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Diante da indiferença de outros pacientes e de um segurança, Esmin Green permaneceu no chão por mais de uma hora sem nenhum socorro.
Quando os funcionários resolveram socorrê-la, já era tarde. A causa da morte ainda não foi revelada. A direção do hospital suspendeu todos todos os funcionários e médicos que aparecem no vídeo.
FUNDAMENTOS SOCIOLÓGICOS DA
Não há pretensão, aqui, de esgotar o tema. A função do presente texto não é aprofundar teorias sociológicas ou realizar abordagens academicistas que nos coloquem distantes da realidade em que vivemos. Estudos desse estilo, certamente os encontramos em bibliotecas ou livrarias. Nosso propósito, ao contrário, é suscitar um debate democrático e solidário sobre a realidade, apontando algumas pistas rumo a metodologia que possam provocar mudanças pessoais e coletivas, gerando comunhão e participação, na formação de uma sociedade autônoma, dona de seu destino.
Tenho certeza que podemos pensar as coisas pelo menos sob dois enfoques. Ou pensar as coisas da educação, da realidade, do mundo, do ser humano, da cidadania, da vida, do ponto de vista funcionalista-positivista, ou pensá-las dialética-histórica-criticamente. Aqui entra o papel da reflexão os Fundamentos Sociológicos da Educação. Aprofundar essas duas concepções ou teorias em sala de aula é fundamental. Mais: buscar caracterizar como se dão, na prática, estas duas teorias é questão emergencial. Aprofundemos um pouco estas questões. O que significa uma sociedade adestrando seus cidadãos para a assimilação, na prática, do discurso positivista? As coisas estão postas, a educação está posta, é assim que correrá o seu curso. A sociedade está organizada de maneira tal, que tudo o que acontece, acontece de modo funcional. O ser humano vai internacionalizando, introjetando esta concepção de mundo. Dela vai decorrer uma prática submissa, intimidada, de perda de identidade, de perda da historicidade, de moralismo exacerbado e autoritário, repressivo e opressivo. A Escola cumpre o papel de censor, reprimindo, punindo, suprimindo os sonhos e as buscas.
Uma abordagem séria sobre nossa realidade nos permitirá perceber que o modelo sócio-político que temos implantado é um modelo fundamentado no “caldo” ideológico do positivismo. Aliás, não é difícil imaginar e entender a razão histórica para tantos regimes de extrema-direita se terem instalado na América Latina contemporânea. Não é acaso a utilização de um aparato repressivo, seja ele jurídico ou militar, como forma de legitimar o modelo que se pretendia impor ao Continente, opondo a “lei da força” à “força da lei”. Já se disse, com muita propriedade, que, em toda a dimensão política, existe a ação pedagógica; que toda a dimensão pedagógica subjaz uma ação política. A ausência de um caráter crítico da organização e da participação, a apatia e o conformismo são sinais claros do modelo que busca impedir o acesso do cidadão à sua plena maturidade política, prática marcada pela liberdade. Penso que temos aqui um grande tema de discussão em sala de aula. Por que não estudar, com nossos educandos, temas como: alienação da juventude, opressão x cidadania no contexto brasileiro e Latino-americano? Por que não aprofundar, com eles, as saídas que os povos vêm encontrando rumo à sua maturidade? Quando trazemos para a sala de aula Movimentos pelos direitos da mulher, da cultura negra, de defesa das nações indígenas, de organização do meio popular, de organização do meio estudantil, estamos apontando para novas saídas, para uma sociedade que quer tomar a história na mão e ter plena consciência da cor do seu destino. Estes estudos podem perfeitamente ser feitos a partir de pesquisas, de painéis, de seminários, de contato concreto com a realidade de cada segmento. Quando a isso nos propomos, estamos fazendo sociologia? Se quisermos uma resposta acadêmica, diria que não. Se buscamos, porém, com nossos alunos, o estabelecimento da relação entre a função da sociologia e da escola como processo de socialização, de formação da cidadania, não temos como deixar de caminhar rumo a esta postura de trabalho.
