho, desorganização, práticas parentais ineficazes, estressores e depressão parental.
O Ministério da Saúde (2002) identifica fatores de risco ao desenvolvimento infantil referentes à família e à criança. Como fatores de risco inerentes à família ele destaca: a) famílias baseadas em uma distribuição desigual de autoridade e poder; b) famílias nas quais não há uma diferenciação de papéis, levando ao apagamento de limites entre os membros; c) famílias com nível de tensão permanente, manifestado por dificuldades de diálogo e descontrole da agressividade; d) famílias nas quais não há abertura para contatos externos; e) famílias nas quais há ausência ou pouca manifestação positiva de afeto entre pai/mãe/filho; e f) famílias que se encontram em situação de crise, perdas (separação do casal, desemprego, morte, etc).
Como fatores de risco referentes à criança, a mesma fonte menciona: crianças com falta de vínculo parental nos primeiros anos de vida, distúrbios evolutivos, crianças separadas da mãe ao nascer por doença ou prematuridade, crianças nascidas com mal-formações congênitas ou doenças crônicas (retardo mental, anormalidades físicas, hiperatividade), baixo desempenho escolar e evasão (Ministério da Saúde, 2002).
No que se refere aos comportamentos de risco emitidos por adolescentes, a Associação Americana de Psicologia aponta: fumo, abuso de álcool e/ou drogas, relações sexuais que podem levar à gravidez e doenças sexualmente transmissíveis, evasão escolar, uso de armas, violência sexual, brigas etc. Fox e Benson (2003) apontam para a existência de pesquisas destacando o papel da comunidade como sendo, também, uma influência no desenvolvimento da criança, porém tais efeitos são complexos, não lineares e mediados pelo comportamento parental e pelo processo familiar. Tais autores realizaram um estudo relacionando práticas parentais e contexto de relação com a comunidade, extraindo como conclusões que as famílias com características positivas podem oferecer proteção às suas crianças dos riscos da comunidade, e famílias de alto risco podem encobrir as vantagens oferecidas por uma "boa" vizinhança ou bairro.