São perguntas significativas, das quais não temos o direito de abdicar: a quem queremos formar? Para quem formamos? Que horizontes descortinamos? Que visão de realidade temos? Que interpretação da sociedade fazemos? Espontaneísta? Crítica? O que buscamos com nosso fazer pedagógico?
Na verdade, nossa prática didático-pedagógica, explícita ou implícita, afirma, queiramos ou não, toda nossa concepção de sociedade, de política, de mundo. Na perspectiva de um currículo emancipador, a sociologia da educação torna-se vital para provocar uma discussão científica, que faça uma interpretação competente, sistemática e orgânica da realidade, que possa permitir que as demais disciplinas de um curso de formação de magistério, como as didáticas, possam apontar para saídas de um projeto educacional formador de cidadania.
Por isso, a Sociologia da Educação se insere nos Fundamentos da Educação, fundamentos que nos lembram: base, referência, paradigma. Olhando para a prática de todos nós, educadores brasileiros, penso que nos falta, ao fazermos educação, olhar para o homem e olhá-lo num processo de relações afetivas, agindo, interagindo na sociedade. Acredito que somente quando assumirmos, na prática, o específico que nos cabe fazer na transformação da sociedade, seremos partícipes e co-autores da Utopia. Cabe-nos ser competentes didática e pedagogicamente. Esta é a nossa função, esta é a nossa contribuição ao mundo do trabalho, onde também se dá a formação do homem como sujeito de direitos, sujeito de dignidade, construtor da solidariedade. Aqui, apontamos para uma outra dimensão essencial em nossa prática. Magistério, bico ou profissão? Na educação das séries iniciais, onde se encontra parte dos meus alunos, o educador não pode escapar desta discussão. Como falar em Direitos às crianças, como apontar a liberdade e a dignidade como valores de vida, se não estou convencido desta opção na minha própria vida? Se a Escola é lugar onde se fazem e se produzem relações humanas, será nesse local que se gestará a mudança, a vida, a liberdade, na vivência do cotidiano. Caso contrário, haverá de ser um espaço onde começaremos a perpetuação da opressão, da desigualdade, da exploração, da omissão... não existe neutralidade. Ou somos a favor do homem, ou seremos a favor de ideologias, de sistemas opressores que se apropriarão do destino deste homem em nome de leis, tradições, estruturas.
Educar o social. Deixar que o social interpele e questione o educando. Educação e cidadania são coisas que convergem. Educar o cidadão para que seja autor de seu destino, para que assuma a sua dimensão histórica, cuidando da vida, da sua, dos outros, de todos, numa dimensão horizontal. Cidadania: dizer não à repressão, dizer não à escravidão, dizer sim à liberdade de expressão, à vivência da solidariedade, à construção comunitária de uma experiência de prática política de autonomia, de reciprocidade, de cooperação e de responsabilidade. Quando promovemos, em sala de aula, um seminário sobre conjuntura nacional, aprofundando questões angustiantes da realidade brasileira, quando somos capazes de analisar suas causas e efeitos, quando somos capazes de discernir saídas, estamos discutindo e aprofundando a compreensão da sociedade, suas relações, a questão do poder, a necessidade da mudança. É impossível discutir cidadania, pensar a realidade globalmente, sem pensar e discutir a realidade da fome, da saúde, das condições de trabalho...
Urge que os Fundamentos da Educação estejam comprometidos com uma proposta que coloque a defesa da vida como valor maior da nossa ação pedagógica. É preciso pensar o homem como sujeito de direitos: direito à alimentação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à expressão política, ao salário justo, direito à habitação, à livre expressão, à livre organização, à escolha livre de um credo ou não... Estes são caminhos para a formação da consciência e de uma prática solidária. Na minha experiência pessoal de formação de adolescentes, futuros educadores, tenho tido o cuidado e a insistência de cultivar as chamadas atitudes de fundo, a tão fundamental sensibilidade, a solidariedade, a bondade. Somente quando mergulhamos na ótica de uma educação pelo “mais”, conseguiremos provocar uma atitude que conduza ao inconformismo e à mudança.
É preciso oportunizar situações concretas em sala de aula para este tipo de vivência. Nem sempre nos damos conta de que, embora tendo um conteúdo crítico, nossa prática é autoritária e domesticadora. O cultivo destas atitudes de fundo vai se dando na forma de como organizamos o espaço em sala de aula: democrático, gerador de comunhão e participação; e no modo como nos relacionamos no cotidiano com nossos educandos. As estratégias de como decidir cooperativamente os critérios norteadores de avaliação (temida e odiada), a forma de como planejamos o trabalho e o modo de como socializarmos e envolvemos cada aluno são maneiras de respaldar o discurso explícito manifesto numa prática implícita. Certamente não estou dizendo nenhuma novidade. Pelo menos em algum momento já pensamos nisso. A verdade, porém, é que não fazemos isto. E nossos alunos dos cursos de magistério, ao saírem, continuam a repetir as mesmas práticas domesticadoras e bancárias, verticalistas, porque contribuímos também para isto. A Sociologia da Educação deve propiciar a percepção da relação intrínseca entre a prática da liberdade – expressão da libertação – e o projeto sócio-político que a referencia e a norteia. É preciso discutir e aprofundar o mito de que as mudanças sociais dependem da Escola. Hoje, é preciso rever esta posição. Uma sociologia positivista até que ajudaria a sustentar este mito. Não queremos isto. A Escola tem o seu papel no processo de mudança, mas os meios de socialização são os mais variados possíveis (família, igreja, partidos, sindicatos, meios de comunicação...). onde existem relações humanas se faz educação. Nossa prática educativa se faz a partir de determinadas teorias que ajudam a explicar e a entender a realidade. Logo, o saber e a forma como o produzo ajudam a explicitar o horizonte da sociedade que queremos construir.
Posso fazer, em minha prática cotidiana, levantamentos de dados, pesquisas, estatísticas, gráficos, tabelas. Isto tudo pode me ajudar a fundamentar uma análise sobre o homem, sobre o que é ele, como se dão suas relações, em que sociedade vive. Tudo isto deve servir para que possa discutir e aprofundar questões de relevância, como, por exemplo: o que torna a região de Pernambuco a terceira do mundo em mortalidade infantil? O que determina a existência de 45 milhões de menores carentes? Como explicar que, de cada mil crianças que ingressam nas séries iniciais, apenas duas concluem a universidade, ingressando no mercado de trabalho? Como explicar um país que organiza um estatuto da criança e do adolescente e convive com a impunidade dos “esquadrões da morte”?
Posso estudar as taxas de natalidade, de mortalidade... Se não fizer uma abordagem e uma interpretação sobre os mesmos, isto tudo vira mera curiosidade, conhecimento diletante ou, em alguns casos, discurso panfletário.
Como educadores, não podemos incorrer em abordagens, simplistas e lacaias do tipo: o que aí está, assim deve ser e deve ser aceito, pois esta é a ordem das coisas.
É interessante aprofundar com os nossos alunos esta análise do mundo funcionalista. Podemos perguntar-lhes: que conseqüências traz para a vida tal abordagem? Que visão de cidadania explicita? Para que horizonte aponta? O funcionalismo na educação acelera o abismo entre os que sabem e os que não sabem, os que pensam e os que não pensam, os que organizam e os que executam. Não passa por aqui o caminho do sonho, da Utopia, da esperança. Lembremos que as coisas não estão aqui simplesmente. Devem ser analisadas. Deve-se descobrir sua dimensão histórica. O homem é um sujeito histórico. A educação faz parte deste processo. Libertar é despertar consciência crítica. Somente assim avançaremos rumo ao futuro e à mudança. Ora, neste enfoque, a escola deve ser vista como uma orquestra que executa uma canção de amor e de paz. Superar a “mesmice”, o continuísmo”, o tecnocratismo, o cientificismo, o psicologismo, a burocracia e o medo, exige respostas inovadoras e corajosas. VIDA, penso ser a palavra que define um novo horizonte. Por que não provocar em sala de aula um aprofundamento a respeito das visões “conteudísticas”, tecnicistas e libertadoras da educação?