Fatores de proteção ao desenvolvimento infantil
Garmezy (1985) classifica os fatores de proteção em três categorias, que serão discutidos no presente trabalho: a) atributos disposicionais da criança - atividades, autonomia, orientação social positiva, auto-estima, preferências, etc); b) características da família - coesão, afetividade e ausência de discórdia e negligência etc); e c) fontes de apoio individual ou institucional disponíveis para a criança e a família - relacionamento da criança com pares e pessoas de fora da família, suporte cultural, atendimento individual como atendimento médico ou psicológico, instituições religiosas, etc.
Segundo Bee (1995), a família pode ser destacada como responsável pelo processo de socialização da criança, sendo que, por meio dessa, a criança adquire comportamentos, habilidades e valores apropriados e desejáveis à sua cultura. Nesse contexto, a internalização de normas e regras possibilitarão à criança um desempenho social mais adaptado e aquisição de autonomia.
Se hostilidade e negligência parental contribuem para o engajamento de indivíduos com distúrbios de conduta em grupos criminosos, por outro lado, práticas efetivas, um bom funcionamento familiar, a existência de vínculo afetivo, o apoio e monitoramento parental são indicativos de fatores protetores que reduzem a probabilidade de adolescentes se engajarem em atos infracionais. Desse modo, a família pode ser identificada como fator de risco ou como fator de proteção, dependendo do estilo parental utilizado (Reppold et al., 2002).
No estudo anteriormente citado de Gomide (2003) sobre estilos parentais, além das práticas educativas negativas, a autora destaca práticas educativas positivas que envolvem: a) uso adequado da atenção e distribuição de privilégios, o adequado estabelecimento de regras, a distribuição contínua e segura de afeto, o acompanhamento e supervisão das atividades escolares e de lazer; e b) comportamento moral que implica no desenvolvimento da empatia, do senso de justiça, da responsabilidade, do trabalho, da generosidade e no conhecimento do certo e do errado quanto ao uso de drogas, álcool e sexo seguro.
Guralnick (1998) assinalou três padrões que podem ser identificados como essenciais na interação da família: a qualidade da interação dos pais com a criança; a medida em que a família fornece à criança experiências diversas e apropriadas com o ambiente físico e social ao seu redor; e o modo pelo qual a família garante a saúde e a segurança da criança, como, por exemplo, levando a mesma para ser vacinada e dando-lhe nutrição adequada.
Segundo Kumpfer e Alvarado (2003), práticas parentais efetivas constituem-se no mais poderoso meio de se reduzir problemas de comportamentos de adolescentes. Tais autores apontam para pesquisas longitudinais, sugerindo que os pais possuem um maior impacto nos comportamentos de saúde dos adolescentes do que previamente pensado. Os mesmos autores salientam que, apesar da influência dos pares ser a principal razão para o adolescente iniciar comportamentos negativos, uma análise mais cuidadosa apontou para a preocupação dos adolescentes com a desaprovação dos pais referente ao uso de álcool ou drogas, como principal razão para não usá-los.
Kumpfer e Alvarado (2003) destacam algumas pesquisas salientando o ambiente familiar positivo como a principal razão para os jovens não se engajarem em comportamentos delinqüentes ou comportamentos não saudáveis. Como exemplo de ambiente familiar positivo, destacaram: relacionamento positivo entre pais e filho, supervisão e disciplina consistente e comunicação dos valores familiares.
A oportunidade de a criança interagir com os pares e com outras pessoas fora da família, o grau de escolaridade materna e seu baixo-nível de depressão, estilos parentais adequados, uma qualidade de interação boa com a comunidade e uma rede social fortemente estabelecida, podem ser destacados como exemplos de fatores positivos à proteção da criança, que podem diminuir a expectativa de conseqüências negativas (Holden et al., 1998). Cabe, também, ressaltar que dentro do contexto familiar a criança não é simplesmente um recipiente passivo que recebe as influências familiares, sendo ela agente no sentido de participar das transações familiares (Holden et al., 1998).
Rae-Grant, Thomas, Offord e Boyle (1989) identificam como fatores de proteção da criança: o temperamento positivo, a inteligência acima da média e a competência social (realização acadêmica, participação e competência em atividades, habilidade de se relacionar facilmente, alta auto-estima e senso de eficácia). Como fatores familiares favoráveis, os autores destacam o suporte dos pais, a proximidade da família e um ambiente de regras adequado. Finalmente, como fatores da comunidade, os autores destacam: os relacionamentos que a criança apresenta com seus pares (fora da família), com outros adultos significativos e com instituições com as quais ela mantenha contato, dentre outros.
Werner (1998) assinala algumas características de crianças que conseguem lidar de forma adequada com as adversidades. Tais indivíduos possuem senso de eficácia e autocompetência, são socialmente mais perceptivos do que seus pares que não conseguem lidar com as adversidades, são capazes de despertar atenção positiva das outras pessoas, possuem habilidades de resolução de problemas, possuem a habilidade de solicitar ajuda de outras pessoas quando necessário e possuem a crença de que podem influenciar positivamente o seu ambiente.
A mesma autora aponta, ainda, como fator de proteção o vínculo afetivo com um cuidador alternativo, tal como os avós ou irmãos. Tal pessoa pode se tornar um suporte importante nos momentos de estresse promovendo, também, a competência, a autonomia e a confiança da criança. Werner (1998) destaca, também, a importância da segurança e da coerência na vida dessa criança, afirmando que crenças religiosas (independente da religião) oferecem a convicção de que suas vidas possuem um sentido e um senso de enraizamento e de coerência. Os amigos e a escola, também, são citados como fatores de proteção importantes no sentido de fornecerem suporte emocional, e os professores podem vir a ser um modelo positivo de identificação pessoal para uma criança de risco (Werner, 1998).
A Associação Americana de Psicologia (APA) destaca fatores que podem ajudar a proteger pessoas jovens de problemas no desenvolvimento, vivendo até mesmo em condições adversas, tais como a pobreza. Neste contexto a Associação destaca a "resiliência" para se referir à ocorrência de bons resultados apesar de sérias ameaças ao desenvolvimento saudável (Rutter, 1985).
A Associação exemplifica como fatores associados a resiliência: a) o relacionamento positivo com ao menos um adulto significativo (parente ou não); b) a existência de uma âncora religiosa ou espiritual (fornece senso de significado); c) expectativa acadêmica alta e realista, e suporte adequado; d) ambiente familiar positivo (limites claros, respeito pela autonomia do adolescente etc); e) inteligência emocional; e f) habilidade para lidar com o estresse.
A APA ressalta que não são necessários todos esses fatores para que o adolescente torne-se resiliente frente às adversidades, porém uma forte tendência a resiliência tem sido associada como tendo presente um número maior de tais fatores de proteção.
Segundo Hughes et al. (2001), os pesquisadores têm estudado crianças resilientes há vinte anos, como crianças advindas de situações adversas, que vivem em abrigos, sob condições de pobreza, com transtorno parental, crianças nascidas prematuramente ou com baixo-peso, crianças sem lar, e crianças cujos pais se divorciaram. Porém, não há, segundo os autores, investigações de resiliência em criança expostas à violência doméstica.
Para os autores, os fatores de proteção associados à derrota da adversidade por crianças expostas à violência doméstica incluem particularidades da criança, dos pais e do ambiente. Como uma característica da criança associada a baixo risco de resultados negativos, pode-se destacar a idade acima de cinco anos. Como fatores parentais para proteger crianças que vivem em famílias que experienciam violência doméstica destacam-se: a competência parental e saúde mental da mãe. Finalmente, como fatores de proteção associados a um amplo contexto ambiental destacam-se: validade e força do suporte social (Hughes et al., 2001).
Para Kumpfer e Alvarado (2003), os mecanismos familiares de proteção e o processo de resiliência individual devem ser direcionados para reduzir os fatores de risco familiares. Como principais fatores de proteção familiares para promover comportamentos adolescentes saudáveis, os autores apontam: um relacionamento positivo entre pais e criança, método positivo de disciplina, monitoramento e supervisão, comunicação de valores e expectativas pró-sociais e saudáveis. Segundo tais autores, as pesquisas em resiliência sugeriram como principais fatores de proteção: o suporte parental auxiliando crianças a desenvolverem sonhos, objetivos, e propostas de vida.
Uma revisão realizada por Kumpfer e Alvarado (2003), sobre os programas de treinamento de habilidades familiares e de terapia familiar breve em programas de prevenção para adolescentes de alto risco e seus jovens pares, concluiu serem tais métodos eficazes na redução de problemas adolescentes, com base na promoção da supervisão familiar e no monitoramento, na facilitação da comunicação efetiva de expectativas, normas e valores familiares, e na promoção do tempo que a família permanece junto para aumentar o vínculo e reduzir a influência inadequada dos pares.