Não se trata apenas de provocar esta discussão, mas de caracterizar todos os elementos que interagem num espaço formativo chamado escola. Nesta última vertente, a da educação libertadora, gostaria de dar ainda mais alguns exemplos de como aprofundar o surgimento de uma consciência da cidadania. O que está presente no dia-a-dia presta-se a isto. As canções, por exemplo, incontáveis canções, sejam elas latinas, populares ou nativas, prestam-se a isto. Podemos analisar a questão da terra, fazendo uma pesquisa a respeito dos festivais de canções nativas, regionalistas, descobrindo, em seqüência histórica, como seus autores vão crescendo na consciência da função social da terra. Assim, também podemos analisar “Morte e Vida Severina”. Podemos pensar o êxodo rural através da leitura de Graciliano Ramos, em “Vidas Secas”... Podemos aprofundar a questão da violência urbana e do menor a partir do filme Pixote... Podemos resgatar a importância da dignidade humana na América Latina debatendo incontáveis documentários e filmes, como, por exemplo: “ A História Oficial”, “Prá Frente Brasil”, “Chove sobre Santiago”, etc... Podemos debruçar-nos sobre a questão da Mulher, da Prostituição, da Gravidez na Adolescência, da Sexualidade Infantil... Podemos fazer tudo isto numa perspectiva histórica, na qual o homem é agente e construtor. Provocar a libertação exige recursos didáticos que nos aproximam da realidade, como forma de explicitar as teorias. Nosso espaço didático-pedagógico é muito vasto e muito rico... Quanto mais nos aproximamos da realidade, quanto mais ela estiver presente em nossa sala de aula, mais e mais estaremos contribuindo para formar pessoas que pensam a educação.
Por fim, penso que a nós, educadores, cabe assumir em definitivo o papel do artista, do poeta, do cantador da palavra que há em nós.
Há muitas lutas por fazer... A defesa da universalização do saber, de uma escola de qualidade para todos, da clareza em nosso projeto sócio-político, da criação de canais de comunhão e participação, da democratização de escola e do acesso à mesma. Já é tempo de assumir este papel de discutir a cultura e de formar a cidadania. Formar a cidadania é pensar no povo, organizar o social. Com a história na mão, mangas arregaçadas no campo ou na cidade, em todas as idades, sigamos despertando, sensibilizando, acordando o sonho que há em cada cidadão. É preciso olhar para frente. Lá está a saída, o novo, o diferente. As perguntas estão aqui. As respostas, as encontraremos juntos, criativamente.
Ao iniciar este artigo, falávamos de duas teorias Sociológicas. De um lado, a que absolutiza o que está pronto, sem pretensões à transformá-lo. De outro, a que pensa o mundo dialeticamente. A história exige de nós um posicionamento entre estas duas. Eu já me decidi pela Segunda, porque creio que a vida não está pronta. Porque ela é dinâmica , um processo que se faz a muitas mãos e de muitas formas. Creio que deva ser o nosso credo. Acalentar o h. humanizar o “não homem”. Ser.
Carlos Alberto Barcellos
Educador nos Colégios Anchieta e Sévigné em Porto Alegre, especialista em psicomotricidade e Assessor da Anistia Internacional no Programa Nacional
http://www.dhnet.org.br/dados/livros/edh/br/rs/cidadan/cap2.htm
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