Conclusão
Pode-se destacar a vasta literatura existente que aponta os fatores de risco ao desenvolvimento infantil. Porém, faz-se necessário, que os profissionais que atuam junto à infância e adolescência, tomem conhecimento de cada um desses fatores, minimizando crenças e questões pessoais que possam contradizer a identificação de tal risco, bem como sejam conscientizados de sua importância como possíveis analistas e possam intervir denunciando, tendo como objetivo o bem-estar da criança ou do adolescente. Dentre tais profissionais pode-se destacar: médicos, psicólogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, assistências sociais, professores ou responsáveis por estabelecimento de atenção a saúde e ensino fundamental, pré-escola ou creche, dentre outros.
Nesse contexto, destaca-se o papel ímpar do Conselheiro Tutelar, profissional responsável por receber as notificações de casos nos quais haja suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescentes. Tal profissional deve estar habilitado para identificar os riscos aos quais crianças ou adolescentes possam estar sendo expostos e os fatores de proteção inseridos nesse contexto, e assim executar sua função, aplicando medidas de proteção cabíveis.
Segundo a Secretaria de Promoção Social da Província de Ontário, no Canadá (Ontario Ministry of Community and Social Services, 2001), os profissionais que cuidam do bem-estar da criança (equivalentes ao Conselheiro Tutelar no Brasil), podem ser guiados na formulação de questões relevantes quanto a estratégias de proteção da própria criança. Tal fonte afirma a necessidade de que tais profissionais identifiquem os pontos fortes, as fraquezas e as habilidades de todos os membros da família para proteger de modo eficaz suas crianças. No que se refere aos recursos da criança para se auto-proteger, a Secretaria aponta que estes profissionais deveriam formular questões importantes que explorem: o relacionamento adequado com a mãe, com outro membro da família ou com vizinhos, suporte do ambiente escolar e de grupos da comunidade, e ainda, a extensão em que a criança entende a violência experienciada. Finalmente, a Secretaria de Ontário apontou que, a fim de avaliar os recursos da comunidade para promover a segurança das crianças, os profissionais deveriam estar atentos para suportes como suporte cultural, tratamento acessível para o abuso de substâncias, sistema de saúde, serviços de bem-estar e social, incluindo aconselhamento e apoio.
No que se refere, mais especificamente, à literatura sobre fatores de proteção ao desenvolvimento infantil, o presente trabalho gostaria de enfatizar sua importância, bem como a necessidade de que os estudos sobre o desenvolvimento infantil possam incluí-la com a mesma atenção dada aos fatores de risco, visando promover a resiliência.
Destaca-se neste contexto o apontamento de Werner (1998) para a necessidade de que as intervenções não sejam focalizadas somente nos fatores de risco presentes na vida das crianças e suas famílias, mas também incluir as competências e recursos informais presentes na vida das pessoas, competências essas que podem ser utilizadas para promover o repertório da habilidade de resolução de problemas e aumentar a auto-estima.
Nesse contexto, cabe mencionar a Psicologia Positiva, tão discutida nos tempos atuais, que direciona a Psicologia para o estudo das emoções positivas e potencialidades das pessoas. Possui três pilares principais: o estudo da emoção positiva (como confiança e esperança), o estudo das características positivas (habilidades como inteligência e atletismo) e o estudo de instituições positivas (democracia, famílias saudáveis e liberdade de expressão) (Seligman, 2002).
Em tempos difíceis, a compreensão e construção de forças e virtudes, como: valores, perspectivas, integridade torna-se mais urgente. Neste sentido, as forças e virtudes funcionam como pára-choque contra o infortúnio e desordens psicológicas, e podem ser a chave para a construção da resiliência (Seligman, 2002).

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Endereço para correspondência
Joviane Marcondelli Dias Maia
Laboratório de Análise e Prevenção da Violência Doméstica (LAPREV)
Universidade Federal de São Carlos
Via Washington Luis, Km 235
Fone: 16- 33518745
www.cech.ufscar.br/laprev.htm
Email: joviane_marcondelli@yahoo.com.br
Enviado em Janeiro/2007
Revisado em Maio/2007
Aceite final em Junho/2007


ITrabalho apresentado na XXXVI Reunião Anual de Psicologia, em Salvador, 2006, na forma de sessão coordenada: "Prevenção de problemas de comportamento na infância e adolescência". Apoio Financeiro: CAPES. Este trabalho é parte da Dissertação de Mestrado da autora: Joviane Marcondelli Dias Maia, defendida no ano de 2002, no Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos, com o título: "Capacitação de Conselheiros Tutelares: instruir para aprimorar", sob orientação da Profa. Dra. Lucia Cavalcanti de Albuquerque Williams.
IIPsicóloga, Doutoranda em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos.
IIIPsicóloga, Doutora em Psicologia pela USP, Professora Titular no Curso de Psicologia e no Programa de Pós-Graduação em Educação Especial, e Coordenadora do LAPREV (Laboratório de Análise e Prevenção da Violência) na Universidade Federal de São Carlos.


Sociedade Brasileira de Psicologia
R. Florêncio de Abreu, 681/1005 
14015-060 Ribeirão Preto - SP - Brasil 
Tel./Fax.: +55 16 3625-9366




Fonte: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X2005000200002

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